sábado, 3 de maio de 2014 By: Fred

{clube-do-e-livro} Ernesto Bozzano - Literatura de além túmulo









Ernesto Bozzano



Literatura de Além-túmulo





Do original italiano

Letteratura d'oltretomba













Miguel Ângelo,

Criação de Adão





¦






Conteúdo resumido



Nesta obra Ernesto Bozzano faz um estudo de seis obras lite-
rárias de origem mediúnica, com o objetivo de demonstrar,
através da criteriosa avaliação desse fascinante grupo de fenô-
menos, a sobrevivência do ser espiritual após a morte do corpo
físico.

Além da reunião e classificação metódica dos fatos observa-
dos, o autor registra as reações e analisa as explicações contrá-
rias à doutrina espírita, desmantelando-as com a demonstração
da inexeqüibilidade de sua aplicação a cada caso específico.








Sumário


Prefácio ......................................................................................... 4
Capítulo I ..................................................................................... 6
Capítulo II .................................................................................. 12
Capítulo III ................................................................................ 15
Capítulo IV................................................................................. 16
Capítulo V .................................................................................. 19
Capítulo VI................................................................................. 27
Capítulo VII ............................................................................... 35
Capítulo VIII ............................................................................. 57
Capítulo IX – Conclusão ........................................................... 68
Posfácio – Quem escreveu o livro de Balzac?.......................... 74
Obras de Ernesto Bozzano ....................................................... 80

Prefácio

O título desta obra sugere, a princípio, que a mesma se trata
de trabalho, como tantos outros, recebido do além; entretanto o
que se encontra em Literatura de Além-túmulo é um estudo, bem
documentado, acerca da produção literária que, através de inú-
meros médiuns, nos tem vindo do mundo espiritual.

Formulado sob a autoridade de um nome mundial, Ernesto
Bozzano, este livro não se destina exclusivamente aos espíritas,
porque a forte e abundante argumentação, que nele se condensa,
pode enfrentar objeções de qualquer natureza, pois é uma obra
que não teme a dialética nem o sofisma acadêmico.

Sabe-se muito bem que, em matéria de comunicações do a-
lém, há muita coisa que deve ser rejeitada, mas também se sabe
que na literatura mediúnica se registram fatos suficientemente
comprovados.

Ernesto Bozzano, homem de ciência, pesquisador frio e seve-
ro, é o primeiro a reconhecer que muitos ditados psicográficos
não suportam crítica, nem mesmo superficial. O acatado mestre
europeu entra no assunto com espírito de análise. Faz confrontos,
apresenta fatos, tira conclusões seguras e, por fim, sustenta a tese
espírita com absoluta convicção à luz de documentação convin-
cente. Não é por uma comunicação duvidosa que se julga todo o
volumoso patrimônio da literatura mediúnica. Bozzano demons-
tra, logo de início, que há comunicações que realmente não
passam de elaboração onírico-subconsciente, com personaliza-
ções sonambúlicas, diz ele, evidentemente grosseiras, mas é
preciso que se saiba distinguir tais comunicações das importantes
mensagens ou páginas literárias em que o médium não tem a
menor participação intelectual.

Muitos adversários do Espiritismo, sempre que se fala em
comunicações de "outro mundo", apelam para a hipótese do
subconsciente. Fizeram do subconsciente uma porta de saída
para todas as situações. Ernesto Bozzano cita, no entanto, casos
em que de maneira alguma se poderia invocar a possibilidade de


haver um médium armazenado no subconsciente certos conhe-
cimentos revelados inesperadamente.

Entre vários exemplos, para provar que a literatura do além é
real, autêntica, incontestável, o autor introduziu no livro um fato
curiosíssimo: uma senhora, que era médium, recebeu, em transe
mediúnico, uma obra intitulada Evangelho suplementar. Nesse
Evangelho, ditado na presença de pessoas de responsabilidade,
inclusive o rev. John Lamond, há conhecimentos de história
religiosa, de línguas antigas, etc., e a médium não tinha cultura
de tais assuntos, segundo apurou o próprio rev. Lamond.

Outro fato de que se ocupa, munido de documentos, é o do
célebre romance A Cabana do Pai Tomás. Muita gente sabe que
esse romance, aliás de fundo social, chegou a ser filmado e
esteve durante muito tempo em cartaz nos nossos cinemas.
Admitiu-se, depois, a possibilidade de haver sido essa obra, de
tão grande influência na vida norte-americana, transmitida
mediunicamente à sra. Harriet Beecher-Stowe. Lê-se em Litera-
tura de Além-túmulo o trecho em que a escritora Beecher-Stowe
confessa francamente: "Não fui eu quem a escreveu", isto é, A
Cabana do Pai Tomás. E acrescenta: "Deus a escreveu. Foi ele
quem ma ditou". Diante dessa afirmativa, Ernesto Bozzano
inclina-se pela hipótese mediúnica.

É um livro, portanto, de observações, fatos e crítica. Aqueles
que tiverem ocasião de ler Literatura de Além-túmulo, ainda que
não entendam de Espiritismo, ficarão seguramente orientados
para entrar no campo da produção mediúnica.

É, finalmente, um livro que deve figurar em toda estante de
obras espíritas.

Deolindo Amorim


Capítulo I

Entre as numerosas formas que revestem as manifestações
mediúnicas de natureza inteligente, não nos devemos esquecer
das que consistem na produção de obras literárias, às vezes bem
volumosas, ditadas psicograficamente por entidades que dizem
ser espíritos de mortos.

Há necessidade de notar que grande número dessas produções
mediúnicas não resistem a uma análise crítica, mesmo a mais
superficial, de tal modo é evidente serem apenas o produto de
uma elaboração onírico-subconsciente, de natureza grosseira e
mais ou menos incoerente, com personalizações sonambúlicas
que se formaram por sugestão ou auto-sugestão.

Essas personificações devem, em toda parte, nesses casos, ter
origem nos recursos do talento e da instrução própria às persona-
lidades conscientes de que provêm, com a conseqüência de que
as obras literárias dos supostos espíritos que julgam comunicar-
se são, algumas vezes, tão rudimentares, que traem sua origem,
sem que se possa ter a menor dúvida a esse respeito.

Não é menos verdade que, ao lado dos pseudomédiuns, en-
contram-se médiuns autênticos, por intermédio dos quais se
obtêm, às vezes, obras literárias de grande mérito, que levam a
uma reflexão séria e não podem ser atribuídas a uma elaboração
subconsciente da cultura geral, muito limitada, que se reconhece
nos médiuns que, materialmente, as escreveram. É então neces-
sário deduzir logicamente daí que essas produções provenham de
intervenções estranhas aos médiuns, tanto mais se se consideram
não somente as provas que se deduzem da forma, estilo, técnica
individual da obra literária e também da identificação de escrita,
como outras provas não menos importantes.

Essas provas consistem, sobretudo, em indicações pessoais
ignoradas de todos os assistentes e das quais se verifica, em
seguida, a veracidade; em citações não menos verídicas e desco-
nhecidas de todos, com referência a elementos históricos, geo-
gráficos, topográficos, filológicos, de natureza complexa e quase
sempre rara, enfim, em descrições minuciosas, coloridas e vivas,


de meios e costumes referentes a povos bem antigos, circunstân-
cias que não poderiam ser esquecidas pela hipótese cômoda da
emergência subconsciente de noções adquiridas e, em seguida,
esquecidas (criptomnesia).

Proponho-me, neste estudo, analisar as principais manifesta-
ções desse gênero, principalmente porque foram obtidos, ulti-
mamente, ditados mediúnicos que revestem alto valor teórico,
num sentido nitidamente espírita.

O que se obteve, no passado, nessa categoria de manifesta-
ções, só tem rara importância teórica; de qualquer forma, não me
absterei de dizer algumas palavras a respeito delas.

Começo por um caso de transição referente a uma célebre o-
bra literária. Tudo o que se pode dizer a seu respeito é que não é
fácil considerar se as modalidades, pelas quais veio à luz, devem
ser atribuídas a intervenções estranhas à médium ou bem a um
estado de superexcitação psíquica, bastante freqüente nas "crises
de inspiração", às quais são sujeitas as mentalidades geniais. Em
todo caso, trata-se de um fato interessante e instrutivo, dadas a
notoriedade da autora e a influência considerável que a obra
literária em questão exerceu sobre acontecimentos históricos e
sociais de uma grande nação.

Quero referir-me à célebre escritora sra. Harriet Beecher-
Stowe e ao seu bem conhecido romance A Cabana do Pai To-
más, o qual muito contribuiu para a abolição da escravatura nos
Estados Unidos da América.

O meio familiar em que viveu Harriet Beecher-Stowe pode
ser considerado como favorável a intervenções espirituais.

O prof. James Robertson assim fala na Light (1904, pág.
338):

"O marido, prof. Stowe, era médium vidente. Ele viu mui-
tas vezes, ao redor de si, fantasmas de defuntos, de maneira
tão nítida e natural que por vezes lhe era difícil discernir os
espíritos "encarnados" dos "desencarnados"."

Quanto à sra. Beecher-Stowe, ela era também grande sensiti-
va, "sujeita a crises freqüentes de depressão nervosa com fases


de ausência psíquica". Ela acolhera com entusiasmo o movimen-
to espírita que se iniciara na América, havia alguns anos.

Relativamente ao seu grande romance A Cabana do Pai To-
más, extraio da Light (1898, pág. 96) as seguintes informações:

"A sra. Howard, amiga íntima da sra. Beecher-Stowe, for-
neceu essas curiosas indicações relativamente às modalida-
des nas quais o famoso romance foi escrito. As duas amigas
estavam em viagem e pararam em Hartford para passarem a
noite em casa da sra. Perkins, irmã da sra. Stowe. Elas dor-
miram no mesmo quarto. A sra. Howard despiu-se imedia-
tamente e ficou, do seu leito, observando sua amiga ocupada
em pentear, automaticamente, seus cabelos anelados, dei-
xando transparecer em seu rosto intensa concentração men-
tal. Nesse ponto, a narradora continua assim:

Finalmente Harriet pareceu sair desse estado e disse-me:

– Recebi, nesta manhã, cartas de meu irmão Henry que se
mostra bastante preocupado a meu respeito. Ele teme que
todos esses elogios, que toda esta notoriedade que se criou
em torno de meu nome, produzam o efeito de provocar em
mim uma chama de orgulho que possa prejudicar mi-
nh'alma de cristã.

Isto dizendo, pousou o pente, exclamando:

– Meu irmão é, incontestavelmente, uma bela alma, po-
rém ele não se preocuparia tanto com esse caso se soubesse
que esse livro não foi escrito por mim.

– Como – perguntei eu, estupefata –, não foi você quem
escreveu A Cabana do Pai Tomás?

– Não – respondeu ela –, não fiz outra coisa senão tomar
nota do que via.

– Que está dizendo? Então você nunca foi aos Estados do
Sul?

– É verdade, todas as cenas do meu romance, uma após
outra, se me desenrolaram diante dos olhos e eu descrevi o
que via.

Perguntei ainda:


– Pelo menos você regulou a seqüência dos acontecimen-
tos.

– De modo algum – respondeu-me ela –; sua filha Annie
me censura por ter feito morrer Evangelina. Ora, isso não
foi por minha culpa; não podia impedi-lo. Senti-o mais do
que todos os leitores; foi como se a morte tivesse atingido
uma pessoa de minha família. Quando a morte de Evange-
lina se deu, fiquei tão abatida que não pude retomar a pena
por mais de duas semanas.

Perguntei-lhe então:

– E sabia que o pobre pai Tomás devia, por sua vez, mor-
rer?

– Sim – respondeu-me ela –, isto eu o sabia desde o prin-
cípio, porém ignorava de que morte iria morrer. Quando
cheguei a esse ponto do romance, não tive mais visões du-
rante algum tempo."

Em outro número da mesma revista, (1918, pág. 325), rela-
tou-se o seguinte episódio sobre o mesmo assunto:

"Certa tarde, a sra. Beecher-Stowe passeava sozinha, co-
mo de hábito, no parque. O capitão X. viu-a, aproximou-se
dela e, descobrindo-se respeitosamente, disse-lhe: Na minha
mocidade, li também com intensa emoção A Cabana do Pai
Tomás. Permiti-me apertar a mão da autora do célebre ro-
mance. A escritora, septuagenária, estendeu-lhe a mão, no-
tando, entretanto, vivamente:

– Não fui eu quem o escreveu.

– Como, não foi a senhora? – perguntou o capitão, sur-
preso –. Quem o escreveu então?

Ela respondeu:

– Deus o escreveu. Foi Ele quem ma ditou."

Na primeira das duas passagens acima, que acabo de citar,
nota-se uma emergência espontânea da subconsciência da autora,
consistindo em visões cinematográficas que traçam a ação do
romance, o que oferece grandes analogias com as modalidades


da cerebração donde saíram romances de outros autores de
gênio, tais como Dickens e Balzac. Estes últimos, por sua vez,
viam desfilar, subjetivamente, as cenas e os personagens que
tinham imaginado. A diferença entre as suas visões e as da sra.
Beecher-Stowe parece, então, consistir nesta última circunstân-
cia: eles assistiam ao desenvolvimento de acontecimentos que a
sua imaginação consciente tinha criado, ao passo que a sra.
Beecher-Stowe assistia, passivamente, ao desenrolar de eventos
que não tinha criado e que estavam, muitas vezes, em oposição
absoluta à sua vontade, pois que, por ela, não teria feito morrer
duas santas personagens do seu romance.

Esta circunstância é importante e parece fazer distinguir as
visões subjetivas, comuns aos escritores de gênio, das tidas pela
sra. Beecher-Stowe, da mesma maneira que as "objetivações de
tipos", estereotipadas e automatizadas, que se obtêm pela suges-
tão hipnótica, não apresentam nada de comum com as personali-
dades mediúnicas, independentes e livres, que se manifestam por
intermédio de verdadeiros médiuns.

A presunção de que não se tratava de visões puramente subje-
tivas adquire mais eficácia ainda graças à segunda das duas
passagens já citadas, na qual a sra. Beecher-Stowe declara,
explicitamente, ter transcrito seu romance como ele lhe fora
ditado, o que prova que a célebre autora era médium escrevente,
circunstância que se acha confirmada por fatos assinalados na
sua biografia, segundo os quais ela era sujeita a "fases de ausên-
cia psíquica" que eram, com toda verossimilhança, estados
superficiais de transe.

Em outro ponto de vista, faço notar que a exclamação da sra.
Beecher-Stowe: "Deus o escreveu", subentende que o ditado
mediúnico se realizou sob forma anônima, isto é, que o agente
espiritual operante ocultava a própria individualidade, limitando-
se, ao que parece, a cumprir na Terra a missão de que se encar-
regara: a de contribuir, eficazmente, graças a uma narrativa
emocionante e pungente, para a obra humanitária da redenção de
uma raça oprimida.

Julguei poder tirar do caso a conclusão que venho de narrar.
Todavia, não insisto nela, considerando que estas induções não


são suficientes para concluir a favor da origem realmente espírita
do romance em questão.

É necessário, todavia, notar que as bases sobre as quais re-
pousam as induções a favor de uma explicação puramente subje-
tiva dos estados da alma por que passou a autora, quando traba-
lhava em seu grande romance, parecem bem mais fracas, quando
são analisadas, que as da interpretação espírita dos mesmos
fatos.


Capítulo II

Passo a analisar um segundo caso do mesmo gênero, o qual
se deu na Itália, há vários anos. É um caso que não pode ser
chamado de transição como o precedente, especialmente porque
nele não se encontra a incerteza teórica proveniente do fato de
não ter a personalidade comunicante desvendado sua presença.
Neste outro episódio, ao contrário, as personalidades mediúnicas
declaram, explicitamente, o que elas são. Infelizmente, no ponto
de vista demonstrativo, as modalidades nas quais se produzem
aqui os ditados mediúnicos faltam em tal medida que isto suscita
perplexidades muito mais fortes que as do caso precedente. O
prof. Francesco Scaramuzza era diretor da Academia de Belas
Artes de Parma, onde ensinava pintura, arte na qual atingira
notável excelência.

Faltava-lhe, todavia, cultura literária, dado o fato de ter dei-
xado de freqüentar a escola na idade de 14 anos a fim de ganhar
a vida. Durante a sua mocidade, ocupou-se, por muito tempo, de
experiências de magnetismo animal, que praticara com sucesso.
Tornou-se espiritista quando já atingira uma idade bastante
avançada e, aos 64 anos, as faculdades de médium escrevente
nele se manifestaram, mas durante apenas 3 anos (1867-1869).
Durante esse curto espaço de tempo, escreveu, com vertiginosa
rapidez, enorme quantidade de obras poéticas de todas as espé-
cies.

Entre elas, mister se faz assinalar, um volumoso poema em
oitavas (29 cantos, 3.000 oitavas) intitulado Poema Sacro, assim
como duas comédias em verso, das quais o espírito de Carlo
Goldoni seria o autor. Essas comédias são vivas, brilhantes,
muito bem concebidas e finamente urdidas, com todo o sabor da
arte goldoniana.

Outro tanto, porém, não se poderia dizer do Poema Sacro,
que foi ditado pelo espírito do grande poeta Ludovico Ariosto.
Trata-se, nesse poema, de assuntos muito elevados, tais como a
natureza de Deus, a gênese do universo, a criação dos sóis e dos
mundos, a origem da vida cósmica, os fins da vida, os destinos


do espírito individualizado graças à passagem pela vida da carne.
Encontram-se, aqui e acolá, imagens magníficas, compreensí-
veis, grandiosas, mas quase sempre expressas em linguagem
pobre e em versos fracos e vulgares. Os conceitos cosmogônicos
que aí se encontram parecem racionais e aceitáveis; eles se
elevam, por vezes, a uma real altura filosófica, por exemplo,
quando tratam da imanência de Deus no universo, revelando-se
aos mortais sob a forma de movimento e quando se analisam o
tempo e o espaço, "atributos de Deus", pois que eles são infinitos
como Deus o é, o que, passando de uma dedução à outra, leva a
personalidade mediúnica comunicante a tender para uma con-
cepção idêntica à hipótese do "Éter-Deus". Experimenta-se
quase um sentimento de tristeza, vendo-se que pensamentos
filosoficamente sublimes são expressos em versos tão banais e
sob uma forma tão vulgar. Entretanto os versos são justos e
fáceis, as rimas quase sempre espontâneas, o que revela uma
familiaridade indiscutível com a técnica do verso por parte da
entidade que se comunicava. Esta se lastima, muitas vezes, de
que o seu médium revista as idéias que lhe transmite sob uma
forma poética descuidada, observando, porém, que não o pode
impedir. É preciso reconhecer que existe um fundo de verdade
nestas afirmativas da personalidade em questão, pois que elas
concordam com os conhecimentos que se possuem, atualmente,
sobre o assunto, graças a experiências de transmissão telepática
do pensamento tendentes a demonstrar que o pensamento só
pertence à mentalidade do agente, ao passo que a forma com a
qual ele é revestido pertence à elaboração subconsciente do
percipiente. É então necessário deduzir daí que, se, como acon-
tece neste caso, o médium é um homem desprovido de cultura
literária, ele só poderia expressar de forma empobrecida as idéias
que lhe seriam transmitidas, telepaticamente, pela personalidade
mediúnica de quem provém a comunicação.

É o que se pode invocar, em favor da origem estranha ao mé-
dium, desse Poema Sacro. Se ele nos surpreende, isto se deve à
elevação filosófica de algumas de suas partes; porém, com
relação à identificação pessoal do suposto espírito que se comu-
nicava, é preciso reconhecer que aí nada se encontra que seja de


molde a reforçar, diretamente, a presunção de que possa, efeti-
vamente, tratar-se de Ariosto, salvo a beleza de algumas ima-
gens, ainda que estejam constantemente empanadas pela vulgari-
dade da forma. Ao mesmo tempo, é preciso reconhecer, não
menos francamente, que, se se quer tudo atribuir às faculdades
de elucubração artística inerentes à subconsciência do médium,
fica o problema bastante obscuro e embaraçoso.

De fato, o médium não só não tinha cultura literária, como
nada conhecia de ciência e filosofia. Donde brotaria, então, a
inspiração grandiosa de certas partes de seu sistema cosmogôni-
co? Mister se faz não esquecer o fato surpreendente de o médium
ter, em três anos apenas, além do Poema Sacro, em 29 cantos e
3.000 oitavas – um volume de 915 páginas –, escrito duas comé-
dias em verso atribuídas a Carlo Goldoni, treze longos contos,
igualmente em versos, dois cantos em estâncias de três versos,
um melodrama, uma tragédia, cinco poesias cômicas assinadas
pelo seu falecido tio, que escrevera, efetivamente, versos dessa
espécie durante sua vida, e, enfim, um grosso volume de poesias
líricas. Trata-se de uma produção literária colossal, sempre fraca
no ponto de vista da forma, porém muitas vezes boa, algumas
vezes mesmo excelente, do ponto de vista da substância, ima-
gens e profundeza de pensamento filosófico.

De qualquer forma, concordo francamente que não é o caso
de se parar, ulteriormente, no comento da produção mediúnica
de Scaramuzza, embora não apresente dados suficientes para
dela tirar deduções mais ou menos legítimas em favor de uma ou
de outra das hipóteses explicativas antagônicas, que dividem o
campo da metapsíquica.

Provavelmente, nem uma nem outra das hipóteses em questão
poderia bastar para explicar essa produção literária, se a conside-
rarmos isoladamente. Seríamos, então, levados a concluir que,
nesses casos, as interferências subconscientes poderiam alternar-
se, de maneira inexplicável, como irrupções fugazes de inspira-
ção supranormal, cuja natureza ainda não está definida.


Capítulo III

Agora, já que falei de um caso que se passou na Itália, direi
duas palavras sobre um outro, inteiramente recente, que se
produziu em um grupo de experimentação na Lombardia, onde
se manifestou uma entidade que afirmava ser o espírito de um
escritor falecido muito jovem, havia poucos anos.

Fora ele, em vida, autor genial de novelas com traços caracte-
rísticos de estilo, de forma de imaginação difícil de imitar-se.
Ora, aconteceu que a entidade em questão, a título de prova de
identificação pessoal, ditou vários contos absolutamente confor-
mes aos que escrevera quando vivo.

Esses documentos mediúnicos foram publicados. A pessoa
que tomou tal iniciativa enviou-me um exemplar da obra e eu
fiquei surpreso com a semelhança incontestável da técnica
literária e da imaginação criadora existentes entre os contos
escritos durante sua vida e os ditados pela entidade comunicante.

Propus-me, então, a analisar, a fundo, o caso em apreço, na
presente monografia. Infelizmente, os pais do falecido moço se
opuseram à divulgação da obra, o editor teve de retirá-la de
circulação e se me proibiu de falar dela.

Isso é tanto mais deplorável quando se trata de documentos
mediúnicos donde sobressairiam detalhes mais instrutivos e
sugestivos que não comportam a maior parte dos escritos dessa
espécie.

O que me consola um pouco é pensar que, como nenhuma
vontade humana pode impedir o defunto de continuar a se mani-
festar, ditando produções literárias com o fito de demonstrar sua
sobrevivência, outras provas virão juntar-se às primeiras e o caso
de identificação do autor terá cada vez mais valor, esperando-se
o dia em que for levantado o veto injustificado pela vontade
daqueles que o impuseram, ou por qualquer outro motivo.


Capítulo IV

Nada querendo omitir na enumeração dos casos especiais de
que me ocupo neste estudo, devo ainda tocar no tão conhecido
episódio relativo ao romance de Charles Dickens: Edwin Drood,
que ficou inacabado por ocasião do falecimento deste e que o
espírito do romancista teria, ele próprio, terminado post mortem,
por intermédio do médium T. P. James, jovem operário mecâni-
co dos Estados Unidos da América, sem cultura literária de
espécie alguma.

O caso se deu em 1873 e parece incontestavelmente autênti-
co. As condições nas quais se desenrolou essa série de sessões
são bem interessantes e também muito conhecidas, sobretudo
devido à obra de Aksakof, não havendo, portanto, necessidade de
recordá-las. A origem supranormal da obra mediúnica em ques-
tão foi, alternativamente, afirmada e contestada por numerosos
comentadores que o fizeram, empregando, igualmente e com a
mesma eficácia, a análise comparada das duas partes – a autênti-
ca e a póstuma – do romance em questão. Os que são favoráveis
à solução puramente consciente do enigma tratam, sobretudo, de
salientar e comentar os defeitos e as incoerências de natureza
geral. Assim, por exemplo, a sra. Fairbanks faz notar que se
encontrou, nos papéis póstumos de Charles Dickens, uma cena
que este autor escrevera, com antecedência, para a segunda parte
do seu romance; ora, esta cena foi ignorada no ditado mediúnico.
A sra. Vessel nota, por sua vez, que, lendo essa segunda seção
póstuma do romance em apreço, encontrou, pela primeira vez,
Dickens monótono e pesado. Ao contrário, os que sustentam a
proveniência, autenticamente espírita do ditado mediúnico, não
deixam de ter bons argumentos para fazerem valer. Eles fazem
notar que a narração é retomada no ponto exato em que Dickens
a interrompera, ao morrer.

Isto se dá com tal naturalidade que a crítica mais sagaz não
seria capaz de assinalar o ponto em questão.

Fazem da mesma maneira sobressair detalhes de forma, de
estilo, de construção, de ortografia, realmente eloqüentes no


sentido afirmativo. Assim, por exemplo, a palavra traveller
(viajante) está constantemente escrita com "L" duplo, como se
escreve na Inglaterra, enquanto nos Estados Unidos da América
se escreve com um único "L". A palavra coal (carvão) está
invariavelmente escrita com um "s" final, à maneira dos ingle-
ses, e não segundo o uso dos americanos. Finalmente, passa-se,
no ditado mediúnico, do tempo passado ao presente, sobretudo
nas cenas movimentadas, hábito característico de Dickens, o que
não se dá com os outros romancistas.

Sir Conan Doyle, analisando, por sua vez, esse caso, em um
artigo publicado na Fortnightly Review (dezembro de 1927),
salienta outras analogias do mesmo gênero, começando pelos
títulos dos capítulos, que guardam, constantemente, na obra
mediúnica, a impressão original dos títulos caros a Dickens. Ele
cita, além disto, duas passagens descritivas, extraídas do ditado
mediúnico, as quais põe em confronto com duas passagens do
mesmo gênero, tiradas da parte autêntica do romance, sem
indicar os textos a que pertenciam os diferentes trechos e convi-
da os críticos a distinguirem as autênticas das mediúnicas. Sir
Arthur declara que a coisa não está longe de ser fácil, dada a
identidade do estilo e da forma, assim como sua beleza literária,
sinal do mesmo temperamento artístico.

Apesar disso, sir Arthur também reconhece que o verdadeiro
Dickens teria provavelmente feito agir, de modo diferente, certos
personagens do romance, porém observa:

"Parece-me, entretanto, que não se deveria insistir muito
sobre este ponto, sem pretender que um Dickens, entorpeci-
do por sua união com o médium James, deva ficar, mental-
mente, tão ágil como um Dickens, senhor absoluto de si
próprio. É preciso, logicamente, admitir qualquer coisa a es-
se respeito."

Noto, por minha vez, que esta última consideração está con-
forme ao que já fiz observar a propósito dos ditados mediúnicos
de Francesco Scaramuzza.

Não obstante isto, Conan Doyle conclui dizendo que, no ro-
mance póstumo em questão, "está-se bem longe ainda de ficar-se


autorizado a afirmar a existência de uma inspiração real da parte
do grande romancista".

É nesse sentido que concluiremos também, isto é, que, se os
processos da análise comparada, ainda esta vez, são, em seu
conjunto, mais favoráveis à hipótese mediúnica do que à contrá-
ria, esta circunstância não autoriza, entretanto, a formação de
juízos precisos a tal respeito. Deve-se, mais, reconhecer que o
caso Dickens ainda não pode ser registrado entre os que servem
para fazer pender a balança das probabilidades a favor da inter-
pretação espírita dos fatos.


Capítulo V

No caso de que vou ocupar-me, pode-se assinalar o primeiro
passo decisivo no domínio supranormal, ainda que se fique bem
perplexo quando se quer definir a verdadeira natureza da mani-
festação supranormal ocorrente. Quero falar do caso muito
conhecido: "William Sharp-Fiona Macleod", no qual se vê
aparecer a misteriosa união de dois escritores, de caráter muito
diferente, em uma só pessoa.

O crítico literário sr. F. E. Leaning, que fez um estudo apro-
fundado do caso em questão, começa assim seu artigo, aparecido
na Light (1926, pág. 218):

"Nos primeiros meses do ano de 1890, o mundo literário
inglês foi agradavelmente surpreendido com a publicação de
um romance e de uma coleção de versos que traziam o nome
de Fiona Macleod. Embora esse nome fosse desconhecido
de todo o mundo, era evidente que se tratava de uma estrela
de primeira grandeza que surgia no horizonte das letras. Foi
o que, de fato, se deu, e durante dez anos ela brilhou com
um esplendor incomparável, fazendo as delícias dos amantes
de uma literatura que se inspirava nas origens célticas.

O sucesso incontestável dessa série de obras literárias, sa-
turadas de estranho encanto, que prendia e entusiasmava os
leitores, não devia surpreender, de tal modo estavam vivifi-
cadas por um "sal céltico", espalhado às mãos cheias. A
prosa continha mais poesia do que uma multidão de poetas
poderia conceber.

Foi assim que a obra de Fiona Macleod encantou os cora-
ções de uma geração inteira. O grande Meredith saudara a
novel escritora como uma mulher de gênio e autores como
Yeats e Russell acolheram-na como seu êmulo.

Quando lhe pediram que lhes fornecesse algumas infor-
mações sobre sua pessoa, disse ser nascida, há mil anos, de
um pai chamado "Sonho" e de uma mãe chamada "Roman-


ce", numa residência situada lá onde o arco-íris toma sua
forma.

Naturalmente, o mistério de que se cercava a amável es-
critora fez com que diversas pessoas sonhassem com a fan-
tasia e algumas mesmo chegaram até a adivinhar a verdade,
mas estas foram logo neutralizadas pelo mais solene des-
mentido ou bem reduzidas ao silêncio, desvendando-se-lhes
o mistério, depois de se lhes ter feito jurar guardar segredo.
Este foi, efetivamente, bem guardado até a morte do autor,
que ocorreu em 1905. Foi então que o mundo literário ficou
estupefato e um zumbido de abelhas em enxames se formou
em todas as revistas, quando se soube que a misteriosa mu-
lher de letras, cheia de graça e de fantasia femininas, com a
qual vários autores haviam flertado de longe, era a mesma
pessoa que o publicista e romancista William Sharp."

Tal é a descrição proveitosa na qual F. E. Leaning narra o su-
cesso literário triunfal da misteriosa Fiona Macleod, terminado
pelo desfecho que se acaba de ler.

A viúva de William Sharp publicou um volume de memórias
biográficas de seu marido, expondo os fatos na sua crônica
verdadeira e detalhada, com o fim de facilitar a tarefa dos psicó-
logos desejosos de analisar o caso. Soube-se, pelo volume em
apreço, que William Sharp era "sensitivo" e "vidente", desde a
sua primeira infância. Ele percebia em torno de si companheiros
de brinquedos invisíveis, via os "espíritos das árvores", o "espíri-
to da natureza" que lhe apareciam sob formas gigantescas ou
anãs.

Certo dia, teve a visão da "fada dos bosques", sob o aspecto
de uma mulher de grande beleza que ele chamou de "Olhos-de-
estrela". Tinha sete anos quando a viu pela primeira vez durante
um dia quente de verão, ereta e esplêndida, no meio de flores
campestres, de campânulas azuis. Tal encanto, tal amor, se
desprendiam de seus olhos que o menino se atirou nos braços
dela. Acharam-no lá, na relva, choroso e lamentoso, pedindo,
apaixonadamente, para rever a bela dama de "cabelos-de-ouro-
luminoso".


Disseram-lhe que ele tinha sido ofuscado pelo sol e que havia
tido um belo sonho. Sharp acrescenta: "Nada disse. Tranqüilizei-
me, mas não me esqueci da visão". E quando o menino cresceu,
quando se tornou publicista e romancista, "a fada dos bosques",
sob o nome de Fiona Macleod, interveio, ditando por "inspira-
ção" romances e poemas saturados de graça feminina, de fantasi-
as, de sonhos, de reminiscências célticas de há mil anos. Tal foi,
pelo menos, a convicção profunda de William Sharp, que sofria,
entretanto, momentos de incertezas, provenientes da circunstân-
cia de que era sujeito a emergências altamente sugestivas, de
recordações pessoais de uma outra existência, vivida como
mulher, o que o levava, por vezes, a identificar-se como Fiona
Macleod.

Na página 301 das Memórias em questão, a viúva fala, nos
seguintes termos, das diferenças radicais existentes entre o modo
de seu marido compor quando personificava Fiona Macleod e
quando escrevia por sua própria conta:

"Durante os anos em que Fiona Macleod desenvolveu, tão
rapidamente, sua própria personalidade, seu colaborador ex-
perimentava a necessidade de sustentar, nos limites do pos-
sível, a reputação que havia adquirido na qualidade de Wil-
liam Sharp. Ele estava mesmo ansioso por não perdê-la, mas
havia uma diferença radical entre as modalidades de produ-
ção dos dois gêneros literários. Os escritos de Fiona Macle-
od eram a conseqüência de um impulso interior irresistível:
ele escrevia porque era obrigado a exprimir o que lhe brota-
va do espírito, sem ser procurado, pouco importando se isso
lhe causava prazer ou tristeza. Quanto ao escritor William
Sharp, ele produzia com modalidades diametralmente opos-
tas às da sua personalidade gêmea: escrevia porque havia
decidido fazê-lo e polia cuidadosamente a forma do que es-
crevia. Finalmente, ele escrevia porque as necessidades da
vida lhe impunham..."

Fica então demonstrado que William Sharp escrevia, por um
impulso estranho à sua vontade, as obras de Fiona Macleod, o
que deixa supor que ele era médium inspirado. Isto, aliás, ressal-


ta, em toda parte, de modo certo, de várias passagens das memó-
rias publicadas por sua viúva. Assim, por exemplo, na página
424, ela escreve:

"Achei-me, muitas vezes, ao lado dele, quando caía em
transe; então todo o ambiente palpitava, tudo entrava em in-
tensa vibração. Deploro não ter logo tomado nota dessas ex-
periências, que eram freqüentes e constituíam um traço ca-
racterístico de nossa vida íntima."

E William Sharp, escrevendo à sua mulher, em data de 20 de
fevereiro de 1895, assim se exprimia:

"Que coisa bizarra e eletrizante é o fato de existirem em
mim duas pessoas, ainda que íntimas! E entretanto elas são
tão diferentes! Sinto às vezes como se Fiona estivesse ador-
mecida no quarto ao lado e eu me surpreendesse em atitude
de escutar para lhe perceber os passos ou ver abrir a porta e
Fiona aparecer. Quando, porém, ela se comunica comigo, é
falando, interiormente, em voz baixa. Espero agora, com an-
siedade, saber como desenvolverá ela o assunto do novo ro-
mance The Mountain Lovers. Como é estranha esta impres-
são de sentir-me aqui sozinho com ela." (pág. 244).

A certeza de ter uma companheira invisível, na vida, estava
de tal modo arraigada nele que ela o levava a coisas curiosas.
Assim, por ocasião da data do seu aniversário, ele escreveu a si
próprio uma carta de felicitações provinda de Fiona; em seguida
escreveu outra de agradecimentos a ela e colocou ambas no
correio. Encontraram-se em sua biblioteca vários volumes com a
dedicatória: "A William Sharp, sua colaboradora e amiga Fiona
Macleod."

Ao que parece, essas dedicatórias eram autênticas, sob certo
ponto de vista, pois que provinham de uma personalidade medi-
única que as firmava e eram transcritas automaticamente pelo
médium.

Um amigo de juventude de William Sharp narra na Light
(1910, pág. 598) um episódio que confirma ulteriormente sua
mediunidade. Escreve ele:


"Há vários anos (por volta de 1878), fiquei conhecendo
William Sharp e tornei-me seu amigo. Ele não era ainda ca-
sado e morava em um pequeno apartamento, perto do nos-
so. Certo dia, aconteceu-me fazer referências, em conversa,
ao neo-espiritualismo e ele declarou que nunca assistira a
experiências dessa natureza e que as veria com prazer, se
uma oportunidade se lhe apresentasse. Convidei-o então pa-
ra tomar parte no nosso círculo familiar. Alguém pergun-
tou: "Quem são os guias espirituais do sr. Sharp?" A mesa
respondeu, lentamente, um nome da família escocesa "Ma-
cleod" (não me lembro bem do nome próprio que deu). Isto
me levou a perguntar ao sr. Sharp: "Seus antepassados eram
escoceses?"

Alguns anos mais tarde, convidei-o para ir à minha resi-
dência, por ter necessidade de um seu conselho, a respeito
do título de um livro de versos que desejava publicar, e
confiei-lhe que havia escrito vários poemas do volume por
"inspiração". Ele exortou-me, vivamente, a ocultar isto se
não quisesse comprometer-me perante os críticos... Em ou-
tra ocasião e a propósito dos poemas de Fiona, ele me ex-
primiu a mesma preocupação: "Fiona morre se descobrem o
segredo de sua existência."

Parece-me que tudo isto basta para esclarecer o mistério.
Sharp era médium inspirado, mas temia que o descobris-
sem. As admiráveis coleções de versos que publicou consti-
tuíam impressões de uma inteligência espiritual que era
verdadeiramente seu espírito guia: "seu nome devia ser re-
almente aquele que tinha sido transmitido, pela primeira
vez, em nosso círculo familiar: Macleod – o que se verifi-
cou vários anos antes que Fiona Macleod se manifestasse a
Sharp."

Sem dúvida, se nos propuséssemos examinar os fatos sob um
ponto de vista estritamente psicológico, poderíamos pensar em
um caso de personalidades alternantes. Há, porém, muitas dife-
renças entre os casos patológicos das personalidades múltiplas
provenientes do fenômeno de desintegração psíquica e o caso
que estudamos aqui. No Journal of the Society for Psychical


Research (vol. XIX, pág. 57), assinalaram-se algumas dessas
diferenças radicais:

"As duas personalidades de William Sharp – escreve o crí-
tico – eram coordenadas entre si, sob certo ponto de vista:
não se notava nenhuma superioridade nítida e precisa de
uma sobre outra, tanto moral como intelectualmente; as al-
ternativas, com as quais se manifestavam, não pareciam as-
sociadas a elementos patológicos. Eram ambas acentuadas
por um temperamento muito sensitivo e em alta tensão, mas
nenhuma das duas mostrou jamais lacunas no seu equilíbrio
mental e no controle de si mesmas. Ambas produziram obras
literárias de uma beleza especial, embora Fiona ultrapassas-
se muito a outra em originalidade, em poder descritivo e em
imaginação. Além disso, o traço característico das persona-
lidades alternantes: o das notáveis variações de humor entre
elas – variações que determinam mudanças mais ou menos
grandes no caráter e conduzem a uma alternativa real das
personalidades – é considerado pelos psicólogos como sendo
dependente do fato de que há ou não lacunas mnemônicas
entre os diferentes estados mentais... Ora, não havia lacuna
mental entre William Sharp e Fiona Macleod e a conclusão
de que deve tratar-se de duas personalidades diferentes pare-
ce fundar-se na impressão precisa e insofismável de que as-
sim era, experimentada pelas próprias personalidades, im-
pressão que não parecia, todavia, excluir a outra, segundo a
qual havia entre elas uma unidade misteriosa, oculta sob as
diferenças."

Assim como fiz notar anteriormente, esta última impressão de
Sharp sobre a existência de uma unidade fundamental, apesar da
diferença existente entre a personalidade de Fiona e a sua pró-
pria, era causada por especiais reminiscências segundo as quais
lhe parecia ter vivido uma outra existência sob a forma de uma
mulher.

A esse respeito, declaro francamente que essas espécies de
impressões experimentadas por William Sharp não se prestam,
de modo algum, a esclarecer o mistério, longe disto! Com efeito,


se a hipótese psicológica das personalidades alternantes parece
facilmente eliminável, estando em contradição evidente com o
conjunto dos fatos, as outras duas hipóteses, que devem ser
tomadas em consideração, reconhecendo-se-lhes igualdade de
direitos (pois que as impressões experimentadas pelo protagonis-
ta não se contam para a pesquisa das coisas), não parecem facil-
mente conciliáveis entre si. Se apenas se trata de uma entidade
espiritual, que tivesse transmitido telepaticamente suas criações
literárias ao médium, o caso em questão poderia ser explicado
muito facilmente; a hipótese reencarnacionista, porém, contribui
para obscurecê-la. Com efeito, nestas condições, seria necessário
admitir que uma fração da personalidade integral do médium –
fração representando uma de suas próprias individualizações
encarnadas, que existiu em época recuada – tenha podido emer-
gir e se manifestar à sua individualização atualmente encarnada,
nas condições de intelectualidade que a caracterizaram.

Compreende-se que esta suposição é muito fantástica, lite-
ralmente gratuita e teoricamente inconcebível. A melhor solução
do mistério consistiria então em retornar á hipótese de uma Fiona
Macleod, espírito-guia de William Sharp, e aí parar. Nesse caso,
se poderia resolver legítima e racionalmente o problema das
reminiscências, fazendo notar que as impressões do médium, que
se sentia às vezes invadido por sentimentos femininos com
reminiscências de uma vida passada sob a forma de uma mulher,
deveriam ser atribuídas à circunstância da realização de interfe-
rências fugitivas entre a consciência normal do médium e a
memória pessoal do espírito-guia que lhe controlava então o
órgão cerebral e lhe influenciava telepaticamente o pensamento.

Faço notar que, nas experiências de psicometria, encontra-se
muitas vezes a circunstância de terem os sensitivos a impressão
de ser identificados na personalidade de um vivo ou de um
morto, com o qual entram em relação, a ponto de experimenta-
rem as idiossincrasias de temperamento deles, com o despertar
de reminiscências a respeito de suas modalidades de existência,
impressões do meio no qual viveram, como se estivessem mo-
mentaneamente unificados com eles, embora conservando a
própria consciência.


Na minha monografia Os Enigmas da Psicometria, citei e-
xemplos nos quais essa identificação do sensitivo nos aconteci-
mentos da existência de outras pessoas se realiza, mesmo quando
se trata de colocação em relação com animais.


Capítulo VI

Lembro-me que há alguns anos, tendo consagrado longo es-
tudo à análise das admiráveis provas de identificações pessoais
fornecidas pela entidade Oscar Wilde,1 o célebre poeta e drama-
turgo inglês, nas suas comunicações por intermédio da médium
Esther Dowden, terminei observando que, no caso em questão,
foram dadas todas as provas cumulativas que se estava razoa-
velmente com o direito de exigir nestas circunstâncias.

Enumerei, com efeito, a transmissão das numerosas provas
pessoais, ignoradas de todos os assistentes e das quais se consta-
tou a autenticidade; a prova memorável da identidade da escrita,
seguida, de modo impecável, no decorrer de várias centenas de
páginas; a prova mais importante ainda da identidade do estilo,
ou, para melhor dizer, dos dois estilos que caracterizavam a
personalidade literária do defunto; enfim, a mais concludente
ainda, da emergência da personalidade intelectual e moral de
Oscar Wilde com todas as variedades de seu caráter: personali-
dade complexa, original, inimitável. Depois do que acrescentei:

"Noto, finalmente, que Oscar Wilde prometeu, por fim,
acrescentar às provas fornecidas até aqui uma nova demons-
tração: a de uma comédia póstuma com o auxílio da sua mé-
dium."

Ele manteve a palavra. A comédia foi ditada à médium logo
depois da publicação de seu livro: Psychic messages from Oscar
Wilde. Esther Dowden (Travers-Smith) dá, a esse respeito, as
seguintes informações:

"Nunca fui admiradora das obras de Oscar Wilde, pois sua
personalidade nunca me prendeu a atenção. Creio racional-
mente concluir então que minha mão tem escrito informes e
escritos que não provêm de mim. Oscar Wilde viveu em
uma época que não foi a minha; suas obras exalam uma at-
mosfera literária muito diferente das obras dos nossos dias.
Não posso tornar para trás, ao período de 1880, como ele fa-
zia; ele não pode se emancipar dos gostos literários e dos


costumes do seu tempo, do qual nada me lembro. Ora, é nes-
ta condição mental que consiste o traço característico mais
saliente de todas as suas mensagens mediúnicas e de sua
comédia. Quando me ditava, pediu-me que o informasse so-
bre os gostos literários e costumes de nossa época e eu lhe
expliquei as mudanças radicais que se tinham efetuado, mas
ele não o levou em conta e não quis se emancipar dos cos-
tumes do meio em que viveu.

Pessoalmente, considero que a prova mais convincente
que se pode imaginar em favor da sobrevivência da alma é
a que se refere à personalidade intelectual e moral dos de-
funtos que se comunicam. As indicações relativas à exis-
tência terrestre, sobretudo se desconhecidas de todos os as-
sistentes, são importantes e convincentes, mas quase sem-
pre suscetíveis de serem explicadas pela hipótese das remi-
niscências latentes nas subconsciências dos assistentes
(criptomnesia). Nenhuma intenção tenho de contestar a im-
portância desses informes, que constituem a base sobre a
qual repousam as pesquisas experimentais concernentes à
questão da sobrevivência; sem elas não se poderia conside-
rar como a identificação do defunto tenha sido provada. En-
tretanto, cada vez que as informações desse gênero consti-
tuem as únicas provas de que dispomos, não podemos con-
siderar-nos autorizados a afirmar que a personalidade do
defunto comunicante estava realmente presente ou que o
espírito sobrevive à morte do corpo. É a mentalidade do
morto que é preciso salientar nas manifestações mediúni-
cas; é a sua personalidade intelectual e moral, com todos os
matizes do seu temperamento e a maneira de compor as fra-
ses que o caracterizavam. Eis o que devemos examinar ex-
perimentalmente, se queremos chegar a dissipar qualquer
dúvida relativamente ao problema do além. Penso que, no
domínio das pesquisas psíquicas, não se compreendeu ainda
toda a importância decisiva que reveste a personalidade
psíquica da entidade que se comunica e que deveria ser o
elemento essencial nas provas de identificação espírita.


Quando as mensagens de Oscar Wilde se sucediam diari-
amente, eu lhe perguntava se não podia ditar-me alguma
obra literária, a título de prova ulterior de sua presença. Di-
rigindo-lhe este pedido, não pensava absolutamente em
uma produção de teatro mas, antes, em seus ensaios literá-
rios, onde, a meu ver, se acha o que de melhor o seu talento
produziu. Foi o próprio Oscar Wilde que me declarou que
ia escrever uma comédia e que se sentia em condições de
fazê-lo. Quanto a mim, fiquei antes cética a esse respeito:
tinha notado, com efeito, que, na mediunidade psicográfica,
as sessões curtas são as únicas que dão bons resultados e
considerava então como irrealizável o seu projeto de me di-
tar uma comédia inteira.

As primeiras tentativas pareceram, de fato, justificar meu
ceticismo: Oscar Wilde era um comunicante indeciso, difí-
cil, autoritário, por vezes de um humor muito desagradável.
Durante as primeiras cinco ou seis sessões, ele discutiu co-
migo a respeito das condições mediúnicas; informou-me
que tinha já concebido o cenário de uma comédia inteira,
que eu nada tinha a me preocupar; que se sentia em condi-
ções de dispor as cenas, de escolher os nomes dos seus per-
sonagens, de desenvolver os diferentes caracteres utilizando
eficazmente a técnica do drama. Fiz-lhe notar que as anti-
gas modalidades tradicionais dos cenários tinham sofrido,
em nossos dias, grandes mudanças, como, por exemplo, os
"à parte" tinham sido abolidos. Ele respondia, da mesma
maneira, a todas as minhas observações, isto é, advertindo-
me que eu não era autora dramática e que como ele já tinha
em sua cabeça todo o entrecho do drama, não poderia desis-
tir...

Com efeito, desde o começo, era manifesto que Oscar
Wilde tinha organizado, em seu espírito, todo o enredo da
comédia, ainda que não chegasse a desenvolver seu diálogo
do modo que desejava. Devo reconhecer, sinceramente, que
a falta era minha, pois estava nessa época sobrecarregada
de trabalhos urgentes que me absorviam a atividade.


Durante os meses de junho e julho de 1923, o primeiro
ditado do drama foi executado; ele tão-só constituía, entre-
tanto, uma espécie de rascunho que foi repudiado pelo au-
tor. Não quero dizer com isso que ele tenha depois refeito a
ordem das cenas, pois esta ficou tal qual era, mas os carac-
teres dos personagens foram, ao contrário, sensivelmente
reformados.

Depois, no mês de agosto, pude consagrar, regularmente,
três ou quatro sessões por semana a Oscar Wilde: isso se
dava habitualmente das 11 às 13 horas.

O sistema de trabalho que Wilde tinha adotado consistia
em um retorno contínuo para trás. Quando ele tinha ditado
um ato de sua comédia, minha auxiliar, srta. Cummins, de-
via relê-lo em alta voz, e Oscar Wilde a interrompia a todo
o instante, sugerindo correções que sempre constituíam
uma melhora sensível sobre o que ditara precedentemente.
Sua diligência era extraordinária, ela excedia muito minha
força de trabalho. Ele refazia, aperfeiçoava, intercalava um
período com cuidados tão meticulosos que se tornava peno-
so continuar, tal o sentimento pesado de monotonia que,
transformando-se em sonolência, me causava.

Tinha resolvido nunca reler o que tinha sido transmitido
mediunicamente, a fim de evitar que a minha mente sub-
consciente pudesse exercer certa influência sobre o ditado
em curso; pensava então que não havia nessa comédia ne-
nhuma idéia coerente e me sentiria desencorajada se a srta.
Cummins não estivesse aí para garantir-me, de tempos em
tempos, que o tema se desenvolvia, diariamente, de maneira
precisa e interessante.

A obra dramática foi intitulada por seu autor: Uma comé-
dia extraordinária. Se ela devesse ser representada, duvido
que os diretores de teatro consentissem em conservar tal tí-
tulo, mas creio que Oscar Wilde não veria com bons olhos a
modificação.

Oscar Wilde explicou que se propusera delinear na sua
comédia a continuidade inalterada da existência humana –


nos seus alvos e nas suas aspirações – assim também antes
como depois da crise da morte, e que, por conseqüência, o
último ato ia desenrolar-se no mundo espiritual. Quando ele
exprimiu esta proposta, voltou-me o desânimo, sabendo
bem eu que nada é tão árduo em literatura como inserir ce-
nas do além em uma comédia. Quando se quer aí introduzir
este elemento, vai-se, inevitavelmente, ao encontro do insu-
cesso. Tais eram minhas preocupações quando Oscar Wilde
anunciou que o último ato de sua comédia devia-se desen-
rolar nas esferas espirituais...

Quando o drama foi terminado, li-o para uma das minhas
amigas, que possui grande experiência de teatro. Logo que
cheguei ao meio do segundo ato, ela me interrompeu, no-
tando: "Tudo isso é tão mundano que o autor jamais chega-
rá a passar a ponte que separa o visível do invisível. Eis
uma tarefa impossível!"

Terminada, porém, a leitura, minha amiga teve exclama-
ções de surpresa e admiração pela genialidade com a qual o
autor tinha sabido vencer o obstáculo. Nenhuma solução de
continuidade no desenvolvimento do drama, embora os dois
primeiros atos sejam de um gênero ligeiro, análogo à co-
média do mesmo autor: A importância de ser sério.

O drama termina com uma nota consoladora: o amor po-
de, ou não, existir no além tal como o conhecemos aqui.
Nas esferas espirituais, o amor-paixão não deixa de existir,
o amor se manifesta na pesquisa da "alma gêmea", com-
plemento de nós mesmos. Nós nos completamos: tal é a as-
piração suprema de todo o espírito; quando o fim é atingi-
do, os espíritos casados vêem nítida e luminosamente o ca-
minho ascensional que lhes resta a percorrer, unidos um ao
outro." (Light, 1925, pág. 524).

Tal é a interessante e instrutiva descrição feita pela sra. Es-
ther Dowden a respeito da maneira pela qual foi ditada a comé-
dia de Oscar Wilde. Para completá-la, vou reproduzir uma alínea
de um artigo que foi consagrado ao memorável acontecimento
pelo sr. David Gow, diretor da revista Light. Escreve ele:


"Notarei de passagem que assisti, pessoalmente, ao ditado
mediúnico do drama de Oscar Wilde durante o qual o autor
morto ocupou a médium e sua secretária por várias semanas
consecutivas, corrigindo, refazendo, suprimindo, dando tan-
tas disposições e ordens que tornava muito penosa a existên-
cia das duas damas. Tudo se desenrolou como se o autor in-
visível, mas absolutamente real, se metesse febrilmente ao
trabalho, desenvolvendo alternativamente um temperamento
irritável, choramingador, brilhante cínico, e algumas vezes
dócil e simpático. A comédia, que veio assim à luz, parece
uma obra de arte extraordinária, mas é preciso notar a esse
respeito que um diretor de teatro a quem ela foi oferecida
para ser representada, depois de a ter lido, relido e pesado,
declarou que ele renunciava a pô-la em cena, não porque não
fosse obra de Oscar Wilde, mas porque era dele mesmo! Ele
queria, com estas palavras, fazer alusão ao assunto e à técni-
ca do desenvolvimento das comédias de Oscar Wilde, que
julgava, para o futuro, fora do uso." (Light, 1828, pág. 18).

Essa declaração de um diretor de teatro é verdadeiramente
preciosa e muito significativa.

Resumindo o que se acaba de ler e concluindo, noto que, sob
o ponto de vista teórico, todas as circunstâncias que acabo de
transmitir tomam, cumulativamente, valor enorme em favor da
interpretação espírita do caso de que nos ocupamos. Os que
leram a comédia póstuma de Oscar Wilde são acordes em afir-
mar que ela constitui uma obra de arte magistralmente orientada
e que é uma reprodução maravilhosa do estilo, da forma, da
técnica teatral que caracterizavam, no seu conjunto, um só autor:
Oscar Wilde, quando vivo. E se isso não bastar para identificar
uma personalidade literária, é preciso ajuntar aí o incidente tão
eloqüente de um diretor de teatro ter declarado que a comédia
em questão não poderia ser representada com sucesso pelo fato
do seu assunto e seu desenvolvimento terem envelhecido meio
século. Não se poderia imaginar confirmação mais eficaz em
favor da identidade pessoal da entidade comunicante, pois que a
reputação de Oscar Wilde atingira seu apogeu há meio século e
os dramas escritos por ele, quando vivo, apresentam todos os


mesmos defeitos assinalados pelo diretor do teatro, ao mesmo
tempo que todas as grandes qualidades literárias e as idiossincra-
sias psíquicas muito especiais de que acabamos de nos ocupar.

Agora, voltando ao que antes fiz notar, lembro que Oscar
Wilde tinha, antecipadamente, dado todas as provas de identifi-
cação pessoal que se pode razoavelmente exigir de um morto que
se comunique. Recordo haver feito notar que a única prova que
ele poderia fornecer ainda seria a de demonstrar aos vivos que
sua intelectualidade, seu temperamento de autor, sua virtuosida-
de incomparável de cinzelador de frases e de artista apaixonado
das palavras permaneceram intactas depois da morte do corpo.
Ora, ele deu também esta prova última, que reveste valor proban-
te superior a qualquer outro, embora não se possa passar pelos
outros para atingir a demonstração experimental, sobre a base
dos fatos, da sobrevivência de uma individualidade pensante.

Noto, enfim, que o valor teórico desta última "prova literária"
é a tal ponto eficaz que triunfa mesmo sobre uma objeção apoia-
da em uma hipótese metafísica fundada em memórias de ampli-
dão infinita. Faço alusão à velha hipótese, agora novamente em
moda, formulada com um fim puramente especulativo, pelo
professor William James, segundo a qual não se poderia teori-
camente excluir a possibilidade da existência, no universo, de
um "reservatório cósmico de memórias individuais", do qual os
médiuns extrairiam as indicações verídicas relativamente às
personificações de defuntos desconhecidos de todos. Não é agora
o momento de discutir essa hipótese, que tenho longamente
analisado e refutado, mantendo-me no terreno dos fatos, numa
monografia especial; noto somente aqui que, mesmo conceden-
do-se à hipótese em questão a extensão incomensurável que lhe
conferem seus defensores, ela não chegaria mesmo a fornecer
provas de identificação espírita análogas às que venho de relatar,
pois que não se referem ao que se deveria encontrar num "reser-
vatório cósmico de memórias individuais". É claro, com efeito,
que, no nosso caso, não se trata de lembranças de espécie algu-
ma, mas de um trespassado que se manifesta ditando uma obra
literária, isto é, executando uma ação que se desenrola no presen-


te, e que não se poderia então encontrar em parte alguma, em
estado de vibração latente.

Repito, então, que a circunstância de ter chegado a triunfar
também da hipótese metafísica do "reservatório cósmico de
memórias individuais" constitui uma circunstância teoricamente
muito importante. De fato, ela equivale a afirmar que nenhuma
hipótese não-espiritualista chegará jamais a explicar, no seu
conjunto, o memorável caso de identificação espírita do qual o
falecido escritor Oscar Wilde foi protagonista.

Inútil é acrescentar que isto serve para fazer ressaltar o valor
teórico muito especial que podem revestir os casos em geral de
comunicações psicográficas na base de "ensaios literários",
ditados por entidades espirituais que afirmam ser autores conhe-
cidos, isto é, "ensaios literários" suscetíveis de serem submetidos
aos processos de análise comparada.


Capítulo VII

O caso seguinte e os admiráveis "ensaios literários" ditados
pela entidade comunicante não são suscetíveis de serem subme-
tidos ao critério experimental da análise comparada destinada a
pesquisar a origem subconsciente ou estranha ao médium, pois,
ao contrário, o caso em questão apresenta tais traços característi-
cos de excelência literária e de genialidade que isso basta para
substituir o inconveniente acabado de assinalar, permitindo até
se chegar a uma conclusão teórica positiva.

Quero falar do famoso caso da personalidade mediúnica Pati-
ence Worth, tal como se manifestou durante muito tempo por
intermédio da médium americana sra. Curran. As revistas metap-
síquicas e espiríticas se ocuparam longamente do caso em ques-
tão, assim como as revistas da atualidade e os jornais políticos. A
leitura da maior parte desses documentos pode ser útil a fim de
formar uma idéia nítida das opiniões das pessoas competentes a
esse respeito; todavia, em se querendo aprofundar o assunto, não
se poderia deixar de recorrer-se à magistral obra do dr. Walter
Franklin Prince: The case of Patience Worth. É sobretudo desta
última obra que tirarei o material dos fatos e as observações que
me são necessárias.

Durante o verão de 1913, a sra. Pearl Lenore Curran e sua
amiga sra. Hutchings foram visitar uma de suas vizinhas que
possuía um pequeno aparelho mediúnico chamado Oui-ja (qua-
drante alfabético com uma agulha móvel no centro). Elas quise-
ram experimentar e a personalidade mediúnica de uma parenta
da sra. Hutchings se manifestou logo. Esta senhora ficou favora-
velmente impressionada e comprou, por sua vez, um oui-ja e foi
à casa da sra. Curran propor-lhe prosseguirem juntas as experi-
ências. Não tardaram em ver manifestar-se espíritos de parentes
de uma como da outra das duas experimentadoras, mas, depois
de alguns dias, o quadrante do Oui-ja ditou as letras de um nome
desconhecido de todos: o de Patience Worth. Esta entidade
inesperada se mostrou logo de uma vida exuberante e senhora
absoluta do aparelho mediúnico. Ela se manifestara ditando a


frase seguinte: "Muitas luas passaram desde que vivi na Terra.
Eis-me de volta ao vosso mundo. Meu nome é Patience Worth."

Mas, uma vez dado seu nome, não pareceu ligar importância
às perguntas de informações a respeito de sua existência terres-
tre, fazendo notar que a circunstância de ter vivido no século
XVII tornava impossível qualquer pesquisa a seu respeito. Ela
acrescentou que sua "verdadeira identidade pessoal devia provir
da excelência e da natureza das obras literárias que ela devia
ditar à médium" – o que foi absolutamente conforme a verdade,
pois que essas obras bastam, ou deviam racionalmente bastar,
para demonstrar sua independência espiritual. De todo modo, a
entidade chegou muitas vezes a fazer alusões à sua vida terrestre;
"Patience Worth disse ter nascido na Inglaterra no ano de 1649
(ou 1694), ter vivido na aldeia onde nascera, trabalhando nos
campos até atingir a maioridade e emigrado, então, para a Amé-
rica, onde algum tempo depois foi vítima de uma incursão arma-
da de índios. Conforme outras declarações, pode-se compreender
que tinha nascido em Dorsetshire, e quando, algum tempo de-
pois, o sr. Yost – um dos experimentadores – partiu para a
Inglaterra, Patience Worth lhe descreveu diversos traços caracte-
rísticos do condado onde vivera (costas, colinas, mosteiros e
caminhos) com o auxílio dos quais poderia reconhecer a pequena
cidade onde tinha nascido. O sr. Yost teve a curiosidade de
visitar Dorsetshire e aí encontrou as colinas que haviam sido
descritas, o velho convento arruinado e os caminhos tortuosos
dos quais Patience Worth tinha falado.

Veremos mais adiante que, quando a entidade comunicante
descrevia, nos romances e nos versos, as paisagens e as praias
inglesas, ela falava delas com a exatidão de uma pessoa que já
tivesse habitado essa região. O interessante é que a sra. Curran
nunca esteve na Inglaterra até essa época e não havia nunca visto
o mar.

Digo isto de passagem, porque, repito, o interesse teórico do
caso está totalmente nas provas de identificação pessoal e gira
exclusivamente em torno do mistério da origem de tantas obras
literárias excelentes, em verso e prosa, assim como das modali-
dades extraordinárias com as quais elas se produziram.


Em algumas circunstâncias em que os experimentadores ad-
miraram a beleza literária do ditado mediúnico, Patience Worth
notara que "durante sua existência terrestre ela já possuía esse
mesmo temperamento imaginativo e poético". Esta observação
não é sem interesse porque contribui para esclarecer o mistério
de uma pequena camponesa morta que se manifesta, mediunica-
mente, ditando obras magistrais em verso e em prosa. É preciso
pensar que a genialidade de escritora era inata nesta pessoa do
Dorsetshire, mas que as condições sociais muito humildes, nas
quais ela nascera, lhe haviam impedido a emergência, enquanto
que dois séculos e meio de existência espiritual tinham contribu-
ído para fazer evoluir admiravelmente suas faculdades intelectu-
ais inatas.

Relativamente às capacidades naturais de mentalidade da mé-
dium e da extensão da sua cultura geral, noto que o dr. Prince
empreendeu, a esse respeito, pesquisas escrupulosas, donde
ressaltou que era necessário, absolutamente, excluir toda a
possibilidade de emergências subconscientes de conhecimentos
adquiridos e depois esquecidos (criptomnesia), como se devia
excluir, de maneira absoluta, a possibilidade de disposições
especiais da médium para a poesia e para o romance. A sra.
Curran deixara de freqüentar a escola na idade de quatorze anos;
jamais manifestara aptidões literárias, nem interesse pela litera-
tura, enquanto que suas inclinações naturais levavam-na, ao
contrário, a se consagrar à arte musical; tinha, até então, apren-
dido canto com a intenção de seguir a carreira teatral. O dr.
Prince levou especialmente suas investigações à cultura histórica
e literária da médium e verificou que nesses ramos do saber se
encontravam nela lacunas consideráveis, compatíveis com uma
existência passada, inteiramente, em uma pequena cidade do
estado de Illinois, longe de todo o centro importante de cultura e
longe do mar, que a sra. Curran jamais tinha visto.

Pois bem, é justamente a cultura histórica, literária e filológi-
ca que constitui o que há de mais notável nos romances de
Patience Worth!

E para começar pela cultura filológica, dizemos que ela é de
um gênero que exclui, absolutamente, toda a possibilidade de


uma colaboração subconsciente da médium no ditado mediúnico.
Patience Worth, com efeito, conversa, constantemente, no seu
dialeto de há três séculos e tem escrito romances e poemas na
velha língua, ou no dialeto da sua época; tudo isto, segundo diz,
a fim de provar sua independência espiritual da personalidade da
médium. O professor Schiller, da Universidade de Oxford, nota a
esse respeito:

"Fica-se admirado e impressionado ao se verificar que um
dos seus romances em versos livres, Telka, constituído de
setenta mil palavras, é escrito na velha língua inglesa, con-
tendo noventa por cento de palavras de pura origem anglo-
saxônica, enquanto que aí não se encontra uma só palavra da
língua inglesa depois de 1600...

Quando se sabe, ulteriormente, que na primeira tradução
da Bíblia há apenas setenta e sete por cento de palavras an-
glo-saxônicas e que é preciso voltar atrás até Laymon
(1205) para igualar a percentagem dos termos anglo-saxões
empregados por Patience Worth, quando se reflete em tudo
isto, não se pode deixar de reconhecer que nos achamos di-
ante de um caso que pode ser definido como um "milagre
filológico"." (Proceedings of the S. P. R., vol. XXXIV, pág.
574).

Importa completar aqui as observações do prof. Schiller, dan-
do detalhes a respeito do poema idílico em versos livres, intitu-
lado Telka, do nome de sua protagonista.

Começo por dizer que, na época em que essa peça foi escrita,
Patience Worth deixara de utilizar o Oui-ja e ditava seus roman-
ces e versos pela boca da médium, isto é, esta, guardando pleno
conhecimento de si, percebia uma voz subjetiva que lhe ditava
palavra por palavra. A médium se limitava, então, a repetir em
voz alta o que ouvia e um secretário escrevia. De tempos em
tempos, o ditado era tão rápido que o secretário não a podia
seguir; neste caso Patience Worth repetia a última frase e prosse-
guia mais lentamente. Ao mesmo tempo, a mentalidade da
médium parecia tão independente do conteúdo do ditado que era
livre para fumar um cigarro, para, interrompendo, tomar parte na


conversa dos assistentes, era livre para se levantar e ir ao aposen-
to contíguo atender ao telefone. Tais interrupções não tinham
nenhuma influência no ditado mediúnico.

É o que também se produzia de uma sessão a outra: a perso-
nalidade mediúnica recomeçava igualmente a ditar na outra
sessão, no ponto justo em que havia parado, mesmo quando
vários meses se escoassem depois da última sessão.

Uma vez em que se perdera o primeiro capítulo de um ro-
mance cujo ditado já estava muito adiantado, Patience Worth o
ditou pela segunda vez e, quando se encontrou de novo a parte
extraviada, verificou-se que o segundo ditado era uma reprodu-
ção literal do primeiro.

Voltando ao poema Telka, eis o que escreveu o dr. Walter
Prince a seu respeito:

"Os personagens de Telka vivem; vemo-los, conhecemo-
los. Nenhum deles é repetição do outro. Algum personagem
poderá manifestar tendências e disposições análogas às de
um outro, mas, ao mesmo tempo, manifesta traços caracte-
rísticos que lhe são próprios, que o diferenciam de todos os
outros.

Ao contrário, os personagens de Maeterlinck (refiro-me a
este escritor devido à grande reputação que conquistou em
gênero análogo) constituem quase sempre sombras sem vi-
da, que dificilmente se podem individualizar segundo suas
palavras ou conforme qualquer outro de seus característi-
cos. E, entretanto, reconhecemos em Maeterlinck um gran-
de artista.

De qualquer forma, não posso deixar de notar que, quan-
do surgir a aurora do dia em que desaparecer a aversão que
se experimenta hoje pelas produções mediúnicas que cho-
cam sobretudo os senhores críticos de arte, então se desco-
brirá que Patience Worth, a julgar por seu poema Telka, é
bem superior a Maeterlinck." (Ibidem, págs. 237-9).


A propósito da língua arcaica empregada no poema em ques-
tão, eis o que escreveu o sr. Gaspar Yost, que publicou uma obra
sobre suas experiências com a sra. Curran:

"Telka é única na pureza de sua língua anglo-saxônica, na
combinação das diversas formas dialetais de localidades e
épocas diversas, em algumas de suas formas gramaticais
particulares, nos desvios e nas extensões conferidas à signi-
ficação de certas palavras... À maneira de Shakespeare, ela
emprega por vezes um advérbio como se fosse um verbo, ou
um adjetivo... Isto se explica pelo estado transitório em que
se achava a língua inglesa nessa época, mas essa observação
constitui uma prova suplementar em favor do fato de que Pa-
tience Worth está plenamente de acordo com o seu tempo,
mesmo nas anomalias gramaticais. Nenhuma dúvida pode
existir sobre isto: que a linguagem de Patience Worth deve
ser considerada como sendo absolutamente espontânea nela,
o que está demonstrado pela circunstância de que ela não a
emprega exclusivamente em uma de suas obras, mas que de-
la se serve constantemente nas suas conversas com as pesso-
as presentes..." (Ibidem, págs. 363-5).

Ainda a respeito de Telka, é preciso assinalar um último deta-
lhe dos mais surpreendentes: é que esse poema de setenta mil
palavras, em versos livres, foi todo ditado à médium em trinta e
cinco horas!

Prossigamos: apesar das maravilhas que acabo de relatar, a-
presso-me a observar que Telka não é a obra literária de Patience
Worth que mais valor tem. A obra mais rica e mais admirável,
sob certos pontos de vista, é o seu grande romance: The Sorry
Tale (Um conto triste), cuja ação se desenrola na Palestina, no
tempo do Cristo, e que nos faz assistir ao drama da crucificação.
É um romance histórico duma vasta concepção, no qual atuam
certos caracteres que não são comparsas superficialmente dese-
nhados, mas caracteres poderosos de personagens vivas. O
protagonista é um filho natural do imperador Tibério, nascido de
uma bela escrava grega, chamada Théia... Expulsa de Roma, ela
é transferida para a Palestina e a criança nasce em uma tenda de


leproso, fora dos muros de Belém, enquanto que, na mesma
noite, dentro da pequena cidade, nasce Jesus. Na amargura do
seu embrutecimento, a mãe dá ao recém-nascido o nome de
Ódio. O ódio é, de fato, a paixão que domina a existência do
filho, até seu trágico fim. A vida desse homem se desenrola
paralelamente à de Jesus: um representa a reencarnação do ódio
na Terra; o outro a encarnação do amor. O filho de Théia ridicu-
lariza Jesus e nele escarra quando o vê realizar o milagre das
redes cheias de peixes. Passando de uma falta à outra, de um
crime a outro, acaba por furtar os ornamentos sagrados do Tem-
plo de Jerusalém e é condenado à morte. Ele morre na cruz ao
lado de Jesus: o filho de Théia era o "mau ladrão".

O capítulo da crucificação, que é muito longo, foi ditado à
médium durante uma única sessão. É um capítulo terrificante
pela extraordinária vivacidade de ação. Não se fez apenas uma
simples descrição do trágico acontecimento e sim de todos os
seus mais cruéis detalhes: assiste-se, aterrorizado e aflito, ao
drama do Gólgota. Encontra-se o mesmo colorido em todas as
cenas às quais o romance nos transporta e que não são somente
representadas de uma maneira exuberante, mas geográfica e
historicamente irrepreensíveis, assim no que concerne à Palestina
como à Roma imperial. A esse propósito, tinha-se acreditado ter
apanhado uma vez só em erro Patience Worth: é quando ela faz
conferir ao imperador romano, pelas personagens judias, o título
de rei. Ora, verificou-se, pela história de Ewald, que nas provín-
cias do império romano existira o costume de chamar rei ao
imperador de Roma. Segue-se que esse pretenso erro contribui,
ao contrário, para fazer sobressair admiravelmente até que ponto,
nos romances de Patience Worth, se vive no meio dos tempos
que aí se descrevem.

Eis outra circunstância que o demonstra de modo ainda mais
estupefaciente, que tem relação com as modalidades nas quais se
realizou o ditado do romance. A médium via desenrolar-se diante
de si uma visão panorâmica de todos os acontecimentos que
eram descritos, sucessivamente, no ditado mediúnico. O que
admira mais, porém, é que os quadros que ela contemplava eram
representações totais de acontecimentos complexos, visualizados


ao natural, enquanto que as descrições dos mesmos acontecimen-
tos, tais como eram dados pelo ditado mediúnico, não eram
jamais totais. Em outras palavras, no ditado mediúnico não
figuravam numerosos incidentes observados pela médium nas
projeções cinematográficas que lhe eram apresentadas, eviden-
temente porque certos incidentes secundários nada tinham a ver
com o assunto do romance. Mas, então, porque eram eles proje-
tados à visão da médium? Só se pode responder a esta última
questão de uma única maneira: necessariamente, tudo isso se
produzia porque se tratava de projeções panorâmicas represen-
tando quadros reais de um passado muito longínquo. Nestas
condições, era natural que, ao lado dos acontecimentos princi-
pais, houvesse outros mais ou menos insignificantes, estranhos
aos acontecimentos principais, como acontece em outra circuns-
tância análoga a um acontecimento tomado após um fato que se
desenrola ao ar livre com o concurso do povo.

O dr. Prince trata, como sempre, dessas espécies de inciden-
tes secundários:

"A médium percebia cães que atravessavam o caminho
correndo; via carros construídos de um modo estranho e cu-
jas rodas eram feitas de caniços enrolados, curvados em
círculos. Esses carros eram puxados por bois, cujos arreios
eram mais estranhos ainda do que os carros. Ela assistia à
feira dos judeus, assim como às disputas que havia entre
negociantes barbudos e seus clientes; ouvia as lamentações
das mulheres que trocavam utensílios por comestíveis; ob-
servava os grão-sacerdotes que passavam com suas vestes
faustosas e via a Arca Santa e o Templo, tais como tinham
sido, realmente, reedificados nessa época; contemplava as
paisagens de Belém e de Nazaré e assistia à passagem de
Jesus cercado pela multidão.

O mesmo fenômeno se reproduziu durante o ditado de
outro romance: Hope trueblood, no qual a médium viu des-
filar diante de si a paisagem inglesa. Neste caso, natural-
mente, as cenas eram mais familiares à médium, mas i-
gualmente vivas e naturais." (Ibidem, pág. 395).


Para ser breve, não prosseguirei na análise do magistral ro-
mance em questão, embora possa assinalar vários outros detalhes
de interesse muito persuasivo. Pela mesma razão, não analisarei
o conteúdo dos outros excelentes romances ditados por Patience
Worth, de títulos: The Merry tale, Hope trueblood, The pot and
the whel, The fool and the lady, The stranger, The madigral,
Samuel Wheaton, Redwing (este último, um drama). Essa enume-
ração mostra que a produção literária de Patience Worth já se
compõe de nove romances e um drama, aos quais é preciso
acrescentar uma coleção de provérbios e aforismos, um número
extraordinário de composições poéticas de todas as espécies,
cujo valor não é inferior ao dos romances, seja do ponto de vista
da formação ou da genialidade da inspiração.

Os romances Telka e Merry tale foram ditados na língua ou
no dialeto do século XVII. Os outros romances, dramas e poe-
mas foram escritos na língua inglesa moderna, ainda que o estilo
e a forma ofereçam os traços característicos que distinguem a
personalidade de Patience Worth.

No que concerne à produção poética de Patience Worth, o dr.
Prince teve o cuidado de reproduzir, em sua obra, passagens de
todas as espécies, as quais ocupam cento e trinta páginas do seu
volume. Todas as poesias e todos os assuntos estão aí represen-
tados. Ora aqui, ora ali, o dr. Prince estabeleceu comparações
entre os poemas de Patience Worth e os análogos de Keats e
outros poetas ingleses, demonstrando que Patience Worth os
iguala sempre, quando não os ultrapassa. Note-se que grande
parte desses poemas são improvisos feitos sobre temas sugeridos
na ocasião pelos experimentadores.

Certa vez, o dr. Prince convidou Patience Worth a ditar-lhe
versos que começassem por tal ou qual letra do alfabeto, na
ordem em que se acham aí dispostas. O poema pedido foi ditado,
imediatamente, com uma rapidez de dicção regulada por aquela
que o secretário devia empregar para escrever à pena. O dr.
Prince nota que Patience Worth parece achar-se consciente da
excelência da sua produção literária, mas que está longe de
envaidecer-se com isto. Ele continua, dizendo:


"Desde o começo, pode-se ver que ela não ignorava seu
alto valor pessoal, pois que se exprimia sempre como um
personagem consciente de sua própria autoridade ou, antes,
sabendo que tinha uma missão a cumprir. Ao mesmo tempo,
porém, em todos os seus atos, em todas as suas exigências,
observavam-se detalhes que bastam para demonstrar que não
era inspirada pelo orgulho. Poder-se-ia compará-la a uma
mãe que dirige e aconselha seus filhos na mocidade, sem ter
mesmo uma sombra de orgulho por sua superioridade men-
tal, em comparação à deles. Patience Worth deixa, por sua
vez, subentender que ela tem sobre nós a vantagem da expe-
riência e de uma situação privilegiada, graças às quais é
muito natural que esteja em condições de aconselhar e diri-
gir os que só possuem a experiência adquirida durante al-
guns anos de existência terrena. Do mesmo modo, deixa
subentender que sua produção literária chegou a tal grau de
excelência graças ao meio infinitamente mais favorável no
qual declara existir. Teve o cuidado, mais de uma vez, de
lembrar-nos que é, em certo sentido, uma mensageira de
Deus, enviada aos vivos em missão, que devia cumprir da
maneira mais conforme a sua natureza espiritual. Eis algu-
mas frases das suas conversas significativas: "Farei com as
palavras o que se faz com sonoras castanholas. Fá-las-ei bri-
lhar com luz nova, empalidecer, gemer, desfalecer. Fá-las-ei
arder no fogo de todas as paixões; serão vingadoras, embra-
vecidas, coléricas, torcidas, mordazes. O que me seguir se
julgará grosseiro em face das prodigiosas cabriolas às quais
submeterei as palavras. Estas mãos saberão tecer a lingua-
gem humana de modo a maravilhar o mundo." (Ibidem, pág.
212).

O dr. Prince reproduz longa série de afirmações análogas de
Patience Worth, mas a que se acaba de ler pode bastar para
deixar entrever-lhe o pensamento. Ela queria, em suma, que se
soubesse que tinha uma missão a cumprir na Terra: a de contri-
buir para demonstrar aos vivos a existência e sobrevivência da
alma e isto fora das provas habituais de identificação pessoal,
isto é, fornecendo provas complementares, destinadas a confir-


mar as fundadas sobre indicações pessoais, dadas pelos defuntos
que se comunicam. Essa tarefa consistiria, para Patience Worth,
em demonstrar que ela tem mesmo de compor jóias literárias que
a mentalidade de um escritor vivo não poderia fazer, apesar de
toda a sua competência, obrigando, assim, a razão humana a
reconhecer a intervenção real de entidades espirituais nas mani-
festações mediúnicas. Já indiquei as mais notáveis destas jóias:
por exemplo, a suprema excelência da arte de Patience Worth,
em todas as modalidades de criações literárias, apesar da intelec-
tualidade modesta da médium; o fato de ter ditado romances em
uma língua ou em um dialeto do século XVII e isto com tal
precisão na linguagem arcaica, que não se vê aí uma só palavra
da língua inglesa, que tenha entrado em uso depois de 1600,
enfim, a genialidade extraordinária de que ela deu provas no
improviso de composições poéticas, de forma irrepreensível,
admiráveis por suas imagens e elevação de idéias, composições
que rivalizam com as dos melhores clássicos ingleses, se não as
ultrapassam.

A propósito desta última jóia literária, o dr. Prince nota:

"Seria útil que nossos leitores voltassem atrás para rele-
rem os pequenos poemas improvisados, imediatamente, so-
bre assuntos escolhidos; só nos detendo para lhes analisar a
excelência é que chegamos a considerar as proporções ma-
ravilhosas do fenômeno. Que se releia, por exemplo, os ver-
sos intitulados The Day's Work. Parece incrível que essa
longa composição poética, tão viva por suas imagens, tão
magnífica por sua forma, tão impecável pelo emprego das
palavras, tão profunda por suas idéias, tenha sido improvisa-
da sobre um assunto escolhido, da maneira mais instantânea,
considerando-se o intervalo entre o pedido e a execução!
Quem se sentiria capaz de melhorar esses versos?" (Ibidem,
pág. 349).

Além dessas jóias de natureza elevada, Patience Worth se
prestou a dar provas de toda a sua arte literária, relacionada com
uma agilidade técnico-mental que os vivos não saberiam imitar,
ou, para empregar uma de suas próprias frases: "Ela se diverte


em jogar com as palavras como se faz com sonoras castanho-
las"...

Assim, por exemplo, certo dia, o dr. Prince convidou-a a ditar
simultaneamente dois poemas sobre assuntos muito diferentes,
um em inglês moderno, outro no dialeto do século XVII, entrela-
çando, sucessivamente, dois versos de um com dois versos de
outro, até o fim. Ela o satisfez logo, ditando, correntemente, esse
embroglio inverossímil de dois poemas distintos no assunto e na
linguagem, engendrados simultaneamente. O dr. Prince reproduz
essas duas composições poéticas e pergunta:

"Há qualquer indício de pressa nesses versos soberbos?
Apresentam eles traços característicos das condições caóti-
cas nas quais foram produzidos? Que me digam qual palavra
deveria substituir outra para melhorar a dicção! Os quatro
últimos versos do primeiro poema são esplêndidos pela sig-
nificação profunda da imagem final." (Ibidem, pág. 290-3).

No capítulo intitulado: "Uma noz para ser quebrada pelos
psicólogos", o dr. Prince cita, entre outras coisas, estes prodí-
gios, análogos aos precedentes, da entidade que se comunicava:

"Patience escreve agora quatro romances simultaneamente
e dita, sucessivamente, uma passagem de cada um. Depois
de ter ditado algumas linhas do primeiro em dialeto arcaico,
passa a fazer outro tanto no segundo em linguagem moderna
e, assim, em seguida, vai intercalando um e outro, sem solu-
ção de continuidade e com uma constante celeridade. Em
dado momento ela toma dois personagens de dois romances
diferentes e faz com que um palestre com o outro, de manei-
ra que o personagem de um romance parecia responder ao
outro e discutir com ele. Quando as passagens dos dois ro-
mances foram desenredadas e colocadas nos seus textos res-
pectivos, verificou-se que cada uma delas se adaptava per-
feitamente à parte que devia ocupar no texto." (Ibidem, pág.
401-2).

Em outra ocasião, enquanto a sra. Curran escrevia uma carta
a uma de suas amigas, Patience Worth empregava sua laringe


para ditar, correntemente, uma admirável composição poética
intitulada: Feux Follets (Ibidem, 285-6).

Fecho a exposição dos fatos a fim de passar à discussão das
hipóteses destinadas a explicar, se possível, tal prodígio.

Como nota o dr. Prince, é claro que, no caso de Patience
Worth, o verdadeiro problema a resolver consiste em pesquisar
donde podia provir tão grande número de obras literárias de
primeira ordem, nas quais se notam vasta cultura e notável gênio,
riqueza de forma inesgotável no modo de exprimir o pensamen-
to, profundeza filosófica, sagacidade penetrante, espiritualidade
elevada, rapidez fulminante na concepção de idéias, habilidade
excepcional no desenvolvimento das mais complexas operações
mentais, enfim, também, uma adivinhação aparente do pensa-
mento dos outros. Como tudo isso pode manifestar-se por inter-
médio da sra. Pearl Lenore Curran, de Saint Louis, a qual, de
acordo com suas próprias declarações, com o testemunho e as
provas que vieram à luz, não possui e jamais possuiu cultura
correspondente, não tendo, ademais, mostrado disposições
literárias nem aspirações nesse sentido? Só nos resta, agora,
aplicar ao difícil problema as diferentes hipóteses que se pude-
ram formular a respeito.

A primeira que se apresenta é a do "subconsciente", entendi-
do na significação estritamente psicológica do termo, segundo a
qual achar-nos-íamos em face de um caso de desagregação
psíquica e da formação consecutiva de uma personalidade sub-
consciente, fração sistematizada da personalidade integral cons-
ciente, que emergiria, alternativamente, à superfície, quer domi-
nando temporariamente o campo consciente da médium, quer se
manifestando no exterior pela utilização da mão e da laringe da
mesma.

O único psicólogo da escola universitária que estudou, pesso-
almente, o caso em questão, foi o prof. Cory, que reconheceu,
sem restrições, o "prodígio de uma personalidade mediúnica que
refletia, em suas obras literárias, a vida e os costumes de outros
tempos, e isto com uma competência e uma familiaridade que
não podia deixar de espantar profundamente os leitores"...


Ele reconhece que o romance The sorry tale faz supor que sua
autora possua enorme acervo de conhecimentos a respeito da
vida e costumes da Palestina e de Roma, na época do Cristo.
Reconhece também que a ação de Telka se desenrola na Inglater-
ra e que este romance está escrito em um idioma arcaico, perten-
cente a regiões e a épocas diferentes, o que causa grande perple-
xidade, complicando ainda o problema a resolver. Tudo isto,
segundo o prof. Cory, tenderia a demonstrar que "o tipo e a
estrutura da mentalidade de Patience Worth são tão novas que é
bem difícil imaginar até onde poderia estender-se a exuberância
de sua mentalidade e quais os limites que se lhe poderiam mar-
car".

Apenas, depois de ter lealmente reconhecido a complexidade
enorme do problema a solucionar, o prof. Cory conclui supondo
que Patience Worth seja o produto de uma atmosfera de expecta-
ção ansiosa por uma manifestação do além; é então mais que
provável que essa expectativa se tornasse o fator essencial da
dissolução psíquica que se desenvolvia... e Patience Worth
nasceu nas profundezas do subconsciente. Engendrada na atmos-
fera do ideal, concebida por pura fantasia, ela modelou seu
próprio ser de uma pura substância imaginária e assim quer ficar,
nada assimilando do que contradiz a ilusão que a domina...
Segue-se daí que ela persiste em crer que tenha sido uma jovem
inglesa que viveu na Inglaterra, há vários séculos.

Em suma, o prof. Cory conclui sem se preocupar, de modo
algum, em explicar de que maneira uma fração da personalidade
dissociada pode ser mais vasta, mais erudita, mais inteligente e
mais genial do que a personalidade integral consciente de que
provém. Inútil perder tempo em discutir uma hipótese literal-
mente insustentável e absurda, do ponto de vista da lógica, nos
limites em que a querem manter os psicólogos ortodoxos.

O dr. Prince analisa, do princípio ao fim, o estudo do dr.
Cory, demolindo, sucessivamente, todas as argumentações e isto
de modo decisivo. A refutação do dr. Prince é magistral, mas, na
verdade, dez linhas bastariam para abater uma hipótese que só
pode ser sustentada não se levando em conta os fatos.


Quando a análise crítica do dr. Cory foi publicada, um expe-
rimentador informou Patience Worth de que um psicólogo
eminente concluíra que ela era uma fração da personalidade da
médium. Eis sua resposta, ditada, como sempre, no dialeto
arcaico de há três séculos:

"Quem ousou dizer então que sou uma parcela extraviada
da imaginação da médium? Quem ousou sustentar então que
uma grande intelectualidade é filha da imaginação de uma
pequena intelectualidade? A voz daquele que proclamou
semelhante absurdo ficará sem eco. Que ele venha e me li-
gue à médium, se isto lhe apraz, mas o futuro proclamá-lo-á
um tolo. Sua pena é pequena! A minha é uma pena de ouro
temperada na sabedoria antiga. Eu não canto por cantar, mas
para que meu canto persista! A idéia de apresentar-me como
uma fração da "harpa viva", que eu emprego, equivale a dis-
tribuir a criancinhas livros, crânios, espadas, vinho e sacra-
mentos para que elas se divirtam com isto. Vede: toco a
"harpa viva" e ela responde vibrando uníssona com a voz da
sabedoria antiga." (Psychic Science, 1928, pág. 164).

Acrescento que o dr. Prince e o prof. Mac Dugall concluem,
por sua vez, em perfeito acordo feito com Patience Worth. O
primeiro nota: "Querem fazer-nos admitir que o maior está
contido no menor." O segundo diz: "Tudo isso equivale a susten-
tar que a parte é mais vasta do que o todo."

Creio que isso deve bastar; não falemos mais do caso e pas-
semos à segunda das hipóteses que podem ser formuladas.

O dr. Prince, em várias passagens do seu volume, deixa cla-
ramente compreender que ele considera a hipótese espírita como
a única capaz de abraçar o conjunto dos fatos, todavia, com a
circunspecção de um sábio, que se dirige a outros sábios que não
estão ainda maduros para certas verdades, conclui, entrinchei-
rando-se por detrás de um dilema que é constituído de duas
proposições e que os psicólogos universitários não achariam de
seu gosto... Diz ele:

"Eis a tese que formulei após dez meses de estudos assí-
duos dos fatos: ou modificar radicalmente a concepção do


que se chama "subconsciente", nele compreendendo poten-
cialidades intelectuais das quais não se tem idéia alguma até
aqui, ou bem reconhecer a existência de uma causa que age
por intermédio da subconsciência da sra. Curran, porém es-
tranha à sua subconsciência. No primeiro caso, torna-se
normal o que se considerou até aqui "supranormal" (da
mesma maneira que a hipnose, a qual, há um século, pare-
cendo subentender possibilidades supranormais, foi depois
"normalizada"); no segundo caso, tem-se que admitir o "su-
pranormal"."

Reconheço, por minha vez, que, se para os casos análogos ao
de que nos ocupamos se renuncia à hipótese do "subconsciente",
entendida no sentido de uma fração sistematizada da dissociação
psíquica do indivíduo, e se admite a hipótese de Myers, segundo
a qual existe, talvez, no homem uma personalidade integral
subconsciente, infinitamente mais vasta e perfeita do que a
consciente, dotada de faculdades de sentido supranormais e de
capacidades intelectuais cuja emergência esporádica daria lugar
às "inspirações do gênio", reconhece qual se se admitisse tudo
isto, se chegará, até certo ponto, à consideração do caso em
questão. Digo "até certo ponto", porque se teriam que enfrentar
obstáculos formidáveis.

De fato, se com essa hipótese se chegasse a explicar, de qual-
quer modo, a excelência das obras literárias ditadas pela persona-
lidade mediúnica, assim como a ligeireza extraordinária com a
qual ela "jogava com as palavras", não se explicaria ainda como
lhe foi possível escrever romances em um dialeto do século XVII
e isto sem jamais cair no erro de inserir, no texto, termos usados
depois de 1600. Do mesmo modo, não se explicaria como pro-
vou estar ao corrente dos costumes e usos da Palestina e de
Roma, na época do Cristo. Estas duas circunstâncias se trans-
formam em uma grave objeção, pois que uma personalidade
integral subconsciente se identifica ainda e sempre com sua
própria personalidade normal. Ora, em nosso caso, esta última
personalidade era totalmente ignorante dos dialetos arcaicos
empregados por sua suposta personalidade integral, como o era
dos costumes e usos de povos existentes há dois mil anos. Isto,


porém, ainda não é tudo. É evidente que uma personalidade
integral subconsciente que atesta, por fatos, o grau muito elevado
de sua superioridade intelectual, em comparação ao da persona-
lidade consciente, não deveria jamais mostrar-se sugestionável
ou auto-sugestionável – duas formas patológicas do êxtase
mental que indicam uma restrição enorme do campo consciente
da personalidade humana. Ora, como esta última argumentação é
incontestável, segue-se que não se poderia explicar como uma
personalidade subconsciente tão superior à consciente pode
iludir-se a ponto de crer ter vivido no século XVII, sob a forma
de uma pequena pastora emigrada para a América e morta em
uma emboscada de índios.

Inútil fazer notar quão poderosa é esta objeção, que parece
fundada na experiência das fases profundas, na hipnose e no
sonambulismo magnético, fases nas quais o sujet não é mais
sugestionável. Esta objeção é, sobretudo, indiscutível em nome
da lógica e do senso comum, tanto mais que as afirmações da
personalidade mediúnica correspondem ao fato de ter ela, cons-
tantemente, conversado no dialeto arcaico que se falava na sua
época, no condado em que diz ter nascido.

O obstáculo teórico em questão não poderia ser evitado, su-
pondo-se que a personalidade integral subconsciente, de que se
trata, conhecesse bem o que ela era, mas se faz passar pelo
espírito de uma morta, a fim de enganar os vivos.

De fato, neste caso, se iria ao encontro de outra monstruosi-
dade de natureza moral, igualmente inadmissível. Com efeito,
uma personalidade subconsciente, de tal modo mais elevada e
mais perfeita que a consciente, deveria ser moralmente superior a
esta última, em uma medida correspondente; ela não deveria,
então, jamais mentir e sobretudo mentir com a intenção estúpida
e malévola de enganar os viventes, mistificando-os nas suas
aspirações espirituais e afetivas mais sagradas.

Resumamos, então, a questão. Considerando que a hipótese
da "consciência subliminal" supõe a existência, na consciência
humana, de uma personalidade integral espiritual dotada, em
uma medida superlativa, de qualidades mais elevadas que a da
personalidade consciente, segue-se daí que ela não deveria


jamais iludir-se sobre sua existência e pondo a crer-se uma
pessoa morta, tendo vivido em certa localidade, em condições
sociais bem definidas, em uma época determinada, com o conhe-
cimento perfeito da língua arcaica de época indicada. Além
disto, considerando que essa personalidade integral espiritual
deveria possuir, em uma medida correspondente às suas faculda-
des superiores intelectuais, também um senso moral não menos
elevado, resulta daí que ela não deveria rebaixar-se e perverter-se
a ponto de enganar, cruelmente, os vivos. Deve-se, então, reco-
nhecer que minhas considerações, ora expostas, demonstram ser
a hipótese da "consciência subliminal" insuficiente, por sua vez,
para considerar os fatos em seu conjunto.

É necessário, então, buscar outra que seja suficiente para o
caso. Eis que se apresenta uma terceira, de latitudes infinitas, que
oferece um traço característico muito curioso: ser tirada do
esquecimento, onde dorme quase sempre em estado latente,
somente nas crises teoricamente desesperadas, às quais são
sujeitos os partidários da interpretação anímica da fenomenolo-
gia supranormal toda inteira. Ela se chama "hipótese da consci-
ência cósmica" e é suscetível de se dividir em dois ramos bem
distintos, segundo o desejo de quem a emprega. Há os que, como
Hartmann, usam e abusam dela na significação verdadeira e
própria da "consciência cósmica", atributo do Absoluto, isto é,
de Deus. Neste caso ter-se-á de admitir que a subconsciência dos
médiuns entra em relação direta com o Ser Supremo e isto com o
nobre fim de enganar o próximo, proposição que é absolutamen-
te blasfema.

Há, ao contrário, outros pesquisadores que empregam a hipó-
tese em questão com o significado que lhe conferiu o prof.
William James, segundo o qual, em um ponto de vista metafísi-
co, poder-se-ia supor a existência de um "reservatório cósmico
de memórias individuais", no qual teriam livre acesso os mé-
diuns, sendo esse um lugar donde extrairiam tudo o que lhes
fosse necessário para mistificar os pobres mortais.

O eminente psicólogo e fisiólogo inglês, prof. Schiller, da
Universidade de Oxford, por ocasião de uma análise do caso de


Patience Worth, que publicou, fala das duas formas da hipóteses
em questão e do fato nos seguintes termos:

"Há filósofos que, uma vez enveredados pelo caminho
cômodo da extensão hipotética da personalidade humana,
mostram-se mal dispostos a parar, enquanto não atingem o
Absoluto. Devemos, então, estar prontos a saber de algum
crítico que a arte literária de Patience Worth vem de uma re-
velação autêntica do Absoluto, ao passo que um outro, mais
moderado, falará de uma arte que seria extraída de um "re-
servatório cósmico", no qual estariam recolhidos todos os
esforços literários dos séculos. Observo que esta segunda
versão da hipótese em causa não considera bastante o pro-
blema da "seleção de fatos" do reservatório acima, ao passo
que a primeira versão se choca com outra dificuldade formi-
dável: é que, neste caso, Patience Worth constituiria uma re-
velação antes humorística e excêntrica desse Absoluto infi-
nitamente perfeito, do qual falam os filósofos. Se se me ob-
jetasse que uma personalidade finita só pode ser uma seleção
do Absoluto, eu responderia que tal esclarecimento esclarece
até demais. Com efeito, se Patience Worth é, neste sentido,
uma "seleção do Absoluto", somos todos, da mesma forma,
"seleções do Absoluto", o que equivale a dizer, nos limites
da argumentação em questão, que Patience Worth deveria
ser um "espírito" como todos os outros." (Proceedings of the
S. P. R., vol. XXXVI, pág. 575).

Parece-me que a argumentação do prof. Schiller é de tal mo-
do cerrada e decisiva que dispensa qualquer outra. Noto apenas,
no concernente à hipótese do "reservatório cósmico", que a
objeção formulada pelo sr. Schiller, isto é, a de que se trata de
uma hipótese que não considera, suficientemente, o problema da
"seleção dos fatos" da parte da personalidade subconsciente do
médium, é sobretudo formidável no caso especial de Patience
Worth. Com efeito, se se devesse supor que se recolheram e se
enfileiraram no "reservatório" em questão todos os termos
velhos da língua inglesa, caídos em desuso depois do ano 1600,
tudo isto representaria apenas um material bruto que não poderia
ser utilizado senão por aqueles que conhecessem a significação


de cada vocábulo, assim como a conjugação dos verbos, desi-
nências dos nomes, construções gramaticais e as elisões inume-
ráveis inerentes ao dialeto, ao qual pertenciam as palavras em
questão. Seria preciso, além disso, que aquele que se servisse
desses vocábulos estivesse em condições de discernir os que
estavam em uso antes de 1600 dos que estão em curso depois
daquele ano.

Ora, a personalidade "subliminal" da médium não podia rea-
lizar tudo isso; a personalidade normal da médium jamais possu-
iu aqueles conhecimentos e de outra parte eles não podiam
existir onde quer que fosse, em estado latente, considerando-se
que a estrutura orgânica de uma língua não é senão pura abs-
tração. Nessas condições dever-se-ia concluir, racionalmente,
que o problema não pode ser resolvido sem a admissão da inter-
venção de uma entidade estranha ao médium, bem conhecedora
da língua de que se serviu tão corretamente.

Segue-se daí que a hipótese fantástica do "reservatório cós-
mico" não se mantém de pé em face da prova dos fatos e que é
necessário excluí-la, por sua vez, do número das que possam
abranger o conjunto do caso de que nos ocupamos.

Como se pode ver, o simples fato de apresentar e discutir as
hipóteses "naturalistas" aplicáveis ao caso de Patience Worth nos
levou, por nossa vez, a tender para a segunda proposição no
dilema formulado pelo dr. Walter Prince, proposição na qual se
supõe a existência de "uma força agindo por intermédio da sra.
Curran, porém estranha à sua subconsciência"...

Na página 460 do seu volume, o dr. Prince, durante sua po-
lêmica com o prof. Cory, escreve a esse respeito:

"Concorda-se que Patience Worth é "eminentemente ra-
cional, sã e equilibrada", porém, no meio de tanta racionali-
dade elevada e de mentalidade equilibrada, pretende-se des-
cobrir "uma ilusão obstinada e persistente: a de crer ter vivi-
do em uma época recuada em nosso planeta". Contudo, ob-
servo eu, por minha vez, que o fato de falar num dialeto ar-
caico, desaparecido há séculos, não é uma ilusão, assim co-
mo o outro fato de descrever regiões estranhas com seu real


colorido local; duas circunstâncias que seriam inexplicáveis
no que se refere à sra. Curran, mas que seriam todas naturais
se a pretensa ilusão fosse, ao contrário, uma realidade. Neste
último caso, ela só faria empregar as recordações de sua ex-
periência terrestre combinadas com prováveis consultas es-
pirituais e com a sabedoria adquirida no decurso de dois sé-
culos e meio de existência transcendental. E não é uma ilu-
são que ela possui uma genialidade literária maravilhosa, da
qual a sra. Curran jamais manifestou o menor indício, mas
que uma pastora inteligente e genial poderia muito bem ter
desenvolvido em si mesma, durante os séculos que se segui-
ram ao seu trespasse, se a sobrevivência da alma é um fato
real e se o espírito progride depois da morte do corpo. E não
é uma ilusão que a manifestação de Patience Worth deu logo
lugar a uma fonte inesgotável de beleza artística, de espiritu-
alidade, de sabedoria e de brilhante conversa, fonte que varia
perpetuamente e que é perpetuamente idêntica a si própria e
infinitamente diferente do temperamento e das capacidades
intelectuais da sra. Curran. Há algo de grotesco em conce-
ber-se que uma pessoa ou uma personalidade perfeitamente
equilibrada, sob todos os pontos, brilhante em seu poder in-
telectual, admirável em sua lógica esplêndida, possa, ao
mesmo tempo, ser vítima de uma grande ilusão que, de res-
to, deveria justamente referir-se à sua identidade pessoal ou
aos acontecimentos de sua existência passada." (Ibidem,
pág. 460).

Chamo a atenção dos meus leitores para a passagem citada
pelo dr. Prince cujos argumentos cerrados são, logicamente,
irrefutáveis. Efetivamente, eles demonstram que o prof. Cory,
querendo chegar à conclusão de que Patience Worth era uma
"personalidade subconsciente" da médium, não considerou as
numerosas circunstâncias que provam o contrário! Mas como se
poderia, racionalmente, afirmar que Patience Worth era vítima
da ilusão obstinada e persistente de ter vivido na Terra do mo-
mento que não se tratava de ilusões, mas de fatos positivamente
verificados – os indicados pelo dr. Prince – e que esses fatos
convergiam admiravelmente para a demonstração de que Patien-


ce Worth dizia a verdade, afirmando ter vivido em uma região
precisa da Inglaterra, em uma época recuada? Seria verdadeira-
mente curioso que, em metapsíquica, se tivesse que adotar um
sistema de análise e de síntese invertido, isto é, concluindo
sistematicamente o contrário do que demonstram os fatos. Cer-
tamente poder-se-ia objetar que as aparências enganam; sem
dúvida, mas, em nosso caso, a abjeção não tem cabimento,
porque, repito-o, não se trata de aparências, mas de fatos incon-
testáveis, positivos, inexplicáveis, tais como os apontados pelo
dr. Prince.

Entre esses fatos, o principal é que Patience Worth fala, cons-
tantemente, em um dialeto arcaico do século XVII, empregando,
invariavelmente, palavras de origem anglo-saxônica que eram
próprias à idade em que vivera, sem jamais cair no anacronismo
de usar vocábulos de origem latina, penetrados na língua depois
de 1600. Já demonstramos que esta circunstância não pode ser
esclarecida pela hipótese ultrametafísica do "reservatório cósmi-
co de memórias individuais".

Segue-se daí que aqueles que não adotam o sistema de não
considerar os fatos em seu conjunto, na investigação das mani-
festações metapsíquicas, deverão, forçosamente, concluir que a
única hipótese capaz de explicar o caso de Patience Worth é a
que contém a segunda proposição formulada pelo dr. Prince, isto
é, que a sra. Curran foi, simplesmente, um médium, por intermé-
dio do qual se manifestou uma entidade espiritual absolutamente
estranha à referida senhora.


Capítulo VIII

Resta-me tomar em consideração uma última obra literária
recebida mediunicamente há algum tempo, que despertou, na
Inglaterra, imenso interesse, assim como suscitou vivas discus-
sões em revistas metapsíquicas, espíritas, religiosas e mesmo em
jornais políticos, de forma tal que a primeira edição se esgotou
em cinco meses. A obra, que tem o título de Os Escritos de
Cléofas, é apresentada como uma "crônica sacra" complementar
dos "Atos dos Apóstolos", que chegaram até nós mutilados em
algumas partes, em conseqüência das perseguições de que foram
vítimas os primeiros cristãos.

Os Escritos de Cléofas teriam sido transmitidos diretamente
(ou, para melhor dizer, "inspirados") pelo discípulo deste nome,
um dos dois ao qual o Cristo apareceu no caminho de Emaús,
três dias após sua morte, e com o qual se sentara para comer na
cidade homônima de Emaús.

O médium, por intermédio do qual essa notável obra foi dita-
da, é a srta. Geraldine Cummins, filha do prof. Ashley Cummins,
de Cork, Irlanda, doutor em medicina.

A srta. Cummins é uma escritora elegante, autora de um ro-
mance e duas comédias escritas em colaboração com outros; é,
ao mesmo tempo, hábil jogadora de lawn-tenis.

Cito isto com o fim único de mostrar o perfeito equilíbrio de
seu corpo e seu espírito. Em 1923 ela começou a exercitar-se na
escrita automática com sua amiga srta. Gibbes, e em 1925 obti-
veram, repentinamente, os primeiros ditados relativos à história
do primeiro século da igreja cristã.

A entidade que os ditava assinava "O Mensageiro" e sua es-
crita mediúnica se processava com a médium em estado de meio-
transe.

O lápis corria mui rapidamente sobre o papel; 1.400 a 1.500
palavras eram ditadas, sem interrupção, numa hora. O ditado,
uma vez terminado, era imediatamente retirado, na ignorância do


seu conteúdo, com o fim de se evitarem interferências possíveis
de sua subconsciência.

Essa medida de precaução não impedia, entretanto, que o es-
crito continuasse, invariavelmente, no ponto preciso em que fora
interrompido. As pessoas que assistiam ao ditado mediúnico não
exerciam nenhuma influência sobre ele. A médium acolhia,
amavelmente, todos os que desejavam vê-la psicografar e daí as
sessões se realizarem, constantemente, na presença de médicos,
padres católicos, pastores protestantes, teólogos, historiadores,
jornalistas, assim como na de alguns membros das duas socieda-
des de pesquisas psíquicas: a inglesa e a americana.

A sensação experimentada pela médium, durante o ditado, era
a de uma pessoa que sonha, sem ter qualquer influência sobre o
desenvolvimento das fantasias sonhadas. Além desta, ela expe-
rimentava a impressão de que seu cérebro era empregado por
outra individualidade que dele se servia, de modo análogo ao
telegrafista com seu aparelho ou ao datilógrafo com sua máquina
de escrever.

Relativamente à origem desse Evangelho suplementar, o rev.
John Lamond, que estava entre os que assistiram à sua produção,
observa:

"Quem quer que seja o autor destas "crônicas sacras", elas
não são, certamente, o produto da mentalidade subconscien-
te da srta. Cummins. Foi, de fato, ela quem os escreveu me-
diunicamente, assistida por sua amiga e provável auxiliar,
srta Gibbes, mas o material de que se compõem as "crôni-
cas" não podia, absolutamente, provir da médium. É lícito
escriturar a seu crédito a beleza literária da forma, mas as
crônicas intituladas Os Escritos de Cléofas não são obra sua.
Nota-se nelas uma surpreendente familiaridade com os vo-
cábulos em uso, no período apostólico da Era Cristã, um co-
nhecimento perfeito das cidades e dos países dessa época re-
cuada. Quanto aos acontecimentos históricos, são descritos
com tal vivacidade de cor local que só se poderia atribuir a
narração deles a uma testemunha ocular. Tudo, em suma,
nesse livro, contribui para demonstrar que seu autor ou auto-


res, quaisquer que sejam, estão inteiramente ao corrente dos
acontecimentos que aí se descrevem e em uma harmonia
perfeita de sentimentos com os autores do drama narrado. É
necessário acrescentar que a srta. Cummins, quando se pro-
duz a escrita mediúnica, se encontra em condições de meio
transe, e a impressão experimentada por todos os que assisti-
ram a essas experiências é que as "crônicas" obtidas dessa
maneira são "inspiradas" por um autor invisível...

A narrativa cresce em interesse à medida que progride e,
quando ficar terminada dentro de pouco tempo, verificar-
se-á que vários acontecimentos, nos quais se toca muito ra-
pidamente nos "Atos dos Apóstolos", estão aclarados por
nova luz. A visita dos discípulos a Emaús está amplamente
descrita nas crônicas, assim como outros acontecimentos de
interesse vital, relativamente à ressurreição. Com efeito, em
Os Escritos de Cléofas expõe-se nova concepção da ressur-
reição. O trabalho devotado da srta. Cummins, nessa ordem
de manifestações, já lhe granjeou o reconhecimento de
grande número de leitores, entre os quais vários teólogos,
profundamente conhecedores da história dos tempos apos-
tólicos e da literatura dos evangelhos apócrifos da época. O
juízo unânime dessas pessoas competentes, a respeito do
grande valor de Os Escritos de Cléofas, merece a mais séria
consideração." (Psychic Science, 1929, págs. 337-8).

Outro eminente teólogo católico, o rev. Cônego H. Bickerstett
Ottley, termina um artigo consagrado a Os Escritos de Cléofas
com a seguinte declaração:

"Tive o ensejo de assistir, pessoalmente, por duas vezes, à
produção da "mensagem" confiada ao instrumento inconsci-
ente que era, nessa ocasião, a srta. Cummins... Consagrei vá-
rios meses ao estudo e à análise a que estava apto a empre-
ender em virtude dos meus títulos acadêmicos. Além disso,
faço notar que tinha começado essa pesquisa com um pre-
conceito apriorístico bem firme, que me tornava cético em
face dessas pesquisas, visto que, desde a infância, tinha a-
prendido a considerar como "vedado o domínio das comuni-


cações espíritas com a vida que sucede à morte". Ora, tenho
o dever de reconhecer que Os Escritos de Cléofas trazem à
apologética cristã de nossos tempos uma contribuição de
importância suprema que se produz no momento justo em
que se sentia mais vivamente a sua necessidade." (Journal of
the S. P. R., 1929, pág. 91).

A srta. Gibbes escreve por sua vez:

"Relativamente à autenticidade supranormal de Os Escri-
tos de Cléofas, mister se faz considerar bem a circunstância
de que eles foram severamente analisados por vários teólo-
gos universitários, considerados como as melhores autorida-
des no assunto. Todos foram unânimes em exprimir a opini-
ão de que Os Escritos de Cléofas são, de qualquer forma, au-
tenticamente transcendentais, constituindo uma das mais
importantes contribuições trazidas para conhecimento do pe-
ríodo apostólico da cristandade. Declaram, do mesmo modo,
que esses escritos contêm numerosos incidentes e episódios
que, se se considerar o grau de cultura daquela que os rece-
beu mediunicamente, são literalmente inexplicáveis no sen-
tido de que tenham origem humana. Pode-se dizer outro tan-
to de grande número de citações geográficas e de incidentes
históricos dos quais se pode constatar a veracidade, assim
como na freqüente terminologia dos tempos apostólicos. Foi
justamente sobre esses dados que se exerceu, especialmente,
a crítica dos teólogos competentes que verificaram a autenti-
cidade e a exatidão constantes dos mesmos." (Light, 1928,
pág. 473).

Para citar alguns dados dessa espécie, lembro o termo poli-
targia, que não existe na "versão autorizada" do Novo Testa-
mento e que em Os Escritos de Cléofas é usado como uma
transcrição no alfabeto moderno (transliteração) da palavra
grega correspondente, empregada nos "Atos dos Apóstolos", 17,
6. Dá-se o mesmo com o vocábulo archon (pág. 161), próprio
para indicar o chefe da comunidade judia em Antioquia da Síria;
palavra de que se notou a justeza quando se verificou que o


imperador Augusto, no ano 11 de nossa era, a destinara a substi-
tuir o antigo título etnarcha.

A sra. Bárbara Mackenzie acrescenta esta outra coincidência
geográfica que os peritos na questão não assinalaram:

"Em Os Escritos de Cléofas li com o mais vivo interesse o
episódio pitoresco de Barnabé, o descobridor de fontes na
planície árida que cerca a cidade Iconium. Pois bem, encon-
trei, há dias, um oficial aprisionado pelos turcos e internado
nessa mesma região, durante a guerra. Pedi-lhe indicações a
respeito e ele me declarou que a "descrição feita em Os Es-
critos de Cléofas era inteiramente exata e que, ao redor da
cidade de Iconium se estende uma imensa planície desolada,
completamente desprovida de água." (Light, 1928, pág.
233).

Como se pode ver, o rev. John Lamond nota, entre outras coi-
sas, que em Os Escritos de Cléofas estão aclarados, com nova
luz, numerosos acontecimentos nos quais os "Atos dos Apósto-
los" tocam muito rapidamente... A título de exemplo, eis um
desses acontecimentos.

No capítulo 7 dos "Atos dos Apóstolos", lê-se que a multidão
lapidou santo Estêvão. O versículo 59 nos conta que "as teste-
munhas arrojaram as vestes do santo aos pés de um moço cha-
mado Saul. Como não se diz mais nada a esse respeito, pergunta-
se: "Por que fizeram isso? Que significa semelhante ação? Quem
era esse Saul?"

Os Escritos de Cléofas contam o episódio mais detalhada-
mente e então é possível compreendê-lo. Saul era um moço que
tinha motivos especiais de animosidade contra Estêvão. Este
despertara nele vivo ciúme por causa dos dons de orador que o
distinguiam, dons que o tornaram um adversário temível de Saul,
assim entre os judeus, como entre os cristãos. Saul tinha, então,
assalariado homens do povo, alguns dos quais estavam mal
dispostos com Estêvão, e os incitara a matá-lo fornecendo-lhes
dinheiro e roupas e eles conseguiram seu malévolo intento. Uma
vez, porém, cometido o crime, ficaram os assassinos de tal modo
impressionados com a coragem heróica do mártir "que se senti-


ram profundamente deprimidos e aterrados, crendo ter morto o
eleito do Senhor".

A narração continua assim:

"Quando as sombrias nuvens da cólera se dissiparam, eles
abandonaram, no caminho, o corpo do santo e foram procu-
rar Saul a quem disseram: "Tu nos arrastaste a cometer uma
ação má e nós não queremos gozar do preço de nosso crime.
Isto dizendo, arrojaram aos pés de Saul os mantos que ele
lhes tinha dado, assim como o dinheiro pago para cometer o
crime. E se foram com a desolação pintada nos semblantes e
o terror nos corações, porque, no momento em que Estêvão
expirava, no martírio que lhe infligiam, perceberam Deus ao
lado dele."

Tal é a descrição simples e detalhada de um fato que, no texto
dos "Atos dos Apóstolos", parecia inexplicável por causa da
narração deficiente e obscura que dele se fizera. Desta vez, todo
o mundo compreenderá porque "as testemunhas depositaram
suas vestes aos pés de um moço chamado Saul".

Observo que, conforme os fatos narrados, o termo "testemu-
nhas", do texto evangélico, deveria ser considerado como inexa-
to; deveria ser antes "sicários" ou "mandatários" ou "assassi-
nos".

O valor teoricamente interessante das concordâncias análogas
à que acabo de citar consiste no fato de que, quando lemos
semelhantes narrações em Os Escritos de Cléofas e as compara-
mos aos versículos correspondentes, mas incompletos, dos "Atos
dos apóstolos", chegamos à conclusão, racionalmente incontes-
tável, de que os fatos contados devem ter-se desenrolado justa-
mente da maneira pela qual estão descritos no ditado mediúnico,
visto que essas narrações servem para elucidar versículos obscu-
ros do texto escriturístico, e de modo tão completo que não se
poderia pensar em outra versão capaz de considerar o mesmo
texto.

Eis pormenores de aparência insignificante e que são, todavi-
a, muito importantes para as pesquisas acerca da natureza da
personalidade mediúnica que transmitiu Os Escritos.


Escreve a srta. Gibbes:

"Em diferentes ocasiões, o "Mensageiro" afirmara que
"Cléofas" se valia de numerosas crônicas da época. Seria,
então, interessante a descoberta de alguma prova tendente a
confirmar essa asserção do "Mensageiro". Estávamos emba-
raçados com o caso, quando, nos primeiros tempos da
transmissão das "mensagens apostólicas", uma dessas, ora
inclusa no capítulo IV, começou, contra o hábito, na "pri-
meira pessoa". A mensagem dizia: "Estive longamente com
Pedro e ouvi-lhe atentamente todas as palavras. Ele tinha o
poder de transmitir a outros a faculdade das visões e dos so-
nhos, por intermédio do poder radioso de sua palavra".
Quinze meses depois, quando se preparava a publicação da
primeira série de Os Escritos, pediram-se explicações à per-
sonalidade comunicante a respeito da frase que acabo de ci-
tar. Foi-nos respondido: "É preciso que saibas que, quando
estas palavras foram ditadas, nossa intenção era a de traduzir
para vossa língua, palavra por palavra, uma antiga crônica
daquela época, transmitindo-a ao mundo por intermédio des-
ta mão. Nosso intento, porém, se modificou desde que des-
cobrimos que os corpos espirituais das duas senhoras, de que
nos servimos, continham poderes suficientes para receber de
nós o ditado dos acontecimentos contidos em várias crôni-
cas. Nessas condições, as palavras da introdução, que dita-
mos há vários meses, não devem ser entendidas como tendo
relação conosco, mas com o autor das crônicas de que tira-
mos as presentes informações que são constituídas de ima-
gens que "Cléofas" colhia na grande "Árvore das Recorda-
ções" para transmiti-las em seguida a nós, seus mensageiros,
encarregados de transformá-las em termos acessíveis aos
homens de vossa geração. De qualquer maneira, seria con-
veniente suprimir no texto palavras de introdução, a fim de
evitar toda a confusão possível entre as pessoas que lerem
essas crônicas."

A srta. Gibbes continua, dizendo:


"As palavras da introdução foram então suprimidas do
texto publicado. Saliento que a explicação acima era absolu-
tamente inesperada por todos nós. Aliás, a julgar pelo imen-
so material de fatos que foi, em seguida, ditado à srta.
Cummins, podemos reconhecer o bom fundamento da afir-
mação supra, segundo a qual se mudará de intenção desde
que se verificou a capacidade mediúnica do "instrumento"
que se empregava, isto é, que se decidiu ditar à médium uma
história dos tempos apostólicos, infinitamente mais longa e
mais completa da que antes se havia combinado." (Light,
1929, pág. 152).

No que concerne aos fins a que se propuseram os espíritos
comunicantes, ditando as crônicas em questão, eis o que eles
dizem a respeito:

"Nossa intenção é a de semear, no coração dos homens de
vossa geração, o gérmen da fé no Divino Mestre, de modo
que essa fé possa reflorescer. Esperamos que o coração dos
homens de hoje receba a nossa semente! Entre eles, alguns
há que julgam que o Cristo é morto! Absolutamente. Isto
não é verdade. Ele vive mais do que nunca e reviverá nos
corações e nos espíritos das gerações futuras com mais es-
plendor do que dantes!" (Light, 1929, pág. 147).

Tais são as suas intenções, tais as suas esperanças. Todavia,
curioso e interessante é saber, a esse respeito, a opinião de um
outro espírito-guia da srta. Cummins, ao qual esta última se
dirigiu para ter informações referentes ao "Mensageiro" que
ditava as crônicas sacras. O espírito-guia respondeu:

"Desde há muito que uma falange de espíritos envidava
esforços para descobrir um sensitivo capaz de receber, atra-
vés do mecanismo de seu cérebro, a história das origens do
cristianismo. Os membros desse grupo pensavam que não
poderia haver expediente melhor para encher o horrível vá-
cuo espiritual que existe nas almas da atual geração, vácuo
horrível quando é observado do mundo espiritual. Cléofas e
seus auxiliares se propuseram, então, enviar aos humanos o
remédio de que tinham necessidade, revelando-lhes a histó-


ria do período apostólico. Na minha opinião, eles não consi-
deraram, suficientemente, que os horizontes mentais da hu-
manidade se modificaram bastante depois da época em que
viveram na Terra. Não perceberam que, na presente socieda-
de humana, não há quase lugar para a fé, pois a humanidade
quer atingir o espiritual através do material." (Light, 1928,
pág. 149).

Resulta daí que o espírito-guia da srta. Cummins duvida do
sucesso da nobre tentativa de Cléofas e seus coadjutores, que se
propuseram transmitir aos humanos crônicas autênticas dos
tempos apostólicos, na esperança de salvar, assim, a presente
humanidade, reconduzindo-a à fé dos cristãos primitivos em seu
Mestre. Muitos dos meus leitores compartilham, sem dúvida, da
opinião do espírito-guia da srta. Cummins, mas isto não tem
importância alguma para nosso ponto de vista e, unicamente,
serve para confirmar uma verdade conhecida desde há muito,
isto é, que ninguém se torna onisciente porque desencarnou, mas
que o espírito fica, intelectualmente, no ponto em que estava por
ocasião da morte. Não tardam esses seres em assimilar grande
número de conhecimentos relativos ao meio espiritual em que se
encontram, mas não se despoja, senão muito lentamente, das
concepções intelectuais que possuíam e só vagamente entrevêem
as verdades espirituais a respeito das quais, assim no além como
no mundo dos vivos, cada um tem o dever de exercer livremente
seu discernimento. Tal fato dá lugar, como na Terra, a várias
opiniões mais ou menos em desacordo entre si.

Com isto, espero ter citado e comentado, suficientemente, o
caso em questão, para dele fazer sobressair o grande valor teóri-
co a favor da interpretação espírita dos fatos. O caso é, aliás,
semelhante ao de Patience Worth e não lhe é, de modo algum,
inferior quanto á natureza maravilhosa do texto obtido mediuni-
camente. A diferença entre os dois casos é de natureza secundá-
ria e consiste em que nas comunicações de Patience Worth se
encontram dados – como sua conversa constante em um dialeto
arcaico – que podem servir indiretamente, mas eficazmente, para
provar a independência intelectual e, em certo ponto de vista, a
própria identificação intelectual da entidade comunicante, ao


passo que, no caso de Cléofas, não se vêem aparecer dados desta
natureza.

Em todo o caso, isso não apresenta uma importância teórica
apreciável, porque, nos dois casos, a eficácia demonstrativa dos
fatos nada tem que ver com a questão de identificação pessoal,
para se concentrar, unicamente, na natureza intrínseca do materi-
al psicográfico obtido, cuja proveniência é inexplicável perante
toda hipótese naturalista. Com efeito, mesmo no caso de Cléofas,
as hipóteses da telepatia, da criptomnesia, da psicometria, não
chegam, de maneira alguma, a considerar o conjunto dos fatos,
sobretudo em se considerando não se tratar de indicações isola-
das ou de acontecimentos fragmentários suscetíveis de serem
atribuídos às emergências da subconsciência da médium (crip-
tomnesia) ou bem ao fato de a médium tê-las captado nas sub-
consciências dos assistentes ou dos ausentes (clarividência
telepática).

Não se trata de "visões psicométricas" em relação com um
objeto apresentado ao médium sensitivo e, por conseqüência,
circunscritas pelas "influências" existentes em estado latente no
próprio objeto, mas, ao contrário, trata-se de crônicas orgânicas,
isto é, de uma narração ordenada de acontecimentos, com nume-
rosas noções geográficas, topográficas, históricas, filológicas,
ignoradas da médium e das quais se verificou, em seguida, a
autenticidade.

Trata-se, finalmente, em grande parte, de episódios que, refe-
ridos obscuramente nos "Atos dos Apóstolos", agora, ao contrá-
rio, são narrados minuciosamente em Os Escritos de Cléofas, o
que torna, pela primeira vez, inteligível o texto escriturístico.

Em suma, trata-se de uma obra histórica ordenada, completa,
vital, que já se compõe de três grossos volumes e ainda não está
terminada. Não é certamente na subconsciência da médium que
se deverá buscar a gênese de um trabalho que apresenta uma
importância real, histórica e religiosa, no qual se encontram
dados, indicações, minúcias, que ninguém poderia focalizar sem
ser especializado nas ciências histórica, geográfica, teológica e
filológica.


Nestas condições, só resta uma coisa a fazer: aceitar, ainda
esta vez, em nome da lógica e do bom senso, as explicações
fornecidas pelas personalidades mediúnicas que ditaram a obra
em questão, isto é, concordar que essas personalidades são
espíritos de defuntos que relatam os acontecimentos dos quais
foram testemunhas ou que se produziram na época e na região
em que viveram.


Capítulo IX
Conclusão

Passemos das conclusões referentes ao caso de Os Escritos de
Cléofas às conclusões gerais que abrangem todas as obras literá-
rias de proveniência supranormal e das quais temos tratado.

Noto, primeiramente, que essas obras prestam-se à ilustração
e à análise eficaz do problema a resolver, apresentando-o ao
julgamento da razão em pontos de vista diferentes, que conver-
gem para a demonstração da origem extrínseca ou espírita das
manifestações dessa natureza, o que confere uma solidez cientí-
fica à solução espiritualista do problema em questão.

Segue-se disto que o grupo de casos que aqui focalizamos
fornece outra prova a favor da existência e da sobrevivência do
espírito humano e isto independentemente dos casos de identifi-
cação espírita, baseados em indicações pessoais dadas pelos
defuntos que se comunicam. Esta última circunstância reveste
altíssimo valor teórico e apresenta mesmo certo lado de atualida-
de, pois que se puderam ler, ultimamente, escritos de metapsi-
quistas eminentes e autorizados, os quais, de boa fé, chamaram a
atenção das pessoas competentes para o valor teórico de velhas
hipóteses metafísicas, propostas para a explicação dos casos de
identificação espírita propriamente dita. Esses metapsiquistas
concluíram, tristemente, que as probabilidades de chegar-se um
dia a obter-se uma prova cientificamente adequada da existência
e da sobrevivência do espírito humano diminuíram, dia a dia, em
conseqüência dessas hipóteses que, embora puramente metafísi-
cas, não podiam ser eliminadas e neutralizavam, para sempre, o
valor dos casos de identificação espírita baseados em indicações
pessoais fornecidas pelos defuntos que se comunicam.

Não discutirei, no momento, essas pretensas objeções in-
transponíveis, que facilmente transpus e demoli, baseando-me
nos fatos, em recente monografia publicada na revista metapsi-
quista italiana Luce e Ombra, hoje La Ricerca Psichica. Sem
nelas tocar, noto, com surpresa, que os eminentes metapsiquistas,
que se exprimiram da maneira aludida, mostraram ter esquecido


que a demonstração científica da existência e da sobrevivência
do espírito humano não depende, de modo algum, de uma prova
única que se tira das indicações pessoais fornecidas, mediunica-
mente, pelos mortos aos vivos.

Ela depende do conjunto importante das manifestações su-
pranormais – anímicas e espíritas – que concorrem, em massa,
para fornecer provas nesse sentido, isto é, todas elas convergem
para a demonstração da existência, no homem, de um espírito
independente do corpo, organizador deste e sobrevivente à sua
morte. Ora, essas provas são absolutamente estranhas aos casos
de identificação espírita criticados por nossos contraditores.

Confirmam, por conseguinte, indiretamente, os casos em
questão, conferindo-lhes uma solidez científica que, em princí-
pio, pode ser considerada inabalável.

Como já disse, uma dessas provas é justamente a da literatura
de além-túmulo, que estudei aqui e graças à qual fomos levados
a admitir a hipótese da existência e da sobrevivência do espírito
humano, por meio de manifestações que não são provas de
identificação. Outra demonstração absolutamente fundamental
para a consolidação científica da hipótese em questão é represen-
tada pelo fato da existência latente, na subconsciência, de facul-
dades de sentidos supranormais, livres dos laços do espaço e do
tempo, independentes da lei de evolução biológica (o que consti-
tui um indício de que não são produto da evolução biológica)
inoperantes e mesmo inúteis durante a existência terrestre, pois
que são inconciliáveis com as condições nas quais se desenvolve
a existência encarnada (é claro, com efeito, que, se a clarividên-
cia no futuro se tornasse normal, ela paralisaria toda a iniciativa
humana). Estas circunstâncias são, teoricamente, muito impor-
tantes, porque provam que as faculdades supranormais subcons-
cientes não podem ser explicadas supondo-se que elas represen-
tem "um sexto sentido" em gestação.

Pode-se acrescentar, sobre o assunto, que, ainda que as cir-
cunstâncias em questão bastem por si mesmas para eliminar,
definitivamente, essa hipótese gratuita, fácil é assinalar outras
circunstâncias de fato igualmente decisivas neste sentido, tal
como, por exemplo, a seguinte: que as faculdades supranormais


subconscientes se manifestam utilizando os sentidos existentes:
visão, audição, tato, o que demonstra que elas não podem consti-
tuir em si mesmas um novo "sentido biológico em gestação".
Outra coisa: em lugar de determinar por percepção direta, isto é,
da periferia para o cérebro, como devia ser, com todo sentido
biológico, passado, presente e futuro, elas se determinam por
percepção inversa, isto é, do cérebro para a periferia, sob a
formação de visões e audições subjetivas projetadas para fora e
quase sempre sob uma forma mais ou menos simbólica.

Isso demonstra, ulteriormente, que não poderia tratar-se de
um "sexto sentido" em gestação, pois que os sentidos biológicos
deveriam automaticamente perceber a realidade tal como se lhes
manifesta e não traduzi-la, inteligentemente, em simbolismos
abstratos que, de resto, no caso em questão, tomam, às vezes,
uma significação precisa da qual se descobrem facilmente os
fins, mas somente quando o acontecimento vem de se realizar.

Noto, finalmente, que essas faculdades emergem, por jatos
fugazes, apenas nos períodos de minoramento vital dos indiví-
duos (sono, síncope, êxtase, hipnose, narcose, coma), outra
circunstância inconciliável com a hipótese do "sexto sentido",
mas que, pelo contrário, está em perfeito acordo com a hipótese
espírita, pois que esta nos leva a deduzir que, quando a crise da
morte tiver libertado as faculdades supranormais do cativeiro da
carne, estas poderão funcionar, então, livremente, em meio
apropriado. Em outras palavras, tudo contribui para demonstrar
que as faculdades supranormais em apreço constituem os senti-
dos espirituais do homem, que existem, pré-formados, em estado
latente, nos refolhos da subconsciência, esperando o momento de
emergir e de funcionar no meio espiritual, depois da crise da
morte, do mesmo modo que os sentidos biológicos existem,
formados antes, em estado latente, no embrião, esperando a
oportunidade de emergir e de exercitar-se no meio terrestre, após
a crise do nascimento, assim como as asas existem na crisálida
da lagarta, na qual se encontram já formadas, em estado latente,
destinadas a emergir e a funcionar num meio apropriado, quando
a lagarta se transformar em borboleta.


Podemos citar outras provas do mesmo gênero, não menos
importantes e significativas como as que é possível tirar do
fenômeno de "bilocação", no sono natural, na narcose, no coma,
ou as que se obtêm, experimentalmente, ou que são visualizadas
por sensitivos na cabeceira dos moribundos. São formas de
manifestação que demonstram a existência real de um "corpo
espiritual", que pode separar-se do "corpo somático". Podemos
dizer outro tanto das provas que se apresentam com as "apari-
ções de defuntos no leito de morte", as quais nada têm de co-
mum com os casos de identificação espírita, que consistem em
indicações pessoais fornecidas pelos defuntos comunicantes. De
outra parte, suas modalidades multiformes de desenvolvimento
bastam para eliminar as hipóteses alucinatória e telepática.

Isso se dá, por exemplo, quando os fantasmas de defuntos são
vistos, coletiva e sucessivamente, pelos assistentes e pelo mori-
bundo, ou quando estes são os primeiros a perceber o fantasma
do morto, quando o moribundo o vê por sua vez, mas somente
quando acontece volver seus olhares para o lado em que está a
aparição e, sobretudo, quando o moribundo e o percipiente são
crianças de idade muito tenra e, por conseqüência, não suscetí-
veis de auto-sugestionar-se a ponto de se alucinarem por temor
de uma morte que ignoram.

O mesmo acontece com as provas oriundas das "aparições de
defuntos algum tempo depois de sua morte", casos que, quando
têm por testemunhas diferentes pessoas, de modo a eliminar as
hipóteses habituais fundadas na alucinação e na telepatia, consti-
tuem uma das provas mais importantes e incontestáveis a favor
da sobrevivência. As experiências chamadas de "correspondên-
cias cruzadas" assumem, por sua vez, em nossos dias, um valor
teórico elevadíssimo, no sentido espírita, graças aos resultados
obtidos pelo dr. Crandon, de Boston, com a mediunidade de sua
esposa, Margery, e com três grupos simultâneos de experimenta-
dores, afastados, um do outro, centenas de milhas, assim como
pelas experiências, não menos admiráveis, do sr. Frederick
James Crawley, em Newcastle, e da médium sra. Osborne Leo-
nard, em Londres.


Saliento, em último lugar, que várias outras categorias de
manifestações supranormais – que ilustrei em monografias
especiais – contêm excelentes provas no gênero das que nos
ocupamos, apenas sendo impossível demonstrar-lhes, eficazmen-
te, a importância teórica sem recorrer a exemplos. Trata-se dos
casos de fantasmas materializados que falam e escrevem, às
vezes, em línguas ignoradas de todos os assistentes (Elizabeth
d'Esperance, Frank Kluski, etc.).

Em outros casos, são variedades de "fotografias transcenden-
tais" nas quais se vêem defuntos desconhecidos de todos os
assistentes e dos quais se descobre, em seguida, a identidade, ou
que fornecem, eles próprios, indicações necessárias para sua
identificação. Podem ser citadas, na mesma ordem de idéias,
certas manifestações maravilhosas de "música transcendental"
no leito de morte e depois da morte, uma variedade muito espe-
cial de fenômenos de "telecinesia" no momento da morte e, após
esta, algumas manifestações imponentes de fenômenos de as-
sombração, um grupo de casos que demonstram a realidade dos
fenômenos de "obsessão e possessão", outros grupos de "premo-
nições" e "auto-premonições" de morte acidental cercadas de
símbolos que são impenetráveis até o momento em que o fato se
dá e isto, manifestamente, com o fito de impedir a vítima de
subtrair-se ao destino que a espera.

Queria, em suma, que se compreendesse que, quando se dis-
cutir sobre a validade da hipótese espírita, não se deverá nunca
esquecer que esta validade não repousa unicamente sobre casos
de informações pessoais fornecidas pelos mortos que se comuni-
cam. Ela está, inabalavelmente, fundada num feixe de provas
extraídas de um conjunto inteiro de manifestações supranormais:
anímicas e espíritas.

Repito que esta última verdade é indiscutível e teoricamente
decisiva, porém noto, ao mesmo tempo, que ela é sempre esque-
cida pelos contraditores da hipótese espírita e muitas vezes
mesmo por seus defensores, que ficam, por vezes, embaraçados e
perplexos em face de objeções contrárias, justamente porque eles
se esquecem, por sua vez, de que a hipótese espírita está solida-
riamente assentada numa imensidade de provas e não numa


prova única, e que basta considerar, cumulativamente, essas
provas, para convencer-se alguém da impossibilidade lógica de
romper, mesmo levemente, o feixe delas.

As almas timoratas, que receiam a iminência de uma catástro-
fe para a verdade que lhes é cara, podem, pois, ter dias tranqüi-
los. Persuadam-se de que não é, racionalmente, permitido ter
dúvida, mesmo a mais leve, sobre a estabilidade das bases nas
quais repousa a hipótese espírita.

Se, apesar de tudo, a hipótese espírita ainda encontra oposito-
res no meio de pessoas competentes em metapsíquica, isto se
deve exclusivamente ao fato de ter a inteligência humana muito
trabalho em submeter ao critério da razão, a um só tempo, todos
os dados que constituem cada problema a resolver, o que deter-
mina a sucessão e a teimosia perpétuas de conclusões erradas,
porque são assentadas apenas numa análise muito parcial dos
fatos.

Reconheço, todavia, que esse inconveniente, oriundo de uma
imperfeição inata na inteligência humana, reveste o valor de uma
lei biológico-psíquica. Nessas condições, só nos resta curvar-nos
ante os decretos da Providência, deduzindo que, em princípio, o
fato de tatear-se no erro e avançar-se no caminho da verdade,
tropeçando a cada passo, sempre impelidos pelo aguilhão da
dúvida filosófica, constitui um elemento indispensável de indivi-
dualização e elevação da personalidade humana.


Posfácio
Quem escreveu o livro de Balzac?

Temos todos nós, espíritas, um dever de gratidão para com
Ernesto Bozzano. O respeitável estudioso nasceu em 1862, cinco
anos, portanto, após o lançamento de O Livro dos Espíritos.

Surgida em hostil ambiente cultural e religioso, a jovem dou-
trina iria mesmo precisar de alguém que se dedicasse com sere-
nidade, competência e isenção, ao trabalho de examinar sua
interface com o contexto científico e filosófico da época.

Já no primeiro estudo publicado em 1901, ficou marcada com
nitidez essa posição de Bozzano. Chamou-se O espiritismo
perante a ciência, que não apenas identifica esse texto, como
caracteriza toda a obra do meticuloso pesquisador, da qual
Francisco Klörs Werneck rastreou nada menos de uma centena
de títulos.

Na presente monografia, Bozzano aborda, com maior ampli-
tude e profundidade, o tema da literatura mediúnica, do qual já
havia tratado parcialmente em estudo anterior. Aos casos de
Oscar Wilde e de Charles Dickens, ele acrescenta o de Carlo
Goldoni – psicografando versos atribuídos a Ariosto – e os de
William Sharp-Fiona Macleod, Harriet Beecher-Stowe (A caba-
na do pai Tomás), Patience Worth e Geraldine Cummins, com
Os Escritos de Cléofas.

Cada um à sua maneira, são todos eles apaixonantes. Houve
um tempo em que mergulhei mais fundo nos dois últimos. Os
textos mediúnicos de Geraldine Cummins, pelo fascínio que
sempre tive pela temática do cristianismo primitivo; o de Patien-
ce Worth, pela magia literária da entidade que se identificava
com esse nome.

Os Escritos de Cléofas suscitaram a atenção, o interesse e o
respeito de eminentes teólogos, historiadores, lingüistas e estudi-
osos em geral. Já as obras de Patience Worth, recebidas mediu-
nicamente pela sra. Curran, foram um fenômeno literário nunca
visto. Por mais que tenha sido estudado e discutido, continua
desafiador e enigmático, provocando perplexidade e encanta-


mento. Cheguei a pensar em traduzir The Sorry Tale, que, como
sempre, me chamou a atenção por se passar na época do Cristo,
em paralelo com a história pessoal de Jesus. Sonhos esses, quase
sempre irrealizados... A gente não faz o que quer, mas o que
pode, ou, como dizia Paulo, o que não quer...

De nosso particular interesse nesta monografia de Ernesto
Bozzano é o caso Oscar Wilde, em virtude de sua conexão com a
temática de O Avesso de um Balzac Contemporâneo, de Osmar
Ramos Filho, publicado pela Editora Lachâtre.

Estou falando de conexão temática e não de semelhança me-
todológica, embora ambos os estudos tenham sido empreendidos
a partir de textos mediúnicos, tanto o de Bozzano como o de
Osmar. Acho até que as diferenças entre eles ressaltam mais
dramaticamente do que as possíveis concordâncias, pelo menos
na abordagem ao assunto.

Bozzano nos põe em contato com um relato da médium britâ-
nica sra. Travers-Smith e assume a clara postura de um pesqui-
sador espírita ao concluir que os textos mediúnicos são de auto-
ria do "falecido" Oscar Wilde. Considera, com eles, amplamente
demonstrada a realidade da sobrevivência do ser à morte corpo-
ral.

É diferente a abordagem de Osmar. Chega a admitir nela as
características de um texto mediúnico, ou melhor, psicográfico,
mas esse não é o seu propósito dominante. Sua opção foi a da
neutralidade de quem se empenha em complexo trabalho de
análise literária do que seria um pasticho intitulado Cristo Espe-
ra por Ti, escrito à maneira de Honoré de Balzac. O estudo se
desenvolve a partir da premissa de que o médium dr. Waldo
Vieira, que psicografou a narrativa, fosse tecnicamente um
pastichador. Com o que Osmar evita trazer para o âmbito de sua
dissertação conotações tidas por metafísicas ou que impliquem
matizes espíritas, sequer parapsicológicas.

Há outra peculiaridade a ser ressaltada no exame comparativo
dos estudos de Bozzano e o de Osmar. Wilde-espírito escreve na
mesma língua em que se expressava enquanto vivo e através de
uma médium também de língua inglesa; Balzac-espírito compõe


sua narrativa em português, língua diferente da que utilizou
enquanto encarnado.

Não estou, com estas observações, pondo em confronto as di-
ferentes abordagens, a fim de concluir qual delas é a melhor.
Não é isso que está em discussão aqui. Procuro examinar não
propriamente os méritos e possíveis deméritos de cada uma das
abordagens, mas as condições segundo as quais Osmar realizou
seu trabalho.

Convém lembrar, contudo, que o tratamento dado por Bozza-
no pode alienar liminarmente do exame dos escritos atribuídos a
Wilde aqueles que resolvem aprioristicamente não levar em
consideração estudos que concluam pela aprovação da chamada
"hipótese espírita" – a turma dos que não viram e não gostaram.
O de Osmar apresenta-se inocente de tal "suspeita", mas não
impede – pelo contrário, facilita – que seus leitores e leitoras
vejam no livro suas evidentes conotações espirituais.

Não tenho como avaliar o nível de profundidade alcançado
pelo trabalho da sra. Travers-Smith, na sua análise comparativa
do texto de Wilde-espírito com seus escritos quando ainda
encarnado, ou, na linguagem corrente, enquanto "vivo". Dificil-
mente teria ela, contudo, realizado algo parecido com a pesquisa
na qual se empenhou Osmar. Literalmente, ele virou o livro
mediúnico do avesso para ver como havia sido costurada a
história, em que estilo, com que imagens e com quais recursos
técnicos. Tive em mãos o exemplar utilizado por ele: está todo
anotado, página por página, com palavras e expressões em
destaque, chamadas para aqui e para ali, referências crípticas,
lembretes e símbolos inteligíveis somente ao próprio Osmar. E
isso foi apenas o lado do avesso. Sete anos foram consumidos na
busca na obra do Balzac "vivo", estimada em cerca de onze mil
páginas, pacientemente lidas, fichadas e anotadas por Osmar.

Era preciso familiarizar-se com a técnica, os modismos e os
cacoetes literários de Balzac, estudar cada uma das numerosas
personagens criadas por ele, prestar atenção até na escolha dos
nomes que lhes deu, do tipo físico e psicológico delas, de como
se vestiam, sobre o que conversavam, que vinhos tomavam, qual
a cronologia das histórias que viviam ou contavam.


As flores a que se referiam casualmente seriam mesmo típicas
daquela região e compatíveis com a época do ano? Seriam de
fato aquelas as técnicas da vindima descritas na história? Estari-
am configurados no espaço cósmico, naquele momento, os astros
a que se refere o "pasticho" psicografado: Por que estranhas
motivações o autor faz uma personagem figurar no texto vestida
com uma roupa cor de girafa? Com que mesmo se parece o
cenário de uma pequena propriedade rural na qual se desenrola
um episódio da história?

Tomemos esta última referência para exemplo, pois ela so-
mente se revela a Osmar ao breve clarão do que poderíamos
entender como um relâmpago intuitivo.

Surpreendentemente, o cenário todo em que se passa deter-
minado episódio, até os últimos e mais irrelevantes detalhes,
figura num quadro de Paul Potter intitulado La Ferme (A Fazen-
da). Será que o suposto pastichador teria condições de saber do
quase obscuro pintor e do quadro que se encontra hoje no acervo
do museu da Hermitage, em São Petersburgo?

Estranhíssimo, pois, esse pasticho, no qual o autor – seja ele
quem for, se você não quer admitir a autoria de Balzac – coloca
centenas, talvez milhares de pistas, de chaves, de charadas
literárias, culturais e históricas, tudo "como se fosse" mesmo
Balzac, mas um Balzac ao mesmo tempo diferente e idêntico a si
mesmo, como ficou dito no prefácio que escrevi para o livro do
Osmar.

Aqui estamos, pois, diante de um livro intitulado Cristo Espe-
ra por Ti, escrito por alguém que não é, positivamente, o Balzac
"vivo", ou seja, encarnado, autor da Comédia Humana, mas que
sabe tudo de Balzac e de sua obra. Usa de sua técnica, de seus
mais secretos e enigmáticos recursos e parece operar como se
tivesse à sua inteira disposição, não apenas a prodigiosa imagi-
nação criadora de Balzac, mas também sua espantosa genialidade
e a memória de toda a sua obra, nos seus mais imperceptíveis
detalhes, nas suas irreveladas intenções, nos seus segredos todos
e na sua fascinante magia.


Ora, a Comédia Humana não constitui literatura de segura ou
terceira categoria, trata-se de um monumento literário, uma visão
panorâmica, ampla e profunda, que não apenas retratou o contex-
to em que foi criada, mas fixou-o para sempre num documentá-
rio, no qual toda uma época é preservada num afresco pintado ao
vivo. Ali a sociedade francesa do século dezenove permanece
congelada, mas paradoxalmente, transbordante de vida, com o
coração a pulsar. Como o coração do Balzac póstumo, sobrevi-
vente, mais romancista e mais genial do que nunca.

Sobre a qualidade do trabalho de Osmar, não me atreveria se-
quer à petulância de um ignaro palpite. O Avesso de um Balzac
Contemporâneo foi ungido pelo pronunciamento consagrador do
prof. Paulo Rónai, reconhecido como respeitada autoridade
internacional em estudos balzaquianos. Assim depõe Rónai, em
carta de 19-05-1988, a Osmar:

"... O autor desse livro, fosse quem fosse, devia saber bem
francês, estar impregnado da cultura francesa do século pas-
sado e conhecer a fundo o universo balzaquiano."

Mais adiante, acrescenta o eminente escritor:

"... Outro fenômeno não menos surpreendente é o extraor-
dinário conhecimento que o senhor possui da obra de Bal-
zac."

Menciona, a seguir, os mestres franceses Marcel Bouteron e
Fernand Baldensperger, da Sorbonne, com os quais ele, Rónai,
estudou e concluiu que "nenhum deles estava mais versado do
que o senhor neste vasto mundo fictício".

Sem desejar pronunciar-se acerca do que chama "a gênese do
livro", o prof. Paulo Rónai atribui, portanto, ao estudo de Osmar
Ramos Filho as mais elevadas marcas de status cultural.

Dirigindo-se basicamente à comunidade internacional da eru-
dição acadêmica, Osmar emprega na pesquisa a metodologia
adequada e funde sua dissertação na técnica expositiva compatí-
vel com o seu público alvo.


Tal como Rónai, Osmar opta por deixar abertas ao seu públi-
co leitor as especulações quanto à gênese do livro. Seu trabalho é
uma competente análise literária de um pasticho.

É nessa qualidade de leitor, portanto, que me coloco, outor-
gando-me o direito e o dever de opinar. Para mim, Cristo Espera
por Ti foi escrito por Honoré de Balzac, o genial criador da
Comédia Humana.

Mas Balzac está morto desde 1850, dirá o cético, e o livro a-
tribuído à sua autoria foi escrito mais de um século depois, em
1964. E daí? Não é o primeiro "morto" que volta a escrever,
como Oscar Wilde ou Charles Dickens. E nem será o último.

Hermínio C. Miranda


Obras de Ernesto Bozzano
2


1. Espiritismo perante a ciência.
2. Hipóteses espiríticas e teorias científicas.
3. A propósito da introdução à metapsíquica humana.
4. Fenômenos de telecinesia em relação com acontecimentos
de morte.
5. Enigmas da psicometria.
6. Pensamento e vontade.
7. A crise da morte.
8. Xenoglossia.
9. Fenômenos de transporte.
10. Comunicações mediúnicas entre vivos.
11. Fenômenos de bilocação.
12. Casos de identificação espirítica.
13. Pesquisas em torno das manifestações supranormais.
14. Fenômenos de assombração.
15. Manifestações supranormais entre os povos selvagens.
16. Precognições, premonições, profecias.
17. Manifestações metapsíquicas e os animais.
18. Fenômenos de obsessão e possessão.
19. Manifestações olfativas de ordem patológica, telepática,
supranormal.
20. Animismo ou Espiritismo?
21. Literatura de além-túmulo.
22. Telepatia, telemnesia e a lei da "relação psíquica".
23. Visão panorâmica ou memória sintética na iminência da
morte.
24. Fenômenos de transfiguração.
25. Marcas e impressões de mãos de fogo.
26. Materializações de fantasmas em proporções minúsculas.
27. Em defesa do Espiritismo.
28. Breve história dos raps.
29. Aparições de defuntos no leito de morte.



30. Música transcendental.
31. Remontando às origens.
32. Fenômenos de telestesia.
33. Criptestesia e sobrevivência.
34. Gemas, amuletos e talismãs relativamente às experiências
de William Crookes.
35. Experiências de "voz direta" nos Estados Unidos.
36. A propósito das revelações transcendentais.
37. Mensagens mediúnicas entre vivos transmitidas com o
auxílio de personalidades espirituais.
38. A volta de "Oscar Wilde".
39. A propósito de "Patience Worth" e "The Sorry Tale".
40. A volta de "sir William Barrett".
41. Considerações sobre uma vidente inglesa.
42. Reminiscências de uma vida anterior.
43. A propósito dos fantasmas materializados e das revelações
transcendentais.
44. Respigando na autobiografia de uma dama inglesa.
45. Materializações de "Marie" a dançarina nas experiências
com Florence Cook.
46. Revelações transcendentais e objeção antropomórfica.
47. Um morto que se recorda de tudo.
48. Interessante caso de identificação espirítica.
49. Importante caso de identificação espirítica.
50. Outro importante caso de identificação espirítica.
51. Psicologia das convicções.
52. Por que a vida.
53. A propósito da obra Psicologia e Espiritismo do prof.
Enrico Morselli.
54. Experiências de "voz direta" em plena luz.
55. As crianças videntes e as aparições de defuntos.
56. Resposta a algumas objeções mal formuladas.
57. Fenômenos metapsíquicos curiosos e interessantes.
58. Acerca dos estados profundos da hipnose considerados
relativamente ao sentido de apego à vida.



59. Gemas, amuletos e talismãs relativamente às experiências
de William Stainton Moses.
60. A natureza dos fantasmas nos fenômenos de assombração.
61. A verdadeira história da "pequena Stasia".
62. A propósito da objeção segundo a qual os desencarnados
não revelam nunca verdades científicas.
63. Discussão cortês com um dos meus críticos.
64. Acabaram-se as lágrimas.
65. A propósito das visões supranormais de Swedenborg.
66. Cérebro e pensamento.
67. A propósito das convicções espíritas do dr. Gustave Geley.
68. Os sonhos e a loucura.
69. Hipóteses que não se podem "conceber" e hipóteses que
não se podem "pensar".
70. A propósito da criptestesia e das modalidades pelas quais
se manifesta.
71. A clarividência no futuro e o fatalismo.
72. A respeito do bem conhecido caso de clarividência precog-
nitiva da "cadeira vazia".
73. Perplexidades teóricas que não têm razão de existir.
74. Os animais e as manifestações metapsíquicas.
75. William Cartheuser, o novo médium de "voz direta".
76. A propósito da possibilidade de fraude com a "voz direta".
77. Investigações psíquicas de um homem de negócios.
78. Corpo etéreo e existência espiritual.
79. O Livro de Curas de um célebre hipnotizador.
80. No círculo experimental de um doutor em medicina.
81. A propósito das experiências do casal Taylor com a mé-
dium Kate Fox.
82. As primeiras experiências de "voz direta" na Itália.
83. Investigações psíquicas de um ministro da igreja anglicana.
84. Autobiografia de uma alma talhada pela dúvida.
85. Em defesa dos fenômenos mediúnicos de efeitos físicos.
86. Notáveis intuições filosóficas e científicas entre os selva-
gens africanos.



87. Em defesa da alma.
88. A questão das almas mortas.
89. A hipótese do Éter-Deus.
90. Ainda a propósito da hipótese do Éter-Deus.
91. Psicologia da razão humana.
92. Significado filosófico da dúvida.
93. Experiências mediúnicas e acontecimentos de morte nas
suas relações com os fenômenos de assombração.
94. Em torno do enigma metapsíquico das premonições insig-
nificantes e inúteis.
95. O sentimento de identificação de Deus nos grandes místi-
cos.
96. Telepatia e psicometria em relação com a mediunidade da
sra. Piper.
97. William Stainton Moses e a crítica científica.
98. Simbolismos e fenômenos metapsíquicos.
99. As faculdades supranormais.
100. Personalidades mediúnicas que se declaram personalidades
subconscientes.






FIM


1 Bozzano se refere ao artigo Le retour d'Oscar Wilde, incluído
na obra Cinco Excepcionais Casos de Identificação de Espíri-
tos (Publicações Lachâtre), sob o título "Surpreendente Caso
de Identificação Espírita". (N.E.)

2 A presente relação de livros e artigos de autoria de Ernesto
Bozzano foi por mim organizada – de acordo com as revistas
Luce e Ombra e Le Ricerca Psichica, da Itália, La Revue Spiri-
te e Revue Metapsychique, da França, e editoras destes dois
países europeus – à proporção que ia colhendo os títulos dos
trabalhos de Bozzano e não pelos anos deles, esclarecendo que
o primeiro publicado teve o título de O Espiritismo perante a
ciência e data de 1901.

Notas:







--

Muita paz !

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'TUDO QUE É BOM E ENGRADECE O HOMEM DEVE SER DIVULGADO!

PENSE NISSO! ASSIM CONSTRUIREMOS UM MUNDO MELHOR."

JOSÉ IDEAL

' A MAIOR CARIDADE QUE SE PODE FAZER É A DIVULGAÇÃO DA DOUTRINA ESPÍRITA" EMMANUEL

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