sexta-feira, 15 de novembro de 2019 By: Fred

{clube-do-e-livro} LANÇAMENTO: IRRESÍSTIVEL ATRAÇÃO - ANNE MATHER - FORMATOS : PDF, EPUB E TXT

- Desculpe se o ofendi, sr. Marchese. N��o sei por

que, mas parece que a gente n��o se entende direito.

Rafe quase suspirou de frustra����o. Ela falava de

um jeito t��o afetado... Deus! Era ele quem devia se

desculpar.

Mais tarde, Rafe diria a si mesmo que n��o preten-

dia toc��-la. Queria provoc��-la, certo. For����-la a se

comportar como qualquer outra mulher, sem aquela

m��scara de puritana. Mas ela ainda era a noiva de

Cary, pelo amor de Deus! Al��m do mais, ele jamais

seduzira uma mulher comprometida. Contudo, naque-

le momento, ele prendeu Juliet pelo pulso quando ela

tentou se esquivar. E ent��o, quando ela o encarou

indignada, Rafe a segurou pela nuca... e a beijou...

Querida leitora,

Eu sempre quis escrever, embora isso n��o queira

dizer que eu sempre tenha querido ser uma escritora

profissional. Por anos e anos eu escrevi para mim

mesma. Apenas quando meu marido sugeriu que eu

enviasse alguma de minhas hist��rias para uma edito-

ra foi que sorteei o nome de uma em um chap��u e

tentei... O resto, como dizem, �� hist��ria. Agora, mais

de 150 livros depois, fico realmente impressionada

com o que aconteceu.

Escrevi por toda a minha inf��ncia e adolesc��ncia

hist��rias que iam de aventuras infantis a t��rridas pai-

x��es ciganas. Minha m��e costumava juntar tudo de

tempos em tempos, quando meu quarto ficava bagun-

��ado demais, e jog��-las fora! O problema era que eu

nunca terminava as hist��rias, e Caroline, meu primei-ro livro, foi tamb��m o primeiro que eu de fato com-

pletei. Eu era rec��m-casada, minha filha era apenas

um beb��, e era um trabalho e tanto fazer malabarismos

entre as tarefas dom��sticas e escrever em cadernos

escolares sempre que tinha a chance. N��o muito pro-

fissional, mas era assim mesmo.

Hoje tenho um casal de filhos adultos e dois neti-

nhos ador��veis, Abigail e Ben. Meu e-mail �� mystic-

am@msn.com, e eu adoraria receber mensagens de minhas leitoras.





Anne Mather





Anne Mather


IRRESIST��VEL A T R A �� �� O

Tradu����o

Simone do Vale

HARLEQUIN

B

O

O

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PUBLICADO SOB ACORDO COM HARLEQUIN ENTERPRISES II B.V JS.��.r.I.

Todos os direitos reservados. Proibidos a reprodu����o, o armazenamento ou a transmiss��o, no todo ou em parte, por quaisquer meios.

Todos os personagens desta obra s��o fict��cios. Qualquer semelhan��a com pessoas vivas ou mortas �� mera coincid��ncia.

T��tulo original: BEDDED FOR THE ITALIAN'S PLEASURE

Copyright �� 2007 by Anne Mather

Originalmente publicado em 2008 por Mills & Boon Modem Romance Arte-final de Capa: Isabelle Paiva

Editora����o Eletr��nica:

INGRAFOTO

Tel.: (55 XX 21) 2224-0003

Impress��o:

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Aos cuidados de Virginia Rivera

virginia.rivera@harlequinbooks.com.br

CAP��TULO UM

J U L I E T imaginou o clima nas Ilhas Cayman nesta ��po-ca do ano. Quase igual em Barbados, deduziu. Ambos

ficavam no Caribe, n��o ��? S�� que ela nunca havia ido

��s Ilhas Cayman. Por��m, independentemente do cli-

ma, devia ser melhor do que essa ag��ncia de empregos

deprimente, onde o carpete gasto e as paredes de um

verde p��lido lembravam pouqu��ssimo o luxo com que

estava habituada. Para o qual nasceu, corrigiu, con-

tendo as l��grimas de autopiedade que se formaram

em seus olhos. Belos olhos cor de violeta, o pai costu-

mava dizer. Lembravam os olhos da m��e, falecida

quando Juliet era apenas um beb��. Agora, tudo isso

parecia muito distante.

Uma coisa era certa: o pai jamais permitiria que

fosse enganada por um sujeito como David Hammond.

Mas quando Juliet completou 19 anos, o pai tamb��m

morrera, v��tima de um tumor cerebral. E, um ano depois,

David surgiu como um cavaleiro de armadura brilhan-

te. Se ao menos tivesse percebido que o ��nico interesse

dele eram os fundos de investimento que o pai tinha

deixado... Que David fugiria com a secret��ria... Com a

sua est��pida coniv��ncia, David assumira o controle dos

investimentos. E, quando Juliet descobriu tudo, ele

transferiu o dinheiro para uma conta no exterior.





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A N N E M A T H E R

Ela havia sido ing��nua demais. Deixara que a

apar��ncia e o charme irreverente de David encobris-

sem qualquer falha de car��ter. Acreditou que ele a

amava. Havia ignorado os conselhos de todos os

amigos, que a avisaram de que David tinha sido visto

com outra. Agora, as m��seras libras que ele havia

deixado na conta conjunta se esgotavam depressa.

Claro, os amigos leais at�� ofereceram ajuda finan-

ceira, mas Juliet achou que a amizade n��o duraria

muito nestas circunst��ncias. N��o, ela precisava arran-

jar um emprego, embora n��o conseguisse sequer

imaginar que tipo de trabalho conseguiria sem qual-

quer experi��ncia. Se ao menos tivesse continuado a

estudar depois da morte do pai...

Tornou a olhar em volta da sala de espera, imagi-

nando quais seriam as qualifica����es que dos demais

candidatos. Al��m dela, havia mais cinco pessoas na

sala: dois homens e tr��s mulheres, todos indiferentes

ao ambiente. Olhando de fora, era poss��vel imaginar

que estavam desinteressados at�� mesmo do emprego.

E pelo menos dois deles pareciam meio sonolentos,

ou quem sabe, drogados.

O que poderia ser bom ou ruim, dependendo do

ponto de vista. Sem d��vida, ap��s entrevistar algu��m

vestindo um jeans surrado ou uma camiseta encardi-

da, ou aquela garota com os bra��os recobertos de

tatuagens horr��veis, Juliet pareceria um col��rio em seu

terninho azul-marinho listrado e os sapatos de salto

alto. Ou talvez n��o. Talvez os piores empregos acabem

ficando com as pessoas que aparentam n��o poder

viver sem trabalhar.

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- Sra. Hammond?

Na verdade, �� srta. Lawrence, Juliet quis corrigir,

mas o nome de casada ainda constava em todos os

seus documentos. Nem todo mundo volta a usar o

nome de solteiro quando se divorcia, como Juliet

preferia. N��o queria nenhuma lembran��a de que um

dia havia sido a sra. David Hammond.

Quando a mulher que havia chamado seu nome

espiou impaciente ao redor da sala, Juliet levantou-se

nervosa.

- Sou eu - afirmou, j�� pegando a bolsa e atraves-

sando a sala hesitante.

- Venha ao meu escrit��rio, sra. Hammond.

A mulher, uma ruiva na casa dos 40 anos, analisou

Juliet, observou-a da cabe��a aos p��s, e depois condu-

ziu-a at�� um escrit��rio um pouco menos sem gra��a

do que a sala de espera.

- Sente-se. - Juliet obedeceu. - J�� preencheu a

ficha?

- A h . . . sim. - Juliet apanhou a folha que havia

dobrado enquanto aguardava. Ao deposit��-la sobre a

mesa de uma funcion��ria chamada Maria Watkins,

Juliet deu um sorrisinho culpado quando entregou-lhe

o papel. - Desculpe.

As desculpas sequer foram ouvidas. A sra. Watkins

estava concentrada demais no que Juliet escrevera,

parando ��s vezes para encar��-la como se n��o acredi-

tasse no que estava lendo. O que era? Ser�� que o so-

fisticado terninho executivo a tinha enganado? Ou

apenas admirava a sua eleg��ncia? Sem saber por que,

Juliet achou que n��o.





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A N N E M A T H E R

- Aqui diz que voc�� tem 22 anos, sra. Hammond.

E nunca trabalhou?

Juliet corou.

- N �� o .

- Por qu��?

Foi uma pergunta direta, mas Juliet considerou-a

injusta. Afinal, ainda lhe restava algum orgulho.

- Isso �� relevante? Preciso de um emprego agora.

N��o basta?

- Receio que n��o, sra. Hammond. Por acaso, as

empresas exigem curr��culos, refer��ncias. �� importan-

te que eu entenda por que uma candidata n��o possui

nada disso.

- Eu era casada - argumentou, decidindo que essa

talvez fosse a explica����o mais simples.

- Sim, compreendo. - A sra. Watkins consultou a

folha outra vez. - O seu casamento terminou h�� qua-

se nove meses, n��o foi?

Nove meses e oito dias, pensou Juliet.

- Correto.

- E nada de emprego?

- N �� o .

Irritada, a sra. Watkins bufou. Que ela havia repro-

vado a sua inexperi��ncia era ��bvio. Juliet especulou

se n��o teria causado melhor impress��o de jeans e

camiseta velha.

- Bem - falou a sra. Watkins, afinal. - Devo avis��-

la, sra. Hammond, de que n��o ser�� f��cil arrumar-lhe

emprego. Voc�� n��o tem qualifica����o e nem hist��rico

profissional. Na verdade, nada para convencer um

empregador de que �� competente. E confi��vel.

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Juliet engoliu em seco.

- Eu sou confi��vel.

- Aposto que sim, sra. Hammond, mas, neste ramo,

n��o trabalhamos com declara����es de boca. Voc�� pre-

cisa de um patr��o disposto a declarar uma opini��o por

escrito.

- Mas n��o tenho um patr��o anterior.

A sra. Watkins deu um sorriso complacente.

- Eu sei.

- Ent��o, quer dizer que n��o vai me ajudar?

- Quero dizer que, no momento, n��o tenho uma

vaga que voc�� possa preencher. A menos que pretenda

lavar pratos no Hotel Savoy, claro. - Riu da pr��pria

piadinha e tornou a ficar s��ria. - Na sala de espera voc��

encontrar�� informa����es sobre os cursos que poderia

fazer na faculdade mais pr��xima, desde culin��ria at��

idiomas estrangeiros. Sugiro que leve alguns panfletos

para casa e decida o que pretende fazer. Depois, volte

e me procure quando sentir que tem algo a oferecer.

At�� l��, aconselho que n��o desperdice mais tempo.

N��o desperdice o meu tempo, Juliet corrigiu desa-

nimada, pondo-se de p��.

- B e m . . . obrigada - respondeu, seguindo as boas

maneiras que aprendera desde o ber��o com uma

equipe de bab��s. - Pensarei no que disse. - Fez uma

pausa. - Ou procurarei outra ag��ncia.

- Boa sorte! - A sra. Watkins falou com certa iro-

nia, e Juliet saiu do escrit��rio sentindo-se ainda mais

discriminada do que antes.

Mas o que esperava? Quem contrataria algu��m

sem capacidade sequer para reconhecer um estelio-

nat��rio quando visse um?





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A N N E M A T H E R

J�� na rua, Juliet olhou para os dois lados da Charing

Cross Road, considerando as op����es. O calor era

surpreendente para o in��cio de mar��o, apesar da chu-

va fina. Ergueu a m��o para chamar um t��xi e, ent��o,

baixou de novo. A ��poca em que podia passear de t��xi

j�� era.

Suspirando, p��s-se a caminhar rumo a Cambridge

Circus. L�� apanharia um ��nibus que a levaria a Kni-

ghtsbridge e ao min��sculo apartamento de um quar-

to onde morava atualmente. A casa grande em Sussex,

onde nasceu e viveu quase a vida inteira, fora vendida

logo ap��s o casamento com David. Ele disse que havia

encontrado uma casa em Bloomsbury muito mais

conveniente. Juliet s�� descobrira que a casa era apenas

alugada quando David a deixou. Sabia que os amigos

ficariam chocados com tamanha ingenuidade, mas,

droga, at�� ent��o ela nunca tinha conhecido ningu��m

t��o desumano quanto David. Por sorte, o apartamento

continuara no nome dela e David n��o p��de toc��-lo. Era

o ref��gio do pai quando ele tinha compromissos na

cidade, e Juliet o manteve por raz��es sentimentais.

No meio do caminho, passou na frente de um bar

e, por impulso, acabou entrando. Estava escuro e

enfuma��ado l�� dentro, mas Juliet sentiu-se bem. Ra-

ramente bebia durante o dia e, no seu atual estado de

esp��rito, torceu para que ningu��m a reconhecesse.

Acomodou-se em um dos bancos e esperou que o

barman a notasse. Baixinho e atarracado, com uma

barriga de cerveja espremida pelo cinto, ele conseguiu

ser profissional e simp��tico ao mesmo tempo. Muito

diferente da sra. Watkins.

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- Muito bem - disse ele, passando o pano molha-

do no balc��o. - O que gostaria de beber?

Juliet hesitou. Aquele n��o parecia o tipo de lugar

que tivesse uma garrafa do vinho da casa. Mas quem

sabe?

- A mo��a quer uma vodca com t��nica, Harry - dis-

se uma voz junto ao ombro dela, e Juliet virou-se,

pronta para dizer a quem quer que fosse que podia

escolher a pr��pria bebida sozinha, obrigada.

Surpresa, Juliet arregalou os olhos. Conhecia

aquele homem. O nome dele era Cary Daniels e eram

amigos de inf��ncia. Mas n��o o via h�� anos. Pelo me-

nos desde o casamento.

- Cary! - exclamou Juliet. - Nossa, que surpresa

v��-lo aqui. - A ��ltima not��cia que tinha recebido foi

de que ele morava na Cidade do Cabo. - Veio passar

as f��rias?

- Quem dera. - Cary sentou-se no banco ao lado

e entregou uma nota de vinte libras ao barman, que

acabara de trazer os drinques. Ele pediu um u��sque

duplo, que virou at�� a metade antes de continuar. -

Agora trabalho em Londres.

- �� mesmo?

Embora tivessem perdido o contato porque, quando

ficou ��rf��o, ele fora morar na Comualha com a av��

paterna, Cary compareceu ao casamento dela. Na ��poca,

estava animado com o excelente emprego que tinha

conseguido na filial sul-africana de um banco de inves-

timentos, e todos pensaram que ficaria l�� para sempre.

- Ent��o, como voc�� vai? - indagou Cary, guardan-

do o troco. Apesar da m�� ilumina����o ter impedido que





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reparasse antes, agora Juliet viu o quanto ele parecia

abatido. Estava com olheiras, a calva bem mais acen-

tuada, e o abdome saliente denunciava u��sques duplos

demais ao longo dos anos. Cary tinha 28, mas parecia

dez anos mais velho. O que aconteceu? Ser�� que ele

tamb��m sofria os efeitos colaterais de um relaciona-

mento fracassado?

- A h . . . eu vou bem - Juliet retrucou baixinho,

erguendo o copo num brinde silencioso e tomando

um gole. Aquilo era muito mais forte do que as coisas

que costumava beber, e mal conseguiu disfar��ar uma

careta. - Sobrevivendo, acho.

- Soube do div��rcio - disse Cary, nada sutil. - Que

cafajeste!

- Sim. - Era in��til negar. - Eu fui uma tola.

- Pena que eu n��o estava por perto. Ele n��o esca-

paria, garanto. O que o desgra��ado anda aprontando

agora?

Mostrar-se t��o solid��rio foi gentileza de Cary, mas

Juliet n��o conseguia v��-lo nocauteando David. Ele

simplesmente n��o fazia o tipo.

- Hum, David est�� nas Ilhas Caymans, acho. Mas,

importa-se de n��o tocarmos neste assunto? N��o vale a

pena remoer velhas m��goas. Eu fui uma tola, j�� disse.

- Voc�� foi inocente, s�� isso. Como todos somos ��s

vezes. �� f��cil ser s��bio depois do golpe.

- E n��o �� mesmo?

- Ent��o... o que tem feito? E onde est�� morando?

Dizem que precisou vender a casa de Sussex.

- Sim. Tenho um apartamento em Knightsbridge.

Pertencia a papai. N��o �� o Ritz, mas pelo menos ��

meu.

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- Desgra��ado! Suponho que voc�� precisou arrumar

emprego.

- Estou tentando. Mas n��o tenho nenhuma expe-

ri��ncia. Muito menos a quem recorrer para conseguir

uma refer��ncia pessoal. Exceto os amigos, claro, mas

n��o pediria isso a eles.

- Ah - Cary entornou o resto do drinque e indicou

ao barman que desejava outro. - Ent��o... voc�� tem

algum plano?

- Ainda n��o. E voc��? Ainda trabalha para o banco?

- Seria muita sorte! - Cary apanhou a segunda dose

de u��sque e tomou um gole generoso. - Fui banido da

comunidade banc��ria. Voc�� n��o sabia? Saiu em todas

as p��ginas de economia.

Juliet ficou tentada a dizer que tinha coisas melho-

res a fazer do que ler as p��ginas de economia, mas

comoveu-se com o que ele disse.

- O que aconteceu?

- Arrisquei os investimentos dos clientes e perdi

uma fortuna. O banco perdeu milh��es de d��lares e

tive sorte de escapar sem ser processado. - Deu de

ombros. - Pelo jeito, a vov�� ainda tem alguma influ-

��ncia. Fui apenas chutado para fora do banco depois

de ouvir um serm��o.

Juliet ficou pasma.

- Milh��es de d��lares! - repetiu, incr��dula.

- ��. Eu n��o fa��o nada pela metade. Vou lhe contar,

soa um bocado mais s��rio na moeda sul-africana. Mas,

droga, eles nos encorajam a arriscar e eu arrisquei.

- N��o sei o que dizer. A sua... Lady Elinor ficou

muito zangada?





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A N N E M A T H E R

- Zangada? - Cary gargalhou. - Ela ficou l��vida,

Juliet. Soltando fogo pelas ventas.

Juliet contemplou o l��quido no copo. Lembrava-se

bem de Lady Elinor Daniels. Principalmente porque,

quando Juliet tinha 13 anos, ela era uma figura meio

assustadora. Tamb��m lembrou-se de que sentia pena

de Cary, que perdera os pais num naufr��gio no Oce-

ano Ant��rtico. Aos 17, ele fora afastado de tudo e de

todos com quem estava acostumado, for��ado a viver

em uma casa velha na Cornualha, com uma mulher

que mal conhecia.

- Mas voc�� n��o disse que tinha arrumado outro

emprego?

- Tempor��rio, l��gico. Acredite se quiser, estou

trabalhando em um cassino. Ah, mas n��o lido com

dinheiro. Eles n��o s��o nada bobos. Sou o que se cha-

ma de cicerone. Um tipo de... le��o-de-ch��cara com

classe.

Juliet engasgou.

- N��o posso acreditar que a sua av�� aprove.

- Ela nem imagina. Apenas acredita que consegui

emprego em um escrit��rio. Ela ainda n��o perdeu a

esperan��a de me ver administrando o nosso patrim��-

nio, estabelecido e com uma boa esposa. E Marchese,

aquele verme, est�� s�� esperando que eu d�� um passo

em falso.

Juliet achava que ele j�� havia dado mais do que

um passo em falso, mas n��o disse nada.

- Marchese?

- Rafe Marchese! N��o se lembra? O maior erro da

minha tia Christina?

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- Ah, o seu primo.

- O bastardo - corrigiu Cary. - Em todos os sen-

tidos. Certamente voc�� n��o espera que eu demonstre

qualquer simpatia por ele. Marchese tornou a minha

rela����o com vov�� quase imposs��vel ao longo dos anos.

N��o esque��o como ele me tratou logo que fui morar

em Tregellin.

- Ele �� mais velho do que voc��, n��o ��?

- Uns dois anos. Deve estar com 30 agora. Ele

passa o tempo todo l��, como uma pedra no meu sa-

pato, e vov�� adora amea��ar que deixar�� para ele toda

a heran��a.

- Para amea��ar voc��?

- ��. N��o que ela pretenda fazer isso, ��bvio. - Cary

riu. - Ela �� conservadora demais.

Juliet hesitou.

- Se a sua tia nunca se casou com o pai dele, por

que o sobrenome Marchese?

- Porque ela colocou o sobrenome do pai na cer-

tid��o de nascimento. Um pouco ir��nico, consideran-

do que talvez Carlo sequer soubesse que seria pai.

Christina era meio vol��vel, sempre �� procura de uma

aventura atr��s da outra.

- Eu achava que ela era uma artista - comentou

Juliet, recordando o que o pai havia lhe contado.

- Ela gostava de pensar que sim. Rafe ficou ��rf��o

muito cedo, igual a mim. Christina tomou alguns

mart��nis a mais e despencou da sacada do hotel em

Interlagos, onde estava hospedada com a sua mais

recente conquista.

- Que horror! - Juliet ficou chocada com a frieza





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A N N E M A T H E R

de Cary. Christina era tia dele, afinal. Tomou outro

gole do drinque e espiou o rel��gio discretamente. Era

hora de ir embora.

- Por falar nisso, preciso passar l�� na semana que

vem - continuou Cary, aparentemente alheio �� impa-

ci��ncia de Juliet. Ele fez uma careta. - Contei que

arrumei uma namorada e vov�� quer conhec��-la.

- Ah. Bem, espero que goste dela. �� algu��m que

conheceu na Cidade do Cabo ou �� daqui de Lon-

dres?

- Eu n��o tenho namorada - confessou Cary, im-

pass��vel. - S�� disse isso para que a vov�� me deixasse

em paz. Lembra quando eu falei que ela quer que eu

me estabele��a e tudo o mais? Pensei que me daria um

refresco se acreditasse que estou comprometido.

- Oh, Cary!

- Eu sei, eu sei. Onde posso arrumar uma namo-

rada decente at�� a pr��xima quinta-feira? Sequer co-

nhe��o qualquer garota "decente". Meu gosto segue

na dire����o oposta.

Juliet encarou-o.

- Voc�� ��... gay?

- C��us, n��o! Mas n��o se apresenta qualquer tipo

de garota para uma av��. N��o estou interessado em me

estabelecer, Jules. Quero me divertir um pouco. N��o

quero uma esposa e um casal de pirralhos pegando no

meu p��.

Juliet balan��ou a cabe��a. Cary estava t��o mudado,

n��o era mais o menino t��mido que conhecera. Seria

culpa da av�� ou ele sempre tivera essa tend��ncia

ego��sta?

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De repente, Juliet percebeu que Cary a fitava com

uma express��o insinuante. Podia estar desesperada,

mas Cary n��o era o seu tipo. Desceu do banco e apon-

tou para a porta.

- Preciso ir.

- Para onde?

E isso era da conta dele?

- Para casa, l��gico.

- N��o prefere jantar comigo?

- Ah, Cary...

- Foi s�� uma id��ia. Queria lhe fazer uma proposta.

- Cary...

- Escute. - Cary pousou uma das m��os no bra��o

dela e, embora quisesse desesperadamente se esquivar,

Juliet aceitou que lhe pagasse um drinque, o que a

deixou em d��vida. - Que tal ir para Tregellin comigo?

Como minha namorada de mentira. Voc�� precisa de

emprego. Ora, estou lhe oferecendo um. Bem remu-

nerado, claro.

- Voc�� n��o falou s��rio!

- Por que n��o? Somos amigos, n��o somos? Homem

e mulher. Qual �� o problema?

- N��s enganar��amos a sua av��. E... o seu primo.

- N��o se preocupe com. Rafe. Ele n��o mora na

casa.

- D �� n o mesmo...

- Voc�� me faria um grande favor, Jules. E vov��

acreditaria quando visse que �� voc��. Sabe que ela

sempre gostou de voc��.

- Ela mal me conhece!





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A N N E M A T H E R

- Ela sabe quem voc�� ��. E quando voltarmos, es-

creverei uma carta de refer��ncia que voc�� usar�� para

conseguir outro emprego.

- Um emprego de verdade, quer dizer?

- Este �� um emprego de verdade, Jules, prometo.

Ao menos diga que pensar�� a respeito. O que voc��

tem a perder?

CAP��TULO DOIS

ERA MAR�� alta, e os bancos de lama se escondiam sob

o rio que banhava Tregellin. As gaivotas mergulhavam

nas ondas e a dan��a do sol na ��gua era fascinante.

Antigamente, a velha casa irradiava uma aura de

beleza, n��o de abandono como hoje.

Ela carecia de um propriet��rio cuidadoso, pensou

Rafe, conduzindo o Toyota Land Cruiser pela descida

tortuosa da alameda que levava �� casa. Que n��o seria

ele, repreendeu-se. A av�� jamais deixaria Tregellin

para o filho ileg��timo de um plantador de azeitonas.

N��o que ele o desejasse, refletiu sem m��goa. Ago-

ra que o ateli�� ia de vento em popa, n��o sobrava

muito tempo para cumprir as tarefas de costume. Ah,

ele recebia os alugu��is e cuidava das contas, conferia

se a av�� havia pago os impostos. At�� aparava o gra-

mado. Mas a casa em si precisava de uma reforma

completa.

O problema �� que ele n��o tinha a quantia necess��-

ria para restaurar o esplendor original do lugar. E se

Lady Elinor era t��o rica quanto o povo do vilarejo

comentava, com certeza escondia isso da fam��lia.

J�� Cary achava que a av�� era uma mulher rica. Por

isso, raramente recusava um convite e a bajulava como

se cada capricho fosse uma ordem. Era pat��tico. Caso





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A N N E M A T H E R

Rafe sentisse mais respeito pelo primo, contaria-lhe

que a av�� apenas o usava para satisfazer sua gana de

poder. Como Cary seria o seu herdeiro, cuidava para

que ele fizesse por merecer.

Entretanto, a menos que Lady Elinor tivesse algum

dinheiro escondido, quando ela falecesse a proprie-

dade precisaria ser vendida. Provavelmente, a inten-

����o de Cary era essa. Rafe n��o conseguia imaginar o

primo abrindo m��o da vida em Londres para se mudar.

Todavia, depois das despesas com o funeral e o in-

vent��rio, Rafe suspeitava que s�� quitaria as d��vidas

da av�� por milagre.

Rafe acreditava que Lady Elinor vivia de cr��dito

h�� algum tempo. As minas de estanho, que outrora

fizeram a fortuna dos Daniels, permaneceram inativas

nos ��ltimos cinq��enta anos. Recentemente, as fazen-

das leiteiras e planta����es da propriedade enfrentaram

dificuldades. As coisas melhoraram, por��m, eles pre-

cisavam de tempo.

Um tempo que n��o teriam, reconheceu. Era triste,

mas a velha n��o era mais t��o forte. Odiava pensar no

que aconteceria quando ela morresse. Tregellin me-

recia ser reformada. E n��o vendida para pagar as d��-

vidas de outro viciado em jogatina.

Contornou a quadra de t��nis e seguiu at�� a entrada.

Tregellin House ficava de frente para o mar, numa po-

si����o privilegiada. Quando menino, adorava ir at�� a casa

de barcos e passear no velho coracle, a t��pica canoa de pesca bret�� que Sir Henry ensinou-o a manobrar.

Abriu a porta e saiu, carregando a sacola com as

compras que havia feito no supermercado da regi��o.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





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Lady Elinor n��o aprovaria que gastasse dinheiro com

ela, mas Josie sim. Josie Morgan, governanta e com-

panheira da av��, era quase t��o idosa quanto a pr��pria

patroa.

Apesar de estacionar o Land Cruiser na frente da

casa, Rafe dirigiu-se �� porta da cozinha. Como sem-

pre, Hitchins, o pequin��s de Lady Elinor, latiu feito

louco, mas quando Rafe entrou, o c��ozinho calou-se

e aninhou o focinho na barra da cal��a dele.

- Voc�� �� uma peste escandalosa, sabia? - ralhou

Rafe, curvando-se para afagar as orelhas de Hitchins.

O cachorro j�� tinha quase 14 anos e era cego de um

olho, mas ainda reconhecia os amigos. Hitchins cho-

ramingou, pedindo colo, mas Rafe largou a sacola na

mesa de pinho e come��ou a arrumar tudo.

Josie irrompeu porta adentro, trazendo uma ban-

deja com um bule de caf�� vazio, duas x��caras e um

prato que ainda continha tr��s biscoitos de chocolate.

Rafe apanhou um biscoito e mordeu, enquanto Josie

o abra��ou, demonstrando gratid��o pelas compras.

- Fil�� mignon! Sinceramente, Rafe, voc�� nos acos-

tuma mal.

- Se eu n��o fizer isso, quem vai fazer? Como est��

a velha esta manh��? Eu queria ter vindo ontem ��

noite, mas acabei preso com outra coisa.

- Essa outra coisa n��o se chama Olivia, n��o ��? -

brincou Josie, guardando os bifes e outros perec��veis

na geladeira antiga.

- Voc�� anda escutando fofocas demais. Onde est��

a vov��, afinal? �� melhor que eu v�� dizer ol��.

- Quer que eu traga outro bule de caf��?





2 2


A N N E M A T H E R

- Vou tomar um desses - explicou Rafe, apanhan-

do uma lata de refrigerante. - N��o. Copo n��o - pro-

testou, quando Josie abriu o arm��rio. - No jardim de

inverno, certo?

- Ah... sim. - Josie fez uma cara tristonha. - Ela

escutou o barulho do carro, n��o duvido nem por um

minuto. Lady Elinor pode estar velha, mas ouve me-

lhor do que nunca.

Rafe sorriu e, com Hitchins nos calcanhares, atra-

vessou o corredor revestido de mogno, e chegou ao

jardim de inverno repleto de sol. Fora constru��do num

lado estrat��gico da casa, para aproveitar a vista do rio.

A ��gua refletia os ramos dos salgueiros-chor��es, en-

quanto os martins-pescadores mergulhavam perto da

margem, velozes e certeiros.

Lady Elinor estava sentada numa cadeira de vime.

Ao lado, o jornal sobre a mesa, aberto no jogo de

palavras cruzadas quase completo. A velha senhora

gabava-se de terminar as palavras cruzadas antes das

11 h, todas as manh��s. Espiando o rel��gio, Rafe viu

que ainda lhe restavam 15 minutos.

- N��o se prenda por minha causa! - exclamou,

rabugenta, notando a sua desaten����o, e Rafe fez uma

careta antes de beij��-la na bochecha enrugada.

- N��o mesmo. Eu s�� quis saber a hora, mais nada.

Pelo jeito, hoje voc�� corre o risco de perder a parada.

- Se est�� falando das palavras cruzadas, a pateta

da Josie tagarelou tanto que me atrapalhou. Ela traz

o caf�� e acha que precisa me distrair. J�� falei dezenas

de vezes que n��o preciso da companhia dela.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





2 3


- N a verdade, voc�� adora. Ent��o... o que voc��s

duas conversaram? Ou prefere que eu nem abra a

boca?

- Desde quando isso fez diferen��a? Contei a ela

que, na quinta-feira, o Cary vai trazer a noiva para me

conhecer. Tomara que fiquem alguns dias.

- A noiva, heim? - Rafe p��s as m��os nos bolsos

da jaqueta de couro. Uma mecha de cabelos negros

caiu nos olhos. - Voc�� deve estar contente. Ele sos-

segou, afinal.

- Se for verdade. - Lady Elinor apertou o cabo da

bengala e Rafe deduziu que Cary n��o a enganaria com

facilidade. A mente continuava ��gil como sempre,

apesar das rugas que marcavam as fei����es aristocr��ti-

cas. - Eu at�� j�� conhe��o a mo��a. Na ��poca em que

Charles e Isabel ainda eram vivos, ela e a fam��lia mo-

ravam na mesma rua. O nome dela �� Juliet Lawrence,

bem, era Lawrence, mas como Juliet �� divorciada, quem

sabe que sobrenome usa agora? Juliet �� mais nova do

que o Cary. O pai trabalhava na cidade. A m��e morreu

quando ela era apenas um beb��, e creio que o pai fale-

ceu h�� cinco ou seis anos.

- A ficha completa. - debochou Rafe.

- Preciso saber essas coisas, Raphael - retrucou,

irritada. - N��o quero que Cary se case com uma

aventureira qualquer. Pelo menos a garota �� de uma

fam��lia decente.

- N��o acha que receber Cary e a namorada ser�� can-

sativo demais? - palpitou, para a indigna����o da av��.

- Estou gripada, Raphael. N��o com pneumonia. ��

essa ��poca do ano. Sempre pego um resfriado na

primavera.





2 4


A N N E M A T H E R

- Voc�� �� quem sabe. Certo. J�� que est�� tudo bem,

vou ver se Josie precisa de ajuda. Se pretende acomo-

d��-los no quarto lil��s, �� melhor que eu veja se tem

vazamento no banheiro.

Lady Elinor mostrou-se absolutamente ofendida.

- N��o vou acomod��-los em lugar nenhum. Cary fi-

car�� no pr��prio quarto, como sempre, e a srta. Lawrence

pode usar a su��te de Christina.

- Nunca ouvi voc�� chamar aquilo de su��te.

- N��o? - A av�� fingiu inoc��ncia.

- N��o que me lembre. - Rafe balan��ou a cabe��a e

dirigiu-se para a porta. - Precisa de mais alguma

coisa?

- Josie contou que voc�� ofereceu uma recep����o no

ateli�� ontem �� noite - sondou ela, meio relutante. - Por

que n��o fui informada?

Rafe suspirou.

- N��o pensei que se interessaria.

- E por que pensou isso?

- Por qu��? Deixe-me ver - brincou. - Porque voc��

n��o aprova que eu ganhe a vida pintando retratos?

Porque voc�� n��o quer que eu acabe feito a minha m��e?

Porque a minha independ��ncia �� dif��cil de engolir?

Est�� ficando quente?

- N��o aprovo certas pessoas com quem voc�� se

mistura - resmungou Lady Elinor. - Mas nunca im-

pedi a sua m��e de fazer o que bem entendesse, e n��o

tentarei impedir voc��. Lembre-se, foi ela quem deci-

diu viver em todos aqueles lugares ex��ticos, carre-

gando por a�� um garotinho que eu nem sabia que

existia. Quando ela morreu, por��m, n��o hesitei em

oferecer-lhe um lar.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





25


Rafe encolheu os ombros.

- Eu sei.

- S�� porque nem sempre pensamos da mesma

maneira...

- Olha, eu lamento, certo?

- n��o significa que n��o me importe com voc��,

Raphael.

- Eu sei. Devia ter contado sobre a recep����o. Voc��

tem raz��o, fui indelicado. O jornal de bairros tirou

algumas fotos, portanto, mostrarei as c��pias quando

apanh��-las. N��o foi nada demais. S�� uma recep����o

para divulgar o ateli��.

- Aposto que foi muito divertido - comentou Lady

Elinor, mas Rafe percebeu o desagrado na voz dela.

- Logo, logo, voc�� n��o ter�� mais tempo para ficar em

Tregellin.

- Sempre tive tempo para voc��, madame. Olha,

realmente preciso ir andando. Vou me encontrar com

a Liv Holderness.

- Olivia Holderness? Por acaso n��o �� a filha de

Lorde Holderness?

- Lorde Holderness n��o tem filha nenhuma, como

voc�� sabe muito bem. Liv �� a esposa dele, e quer

encomendar um retrato do marido para dar de presen-

te no sexag��simo anivers��rio dele.

- Entendo. Voc��s parecem muito ��ntimos. Pelo que

me lembro, Holderness n��o est�� casado com ela h��

muito tempo.

- Por 18 meses, acho. �� a terceira mulher dele. O

sujeito costuma troc��-las em intervalos regulares por

um novo modelo.





2 6


A N N E M A T H E R

- N��o seja vulgar. E cuidado com o que anda

aprontando, Raphael. Parece-me estranho que Olivia

prefira um ateli�� da regi��o ��s galerias famosas que

ela e o marido devem conhecer em Londres.

- Chega de falar bobagem. N��o se preocupe, co-

nhe��o Liv h�� anos. O pai dela �� dono do Dragon

Hotel, em Polgellin Bay.

- Ah. Ent��o, ela �� da fam��lia Melrose?

- A filha ca��ula - confirmou Rafe, desanimado

porque a av�� falou como se eles fossem da fam��lia

Addams.

- Ela n��o �� muito mais nova do que Holderaess?

- Quase trinta anos, creio. Mas os dois parecem

muito felizes.

- Bem, n��o se esque��a de que eu avisei - declarou

Lady Elinor, levantando-se de repente.

Mesmo curvada para apoiar-se na bengala, ela

continuava alta, embora n��o tanto quanto ele. Vestia

a saia plissada que era a sua marca registrada, com

uma blusa de seda sob o xale cinzento, enquanto

mechas grisalhas cobriam os cabelos negros de anti-

gamente. Pousou uma das m��os no bra��o dele e fitou-

o com olhos t��o azulados quanto as violetas do

vale.

- Tome cuidado - acrescentou ela, com um beijo.

- Eu posso n��o demonstrar, mas gosto muito de voc��,

Raphael.

A C U L P A foi da conta de luz.

Quando Juliet voltou ao apartamento, ela j�� estava

�� sua espera. Arregalou os olhos incr��dulos ao ver o

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2 7


quanto devia. N��o podia acreditar que gastara tanta

energia assim. Pelo amor de Deus, ela quase n��o

usava o forno el��trico e apagava todas as l��mpadas

religiosamente antes de sair.

Mas havia usado o microondas, lembrou-se. E o

sistema de aquecimento do t��rreo consumia eletrici-

dade demais. Um dos vizinhos at�� a avisara. Por��m,

ver a cifra bem ali, preto no branco, foi assustador.

Por isso, quando Cary telefonou dois dias depois,

Juliet cedeu �� sua insist��ncia. Foi imposs��vel recusar

a quantia que ele ofereceu por quatro dias de trabalho.

Juliet pagaria as contas do m��s e ainda sobraria um

pouquinho. Talvez o bastante para sobreviver at��

arranjar um emprego decente.

Mesmo assim, na tarde de quinta-feira, quando

Cary dobrou a rodovia A30, logo depois de Bodmin,

Juliet sentiu um frio na barriga ao pensar que come-

tera um grande erro. Ela gostava de Cary, l��gico. Ou

talvez gostasse do garoto que conheceu h�� muitos

anos. Hoje em dia, sabia pouqu��ssimo sobre ele. A

presen��a de Cary no seu casamento mal serviu para

resgatarem a amizade. E a id��ia de ser apresentada ��

Lady Elinor Daniels como a noiva de Cary deixou-lhe

um gosto amargo na boca. Quando ele mencionou a

id��ia pela primeira vez, disse que precisava de uma

namorada. Agora a namorada tinha virado noiva, o

que era bem diferente.

- Estamos quase chegando - disse Cary. - Ainda

podemos parar para almo��ar, se quiser.

Sem querer passar mais tempo sozinha com Cary

al��m do necess��rio, Juliet for��ou um sorriso.





2 8


A N N E M A T H E R

- �� melhor n��o chegarmos atrasados. Al��m do mais,

a sua av�� n��o est�� nos esperando para o almo��o?

Cary franziu os l��bios e Juliet teve o pressentimen-

to de que ele n��o ansiava menos pela visita do que

ela. O que era compreens��vel, j�� que a av�� vivia se

metendo na vida dele. Mas cabia admitir que, sem a

interven����o de Lady Elinor, Cary estaria mofando

numa pris��o sul-africana.

- Creio que agora �� meio tarde - reconheceu. -

Voc�� j�� viu um mar dessa cor antes? Na Inglaterra,

quer dizer. Parece quase tropical. Lembra-me o feria-

do que passei nas Ilhas Maur��cio. Nossa, fiquei num

hotel sensacional. A su��te ocupava o andar inteiro.

- Que chique - murmurou, sarc��stica.

- Sim, eu queria ter toda aquela grana agora - con-

cordou, sem um pingo de remorso. - �� por isso que

preciso tratar a velha com tanta aten����o. Sem o di-

nheiro dela, s�� me restaria passar umas f��rias mixu-

rucas na Espanha todo ano.

- Ela sabe que voc�� gasta o dinheiro que lhe d�� em

f��rias extravagantes?

- Ei, essa informa����o �� confidencial. N��o comen-

te as minhas despesas com ela. Se vov�� resolve me

financiar ��s vezes, n��o sou eu quem vai recusar, cer-

to? A velha �� riqu��ssima! Pelo aspecto da casa, pare-

ce que n��o. Mas acredite, sei que ela tem uma fortuna

escondida em algum lugar.

Juliet sentia-se cada vez menos empolgada em

participar daquela farsa. Se Cary tivesse sido total-

mente honesto desde o in��cio, ela jamais aceitaria vir.

Ou ela �� quem n��o estava sendo totalmente honesta

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





2 9


consigo mesma? Droga, ela tamb��m tinha se envol-

vido nisso por dinheiro.

- Me fale do seu primo - Juliet sugeriu, tentando

distrair-se. - Ele �� parecido com voc��?

- Nem um pouco. Ele parece um cigano, se quer

saber. Pele encardida, cabelos pretos sebosos e uma

frieza de pedra.

- Voc�� n��o gosta mesmo dele, n��o ��?

- J�� disse como ele ��. Vive bajulando a velha. Sem

d��vida, ela vai cobri-lo de elogios enquanto voc��

estiver l��. Faz isso s�� para me irritar.

- Ah, Cary...

- �� s��rio. Tenho mais o que fazer do que tapar

vazamentos. Sou um banqueiro, Jules, n��o um enca-

nador. Ou melhor, era, at�� o mercado de futuros ficar

saturado.

- Provavelmente, ele s�� quer ajudar a sua av��.

- Claro. Bem, ele n��o devia pensar que fazer todas

essas coisas lhe dar�� algum direito �� heran��a quando

a velha empacotar. Assim que lerem o testamento,

direi a Marchese que n��o quero mais que ponha os

p��s por l��. Tregellin �� minha. Sou o ��nico herdeiro

leg��timo e ele sabe disso, o que n��o o impede de ro-

dear o lugar, bancando o bom samaritano.

- Voc�� �� t��o rancoroso!

- N��o. Apenas pr��tico. Bem, estamos quase che-

gando. Aquela �� a chamin�� da casa. Ela fica no pe-

nhasco, de frente para a foz do Rio Eden. Um belo

lugar, mas n��o �� nenhum Jardim do Eden.

Chegaram na casa ap��s seguirem uma trilha sinuo-

sa, margeada por cercas vivas de rododendros e ac��-





30


A N N E M A T H E R

cias. Juliet imaginou que, entre o fim da primavera e

o come��o do ver��o, aquelas mesmas cercas deviam

oferecer um espet��culo colorido. Por ora, as folhas

reluzentes escondiam os bot��es. E por causa das nu-

vens carregadas, tudo parecia meio triste.

O terreno era bem amplo. Uma quadra de t��nis e

um campo de croqu��, uma horta atr��s de um muro de

pedras coberto de limo.

Havia um grande utilit��rio da Toyota estacionado

no p��tio, e quando Juliet saiu do carro, escutou Cary

soltar um resmungo de irrita����o. Virando-se para ver

o que o aborreceu, avistou um homem que acabara de

sair de um canto da casa. Era um sujeito grandalh��o,

alto e forte, vestindo jaqueta de couro e um jeans que

se amoldava ��s coxas musculosas. Um par de botinas

completava o traje, e Juliet n��o precisou de um sexto

sentido para adivinhar que aquele homem era o fami-

gerado Rafe Marchese.

Rafe olhou na dire����o dela e Juliet sentiu um frio-

zinho suspeito na barriga. Mas, puxa, como ele era

charmoso, pensou, vendo que a descri����o despeitada

de Cary n��o tinha sido honesta.

Sim, os cabelos eram negros, e careciam de um

corte, mas n��o eram sebosos. A pele era bronzeada e

a barba estava por fazer. Mas tamb��m n��o o chamaria

de encardido. N��o era bonito. As fei����es eram viris

demais. E ela apostaria at�� o ��ltimo centavo que as

suas habilidades t��cnicas n��o eram o ��nico motivo

por que Lady Elinor gostava de t��-lo por perto.

- Cary - disse Rafe, quando o primo saiu do carro.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

31

- Rafe. - A voz soou tensa e Cary foi recolher a

bagagem no porta-malas, sem dar-se ao trabalho de

apresentar Juliet.

E isto realmente a incomodou. Mais do que deve-

ria, talvez, admitiu. Mas, droga, todos pensavam que

ela era noiva dele. Ignorando Cary, contornou o carro

e estendeu a m��o.

. - Oi - falou sorridente. - Sou Juliet. A... namora-

da de Cary.

CAP��TULO TR��S

O ALMO��O estava frio, mas n��o podiam culpar a go-

vernanta. Os dois marcaram de chegar ��s 13h, e j��

eram 13h45. Por melhor que fosse a cozinheira, nin-

gu��m consegue manter um risoto de champignon

aquecido por tanto tempo.

N��o que Juliet sentisse muita fome, pois o con-

fronto entre Cary e Rafe Marchese tirou-lhe o apetite.

Obviamente, os dois n��o se gostavam, e Cary agiu

feito um grosseir��o.

Talvez parte da culpa fosse sua. Ela marcara Cary

por se apresentar ao primo dele. Mas, puxa, ela havia

ficado t��o zangada quando Cary a ignorou, que n��o

mediu as conseq����ncias da pr��pria atitude.

Embora desagrad��vel, a verdade �� que ela quis ser

notada por Rafe Marchese. Juliet estranhou sua rea-

����o, pois desde que David fugira, h�� mais de um ano,

ela n��o teve nenhum interesse por outro homem. Mas

n��o podia se gabar de que Marchese sentiu o mesmo.

Ele foi gentil, por��m, distante.

- Ah, sim - disse Rafe -, a noiva de Cary. Lady

Elinor j�� estava achando que voc�� tinha mudado de

id��ia.

Mesmo assim, quando Rafe tocou-lhe a m��o, Juliet

reagiu como se houvesse levado um choque. A m��o

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33

dele irradiou um calor que lhe aqueceu toda por den-

tro. Ent��o, fitou-o nos olhos negros e melanc��licos.

E Juliet descobriu-se enfeiti��ada.

Claro, Juliet puxou a m��o de um jeito meio brusco,

e Cary aproximou-se a toda carga, como um touro

furioso defendendo a f��mea.

- O que foi? - desafiou, segurando Juliet pelo

ombro de maneira possessiva. - O que voc�� disse para

a minha noiva? Pensei que teria a dec��ncia de n��o

aparecer, j�� que sabia que vir��amos.

Rafe Marchese n��o se mostrou nada perturbado

pelos berros de Cary.

- �� bom v��-lo tamb��m, Cary.

- Ora... - Cary continuou indignado. - A vov��

falou que, ultimamente, voc�� anda ocupado demais

para dar-lhe aten����o. Como ela diz, passando tempo

com os seus amigos metidos a artistas. Mas �� l��gico

que voc�� apareceria quando eu chegasse.

Rafe conteve o riso.

- Eu n��o levaria as coisas que a vov�� fala t��o a

s��rio - comentou, os olhos fixos no semblante enver-

gonhado de Juliet. - Voc�� sabe que ela gosta de jogar

um contra o outro. Se voc�� n��o fosse t��o ing��nuo, ela

jamais conseguiria.

- Ah, e voc�� a conhece t��o bem.

- Eu diria que a vejo mais. Se isso significa que a

conhe��o melhor, fica a seu crit��rio.

- Bem, n��o pense que n��o sei onde pretende che-

gar. Voc�� acha que leva vantagem, s�� porque moro

em Londres e voc�� mora aqui. - Apertou o ombro de





3 4


A N N E M A T H E R

Juliet. - Assim que nos casarmos, voc�� pode dar adeus

a qualquer chance de convenc��-la a mudar de id��ia.

Minha nossa, eu queria morrer, pensou Juliet,

desfazendo a mala. Pelo amor de Deus, j�� era horr��vel

fingir ser noiva de Cary. Ela n��o fazia id��ia do que

Rafe Marchese achou. Se aquele sorriso ir��nico ser-

visse de pista, ele estava acostumado com os faniqui-

tos de Cary e n��o se ofendia. Mas, mesmo assim,

Juliet preferia n��o ter assistido ��quela cena.

Por sorte, a chegada de um c��ozinho encerrou a

discuss��o. Era um pequin��s de latido estridente, que

avan��ou contra Cary e cravou os dentes na perna da

sua cal��a.

- Maldito vira-lata idiota! - Cary gritou, furioso,

enxotando o cachorro.

- Na verdade, ele �� muito inteligente - retrucou

Rafe, curvando-se para afagar o animal.

Juliet sentiu certa inveja do cachorro, e pensou que

estava sendo rid��cula. Cary tirou as malas do carro e

entrou na casa, e ela foi obrigada a segui-lo. Agora

ela entendeu por que ele n��o tinha batido no c��o. Era

o cachorro de Lady Elinor e Juliet imaginou que ela

n��o gostaria de ver o neto chutando seu pequin��s.

Tomara que Rafe Marchese n��o contasse nada. Mas

depois do jeito como Cary havia se comportado, ela

n��o o culparia caso o fizesse.

Foi um pouco estranho reencontrar Lady Elinor.

Ela era muito mais idosa do que Juliet recordava,

l��gico, mas continuava uma figura intimidante. No

m��nimo, Juliet diria que Rafe era muito mais pareci-

do com ela do que Cary. Ele tamb��m era alto e tinha

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35


o mesmo ar de nobreza. Durante o almo��o, Juliet

precisou se esquivar de um bom n��mero de perguntas

sobre o casamento fracassado. O fato de que o div��r-

cio sa��ra h�� apenas nove meses bastou para Lady

Elinor opinar que, no lugar dela, n��o teria a menor

pressa para se casar outra vez.

L��gico, Cary intercedeu, garantindo que o casa-

mento de Juliet n��o tinha dado certo porque, em

primeiro lugar, ela escolheu o homem errado.

- Hammond s�� queria o dinheiro dela - explicou,

desdenhoso, e Juliet alegrou-se por Rafe Marchese

n��o estar presente para ver a express��o quase sar-

c��stica de Lady Elinor. Mas, pelo menos, isso lhe

deu a chance de respirar. E t��o logo acabaram de

comer, a anfitri�� ordenou que Josie a levasse at�� o

quarto. Evidentemente, a senhora pretendia passar

algum tempo a s��s com o neto, e Juliet torceu para

que ele n��o prometesse mais nada que n��o pudesse

cumprir.

Ap��s desfazer as malas, Juliet observou o aposen-

to. Nem os c��modos da casa do pai eram p��reos para

este. Mas o lugar inteiro ca��a aos peda��os, desde o

teto, que carecia de reparos, at�� o papel de parede que

despencava.

N��o era de se admirar, j�� que Josie era a ��nica

ajudante de Lady Elinor. Ela era quase t��o idosa

quanto a patroa, e Juliet duvidou que tivesse tempo

para espanar todos os quartos, quanto menos efetuar

reparos. Tudo era grandioso, incluindo os m��veis e o

toalete, onde havia uma banheira com p��s e um lava-

t��rio montado sobre uma pequena plataforma.





3 6


A N N E M A T H E R

Depois de permitir-se um ligeiro pulo na cama,

Juliet constatou que o colch��o era confort��vel. E os

len����is limpos cheiravam a amaciante com perfume

de lavanda. Seriam apenas tr��s noites, consolou-se. E

era imposs��vel que Lady Elinor tivesse mais alguma

coisa a lhe dizer. Talvez pegasse o carro de Cary em-

prestado e fosse at�� a cidade vizinha.

O quarto tinha uma bela vista do rio. Agora a mar��

estava baixa e havia d��zias de p��ssaros saltitando na

lama atr��s de comida. Juliet viu gaivotas, cegonhas e

at�� reconheceu um casal de ma��aricos-das-rochas.

Ainda eram 16h30 e, desistindo de permanecer no

quarto at�� o jantar, Juliet decidiu procurar a gover-

nanta. Talvez Josie contasse um pouco mais sobre a

hist��ria da casa - ou de seus moradores -, admitiu,

percebendo que estava mais interessada em Rafe

Marchese do que em qualquer outro assunto. Lavou

o rosto na pia de m��rmore rachada e contemplou o

pr��prio reflexo no espelho manchado. Ainda parecia

corada, mas, provavelmente, tinha sido s�� a ��gua fria.

Lady Elinor n��o devia permitir que se esquentasse a

��gua durante o dia.

De volta ao quarto, ap��s convencer-se de que aque-

la blusa bege de seda e a saia de linho no mesmo tom

serviriam para o passeio, retocou o delineador e o r��mel,

passando um gloss cintilante nos l��bios carnudos. Ela

n��o era bonita, pensou, mas o rosto em formato de

cora����o tinha um certo charme. Felizmente, os cabelos

cacheados n��o precisavam mais do que uma simples

escovada. Embora n��o pudesse pagar o sal��o h�� tempos,

as mechas douradas ainda sobressa��am na cabeleira cor

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37


de mel. Ou seriam grisalhas? Juliet alarmou-se e chegou

mais perto do espelho. Depois de tudo pelo que havia

passado, n��o seria de surpreender.

Desceu a escada ressabiada, tentando avistar Cary

ou a anfitri��. Juliet preferia n��o esbarrar em nenhum

dos dois e, como o sombrio sal��o parecia deserto,

seguiu direto para a cozinha. Deparou-se com Rafe

Marchese, que tomava ch�� com a governanta, senta-

do num canto da mesa.

- Ora... srta. Lawrence - disse Josie, levantando-se,

sem gra��a. - Eu j�� ia levar o seu ch��.

- Meu ch��?

Juliet viu a bandeja com uma x��cara, leite e a����car,

al��m de um prato com sandu��ches de picles e bolinhos.

S�� faltava o bule, e Juliet deduziu que Josie fora in-

terrompida pela visita.

Rafe n��o demonstrou importar-se com a sua apari-

����o repentina. Sequer se levantou, e apenas levou a

caneca aos l��bios, lan��ando-lhe um olhar enigm��tico.

- Sim, o seu ch��. - Josie parecia ansiosa para as-

segurar que estava tudo pronto. - Mas j�� que est�� aqui

embaixo, prefere que eu sirva na sala de visitas?

- Ah... hum... - ap��s o fiasco do almo��o, era me-

lhor n��o repetir a experi��ncia - ... posso comer aqui

mesmo? Com voc�� e o... sr. Marchese.

- Rafe - corrigiu ele. - Acho que Josie prefere que

voc�� a deixe servi-la na sala.

- Mas prefiro comer aqui. Incomodo?

- Claro que n��o, srta. Lawrence. - Josie inquietou-

se ante a s��bita hostilidade entre ambos. - Se me der

um minuto, vou preparar mais ch��...





38


A N N E M A T H E R

- Esse mesmo est�� ��timo. - Juliet encarou Rafe com

o que ele considerou um reflexo da arrog��ncia do pri-

mo. - Pensei que j�� tivesse sa��do, sr. Marchese.

- Eu voltei. Algum problema nisso?

- N��o me cabe criticar - respondeu ela.

- Mas criticou.

- Rafe, por favor - interveio Josie. - Aposto que

a srta. Lawrence s�� queria conversar. Como prefere

o ch��, senhorita? Com leite e a����car, ou lim��o?

Juliet sentiu-se constrangida. O clima na cozinha

estava tranq��ilo at�� ela chegar, e a culpa era toda sua.

Bem, talvez parte da culpa, defendeu-se, e Josie

colocou o leite na x��cara, como ela havia pedido.

Juliet come��ava a desconfiar se Cary n��o teria algum

motivo para tanto ressentimento, afinal. N��o restava

d��vida de que Rafe a maltratou de prop��sito.

- Gostou do quarto? - indagou Josie, oferecendo-

lhe uma cadeira - e uma tr��gua.

- Ah... muito confort��vel. Tem uma vista maravi-

lhosa do rio.

Rafe a olhou de soslaio, contrariado porque a av��

hospedou-a no quarto da m��e. E imaginou o que uma

garota como Juliet tinha visto num fracassado feito

Cary. O que foi mesmo que Lady Elinor contou? Que

ela j�� havia se casado e se divorciado? Juliet n��o

aparentava ser t��o vivida.

Juliet percebeu que ele a observava com aqueles

perturbadores olhos negros. O que Rafe achava? Que

ela s�� estava interessada no dinheiro de Lady Elinor,

igual a Cary? Pois, apesar de tudo o que ele disse ao

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





3 9


primo, quando Lady Elinor se distra��a, a express��o

no rosto de Cary n��o era nada simp��tica.

O sil��ncio se prolongou demais e Josie, preocupa-

da em fazer algum coment��rio neutro, voltou os olhos

suplicantes para Rafe.

- A sua av�� vai oferecer um jantar ��ntimo no s��-

bado �� noite. Ela j�� lhe contou?

- Ora, e por que contaria? Eu n��o fui convidado,

n��o ��?

- N-n��o. Mas os Holderness vir��o.

- Jura? A velha n��o d�� ponto sem n��.

- Bem, a inten����o �� essa...

Mas Josie percebeu que fora indiscreta na presen-

��a de uma h��spede. Rafe aproveitou a deixa e des-

conversou.

- Ora, n��o se preocupe, estarei por perto se preci-

sar de mim.

- Oh, Rafe!

As palavras soaram t��o comovidas que Juliet en-

tendeu que a governanta n��o partilhava da mesma

opini��o sobre ele. Na verdade, parecia existir uma

afei����o genu��na entre os dois, e Juliet espiou na dire-

����o de Rafe. S�� para encontrar aquele olhar melan-

c��lico.

Desviou os olhos imediatamente, mas n��o sem

notar que a antipatia entre ambos era rec��proca. Com

certeza, Rafe devia achar que ela era uma patricinha

desmiolada, que s�� se agarrava a Cary por causa das

expectativas dele.

At�� parece!, pensou Juliet.

Ela decidiu que devia tentar mudar essa impress��o.





4 0


A N N E M A T H E R

- Cary comentou que �� um artista, sr. Marchese.

Ser�� que j�� vi o seu nome em algum lugar?

- Creio que ele deve ter dito que tenho amigos

metidos a artistas - Rafe murmurou malicioso, ou-

vindo Josie respirar fundo.

- Rafe! - ela ralhou baixinho, mas Juliet n��o pres-

tou aten����o.

- E �� verdade? Seus amigos s��o metidos a artistas,

quer dizer?

- N��o. �� s�� o jeito de Cary depreciar tudo o que

n��o compreende.

- Por favor, Rafe...

Josie estava desesperada, e agora Juliet ouviu.

- Ah, n��o se preocupe, sra. Morgan. O sr. Marche-

se n��o gosta de mim. Ora, tudo bem. Tamb��m n��o

morro de amores por ele. Se me d��o licen��a, vou dar

uma olhada l�� fora, certo?

Logo que se viu no sal��o outra vez, Cary acabara

de descer a escada. Ah, perfeito!, pensou Juliet. Era

tudo o que ela precisava. E a situa����o n��o melhorou

quando a porta atr��s dela tamb��m se abriu. Por algu-

ma raz��o, Rafe decidiu acompanh��-la.

Da escada, Cary n��o notou a presen��a do primo.

- Onde voc�� se meteu, Juliet? Fui ao seu quarto,

mas voc�� n��o estava l��. ��bvio. Que diabo andou fa-

zendo?

Juliet se enganou, achando que Rafe n��o iria inter-

ferir.

- Ela estava tomando ch�� na cozinha comigo e a

Josie - falou calmo. - Voc�� n��o tem nada contra,

tem?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





41


- S�� tenho! - Encarou a suposta noiva, furioso. -

Como isso aconteceu?

- Foi sem querer - Juliet retrucou nervosa, fuzi-

lando Rafe com o olhar. - Eu queria... algu��m com

quem conversar. Pensei que Josie poderia me falar

sobre a casa.

- E o que ele ficou fazendo? - Cary apontou para

Rafe.

- Se quer saber, eu estava tomando ch�� com a

Josie - interrompeu Rafe. - Essa ainda n��o �� a sua

casa, Cary. Eu entro e saio quando bem entendo.

- E eu n��o sei? Onde est�� a vov��? Aposto que no

jardim de inverno, para variar.

- Acho que ela est�� deitada. Ela sempre descansa

�� tarde, como voc�� saberia se passasse mais tempo

em Tregellin.

Cary n��o se deu ao trabalho de responder. Em vez

disso, colocou um bra��o em tomo dos ombros de Juliet,

que sentiu um calafrio desagrad��vel na espinha.

- Que tal um passeio? - sugeriu Cary.

- Ah... n��o. - Com certa discri����o, Juliet desven-

cilhou-se. - Eu... eu j�� ia tomar banho.

- Um banho, heim? Ah, sim, que programa incr��-

vel. Podemos tomar banho juntos, querida. J�� reparou

como as banheiras daqui s��o grandes? O que a gera-

����o da minha bisav�� n��o devia ver naquelas festas de

arromba que o meu tatarav�� costumava dar, entre uma

guerra e outra.

- Nada do que voc�� est�� pensando, Cary - declarou

uma voz autorit��ria. Lady Elinor apareceu na porta.

- Rafe. D��-me um minuto antes de ir embora, por

favor.

CAP��TULO QUATRO

J U L I E T tomou banho, mas de ��gua gelada. Felizmente, havia deixado uma toalha �� m��o antes de entrar na

banheira. Como lavara os cabelos de manh��, n��o se

preocupou por n��o haver nenhum secador. Ela era

mimada, pensou. Estava acostumada a hospedar-se

em hot��is onde todas as futilidades eram providen-

ciadas.

Agora n��o mais, claro, disse a si mesma, ainda

assombrada pelo fantasma da conta de luz. E, apesar

daquela situa����o constrangedora, pelo menos ganha-

ria dinheiro suficiente para pag��-la. Se conseguisse

ignorar Rafe Marchese, n��o seria t��o ruim assim.

J�� que Lady Elinor ofereceria um jantar em home-

nagem ao neto, Juliet examinou as roupas que trou-

xera com um olhar cr��tico. N��o que fossem poucas,

pelo contr��rio. At�� David cancelar os cart��es de cr��-

dito, comprar era um passatempo divertido. Por��m,

n��o trouxera muitas pe��as. As reclama����es de Cary

quanto �� parcim��nia da av�� n��o a prepararam para a

situa����o real de Tregellin.

Embora n��o aparentasse possuir muito dinheiro,

Lady Elinor vivia com estilo. S�� a manuten����o da

casa devia custar uma fortuna, mas troc��-la por uma

resid��ncia menor parecia fora de quest��o. O que sig-

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





43


nificava que Juliet precisava guardar o vestidinho

preto at�� s��bado. Era a coisa mais formal que trouxe-

ra, e Cary devia esperar que a noiva vestisse algo

adequado.

Naquela noite, Juliet decidiu usar uma cal��a cigar-

rete de seda p��rpura, mas o c��s baixo expunha a pele

alva com generosidade excessiva. Portanto, colocou

uma blusa solta de estampa verde e violeta, que cobriu

a brecha.

Quando ela desceu, passava pouco das 19h. Cary a

avisou que a av�� costumava jantar ��s 19h30. Apesar de

preferir continuar no quarto at�� a hora de comer, o que

seria indelicado, Juliet dirigiu-se �� sala de visitas.

Esperando encontrar Cary com a av��, Juliet inco-

modou-se ao ver que ambas estavam sozinhas, em-

bora Lady Elinor tivesse sido gentil ao oferecer-lhe

um copo de xerez antes da refei����o.

- Ah... - Juliet nunca gostou de xerez, achava doce

demais. Mas pelas regras da etiqueta, devia aceitar a

oferta. - Obrigada.

- Pode se servir - acrescentou Lady Elinor, apon-

tando a bandeja sobre a c��moda com a bengala. - Eu

tenho artrite nas m��os, e n��o �� f��cil levantar a garrafa.

Juliet obedeceu, grata por precisar servir-se de uma

dose m��nima.

- Meu pai sofria de artrite nas m��os, tamb��m -

comentou, sentando-se no sof�� de couro em frente

�� poltrona de Lady Elinor. - Dizia que foi de tanto

escrever.

Lady Elinor concordou. Estava particularmente

elegante esta noite, de saia preta longa e blusa de seda





4 4


A N N E M A T H E R

bege. Mais uma vez, trazia um xale nos ombros, ago-

ra estampado nas cores do outono.

- A sua m��e faleceu antes do seu pai, n��o foi? - in-

dagou Lady Elinor.

- Ela morreu logo depois que eu nasci. Meu pai

ficou arrasado, como pode imaginar.

- Claro. E o seu pai era muito mais velho do que

a sua m��e, creio - prosseguiu, surpreendendo Juliet

por saber tanto. - Mas, ao menos, ele tinha voc��.

Voc��s deviam ser muito apegados.

- Sim, ��ramos. Conheceu meu pai, Lady Elinor?

- N��o. Mas me lembro de que meu filho e a esposa

falavam da amizade de Cary com a filha de Maxwell

Lawrence. E sei que Cary ficou magoado quando o

afastei de todos os amigos.

Juliet provou um gole do xerez e n��o achou t��o

doce quanto esperava.

- Parece que isso aconteceu h�� s��culos.

- Bem, claro que sim. �� mais f��cil recordar o pas-

sado quando se chega na minha idade. Mas voc�� se

casou com outro. Cary compareceu �� cerim��nia.

Juliet fez uma careta.

- Prefere n��o tocar no assunto?

- N �� o . Foi s�� um grande erro, mais nada. David

nunca me amou. Como Cary provavelmente j�� contou,

ele s�� estava interessado no meu dinheiro.

- E o seu pai n��o insistiu para que ele assinasse

qualquer tipo de acordo pr��-nupcial?

- Papai morreu um ano antes de eu conhecer David.

E como j�� disse, eu acreditei quando ele falou que n��o

ligava para dinheiro.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





45


- Dinheiro �� sempre importante. Exceto talvez para

Raphael. - Hesitou. - Voc�� conheceu o Rafe, n��o ��?

Ele �� filho da minha filha Christina. Infelizmente, ela

nunca se casou com o pai dele.

- Ah. - Juliet conteve-se um minuto. - Importa-se

se eu perguntar por que comentou que o Rafe n��o se

interessa por dinheiro?

Foi uma pergunta pessoal, mas, por sorte, Lady

Elinor n��o pareceu ofendida.

- Talvez eu devesse corrigir para o meu dinheiro

- retrucou com um sorriso maroto. - Raphael vive

muito bem sem ele. A pequena galeria que acabou de

abrir em Polgellin Bay �� um sucesso e tanto.

- Ent��o ele �� pintor?

-E tamb��m d�� aulas de arte numa escola em

Bodmin.

- S��rio? Que interessante!

- Acha mesmo? A irrespons��vel... falta de apego

da m��e dele partiu o meu cora����o. Ela tamb��m pin-

tava, e veja o que lhe aconteceu.

- Cary disse que ela... caiu da sacada de um hotel.

- Bom, essa �� a vers��o oficial.

Juliet a encarou intrigada.

- N��o �� verdade?

- Ah, assim eu estragaria o suspense, n��o ��, srta.

Lawrence? Por que n��o conta de novo como voc�� e

Cary se conheceram? Parece uma grande coincid��n-

cia. Por acaso costuma visitar o cassino?

- Cassino? - Juliet ficou pasma.

- Sim. �� onde o meu neto trabalha, n��o ��? N��o

consigo imaginar como ele os persuadiu a contrat��-lo,





4 6


A N N E M A T H E R

depois do fiasco na ��frica do Sul. Sabe disso, n��o

sabe?

- Bem, sim.

Juliet n��o tinha nada mais a dizer, e ficou aliviada

ao escutar passos se aproximarem. Um instante de-

pois, Cary surgiu na porta, meio embonecado demais

numa cal��a preta acetinada e um palet�� de smoking

vermelho. Adentrou a sala com um andar ligeiramen-

te afetado, como se esperasse ser elogiado pela apa-

r��ncia. Por��m, Lady Elinor apenas ergueu as sobran-

celhas negras. E quando Hitchins come��ou a latir, ela

colocou o animal no colo.

- Vov��. - Cary a cumprimentou, espiou o cachor-

ro com uma express��o pouco amistosa e sentou-se ao

lado de Juliet. - Voc�� est�� maravilhosa - comentou,

dando-lhe um beijo inconveniente logo abaixo da

orelha. - Hum, e o perfume tamb��m �� maravilhoso.

�� Chanel?

- N��o. - Juliet conteve-se para n��o dizer que era

uma simples col��nia herbal que n��o custava nem a

metade do pre��o. - A sua av�� e eu est��vamos espe-

rando por voc��.

- Desculpe. Se soubesse que sentiam a minha

falta, teria sido muito mais r��pido, acreditem.

- Ela n��o falou que sentiu a sua falta, Cary - alfi-

netou a av��. - Para dizer a verdade, Juliet e eu tivemos

uma conversa muito interessante.

- �� mesmo? - Cary mostrou-se apreensivo.

- Sim. Ela j�� ia me contar onde voc��s dois se re-

encontraram.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





4 7


Juliet sentiu Cary petrificar. Eles n��o previram essa

situa����o, o que foi pat��tico.

- N��s... nos encontramos na casa de amigos em

comum - mentiu Juliet. - Os Bainbridge, n��o ��, Cary?

John e Deborah. N��s os conhecemos h�� anos.

- Sim, os Bainbridge - Cary concordou, grato.

Mas, notando a falsidade na voz dele, Juliet entendeu

porque Lady Elinor resolveu investigar o novo em-

prego do neto. Tamb��m rezou para que a senhora n��o

fosse amiga dos Bainbridge. Debbie ficaria muito

confusa ao saber que Juliet n��o havia lhe contado que

planejava se casar de novo. Muito menos que tinha

conhecido o futuro noivo na casa dela.

- E quando foi isso?

- Ah... mais de seis meses atr��s! - exclamou Cary,

arrancando um gemido de Juliet.

- Mais de seis meses? Ent��o por que eu n��o soube

de nada? Quando voc�� voltou - deixe-me ver, h�� seis

semanas - n��o comentou nada sobre noivado nenhum,

Cary.

- Foi minha culpa, Lady Elinor - mentiu Juliet,

torcendo para o sorriso disfar��ar o rubor. - Pedi a Cary

que n��o contasse a ningu��m sobre a nossa rela����o.

Como me divorciei h�� pouqu��ssimo tempo, n��o queria

que pensassem que me atirei em outro casamento.

- Apesar de ser verdade - Lady Elinor ironizou.

Mas, felizmente, Josie voltou naquele exato momen-

to para avisar que o jantar estava pronto.

Apesar de tudo, o jantar - rosbife, pudim Yorkshi-

re e compota de frutas para a sobremesa - se passou





4 8


A N N E M A T H E R

sem incidentes. E, depois, Juliet encontrou a desculpa

perfeita para se recolher cedo.

- Foi um dia muito cansativo - explicou.

Quando Cary insistiu para que ficasse, percebeu o

olhar fulminante de Juliet e preferiu n��o abusar da

sorte.

- Certo, descanse bastante - disse ele, levando a

m��o dela aos l��bios. - Vejo voc�� de manh��, querida.

Durma bem.

Na verdade, Juliet dormiu mal. Apesar de confor-

t��vel, ela estranhou a cama, e saber que ainda faltavam

mais tr��s dias era angustiante. Ap��s revirar-se duran-

te horas, acabou se levantando quando o dia amanhe-

cia, e foi at�� a janela espiar o alvorecer no rio. Nunca

vira tantas aves juntas, grasnando ao disputar entre si

as larvas que a mar�� havia deixado para tr��s.

Juliet sentiu uma vontade s��bita de sair, para fugir

de outro interrogat��rio. Pois, com certeza, Lady Elinor

n��o teria saciado a curiosidade totalmente. Tomou um

banho de chuveirinho, o que era melhor do que nada.

Tr��mula de frio, mas refrescada, vestiu um jeans e um

su��ter verde-oliva com gola em V, cal��ou um par de

t��nis All Star de cano alto e saiu. Como ontem �� noi-

te, tudo parecia deserto.

A cozinha estava gelada e escura. Juliet abriu as

cortinas e colocou ��gua para ferver. Daria-se por feliz

se achasse um pote de caf�� instant��neo, pensou. En-

controu o que procurava no terceiro arm��rio que abriu,

e ent��o a chaleira apitou. Adicionou duas colheres de

caf�� na caneca e encheu de ��gua fervente.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





4 9


Estava de costas para a porta quando algu��m en-

trou. Virou-se assustada e deparou-se com Rafe Mar-

chese. Ele carregava algumas sacolas e o aroma de-

licioso de p��o fresco inundou o ambiente. Juliet achou

que n��o estava com fome, mas se enganou.

- J�� est�� se sentindo em casa? - comentou, pregui-

��oso, colocando as sacolas na mesa.

Rafe vestia uma cal��a cargo caqui e um colete de

n��ilon azul-marinho, sobre uma camisa com a gola

desabotoada. A vis��o dos p��los negros do peito era

perturbadora, e as mangas enroladas exibiam os bra-

��os bronzeados, tamb��m cobertos de p��los.

Juliet ficou vermelha s�� de olhar. Honestamente,

ela parecia uma virgem, o que n��o era verdade. Por

que Rafe Marchese fazia com que pensasse coisas que

chocariam qualquer garota decente?

- Hum... quer um pouco? - indagou, tentando

parecer controlada.

- Depende do que est�� me oferecendo - brincou

ele, vendo o rubor queimar-lhe as faces.

Era t��o bom olhar para Juliet, pensou Rafe. Em-

bara��oso, ali��s, o que era interessante. Juliet vestia

um jeans que se amoldava ao contorno sensual dos

quadris e, embora teimasse em esticar o su��ter, n��o

conseguiu esconder um vislumbre fascinante da pele

alva do abdome. Quando a av�� contou que Cary le-

varia a noiva para Tregellin, ele imaginou uma mulher

completamente diferente. E, embora seduzi-la con-

trariasse o bom senso, algo em Juliet despertava o

desejo malicioso de testar os pr��prios limites.





5 0


A N N E M A T H E R

Por sua vez, Juliet sabia que Rafe estava jogando

charme de prop��sito, e perguntou-se por qu��. Droga,

ela era a suposta noiva de Cary.

- Caf��? - ofereceu Juliet.

- Caso se refira a essa... coisa... que est�� bebendo,

eu passo, obrigado. A Josie c��a o caf��. Os filtros ficam

por a�� em algum lugar.

- Tomara que voc�� n��o espere que eu lhe prepare

um caf�� especial! O que voc�� faz por aqui, ali��s? N��o

�� meio cedo para uma visita?

- Esta �� a sua id��ia de hospitalidade? Lembre-me

de manter dist��ncia quando voc�� estiver mais sens��vel.

Ou rabugenta?

- Voc�� n��o respondeu �� minha pergunta.

- Que pergunta?

- Perguntei o que fazia aqui t��o cedo. Lady Elinor

o chamou?

- Pode-se dizer que sim.

- Por qu��?

- Por que o qu��?

- Por que ela o chamou? - Se ele podia bancar o

c��nico, ela tamb��m podia. Ent��o, uma id��ia lhe ocor-

reu. - Lady Elinor n��o est�� doente, n��o ��?

Mais uma vez, Rafe fitou Juliet com aqueles olhos

perturbadores.

- N��o que eu saiba. Teve uma noite agrad��vel?

Juliet bufou. Ele era teimoso demais.

- Muito... agrad��vel. Tomou um gole de caf��. -

Hum, est�� gostoso.

Rafe n��o acreditou, mas realmente n��o tinha tem-

po para discutir agora.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

51

- Aceita um croissant? Est��o fresquinhos.

- Foi voc�� quem fez?

Rafe deu uma gargalhada.

- N��o. Fui dormir depois da uma da manh��, por-

tanto, n��o estava acordado ��s 5h, fazendo p��es.

Uma da madrugada! Juliet adoraria perguntar o

que ele ficou fazendo at�� t��o tarde, mas n��o teve

coragem. E ser�� que ela queria mesmo saber?

- L��gico - replicou, incapaz de resistir ao delicio-

so p��ozinho. Fazia tanto tempo desde que podia dar-

se a esses luxos.

O croissant esfarelou quando Juliet o colocou na

boca. Foi uma cena t��o sensual que Rafe sentiu um

desejo repentino de lamber os farelos nos l��bios dela.

E imaginou que aquela boca era macia, ��mida e per-

fumada...

Dio! Censurou o rumo dos pr��prios pensamentos.

Minha nossa, ela era noiva de Cary. Onde estava com

a cabe��a para deixar-se levar pela excita����o, quando

n��o havia a menor chance de possu��-la?

Juliet apanhou um guardanapo e limpou os l��bios.

- Estava... delicioso! Obrigada.

- Ent��o... o que voc�� e Cary pretendem fazer

hoje?

- N��o sei. Acredite ou n��o, antes de voc�� chegar

eu pretendia sair para passear. Talvez perto do rio.

- De t��nis?

Juliet espiou os pr��prios p��s.

- S��o muito confort��veis.

- Mas n��o s��o �� prova d'��gua. Voc�� precisa de

botas de borracha. A margem do rio fica muito lama-

centa nessa ��poca do ano.





5 2


A N N E M A T H E R

- Ah, puxa... Ent��o vou limitar minha explora����o

ao jardim. - Hesitou. - Voc�� vai... dar aula hoje?

Rafe mostrou-se surpreso.

- A vov�� lhe contou?

- Que voc�� �� professor? Sim. N��o �� nenhum se-

gredo, ��?

- N��o. Voc�� descobrir�� que Lady Elinor prefere

que eu tenha um emprego med��ocre a ganhar a vida

de algum outro jeito.

- Quer dizer, pintando?

Rafe sorriu e Juliet sentiu um frio na barriga. Ele

era t��o atraente e ela n��o seria humana se n��o perce-

besse que a vida de solteira tinha muitas desvantagens.

Passou-se tanto tempo desde que fizera, ou desejara,

sexo com um homem, muito menos com David. Mas

imaginar as m��os de Rafe no seu corpo a deixou arre-

piada. O que, provavelmente, n��o aconteceria, lembrou-

se. Al��m do fato de que ele n��o estava interessado nela,

todos achavam que era a noiva de Cary.

- Sim, pintando - assentiu Rafe, justo quando

Josie entrou na cozinha, reparando nos dois e nas

sacolas da padaria sobre a mesa. E Rafe flagrou-se

com remorsos. Como se os seus pensamentos estives-

sem estampados no rosto.

- Voc�� acordou cedo, srta. Lawrence, - disse ela

a Juliet.

- O dia est�� t��o bonito. Pensei em sair para passear.

- E eu a atrasei - Rafe completou. - Ela precisa

de galochas e n��o trouxe.

- Quanto cal��a, srta. Lawrence?- indagou a gover-

nanta.

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53


- Hum... 38, acho.

- Ent��o pode usar as minhas botas, se quiser.

Juliet n��o sabia o que dizer. Nunca precisou usar

as botas de ningu��m emprestadas, mas n��o era hora

de bancar a orgulhosa.

- �� muita gentileza sua - agradeceu. - E, por favor,

me chame de Juliet.

CAP��TULO CINCO

R A F E chegou em casa depois do meio-dia. O aparta-

mento ficava em cima do pequeno ateli�� onde exibia

os seus trabalhos art��sticos e, ��s vezes, os de outras

pessoas. Sempre teve o sonho de abrir o pr��prio ne-

g��cio. E, embora os lucros fossem modestos, a satis-

fa����o era grande.

Naquela manh��, ele daria uma aula na escola onde

trabalhava meio expediente. E, �� tarde, Liv Holderness

iria ao ateli�� para que ele fizesse os primeiros esbo��os

do retrato dela. ��s vezes, Rafe usava uma c��mera para

estudar o modelo, calcular a ilumina����o adequada.

Acabou se tornando um ��timo fot��grafo, mas pintar

sempre foi a sua maior paix��o.

No apartamento, que tinha uma ampla ��rea de

conviv��ncia, cozinha americana, quarto e banheiro,

Rafe tirou o colete e foi preparar o caf��. Enquanto

colocava o p�� no filtro de papel, lembrou-se do en-

contro com Juliet naquela manh��. Droga, o que

aquela mulher fez para incomod��-lo tanto? Ela foi

gentil, quase simp��tica, mas ele se comportou feito

um imbecil.

Ali��s, para in��cio de conversa, recordou como a

havia provocado. E, de fato, preferia n��o pensar na

maneira como reagiu mais tarde. Deixar-se seduzir

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





55


por ela foi pat��tico. Acima de tudo, Juliet era noiva

de Cary. E, a julgar pelo que Lady Elinor contou,

parecia que ela nunca tinha encarado um ��nico dia de

batente na vida.

De acordo com a av��, ela era a filha ��nica mimada

de um rico executivo. Casou-se logo depois de con-

cluir o ensino m��dio, tornando-se uma esposa papa-

ricada. Os motivos pelos quais o casamento havia

fracassado n��o eram muito claros. Diferen��as irre-

concili��veis, presumiu, ligando a cafeteira. N��o era

esse o jarg��o usado hoje em dia? O que ela via em

Cary Daniels era outro mist��rio. A menos que fosse

daquelas mulheres carentes. Em todo o caso, n��o era

da sua conta. Gra��as a Deus, ele era independente e

vivia com conforto, sem a ajuda de ningu��m. Esta era

uma das coisas que incomodavam Lady Elinor, pois

ela preferia que ele fosse igual ao primo.

Rafe tomava a segunda caneca de caf�� quando

Olivia chegou. Guardou o resto de um sandu��che no

frigobar e foi abrir a porta.

Olivia Holderness era completamente diferente de

Juliet Lawrence. Embora o motivo para compar��-las,

mais uma vez, o aborrecesse. N��o era justo criticar

Liv s�� porque ela era uma loura escultural, que gos-

tava de usar saias curtas e saltos altos para chamar

aten����o. Por��m, comparou-a com uma mulher alta,

esbelta e elegante, mas que n��o possu��a o mesmo

charme.

Entretanto, Rafe n��o estava no melhor dos humo-

res quando acompanhou Liv at�� o ateli��. O lugar fi-

cava fechado ao p��blico quando estava ocupado. Ao





5 6


A N N E M A T H E R

contr��rio de certos pintores, Rafe n��o gostava de

plat��ia. Al��m do mais, qualquer colecionador s��rio

poderia marcar uma visita, e a sua principal fonte de

renda eram as comiss��es de vendas.

- S�� posso ficar uma hora - avisou Olivia, acomo-

dando-se na cadeira. - Bobby acha que fui ao cabe-

leireiro - confessou, enquanto Rafe ajustava as luzes

para iluminar o rosto. Ela riu. - Vou ter que inventar

alguma desculpa quando ele notar que o meu cabelo

continua igual. O que voc�� acha?

Rafe ainda n��o se acostumara ao fato de que

"Bobby" era Lorde Robert Holderness. Liv contou

que Bobby havia se apaixonado porque ela era muito

diferente das outras esposas. E Rafe acreditou sem

hesitar.

- Meu cabelo est�� bom, n��o ��? Isto ��, quero sair

bem no retrato. Imagine, eu, posando para uma pin-

tura! Quem diria?

- Quem? - brincou Rafe, e Liv lan��ou-lhe um olhar

sedutor.

- Voc�� n��o acha que sou boba?

- N��o. Por que acharia? Voc�� me pagou muito bem

e preciso do trabalho.

- Ora, por acaso sei que n��o �� verdade. Poppy...

Poppy Gibson - acrescentou, mencionando o nome

da esposa do membro do parlamento que residia na

regi��o - ela contou que foi na sua recep����o, na sema-

na passada, e que voc�� recebeu algumas comiss��es.

Queria tanto vir com o Bobby. Mas ele n��o estava se

sentindo bem - ele tem press��o alta, sabe - e eu n��o

podia deix��-lo sozinho, n��o ��?

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5 7


- Claro que n��o.

- E voc�� acha que o meu cabelo est�� bom? - Liv

ajeitou as mechas sedosas que ca��am no decote gene-

roso. - Connie - Conrad Samuels do sal��o Batik em

Bodmin - acha que essa cor combina comigo. Mas

n��o tenho certeza. Eu sou loura natural, sabe?

- Sim, claro. - Rafe conhecia Liv h�� tempo o su-

ficiente para saber que o cabelo natural dela era cas-

tanho. Igual �� Juliet, pensou, mas sem o mesmo brilho.

Rafe amarrou a cara. Deus, ele tinha que tirar aquela

mulher da cabe��a.

- N��o precisa ficar zangado. - Olivia pensou que

ele tivesse ficado aborrecido com o coment��rio. -

Ali��s, Bobby pensa que eu sou loura natural, e isso ��

o que conta.

- Ele acha mesmo? Ora, que surpresa.

- Seu descarado! Aposto que voc�� n��o se lembra

de como eu sou. Daquela vez, estava escuro e voc��

ficou...

- B��bado - completou Rafe. - Agora fique parada,

certo?

- Mas foi bom, n��o foi? Lembro-me de acordar na

manh�� seguinte e achar que estava apaixonada.

- Excitada, �� mais prov��vel - retrucou Rafe, pre-

ferindo evitar aquela conversa. O caso com Liv fora

breve, e n��o especialmente rom��ntico. Recordou-se

de acordar com ressaca. Muito parecida com a que

teve esta manh��, pensou, mas por uma causa nobre.

- Mas a gente se dava t��o bem - insistiu ela. E

como Rafe n��o respondeu, Liv balan��ou a cabe��a,

chateada. - Rafe, voc�� est�� me ouvindo?





58


A N N E M A T H E R

Ele ajustou a c��mera, mas Liv se mexeu e estragou

a foto.

- Sou todo ouvidos - resmungou. - Mas estou

tentando trabalhar.

- Desculpe.

- N��o me leve a s��rio. Tomei vinho demais ontem

�� noite.

- Vinho? Desde quando voc�� bebe vinho, Rafe?

- Desde que descobri que �� um analg��sico mais

barato do que u��sque. - Rafe estudou-a atrav��s das

lentes da c��mera um instante - Ent��o, realmente acha

que o seu marido vai gostar?

- Que eu seja pintada nua? Oh, sim. Bobby �� lou-

co pelo meu corpo.

- Certo. Ent��o... voc�� quer o esquema completo?

Barba, cabelo e bigode?

Olivia fez uma careta.

- Voc�� tem um jeito t��o rom��ntico de dizer as

coisas. - Liv cruzou os bra��os no colo, puxando a

bainha da saia e fingindo n��o querer que ele olhasse

para as suas pernas. E que pernas, Rafe admitiu.

- ��timo.

Ajustou a c��mera novamente e bateu fotos de ��n-

gulos variados. Seriam ��teis para estudar a estrutura

do rosto. Rafe sabia que Liv observava ansiosa. E

perguntou-se pela primeira vez se teria sido sensato

aceitar aquele trabalho.

- Pronto - disse ele, alguns minutos depois, arras-

tando um sof�� de veludo para o centro do c��modo.

- Deite-se aqui. Quero fazer alguns esbo��os, s�� para

ter id��ia de como vai ficar.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





5 9


Olivia saltou de p��.

- J�� posso tirar a roupa?

- N��o! Quer dizer, hoje ainda n��o �� necess��rio. S��o

apenas esbo��os. Completo os detalhes depois. �� incr��-

vel o que se pode fazer sem a presen��a do modelo.

Olivia fez beicinho.

- Quer dizer ent��o que n��o vou precisar tirar as

roupas?

- Por enquanto, n��o. Voc�� devia estar aliviada. Este

lugar �� muito abafado.

- Imagino. - Mas Olivia ainda parecia desaponta-

da e Rafe compreendeu que ela queria se despir por

sua causa. Oh, Deus, pensou ele, n��o �� poss��vel que

a av�� tivesse raz��o. Quando Lady Elinor destilou todo

aquele veneno sobre a nova Lady Holderness, talvez

ele devesse ter escutado...

J U L I E T passou duas horas agrad��veis passeando pela margem do rio, que n��o era particularmente largo. Na

verdade, as ��rvores de um lado quase tocavam as outras

na margem oposta. O terreno, como Rafe tinha avisado,

estava cheio de h��mus acumulado desde o ��ltimo des-

folhamento do outono, ap��s meses de chuva forte.

A primavera despontava. Juliet lamentou n��o saber

mais sobre as flores silvestres que cresciam abundan-

tes ao longo do rio.

Quando voltou para casa, descobriu que Cary e a

av�� tomavam caf�� no jardim de inverno. Juliet, depois

de tirar as botas de Josie na ��rea, preferia subir cor-

rendo e se arrumar antes de encontrar a anfitri��. Mas

Cary surpreendeu-a no corredor.





6 0


A N N E M A T H E R

- Onde voc�� se meteu? Se planejava sair, podia ter

me avisado.

- Apenas quis dar uma volta, mais nada.

- Mesmo assim, devia ter me avisado. Eu adoraria

respirar ar fresco para compensar o clima nesse mau-

sol��u.

- Desculpe.

- Ora, deixa para l��. Venha. Estamos tomando o

caf�� no jardim de inverno.

- Ah, bem... eu j�� ia me arrumar - protestou, mas

Cary n��o pareceu se importar com a opini��o dela.

Ou com a sua apar��ncia, para ser exato.

- Mais tarde - disse ele, segurando-a pelo cotove-

lo para conduzi-la at�� o jardim.

Juliet lan��ou-lhe um olhar impaciente, mas Cary

n��o arredou p��.

- Aqui est�� ela, vov��! - exclamou triunfante. - Ju-

liet foi s�� foi dar um passeio.

Antes que Juliet pudesse responder, Hitchins apa-

receu correndo. A voz alta de Cary o perturbou. Como

antes, ele mirou direto na barra da cal��a de Cary, que

n��o conseguia esconder a frustra����o por n��o poder

fazer nada.

- Ei... - Sorrindo para Lady Elinor, Juliet agachou-

se e separou o pequin��s da sua presa. Hitchins, com

certeza, n��o antipatizava com ela, pois assim que se

viu nos seus bra��os, sapecou-lhe uma lambida no

queixo. - Ora, voc�� n��o vai me amolecer assim - dis-

se ela, j�� comovida pela demonstra����o de afeto do

cachorrinho. - N��o se sai por a�� mordendo as pessoas,

certo?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





61


- Ele gosta de voc��, srta. Lawrence - comentou

Lady Elinor. - Geralmente, Hitchins sabe distinguir

um bom car��ter, creio.

O que, sem d��vida, deixava Cary em maus len����is.

O sorriso confiante deu lugar a uma carranca despei-

tada. Sem dizer nada, ele simplesmente se fez de

desentendido.

- Eu tinha um labrador - contou Juliet. - Quando

eu era pequena. E, por favor... meu nome �� Juliet.

Adoraria se me chamasse assim.

- Juliet. - Lady Elinor concordou e apontou a

poltrona de vime a seu lado com a bengala. - Venha

c�� e sente-se, Juliet. E j�� pode colocar o Hitchins no

ch��o, ali��s. Se o Cary parar de tremer, Hitchins sim-

plesmente vai ignor��-lo.

- Eu n��o estou tremendo, vov��. Posso mandar a

Josie colocar outra x��cara para Juliet? Da�� voc��s duas

conversariam mais �� vontade.

Juliet fitou-o com os olhos arregalados de p��nico.

- Sim, fa��a alguma coisa de ��til, Cary. E traga um

bule de caf�� fresco quando voltar.

- Eu n��o sou um criado, vov��.

- Nem Josie - respondeu, balan��ando a bengala

como se ela fosse uma varinha de cond��o. - V�� logo.

E n��o demore.

Para a surpresa de Juliet, Cary n��o protestou. Ape-

nas baixou a cabe��a e obedeceu. Era impressionante

como permitia que Lady Elinor pisasse nele. Ser�� que

Cary suportaria qualquer tipo de humilha����o s�� para

garantir a heran��a? Pelo jeito, sim.

-E voc��, apreciou o passeio? - indagou Lady

Elinor, t��o logo Cary saiu.





6 2


A N N E M A T H E R

- Muito.

- Caminhou ao longo do rio? Josie a avisou que ��

muito escorregadio nessa ��poca do ano?

- Hum... foi o sr. Marchese, na verdade.

- Rafe? Rafe estava aqui?

- Sim. Acho que ele trouxe algumas... coisas... para

a sra. Morgan. Acordei cedo e por acaso estava na

cozinha quando ele chegou.

- Ah. Ent��o... qual �� a sua opini��o sobre Rafe?

- Oh... - Juliet ficou perplexa. - Ele... bem...ele

parece muito meigo. Ele mora aqui por perto?

Lady Elinor gargalhou.

- Querida, meu neto mais velho n��o tem nada de

meigo. Irritante, debochado, e at�� fascinante. Mas

meigo, n��o.

- Ele... n��o se parece muito com o Cary, n��o ��?

- N��o. Gra��as a Deus! Ent��o... suponho que Rafe

n��o lhe contou onde mora.

- N��o. N��s n��o conversamos muito.

- Bem, ele mora em Polgellin Bay. Em cima do

ateli��.

- Tem algum dos quadros dele, Lady Elinor?

O sil��ncio se estendeu, e Juliet come��ou a achar

que cometera uma gafe. Mas a senhora respondeu:

- Rafe n��o acredita que me interesso pelo trabalho

dele. Mas gostaria de conhecer a sua opini��o, Juliet.

Como se isso fosse acontecer, Juliet concluiu,

ir��nica. Apesar de aberto ao p��blico, o ateli�� de Rafe

era o ��ltimo lugar para onde Cary a levaria.

- Voc�� e Cary j�� marcaram a data do casamento?

A pergunta foi t��o inesperada que Juliet ficou sem

palavras.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





6 3


- Oh, n��o. N��s... acabamos de ficar noivos. N��o

pretendemos nos casar t��o cedo.

- Foi o que pensei.

Lembrando-se de que Cary n��o ficaria nada feliz

caso ela criasse d��vidas na cabe��a da av�� dele, Juliet

inventou algo.

- Talvez... deixemos para planejar tudo no fim do

ano.

- Voc�� n��o est�� usando um anel.

- N��o. - Agora Juliet n��o teve resposta.

- Suponho que meu neto esteja com problemas

financeiros, como sempre. Lembre-me de dar uma

olhada na minha caixa de j��ias, Juliet. Talvez eu tenha

um anel perfeito para voc�� usar.

Oh, Deus! Era vergonhoso imaginar-se com um

anel de Lady Elinor. Juliet nunca se sentiu t��o despre-

z��vel. O retorno de Cary n��o bastou para consol��-la.

O estrago j�� fora feito. Sem d��vida, logo que voltas-

sem a Londres, Cary mandaria avaliar o anel e Juliet

duvidava que Lady Elinor tornaria a v��-lo.

Naturalmente, a av�� comunicou a sugest��o a

Cary.

- Como amanh�� �� noite oferecerei um jantar para

comemorar o noivado, n��o posso permitir que Juliet

apare��a sem um anel de noivado, posso?

- Voc�� �� um anjo, vov��! - exclamou Cary, abra-

��ando-a com tanto entusiasmo que Hitchins quase o

atacou de novo. - O que far��amos sem voc��?

CAP��TULO SEIS

J U L I E T estava se arrumando para o jantar quando Josie bateu na porta.

A princ��pio, ficou tentada a fingir que n��o tinha

ouvido, pensando que fosse Cary. Juliet torceu para

que Lady Elinor se esquecesse de que havia lhe ofe-

recido o anel. Entretanto, depois do almo��o ela pedi-

ra a Josie que trouxesse a caixa de j��ias e passara os

30 minutos seguintes vasculhando o conte��do.

Cary estava morrendo de curiosidade para ver o

que havia dentro do estojo que a av�� guardava com

tanto zelo. Por��m, Lady Elinor cuidou para que ele

se sentasse do lado oposto da mesa enquanto ela exa-

minava tudo. Homens n��o devem ser t��o curiosos,

ralhou ela.

Por sua vez, Juliet n��o queria tomar parte nisso, mas

n��o teve outra alternativa. Os an��is que Lady Elinor

depositou sobre um peda��o de linho reluziram ao sol.

Eram muito antigos, mas o design continuava na moda.

Havia um solit��rio, um anel de esmeralda cravejado de

brilhantes e um anel de rubi. No entanto, Juliet suspei-

tou que as pedras fossem semipreciosas.

Cary respirou fundo quando viu os an��is. Foi f��cil

adivinhar os pensamentos dele, ouvindo a sua caixa

registradora mental calcular os valores.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





65


- De qual voc�� gosta mais, Juliet? - indagou Lady

Elinor. - Como pode ver, s��o antiguidades. O anel de

diamante pertenceu �� minha av��, e o anel de esmeral-

da a minha m��e ganhou de presente do adido cultural

brasileiro. O anel de rubi eu ganhei quando debutei.

- Todos s��o muito bonitos.

- Sim, s��o mesmo. - Cary cochichou no seu ouvido,

incapaz de resistir ao impulso de juntar-se a elas e

apanhar o solit��rio. - �� muita generosidade, vov��. Eu

e Juliet ficamos muito agradecidos, n��o ��, querida?

- Muito - concordou, rangendo os dentes. Em

seguida, tomou-lhe o anel de diamante e colocou-o

de volta no lugar. - N��o sei qual escolher.

- Ah, eu acho que o solit��rio �� o mais apropriado

- Cary declarou, nervoso.

Era mesmo, Juliet pensou com sarcasmo, sabendo

exatamente o que ele tramava.

- Na verdade - disse ela, apanhando o anel de rubi

- gosto mais deste.

- Mas...

- Voc�� deve concordar que, como Juliet vai usar o

anel, �� ela quem deve tomar a decis��o - intercedeu a

av��. - Preciso admitir, tamb��m prefiro o anel de rubi.

�� uma pedra perfeita, importada de Burma.

E pequena, Juliet ponderou, animada, antes de entrar

no banho. Se Cary planejava depenar a av��, ela n��o

seria c��mplice. Agora, ao escutar algu��m bater na porta,

imaginou se ele n��o havia decidido intimid��-la.

S�� faltava mais um dia, pensou Juliet, vestindo o

robe de seda. Ela s�� precisava ag��entar at�� amanh��.

Mas ainda restava esta noite e, abrindo a porta, pre-





6 6


A N N E M A T H E R

parou-se para enfrentar a ira de Cary. Ficou agrada-

velmente surpresa ao ver que era Josie, apesar de a

governanta parecer um pouco apreensiva.

- Oh, srta. Lawrence - disse ela, esquecendo-se de

que Juliet pedira para cham��-la pelo nome. - Achei

que voc�� e o sr. Cary tinham ido embora.

- Ah... n��o. Eu s�� estava no banheiro. Algum pro-

blema?

Josie parecia mesmo nervosa e, embora Juliet

suspeitasse que ela n��o revelaria nada, convidou a

governanta para entrar.

- �� s�� que... bem, Lady Elinor n��o est�� passando

bem. Precisei chamar o dr. Charteris.

- Posso ajudar em alguma coisa?

- Duvido. Ela detesta ficar de cama. E n��o gosta-

ria que a visitassem por enquanto, acredite. Ela fica-

r�� zangada comigo quando souber que chamei o

m��dico.

- Mas se ela est�� indisposta...

- Eu sei. Mas �� o jeito dela. Ali��s, voc�� e o sr. Cary

se importariam de fazer um lanche hoje? Com o m��-

dico por aqui e tudo o mais...

- Claro. N��o se preocupe conosco, sra. Morgan.

- Ah, mas n��o creio que o sr. Cary concordar��...

- Cuidarei para que o sr. Cary concorde. Posso

ajud��-la?

Josie fitou-a, de olhos arregalados.

- Lady Elinor n��o aprovaria.

- Lady Elinor n��o precisa saber, certo?

- N��o sei o que dizer, srta. Lawrence.

- Pode come��ar por me chamar de Juliet. Agora...

quando o m��dico chega?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





6 7


Quase meia hora depois, Juliet estava na cozinha

ralando queijo quando Cary apareceu.

- Ah, aqui est�� voc��! Voc�� �� a mulher mais escor-

regadia que j�� conheci. Vive se escondendo e... Que

diabos est�� fazendo?

- O que lhe parece?

- Que voc�� est�� fazendo o trabalho de Josie. Onde

ela se meteu? Perdendo tempo por a��, para variar?

- N��o acho que Josie tenha tempo de sobra. Faz

id��ia de como cuidar de um lugar desses �� trabalhoso?

N��o, claro que n��o.

- Ainda n��o entendi o que voc�� est�� fazendo aqui.

Quer que a velha pense que pretendo me casar com

uma faxineira?

- Ningu��m, exceto voc��, pensaria uma coisa des-

sas, Cary. E qual o problema em ser faxineira? �� um

trabalho digno e, na minha situa����o, n��o se pode es-

colher.

- Ah, corta essa. Voc�� nem sonharia em ganhar a

vida limpando a casa dos outros. E, al��m do mais, ��

s�� for��a de express��o. O que eu realmente quis dizer

foi que a vov�� n��o aprovaria que uma convidada

preparasse o pr��prio jantar.

- A sua av�� n��o est�� passando bem. Josie at�� cha-

mou o m��dico.

- Tudo bem! Mas ningu��m me avisou nada.

Juliet franziu a testa, notando que Cary ainda ves-

tia a cal��a cinza e o palet�� de tweed que havia usado

�� tarde.

- O que voc�� andou fazendo?

- Ah... Nada demais. - E ent��o, como se precisas-

se contar-lhe algo importante, fechou a porta e apro-





6 8


A N N E M A T H E R

ximou-se. - Na verdade - cochichou - andei confe-

rindo os livros.

- Que livros?

- Os livros de contas. Deus, voc�� n��o vai acreditar

no que descobri!

- A sua av�� pediu que fizesse isso?

- ��bvio que n��o.

- Ent��o, ela n��o sabe que andou xeretando?

- N��o. Mas n��o se preocupe com isso agora. Eu vi

uma carta...

- Voc�� n��o devia ler a correspond��ncia de Lady

Elinor.

- Ah, pelo amor de Deus. Ela deixa aquele bastar-

do do Marchese cuidar das contas.

- N��o o chame assim.

- Ah, n��o me diga, voc�� tamb��m entrou para o

f��-clube?

- N��o. - Juliet corou.

- Certo, tudo bem. A velha recebeu uma oferta de

compra para Tregellin. Pode acreditar? Duvido que

nem aquele... Marchese saiba. Um empres��rio de

Bristol quer comprar a casa, as fazendas, tudo. Ele

pretende construir um condom��nio de luxo. Provavel-

mente, essa oferta vale milh��es!

Juliet encarou-o com repulsa.

- N��o consigo acreditar que Lady Elinor venderia

a casa para uma empreiteira.

- Bem, �� claro que n��o! Por isso ela nunca falou

nada a respeito. Meu palpite �� que ela recusou na

mesma hora.

- Gra��as a Deus.

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6 9


Apesar de ter passado apenas dois dias na casa,

Juliet se sentia apegada ao lugar.

- Como assim, gra��as a Deus? �� uma chance ��ni-

ca. Eu n��o recusaria.

- Talvez por este motivo ela n��o tenha lhe contado

nada. E voc�� sequer perguntou como a sua av�� est��

passando. Ela poderia estar �� morte, ora.

- Seria sorte demais - Cary resmungou baixinho,

mas Juliet escutou, enojada. - Afinal, o que voc�� est��

fazendo? Brincando de casinha?

- Estou ajudando a Josie. Como Lady Elinor est��

se sentindo mal, ela perguntou se nos importar��amos

de comer um lanche hoje. Mas pensei que poderia

incrementar as coisas. O que acha?

- Voc�� est�� preparando o jantar? Voc�� n��o �� cozi-

nheira!

- N��o. Mas achei bifes de rim na geladeira, e pre-

tendo frit��-los com um pouco de bacon. Pensei tam-

b��m em batatas assadas, cobertas de queijo gratinado

para acompanhar. Que tal?

Cary fez uma careta.

- Rins! Eu n��o como tripas!

Comeria sim, caso a av�� oferecesse, Juliet pensou

irritada.

- Ent��o... voc�� come um sandu��che, combinado?

- Sandu��che! Voc�� s�� pode estar brincando. Que

tal sairmos para jantar?

- Sair?

- ��. Poder��amos ir a Bodmin, encontrar alguns

amigos meus, comer por l��. Talvez at�� exista um

cassino.





7 0


A N N E M A T H E R

- E a sua av��?

- Ah, por favor. Ela n��o vai querer me ver. Onde

est�� o anel?

- No meu bolso. - Juliet vestia uma cal��a de linho

azul-marinho com um su��ter rosa de angor��, cujo

decote em V era mais generoso do que ela gostaria.

- Voc�� s�� pensa em dinheiro?

- D�� um tempo. Isso foi um n��o, certo?

- Exato.

Cary saiu bufando da cozinha. Ela meio que espe-

rava que ele mudasse de id��ia e fosse ver a av��, mas

logo escutou o ru��do de um carro dando a partida.

Droga!

Ela n��o costumava xingar, mas estava farta do

ego��smo de Cary.

Mas poucos minutos depois, Josie apareceu e sus-

pirou de satisfa����o ao sentir o cheiro da comida.

- Oh, senhorita... Juliet... n��o era necess��rio.

- Por que n��o? Lady Elinor precisa se alimentar,

n��o ��?

- Voc�� �� uma boa garota. Quem diria que Cary

encontraria uma mo��a ador��vel assim?

- Quem diria? - gracejou.

Juliet jantou no jardim de inverno, ainda quente

ap��s ter sido banhado pelo sol ao longo do dia. Co-

gitou em levar a bandeja para o quarto, mas agora que

Cary tinha sa��do, sentiu-se mais �� vontade.

Acabara de p��r de lado um peda��o de rim meio

queimado, quando percebeu que tinha companhia.

Apenas duas l��mpadas que iluminavam o jardim es-

tavam acesas, portanto, Juliet levou um susto quando

notou um vulto alto, parado na entrada.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





71


- Ol��. Josie falou que eu a encontraria aqui.

Juliet tomou f��lego.

- Voc�� estava me procurando?

- Eu vim visitar a vov��. Josie ligou e me disse que

tinha chamado o m��dico.

- Ah. - Apesar das reservas em rela����o a Rafe, ele

pensava muito mais na av�� do que Cary. - Ent��o...

como ela est��?

- Chateada. Vov�� detesta ouvir o dr. Charteris

reclamar que ela n��o se cuida.

- Mas devia. E caso eu possa fazer qualquer coisa

para ajudar...

Rafe concordou. Esta noite, ele vestia uma cal��a

social preta e uma camisa branca de seda com as

mangas dobradas at�� os cotovelos. O contraste entre

o tecido e a pele atraiu o olhar de Juliet. Talvez ele

planejasse sair com alguma garota de quem gostasse,

at�� Josie telefonar.

- Normalmente, ela nunca sente nada. - Rafe re-

trucou afinal, sabendo que o pretexto para vir atr��s de

Juliet n��o era muito louv��vel. Quando a av�� lhe con-

tou que a h��spede havia preparado o jantar para todos,

ele sentiu uma vontade irresist��vel de agradec��-la.

Mas agora, aqui de p��, contemplando a bela figura

sob a luz suave, imaginou se gratid��o tinha sido mes-

mo o principal motivo.

- Ent��o, acha que a nossa estadia pode ser estres-

sante demais para ela?

- N��o. Ela pegou uma gripe violenta em fevereiro.

Charteris recomendou repouso, mas voc�� j�� deve ter

percebido que ela n��o aceita ordens de ningu��m.





72


A N N E M A T H E R

- Voc�� est�� preocupado?

- N��o mais do que o normal. A prop��sito, ela

mandou dizer que o jantar estava delicioso.

- Ela n��o falou isso.

- Falou sim. - Rafe hesitou um instante e aproxi-

mou-se. Sabia que estar aqui era desafiar o perigo,

mas Josie contou que Cary tinha sa��do. E ele adorava

implicar com a noiva do primo. Ela era um alvo t��o

f��cil. - Ent��o, por onde anda o garoto prod��gio? Con-

ferindo a beleza local?

- N��o! Cary foi encontrar alguns amigos em

Bodmin, eu acho.

Rafe sentou-se de frente para Juliet, que sentiu o

local encolher. Ou talvez ele estivesse pr��ximo de-

mais, a brisa fresca contrastando com o calor que Rafe

irradiava.

- Ent��o, por que n��o foi junto? Ou ele n��o a con-

vidou?

- Convidou sim! Mas eu n��o quis sair.

Rafe resignou-se a fit��-la, intrigado. Ele tinha o dom

irritante de criar um clima de tens��o, quando ela n��o

possu��a nenhum motivo l��gico para ficar nervosa.

- Eu... bem... adorei o passeio. Hoje de manh��,

quer dizer. E... voc�� tinha raz��o quanto �� lama. Sem

as botas, meus p��s ficariam encharcados.

Rafe sabia que ela ficava nervosa perto dele. Juliet

parecia inocente demais, embora pudesse estar enga-

nado. Talvez n��o passasse de uma farsa para conquis-

tar a sua simpatia.

- Quando voc�� e Cary ficaram noivos?

- Hum... h�� poucas semanas. Nos conhecemos

desde crian��as.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





73


- ��, eu sei. Vov�� me contou.

- Lady Elinor lhe conta tudo.

- E isso a incomoda?

- Claro que n��o. Voc��s s��o muito ��ntimos, ��bvio.

- Duvido que a vov�� seja ��ntima de algu��m; Ex-

ceto da Josie, talvez.

- Isso n��o �� verdade.

- Voc�� n��o acha que ela �� ��ntima do Cary, acha?

- Ele �� neto dela.

- E tamb��m �� um puxa-saco ego��sta.

Juliet ficou boquiaberta e saltou de p��.

- Voc�� n��o tem o direito de me dizer essas coisas!

- N��o? - Para o seu desgosto, Rafe tamb��m levan-

tou. E embora fosse alta, Juliet precisou erguer a ca-

be��a para encar��-lo. - Voc�� n��o vai tentar me conven-

cer de que, apesar da sua experi��ncia, n��o enxerga os

defeitos do Cary, vai? Faz parte do charme dele,

acho.

- Que grosseria!

Rafe reconheceu que foi longe demais, mas n��o

conseguiu controlar o impulso absolutamente destru-

tivo de provoc��-la.

- Fui grosseiro com voc��, como? Por presumir que

tem alguma experi��ncia com homens porque j�� foi

casada? Ou por duvidar do charme de Cary?

- Voc�� sabe o que disse. �� isso que voc�� diz para

Lady Elinor? Que... o Cary �� um ego��sta... o que foi

que voc�� falou?

- Um puxa-saco! Falei que ele �� um puxa-saco, e

�� mesmo. E se pensa que eu preciso dizer isso �� vov��,

�� porque n��o a conhece direito.





74


A N N E M A T H E R

- N��o conhe��o Lady Elinor nem voc��. Se me der li-

cen��a, preciso levar a bandeja de volta para a cozinha.

- E se eu n��o der? A conversa ainda n��o terminou.

- Por mim terminou - retrucou Juliet, sentindo a

raiva esmorecer depressa. - Por que est�� fazendo isso,

sr. Marchese? Voc�� nem gosta de mim.

- Eu n��o falei isso.

- Nem precisava. Desculpe se o ofendi, sr. Mar-

chese. N��o sei por qu��, mas parece que a gente n��o

se entende direito.

Rafe quase suspirou de frustra����o. Ela falava de

um jeito t��o afetado. Deus, era ele quem devia des-

culpar-se.

Mais tarde, Rafe disse a si mesmo que n��o preten-

dia toc��-la. Queria provoc��-la, certo. For����-la a com-

portar-se como qualquer outra mulher que ele conhe-

cia, sem aquela m��scara de puritana. Mas ela ainda

era a noiva de Cary, pelo amor de Deus. Al��m do mais,

ele nunca seduzira uma mulher comprometida. Con-

tudo, ele prendera Juliet pelo pulso quando ela tentou

se esquivar. E ent��o, quando ela encarou-o, indignada,

Rafe segurou-a pela nuca e a beijou.

CAP��TULO SETE

J U L I E T aconchegou-se debaixo das cobertas, sabendo que havia cometido uma grande estupidez. Por mais que

tentasse justificar o incidente, nada mudaria o fato de

que, enquanto todos pensavam que era noiva de Cary,

ela deixara que Rafe Marchese a beijasse.

Ele a beijou!

Foi s�� isso que ele fez? Seria essa uma descri����o

coerente com aquele ardente arroubo de paix��o?

Santo Deus, ela se sentiu violada. Que outra palavra

traduziria a avidez com que a l��ngua de Rafe explorou

a sua boca, impedindo qualquer tentativa de defesa?

Bem, para ser honesta, Rafe n��o a obrigara a nada.

Sim, ele a beijou, e a l��ngua dele quase a sufocou.

Rafe chegou a aninhar a perna entre as suas para pux��-

la para si. Por��m, n��o a tocou com maior intimidade.

Embora ainda se sentisse palpitante por causa de uma

onda pat��tica de excita����o.

Como diabo isso aconteceu?, perguntou-se pela

en��sima vez. Por que n��o o deteve? Por que n��o lhe

deu um tapa?

Mas que coisa, quando Rafe a tomara nos bra��os,

as pernas tremeram feito gelatina. Ele a abra��ou com

tanta for��a que comprimiu-lhe os seios, cuja rea����o

seria in��til negar. E quando Rafe segurou-lhe as n��-

degas, ela sentiu uma umidade peculiar na calcinha.





7 6


A N N E M A T H E R

Agora, tocando os pr��prios seios, Juliet descobriu

que ainda estavam quentes e rijos. Assim como a

vis��vel excita����o de Rafe, lembrou, tr��mula. Ele pa-

receu t��o grande, t��o forte ao ro����-la com um deses-

pero que ela jamais conhecera. Quando fazia amor

com David, ela nunca reagia com tamanho ardor.

O que havia de errado com ela, ora, bolas? C��us,

ela sequer se abalou quando David a deixou. Por que

Rafe Marchese fazia com que ela agisse de um jeito

absolutamente estranho? Santo Deus, bastou o sujei-

to beij��-la e ela se transformou num pudim.

Agora, relembrando tudo no ref��gio do quarto,

Juliet imaginou o que aconteceria se Josie n��o os

interrompesse. Felizmente, ambos escutaram os pas-

sos dela e, quando Josie apareceu na porta, Rafe j��

estava do outro lado do jardim. Juliet estava entorpe-

cida de al��vio - ou de desapontamento. N��o sabia

direito qual dos dois.

N A MANH�� de s��bado, Cary sugeriu que fizessem um

passeio at�� Polgellin Bay.

Juliet ignorava a hora em que ele havia voltado na

noite passada, e n��o se importava. Contudo, achava

que ele devia passar algum tempo com a av��, em vez

de sair outra vez.

- Ah, ela est�� bem - Cary argumentou quando ela

tocou no assunto. - Eu a vi hoje cedo e ela disse que

se sente muito melhor.

Juliet n��o discerniu bem se era verdade ou n��o, mas

julgou que n��o tinha o direito de criticar Cary, quando

ela mesma n��o era nenhum exemplo de virtude.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





7 7


Entretanto, Juliet suspeitou de que havia sido Josie

quem lhe passou aquela informa����o. Mais cedo,

quando visitou Lady Elinor, Josie n��o comentara que

tinha visto Cary. S�� Rafe.

Lady Elinor dissera a Josie que gostaria de falar

com Juliet ap��s o caf�� da manh��. Cary ainda n��o tinha

descido. E Juliet permaneceu na sala de jantar porque

Josie mostrou-se irredut��vel quando ela pediu para

comer na cozinha tamb��m.

- N��o. Agora, espere sentada a��, enquanto eu bus-

co caf�� e torradas.

Quando retornou, Josie informou-lhe o pedido de

Lady Elinor.

- Ela vai levantar mais tarde e est�� muito melhor

agora. Um bocado ansiosa para o jantar de hoje. Va-

mos, eu acompanho voc�� at�� o quarto.

Lady Elinor estava recostada nos travesseiros. No

quarto enorme, havia o tipo de mob��lia antiga que

Juliet vira apenas em exposi����es. Por��m, todo aque-

le esplendor em decad��ncia ainda guardava algo de

impressionante, e a vista das janelas era digna do

tesouro de um rei.

Ou da fortuna de um empreiteiro, Juliet pensou

contrariada. Se ela fosse Lady Elinor, faria tudo ao

seu alcance para manter o lugar. N��o era s�� uma casa.

Era uma tradi����o de fam��lia.

- Voc�� viu o Rafe ontem �� noite - disparou Lady

Elinor.

Ap��s responder com impaci��ncia ��s perguntas pre-

ocupadas de Juliet, Lady Elinor foi direto ao assunto.

78

A N N E M A T H E R

- Hum... sim. Suponho que voc�� tamb��m tenha

conversado com ele.

- Ora, �� claro. Rafe veio me visitar. Ele se preocu-

pa comigo. Ou, pelo menos, �� o que ele diz.

- Garanto que todos est��vamos preocupados com

voc�� ontem - Juliet afirmou, ressabiada. Chato, mas

ela precisava apoiar Cary. - Rafe... disse que voc��

pegou um resfriado, e que talvez tenha se esfor��ado

demais.

- Rafe deveria guardar as pr��prias opini��es para

si. Quem chamou Charteris? Foi ele?

- N��o, acho que foi Josie - disse Juliet, torcendo

para n��o dedurar ningu��m. - �� sempre melhor contar

com a opini��o de um profissional.

- Humpf. N��o poder decidir o que se quer �� muito

irritante. Contou a Rafe que lhe dei um anel?

Juliet prendeu a respira����o.

- N��o.

- Por que n��o? �� estranho que Rafe n��o lhe per-

guntasse nada a respeito.

- Bem, de fato, eu n��o estava usando o anel. Guar-

dei-o no bolso enquanto ajudava a sra. Morgan a

preparar o jantar, e acabei me esquecendo. At��... mais

tarde.

At�� escapar do jardim de inverno, na verdade.

Nervosa, Juliet recordou-se de ter corrido escada

acima, sentindo-se uma desclassificada. Tirou o anel

do bolso e colocou-o no dedo. Como se ele pudesse

funcionar como um amuleto e apagar os erros que

havia cometido.

N��o apagou, claro.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

79

- Entendo. - Caso n��o se sentisse t��o envergonha-

da, Juliet talvez estranhasse o brilho quase compla-

cente nos olhos da velha senhora. - Bem, hoje voc��

est�� usando.

- Oh... sim. �� t��o bonito! Naturalmente, devolve-

rei antes de partirmos.

- Devolver? O anel �� seu.

- Mas... se... quando... Cary comprar um anel de

noivado, n��o precisarei mais dele.

- Voc�� n��o gostou?

- Claro que gostei.

- Ent��o, o assunto est�� encerrado. Gosto de saber

que a esposa de meu neto usar�� este anel. Que um dia,

ele pertencer�� a minha bisneta. Agora, quero que

saiam e divirtam-se. Vejo voc��s mais tarde.

E Juliet n��o teve escolha, exceto obedecer. N��o

estava feliz com a situa����o, e decidiu que, quando o

"noivado" acabasse, devolveria o anel a Lady Elinor.

Mais tarde, acabou aceitando o convite de Cary para

darem uma volta, assim Lady Elinor teria tempo para

repousar.

Logo depois de avisarem Josie, Cary e Juliet sa��-

ram. J�� passava das dez e, depois da chuva, um sol

t��mido surgia por entre as nuvens. As muretas da es-

trada sinuosa ofereciam um vislumbre do mar, en-

quanto a brisa salgada do oeste soprava forte. Polgellin

Bay era maior do que Juliet esperava. Seguiram pela

estrada litor��nea at�� o ponto mais movimentado. A

estreita rua principal conduzia a um ancoradouro,

onde havia barcos de pesca e iates luxuosos.

Cary estacionou na marina que, nessa ��poca do ano,

n��o ficava lotada como na alta temporada, contou ele.

80

A N N E M A T H E R

Agora, era poss��vel circular sem dificuldades. Entre o

final da primavera e o in��cio do ver��o, a multid��o

transformava qualquer passeio em um pesadelo.

Juliet duvidou que um lugar t��o bonito poderia ser

considerado um pesadelo em qualquer esta����o. Ago-

ra que o sol saiu, fazia bastante calor e ela ficou

grata por trocar o jeans por uma cal��a de algod��o de

cintura baixa. Combinando ainda uma bata rosa-choque

e uma camiseta branca de malha, Juliet sentiu-se de

f��rias. Talvez, por algumas horas, ela esquecesse o

pr��prio papel naquela farsa.

Um bar �� beira-mar oferecia mesas ao ar livre, e

Cary sugeriu que tomassem um drinque.

- Eu s�� quero um caf�� - Juliet insistiu, contente pela

oportunidade de sentar e apreciar o movimento.

Em seguida, os dois passearam pela rua ��ngreme

que haviam subido de carro na chegada. V��rias lojas

famosas disputavam a clientela com os comerciantes

locais. Havia in��meros caf��s e muitas lojas de suvenir,

assim como diversas galerias de arte.

- �� aqui que... o seu primo tem um ateli��, n��o ��?

- Juliet deixou escapar, amaldi��oando a pr��pria l��ngua

comprida.

- �� - Cary retrucou seco. - Bem, n��o aqui, exata-

mente. Fica numa dessas ruas laterais. Ele n��o pode

pagar o aluguel nessa ��rea com o que ganha venden-

do aqueles rabiscos.

- Suponho que voc�� n��o se interessa por arte.

- Arte, sim. O que ele faz, n��o. Venha. Eu lhe mos-

tro. Aposto que Rafe n��o vai barr��-la na entrada.

- Oh... n��o...

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





81


Ver Rafe era a ��ltima coisa que Juliet queria. Santo

Deus, ele pensaria que ela tivesse armado o passeio de

prop��sito. Apesar da maneira como o repelira na noite

passada, mal podia esperar para v��-lo de novo.

- Honestamente, n��o acho que �� uma boa id��ia. O

ateli�� deve estar fechado.

- Talvez. Mas eu o conven��o a abrir.

O lugar parecia vazio, e Juliet j�� ia sugerir que

fossem embora quando uma mulher saiu de uma

Mercedes reluzente e caminhou na dire����o deles.

- Est��o procurando o Rafe? - indagou ela. - Ei,

voc�� �� o primo dele, n��o ��? - continuou, olhando fixo

para Cary. - Lembro-me de voc�� na ��poca em que

morava em Tregellin.

Na mesma hora, Juliet percebeu que Cary n��o gos-

tou de ser associado a Rafe. Por��m, observando o de-

cote ousado e a minissaia da mo��a, Juliet imaginou que

ela fosse justo o tipo de mulher que Rafe apreciava.

- Sim, eu sou Cary Daniels. E voc�� ��?

- Liv Holderness. Bem, Liv Melrose, n��o se lem-

bra? Voc�� costumava se hospedar com bastante fre-

q����ncia no hotel do meu pai.

- Meu Deus! - Cary mostrou-se estupefato. - Voc��

�� a Lady Holderness?

- Primeira e ��nica. Bobby e eu vamos jantar com

voc�� e a sua av�� hoje �� noite. Ela n��o contou?

- Eu... ela deve ter comentado. - Cary ficou em

uma saia-justa. - Voc�� veio aqui ver... o Rafe?

- Isso cabe a mim saber e a voc�� descobrir - brin-

cou ela, lan��ando um olhar para Juliet com um inte-

resse calculado. - Quem �� ela? Outra parente?





8 2


A N N E M A T H E R

- Bem... esta �� Juliet Lawrence. Minha noiva.

- Noiva? Aposto que a sua av�� aprovou.

- Claro. - Juliet foi compelida a responder. Depois,

olhou para Cary. - Precisamos ir.

- Voc��s viram o Rafe?

Coube a Cary admitir que n��o, o ateli�� parecia

estar fechado.

- Bem, ele n��o abrir�� - Liv afirmou impaciente.

- Rafe nunca trabalha com gente assistindo. Al��m do

mais, ele deve estar l�� em cima no apartamento. J��

tocaram a campainha?

- N �� o . - Cary olhou desesperado para Juliet e

observou a mulher passar-lhes a frente e apertar o

bot��o. - Eu acho que ele n��o vai atender.

- Ah, vai sim - Liv assegurou, confiante. - Ele

est�� me esperando.

Angustiada, Juliet n��o queria estar ali. Ainda mais

agora, ao descobrir que Rafe tinha uma esp��cie de

caso com aquela mulher.

Mas era tarde demais. Aporta se escancarou e Rafe

apareceu, irresistivelmente m��sculo numa camiseta

de malha e short caqui. Tamb��m cal��ava t��nis e, a

julgar pela marca de suor em forma de V que manchou

a frente da camiseta - delineando cada m��sculo -, ele

estava correndo ou praticando algum outro exerc��cio

f��sico. E Juliet, que costumava acreditar que n��o

gostava de homens de short, reconheceu que a pr��pria

opini��o tinha pouqu��ssimo fundamento.

- Querido! - Liv torceu o nariz. - O que voc��

andou fazendo?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

83

A contrariedade transpareceu no semblante de

Rafe. S�� faltava essa, pensou ele, que diabo Cary veio

fazer aqui? Com Juliet?

- Voc�� chegou cedo - foi tudo o que disse, igno-

rando a express��o sarc��stica do primo. - Eu ia tomar

um banho.

- J�� passa da hora, eu diria - alfinetou Cary. - Eu

n��o sabia que dar umas pinceladas �� toa deixavam

ningu��m suado!

- E como saberia, Cary? Duvido que voc�� sequer

tenha suado algum dia! Ah, exceto quando as autori-

dades sul-africanas estavam no seu encal��o.

- Ora, seu...

Juliet n��o imaginava o que Cary faria caso Liv n��o

intercedesse a tempo. Mas ela duvidava que o "noivo"

sairia ganhando.

- Podemos subir?

Foi Liv quem falou, enquanto Juliet tentou con-

vencer Cary a ir embora. Mas Cary n��o atenderia a

um reles pedido.

- ��, o que acha, Marchese? - indagou ele. Em

seguida, dirigiu-se a Juliet. - Quero ver onde ele mora.

Aposto que �� um pardieiro!

Fora o fato de que se recusava a perder mais tempo

com Cary do que o necess��rio, Rafe n��o queria que

Juliet invadisse o espa��o dele. Ela j�� havia lhe invadi-

do os pensamentos, mais do que era sensato. Droga,

ela era noiva do seu primo idiota. Ele n��o tinha o di-

reito de lembrar como os l��bios dela eram macios.

Contudo, Liv logo suspeitaria que havia algo no

ar, se ele agisse de maneira estranha. Resignado, Rafe

disse:





8 4


A N N E M A T H E R

- Sim, vamos subir. Liv, prepare um pouco de

caf��.

Juliet fuzilou Cary com o olhar, mas ele apenas a

encorajou a entrar.

- Depressa, querida - disse ele. - Voc�� sabe o

quanto eu quero ver a resid��ncia do grande pintor.

Se Rafe ouviu, ignorou, e arrependida por meter-se

nessa situa����o, Juliet subiu a escada estreita, acom-

panhando Liv. A outra mulher cal��ava saltos altos e

quase perdeu o equil��brio nos degraus desnivelados.

Juliet notou que os olhos de Cary pareciam grudados

na bainha da saia de Liv, que balan��ava lascivamente na

altura das coxas.

O apartamento era mais espa��oso do que imagina-

va. Pelo menos a sala, corrigiu Juliet. Comparado a

Tregellin, era moderno demais, com um conjunto de

sof�� e poltronas de couro marrom num dos cantos da

sala, al��m de mesa e cadeiras de ferro batido no outro.

Havia uma larga estante de madeira com aparelhagem

de som e v��deo, decorada com esculturas que confe-

riam ao ambiente uma apar��ncia sofisticada. Mais at��

do que Cary esperava, suspeitou Juliet, reparando o

olhar atento com o qual ele observava o bom gosto

da decora����o. E, determinada, desviou os olhos

dele.

Neste instante, Juliet encontrou o olhar misterioso

do anfitri��o. Ela paralisou, especulando se Rafe pre-

tendia vingar-se ao mencionar o encontro da noite

anterior. Mas tudo o que ele disse foi:

- Se me d��o licen��a... - e, l��nguido, dirigiu-se ��

porta que conduzia ao banheiro.

CAP��TULO OITO

Q U A N D O Rafe se virou, Juliet tentou evitar aqueles olhos magn��ticos. Mas n��o conseguiu se impedir de

observ��-lo.

Engoliu em seco e, ent��o, notou que o seu interes-

se n��o passou despercebido. Cary a encarava agora

com uma express��o curiosa. Se ele descobrisse que

se sentia atra��da por Rafe, s�� Deus sabe 0 que seria

capaz de fazer.

Enquanto isso, Liv mancou at�� a cozinha. Os ar-

m��rios em laminado de carvalho e as bancadas em

granito conferiam ao espa��o um ar de requinte.

Obviamente, Liv conhecia bem a cozinha, porque

encontrou a cafeteira e o p�� sem nenhum esfor��o.

Juliet tentou n��o deixar que os sentimentos por Rafe

deturpassem a opini��o que tinha da mo��a. Por��m, a

imagem dos dois juntos - na cama dele - n��o lhe sa��a

da cabe��a.

- Voc�� conhece Cary h�� muito tempo? - indagou

Liv.

- Desde de crian��a - interveio Cary. - Ent��o, o que

est�� rolando entre voc�� e Marchese? Ou �� uma per-

gunta incriminadora?

Liv sorriu meio sem gra��a.

- Acho que isso �� problema nosso, n��o ��?





8 6


A N N E M A T H E R

Para desconversar, Juliet apontou um conjunto de

aquarelas penduradas na parede.

- Esses quadros s��o do sr. Marchese, Lady Hol-

derness?

- Chame-a de Liv, pelo amor de Deus! - repreen-

deu Cary.

- Como se o Rafe fosse pendurar qualquer coisa

dele no pr��prio apartamento! - Liv exclamou com

desd��m. - N��o, s��o de Susie Rivers. Ela �� uma esp��-

cie de disc��pula.

- Ele tem v��rias - alfinetou Cary, recebendo um

olhar fulminante de Liv. - Sente-se, querida. Aposto

que Rafe vai adorar mostrar o seu trabalho depois do

banho.

Quando Rafe voltou para a sala, estavam todos

sentados, tomando caf��. Os cabelos ��midos reluziam,

e uma camisa azul e um jeans apertado real��avam o

corpo musculoso. Estava descal��o, e naquele breve

instante, Juliet sentiu como se soubesse tudo a seu

respeito. Bem, sobre a apar��ncia dele, corrigiu.

- Vou apanhar uma x��cara para voc�� - disse Liv.

- Eu mesmo pego - retrucou ele, dirigindo-se �� ban-

cada para servir-se. - Fico feliz de v��-los �� vontade.

- N��o, n��o fica. - Liv foi sarc��stica. - Sei que

prefere trabalhar sozinho.

- Espero que voc�� n��o pense que acreditamos que

ele andou trabalhando hoje, - implicou Cary. - Fa��a-

me o favor, n��o somos idiotas.

- Eu estava correndo - explicou. - Lamento se a

minha apar��ncia ofende a sua sensibilidade, Cary, mas

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





8 7


certas pessoas gostam de esticar as pernas de vez em

quando.

- Para variar de tanto rastejar, suponho - Cary

rebateu, ir��nico, e Juliet conteve um gemido. Nossa,

ser�� que ele estava decidido a brigar com o primo?

- Ora, quer calar a boca, Cary? - Liv, evidente-

mente, chegou �� mesma conclus��o.

- Com quem voc�� acha que est�� falando? - pro-

vocou Cary. Mas Liv n��o deu ouvidos. Em vez disso,

sorriu para Rafe.

- Acho que Juliet quer ver o seu trabalho, querido

- comentou, como se Juliet fosse incapaz de falar por

si mesma. - Quer que eu a leve ao ateli��? Assim voc��

poderia terminar o caf�� sossegado.

- Se Juliet quer ver o ateli��, eu mesmo mostro -

replicou Rafe. - �� o que voc�� quer? Decida-se. Preci-

so trabalhar.

Embora a ��ltima coisa que desejasse fosse ficar a

s��s com Rafe, que mal haveria em conhecer o ateli��?

- Hum... sim, eu adoraria - respondeu, ignorando

a express��o ultrajada de Cary. - Obrigada.

- Eu vou com voc��s - declarou Liv. Rafe suspirou.

Se Liv os acompanhasse, Cary tamb��m iria, e ele n��o

queria o primo por perto.

- O lugar �� apertado demais para todos - argumen-

tou, olhando enviesado para Liv. - Estou no meio de

um trabalho, e n��o quero que ningu��m veja.

- Ah...

Liv captou a mensagem, notou Rafe. Deixar Cary

ver os esbo��os para o retrato dela n��o seria a coisa

88

A N N E M A T H E R

mais sensata do mundo. Comentar aquele pequeno

detalhe picante durante o jantar, fingindo estar mor-

tificado quando o marido de Liv expressasse a sua

surpresa, seria t��pico de Cary.

- Ora... tudo bem - concordou Liv. - Cary e eu

vamos tomar outra x��cara de caf��.

Cary n��o se mostrou nada animado.

Liv o segurou pelo bra��o, e Juliet n��o conseguiu

distinguir se Cary ficou aborrecido ou lisonjeado. Mas

logo Rafe a conduziu em dire����o �� porta e outros

pensamentos substitu��ram a curiosidade.

Rafe seguiu �� frente, acendendo duas l��mpadas

para iluminar uma ��rea maior do que ela esperava,

segundo o que ele havia dito a Cary. Por��m, ela n��o

o culpava por n��o querer que o primo os acompa-

nhasse.

A porta se fechou. Ela e Rafe estavam sozinhos, ��

verdade, mas Juliet n��o se iludiu achando que ele tinha

planejado tudo. Ao contr��rio, quando Rafe tirou uma

tela do trip�� armado em um canto do ateli��, e guardou-a

nos fundos, Juliet pressentiu que ele tamb��m n��o dese-

java que ela visse a "obra inacabada".

-�� muito... impressionante - comentou Juliet,

espiando em volta. A mesinha estava entulhada de

esbo��os, enquanto d��zias de telas repousavam empi-

lhadas num canto.

- �� confort��vel. Mas voc�� n��o queria mesmo ver

o meu trabalho, queria?

- Sim. Queria mesmo. �� muito... interessante.

Quanta conversa fiada. Rafe contraiu o maxilar.

- Se voc�� acha.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





8 9


- O que h�� de espantoso em querer ver o seu tra-

balho? Se est�� pensando no que aconteceu ontem ��

noite, esque��a. Eu j�� me esqueci.

- �� bom saber que n��o sou inesquec��vel.

Juliet lamentou sentir-se t��o vulner��vel.

- Quer conversar a respeito? �� o que tentou dizer?

- Ei, quem tocou no assunto foi voc��, n��o eu.

- Eu sei, mas... ora, aquilo n��o devia ter aconteci-

do. Voc�� sabe disso t��o bem quanto eu. Ent��o, posso

ver alguma coisa?

- Voc�� sempre muda de assunto assim, de repente?

Eu ainda tenho d��vidas de que voc�� n��o usou essa

visita como pretexto s�� para ficar a s��s comigo.

Irritada, Juliet encarou-o.

- Sou noiva do Cary. Isso pode n��o ser importan-

te para voc��, mas �� importante para mim.

- �� mesmo? Sabe, n��o foi essa a impress��o que eu

tive ontem.

- N��o, bem... Eu n��o esperava.

- Acredite ou n��o, nem eu. Cary contou onde pas-

sou a noite? Ele encontrou os tais "amigos"?

- Eu n��o perguntei.

- N��o? - Nenhuma resposta deixaria Rafe mais

satisfeito. - Voc�� n��o liga?

- N��o �� da sua conta.

- Ent��o... o que voc�� quer dizer? Que voc��s t��m

um relacionamento aberto?

- Podemos conversar sobre outra coisa?

- Voc�� �� quem manda.

Mas Rafe n��o conseguiu deixar de pensar no rela-

cionamento dela com o primo. Ser�� que Juliet s��





9 0


A N N E M A T H E R

estava enrolando Cary at�� aparecer coisa melhor?

Era poss��vel, mas Rafe descartou a id��ia. E censurou-

se por querer algo que n��o podia - e tampouco deve-

ria - ter.

Obrigando-se a n��o reparar na maneira como ela

empinou os seios delicados ao cruzar os bra��os, Rafe

dirigiu-se ��s telas encostadas na parede r��stica. Des-

virou uma delas, revelando o retrato de um velho

pescador sentado na beira do cais.

Juliet n��o conteve um murm��rio de admira����o.

- �� seu? Meu Deus, ele parece vivo! �� uma pessoa

de verdade?

- Era. - Rafe postou-se ao lado de Juliet, conven-

cendo-se de que foi para ter a mesma perspectiva da

tela. - O nome dele era John Tregaron. A sua fam��lia

vive em Polgellin desde sempre.

- Incr��vel!

- O qu��? A fam��lia dele morar aqui h�� centenas de

anos?

- N��o - admitiu, cabisbaixa. - Sabe o que eu que-

ro dizer. As pessoas j�� devem ter elogiado o seu tra-

balho antes.

- Obrigado.

- Meu pai era um grande admirador de certos

pintores. Aprendi com ele o pouco que sei sobre

arte.

- Tamb��m tenho os meus favoritos. Quando eu era

mais novo, costumava ir a qualquer exposi����o. Co-

mecei gostando de William Turner e um contempo-

r��neo dele chamado Thomas Girtin. J�� ouviu falar?

Infelizmente, Girtin morreu com vinte e poucos anos.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

91

Reza a lenda que Turner dizia que, se Tom Girtin

continuasse vivo, ele passaria fome.

- Voc�� acredita nisso?

- N��o, Turner era ��nico. Mas os dois estudaram jun-

tos, e as primeiras obras de ambos eram semelhantes.

Juliet ficou impressionada e cometeu o erro de

olhar para Rafe. E n��o conseguiu desviar os olhos,

hipnotizada pelo s��bito ardor da sua express��o.

Contudo, Rafe desviou a aten����o.

Embora determinado a resistir ��quela atra����o do-

entia, n��o podia negar o desejo implac��vel que o

consumia.

- Voc��... tem outra coisa para me mostrar? - Juliet

sugeriu, nervosa, e Rafe ignorou a inocente conota����o

sexual da pergunta para apanhar um desenho em ta-

manho natural da pr��pria Lady Elinor.

- Oh... puxa! Eu n��o sabia que Lady Elinor j�� veio

aqui.

- Ela n��o veio. Eu fiz de cabe��a.

- Ora, �� muito bom.

- Fico feliz que goste.

Juliet sorriu, e o contorno dos l��bios conferiu ao

rosto uma beleza perigosa. Perigosa porque ela era

uma tenta����o e n��o sabia.

- Eu gosto do seu trabalho - comentou, descontra��da.

- O que n��o significa que eu goste de voc��.

- Fiquei magoado. - Rafe hesitou e, ent��o, algo

lhe ocorreu. - O seu pai gostava do seu marido?

- Meu pai? Eu... ele nunca conheceu David. Mor-

reu logo depois que terminei o ensino m��dio.

92

A N N E M A T H E R

- Lamento.

- Sim, eu tamb��m. Se ele fosse vivo, talvez eu n��o

cometesse tantos erros.

- Como o seu casamento?

- Pode-se dizer que sim. Papai n��o confiaria todo

o dinheiro dele a David.

- Voc�� fez isso?

- Sim. Sei que fui uma boba. Voc�� n��o me despre-

za mais do que eu mesma.

- Por que eu a desprezaria? Esse David deve ser

um tremendo canalha!

- Nem me diga.

- Mas bonito, aposto. Foi por isso que se casou

com ele?

- N��o sei direito por que me casei com ele. Papai

havia acabado de morrer. Eu cometi um erro. V��rios

erros, na verdade. Mas vou superar.

- E acha que Cary ir�� ajud��-la?

Oh, c��us! Juliet fechou os olhos. Por um breve

instante, esquecera-se o motivo de estar ali. Gra��as a

Deus, n��o dissera nada comprometedor. Mas n��o era

f��cil mentir, principalmente para Rafe.

O que era outro erro.

- Hum... tomara que sim - retrucou ela. - Bem, eu

n��o tenho dinheiro algum, portanto, acredito que ele n��o

vai se casar comigo por causa disso.

- Ent��o, por que ele vai se casar com voc��?

- Porque ele me ama, suponho. Por que n��o per-

gunta a ele?

- N��o �� necess��rio. Ah, Juliet, quando voc�� vai

aprender?

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9 3


Ela engoliu em seco.

- Voc�� n��o sabe de nada.

- N��o mesmo? Acho que conhe��o Cary melhor do

que voc��.

- Ah, claro. Ent��o, quando foi a ��ltima vez que

voc�� dormiu com ele?

- Eu n��o me deito com cobras.

- Nem eu. Ali��s, eu n��o imaginava que voc�� fosse

t��o exigente. N��o a julgar pela sua atual... como se

chama mesmo... obra aberta?

- N��o est�� insinuando que ando dormindo com Liv

Holderness, espero?

- E n��o est��? Bem, �� o que ela quer. A mulher n��o

tira os olhos do seu bumbum!

O rid��culo da situa����o levou um sorriso involun-

t��rio aos l��bios de Rafe.

- Ora, n��o sei por que se importaria com isso. Cary

n��o �� o bastante para voc��?

- Que id��ia repulsiva!

Rafe reconheceu que falou mais do que devia.

Mesmo assim, irritou-se porque ela n��o enxergava as

mentiras de Cary.

Desistindo de continuar aquela conversa, Rafe

guardou o quadro e o desenho. Precisava manter a

aten����o no trabalho, censurou-se.

Enquanto isso, Juliet tentava controlar o impulso

de dar um chute no seu traseiro arrogante. Rafe ofe-

receu a oportunidade perfeita quando se abaixou para

colocar as telas no lugar, o jeans revelando as n��degas

rijas e as pernas musculosas. Quem Rafe pensava que

era, para falar com ela daquele jeito? Se a id��ia n��o 9 4

A N N E M A T H E R

fosse t��o rid��cula, ela acharia que ele a desejava. O

que era o maior absurdo.

- Eu vou voltar l�� para cima. Vi tudo o que eu

queria ver.

Rafe virou-se, levantando-se.

- Bem, j�� �� alguma coisa.

- Voc�� adora se divertir ��s minhas custas, n��o ��?

- Querida, j�� tem gente demais fazendo isso - acres-

centou, ��spero, antes de perceber a crueldade do que

disse. Mas, droga, ela era ing��nua demais, e se ele n��o

falasse nada, com certeza ningu��m mais falaria.

- Sabe... voc�� critica o Cary, mas pelo que vejo,

voc�� n��o �� t��o diferente.

- Besteira!

- N��o �� mesmo. Os dois pensam que sabem tudo

sobre as mulheres, mas n��o sabem nada.

- Voc�� acha que o problema �� esse?

- E n��o ��?

- N��o. - Suspirou. - Encare os fatos, Juliet. Voc��

n��o sabe nada sobre os homens. Tudo bem, voc�� foi

casada e se divorciou, e devia ter aprendido alguma

coisa, mas n��o aprendeu. Sen��o, eu n��o me sentiria

t��o respons��vel.

- N��o h�� motivo nenhum para que se sinta respon-

s��vel por mim, sr. Marchese. J�� sou bem grandinha

para saber o que fa��o.

- ��, claro.

- Sabe de uma coisa, sr. Marchese? Acho que toda

este serm��o sobre responsabilidade �� apenas um dis-

farce para o que voc�� realmente quer.

- Por exemplo?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





9 5


- A oportunidade de tomar o lugar de Cary como

leg��timo herdeiro - declarou sem pensar, e ent��o

quase desmaiou de medo quando Rafe agarrou-lhe o

pulso.

- Retire o que disse - rosnou ele, a express��o

amea��adora. - Dio - resmungou, os olhos quase ne-

gros. - Esse anel! - Rafe notou o anel de noivado e

segurou-lhe a m��o. - Onde voc�� pegou isso? Foi Cary

quem lhe deu?

Juliet engoliu em seco.

- Eu... Lady Elinor... me d-deu - gaguejou, sentin-

do os dedos fortes de Rafe cravados na pele. - Eu...

s�� peguei emprestado.

- Emprestado?

Rafe encarou-a incr��dulo e Juliet explicou tudo,

embora ele n��o merecesse.

- N��s... Cary n��o comprou um anel... ainda. E a

sua... sua av�� disse que, como os Holderness v��m

jantar essa noite, eu... devia usar um.

- E ela lhe deu esse? - Rafe sabia que n��o devia

questionar as atitudes da av��, mas n��o conseguiu

controlar uma onda de ressentimento.

- �� s�� emprestado - repetiu Juliet, sem entender.

Mas havia algo de errado.

- Voc�� acha mesmo que Cary deixar�� que devolva

isso? Perdoe-me se eu disser que duvido. E duvido

muito.

- Certamente isso �� problema de Lady Elinor, n��o

seu. O anel �� dela.

- Pertencia �� minha m��e. Vov�� lhe deu de presen-

te quando ela completou 21 anos.

96

A N N E M A T H E R

- Oh, Deus! - Juliet ficou horrorizada. - Eu n��o

fazia id��ia.

- N��o. - Rafe acreditou nela.

- Ela... eu... Lady Elinor contou que ganhou o anel

quando era menina, e jamais sonhei que...

- Esque��a. - Bruscamente, Rafe a soltou e recuou.

- Eu n��o devia ter reagido assim. Vov�� pegou o anel

de volta quando a minha m��e... quando ela morreu.

Eu n��o quis e acho que ela se sentiu no direito de

fazer com ele o que bem entendesse.

- Mas... eu posso devolver. Realmente n��o preciso

de anel nenhum...

- E ag��entar que ela me culpe por estragar a noite?

Melhor n��o. Eu n��o devia ter mencionado nada.

Mas era importante e Juliet julgou saber por que

Lady Elinor ficara t��o contente quando ela escolheu

justo aquele anel. Ela sabia que Rafe o reconheceria.

Por isso havia perguntado se ele vira o anel ontem ��

noite. Por��m, Juliet n��o queria tomar parte em nenhum

plano para mago��-lo.

Cabisbaixa, seguiu ��s cegas na dire����o da porta. A

situa����o era muito mais complicada do que imaginou

e j�� vira o bastante.

- Encontro voc�� l�� em cima - disse ela, virando-se

para encarar Rafe. E soltou um grito agudo. Estava

t��o ansiosa para alcan��ar a escada que n��o olhou por

onde pisava. E antes que percebesse, trope��ou na tela

que ele havia encostado na parede quando chegaram.

A tela balan��ou e Juliet a segurou. E ao faz��-lo, um

punhado de esbo��os que estavam atr��s do quadro

ca��ram espalhos pelo ch��o.

CAP��TULO NOVE

LOGO depois, Juliet ficou tonta e apoiou-se na parede,

sem saber se por causa do nervosismo ou por ver os

esbo��os. Sem d��vida, as imagens do corpo nu de Liv

a deixaram atordoada. Santo Deus, os dois tinham

um caso. Por que outra raz��o Liv estaria deitada no

sof�� de Rafe, completamente nua? N��o era de se

admirar que ela o tratasse com aquele ar de proprie-

t��ria. Rafe n��o se importava por Liv ser uma mulher

casada?

Ali��s, Rafe tamb��m n��o se incomodou com o fato

de que ela e Cary fossem noivos. Como ele ousava

criticar Cary? Comparado a Rafe...

Mas a cabe��a girava e o calor na sala era sufocan-

te. At��nita, Juliet virou-se, enquanto Rafe correu para

acudi-la.

- Mulher est��pida - resmungou, segurando-a pela

cintura. - Por que diabos n��o olha por onde pisa?

Juliet tremia tanto que mal encontrou palavras para

se defender. E a verdade �� que, sem o amparo de Rafe,

talvez se estatelasse no ch��o.

- Lorde Holderness sabe que a esposa dele posa

nua para voc��?

Rafe suspirou. E xingou a si pr��prio por deixar os

esbo��os �� vista.





9 8


A N N E M A T H E R

- N��o. Estou pintando um retrato de Liv para o

anivers��rio do marido dela. Ser�� uma surpresa, por-

tanto, agrade��o se guardar segredo.

- Minha nossa, voc�� deve me achar uma comple-

ta idiota!

- �� verdade - Rafe retrucou, obstinado. E quando

Juliet tentou se esquivar, ele a segurou pelos pulsos e

puxou-a para si. - Eu n��o minto. Se eu tivesse um

caso com Liv, acha que eu estaria aqui com voc��?

- Eu s�� pedi para ver o seu trabalho.

- E eu relutei para mostrar.

- Por causa da Liv.

- N��o, por causa disso - sussurrou Rafe, tenso e,

envolvendo Juliet nos bra��os, beijou-a.

Ele havia se aproveitado da sua fraqueza, Juliet

pensou consigo mesma mais tarde. Por isso ela n��o

havia conseguido det��-lo quando Rafe entreabriu seus

l��bios com a l��ngua. Ap��s sentir o contato inconfun-

d��vel da excita����o dele, foi muito f��cil render-se ��s

emo����es. E quando Rafe ro��ou os dedos na base dos

seios, Juliet sentiu uma vontade incontrol��vel de

colar seu corpo no dele.

Os sentidos ficaram inebriados e, de repente, a

no����o de que fingia ser a noiva de Cary se perdeu no

prazer sensual que Rafe despertou no seu ��ntimo. A

for��a do pr��prio desejo sufocou todo o rancor. Juliet

queria que Rafe a beijasse. Santo Deus, queria que

ele fizesse muito mais do que isso.

Conforme devassava a boca de Juliet com a l��ngua,

Rafe sentiu-se dominar por uma paix��o avassaladora.

Ele a desejava, pensou. Ele a queria com um deses-

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





9 9


pero que jamais havia experimentado. Estavam sozi-

nhos aqui. Mas poderiam contar que n��o seriam fla-

grados por Liv, ou Cary? Adoraria possu��-la no sof��,

e apagar da mente as imagens do corpo nu de Liv.

- Eu quero fazer amor com voc�� - confessou,

percorrendo a nuca ��mida com os l��bios, mordiscan-

do a carne com um ardor voluptuoso. Juliet gemeu

baixinho e as m��os de Rafe tremeram um pouco

quando ele abaixou a blusa dela at�� os ombros. A pele

era t��o macia, as al��as finas da lingerie mal disfar��a-

vam os bicos tenros dos seios.

Com o indicador, Rafe percorreu o queixo, a gar-

ganta, descendo at�� o vale logo abaixo do decote da

camiseta. Ent��o, abaixou a cabe��a e repetiu o gesto

com a l��ngua, deliciando-se com o sabor levemente

salgado da pele ��mida. Jamais sentira uma descarga

emocional t��o forte, jamais sentira o sangue pulsar

com tanta for��a nas veias.

- Voc�� tem um gosto t��o bom - sussurrou, enquan-

to Juliet acariciava os seus l��bios com os polegares,

de maneira sensual. Rafe perdeu o controle, abriu a

boca e cravou os dentes no relevo macio, at�� Juliet

choramingar. Em seguida, baixou as al��as da lingerie

e enterrou o rosto entre os seios.

Juliet foi incapaz de resistir, estava em brasas e se

sentia viva, alerta, a cada gesto provocante de Rafe.

Sentir uma das pernas dele aninhada entre as coxas fez

o ponto mais sens��vel do seu corpo palpitar, inundado

de desejo. Rijo e pulsante, Rafe a agarrava com for��a.

A vontade de possu��-la era desesperadora. Rafe s��

conseguia pensar em mergulhar na umidade c��lida do

100

A N N E M A T H E R

corpo de Juliet, e deixar-se envolver pelos m��sculos

tensos at�� sentir dor. Beijou-a com mais paix��o, im-

prensando-a contra a parede, explorando a boca de

Juliet com mais voracidade ainda.

Quando Rafe aprisionou seu corpo contra o dele,

Juliet se deliciou com tamanho arroubo de lux��ria.

Impaciente, ela se contorcia, louca para ser tocada por

inteiro. E, particularmente, naquele lugar secreto que

ansiava por ser possu��do.

- C��us, fique quieta! - Rafe resmungou, rouco.

Jamais chegou t��o perto de perder o controle. Se ela

n��o parasse de se mexer...

De repente, por��m, Juliet paralisou. Foi como se

a brusca rispidez daquelas palavras quebrassem o

encanto da loucura que os dominou.

- O que voc�� disse? - indagou hesitante, agora

repelindo Rafe.

- Droga, Juliet...

- Me solta!

- Ah, pelo amor de Deus...

Rafe estava descal��o e, quando ela pisou no seu

p��, ele gritou de dor.

- O que voc�� esperava? - indagou zangada. - Voc��

acha que, me seduzindo, conseguiria apagar o despre-

zo que sinto pelo modo como trata o marido de Liv.

Voc��... me atacou! Voc�� �� totalmente... totalmente

imoral!

- Ah, cai na real! - disse Rafe, ofendido. Havia se

deixado abater pelo insulto de Juliet, e uma n��tida

sensa����o de tristeza o abalou. - Beijar voc�� n��o teve

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





101


nada a ver com aqueles esbo��os da Liv. Por favor, ��

o meu trabalho. Eu sou um pintor!

- Tanto faz...

- Tanto faz? Nada disso. Voc�� n��o tentou me ma-

chucar porque a beijei. Voc�� apenas percebeu que

gostou e sentiu-se culpada por enganar o tolo do meu

primo l�� em cima!

D E P O I S que Liv saiu, Rafe continuava mal-humorado.

Lembrou-se que, para o seu al��vio, Juliet n��o men-

cionara nada do que se passou no ateli�� e foi logo

embora com Cary. Liv, entretanto, pareceu desconfiar

do isolamento prolongado dos dois, mas teve o bom

senso de n��o abrir a caixa de Pandora hoje. Mesmo

assim, Rafe sugeriu que adiassem o compromisso para

a pr��xima semana.

- Estou com dor de cabe��a - alegou, embora o que

realmente o afligisse fosse uma excita����o que se re-

cusava a passar.

Mais tarde, um banho frio resolveu o problema e

Rafe acabava de sair do boxe quando o telefone tocou.

Enrolou-se na toalha e atendeu, impaciente.

- Sim - falou r��spido, torcendo para n��o ser ne-

nhum cliente, e ent��o conteve um palavr��o quando

escutou a voz autorit��ria de Lady Elinor.

- Raphael! Raphael, �� voc��?

- J�� que este �� o telefone do meu apartamento, eu

diria que h�� uma grande chance de que seja eu. O que

voc�� quer, vov��?

- Parece que voc�� farreou a noite toda e est�� de res-

saca - Lady Elinor disse, afinal. - Voc�� viu o Cary?

102

A N N E M A T H E R

- Por que a pergunta?- indagou, imaginando se

Juliet havia comentado algo. Mas n��o. Ela e Cary mal

tiveram tempo de voltar a Tregellin.

- Porque creio que ele e Juliet foram para Polgellin

Bay essa manh��. Juliet queria ver o seu trabalho.

- Eles j�� foram. - Se n��o contasse a ela, Cary

certamente contaria. Ali��s, a presen��a de Liv desper-

taria certa curiosidade discreta - ou, no caso de Cary,

n��o t��o discreta.

- E voc�� lhe mostrou os quadros? Ela �� uma garota

t��o simp��tica, n��o ��? N��o �� nada do que esper��vamos.

- Do que voc�� esperava, quer dizer. Eu sequer tinha

alguma opini��o.

- Mas agora a conheceu. Voc�� deve ter formado

alguma opini��o sobre o car��ter dela. Josie contou que

voc��s dois conversaram ontem �� noite.

- O que voc�� quer que eu diga, vov��? Que gosto

dela? Que invejo a sorte de Cary? Voc�� gosta dela.

N��o basta?

- Raphael, s�� estou pedindo a sua opini��o.

- Jura? - Rafe irritou-se e perdeu a compostura.

- Voc�� acha que eu quero fazer sexo com ela? �� isso

que quer ouvir?

Se Rafe esperava que Lady Elinor ficasse ofendi-

da, enganou-se redondamente. Ela soltou uma garga-

lhada.

- E voc�� quer? Pobre Cary. Ele n��o faz id��ia do

que ter�� de enfrentar.

- As vezes, voc�� �� uma bruxa m��. Olha, onde pre-

tende chegar com isso? Porque estou s�� de toalha.

- Ent��o, n��o vai falar sobre Juliet?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

103

- Falar o qu��? �� ��bvio que voc�� gosta dela. O

bastante para dar-lhe o anel da minha m��e.

- Ah! - Rafe teve a sensa����o de que essa era a

deixa que a av�� esperava. - Voc�� notou.

- Seria imposs��vel n��o notar, n��o ��?

- Se pensa assim, querido. Devo entender que voc��

se op��e �� minha generosidade? Ou est�� com medo de

que Cary possa afanar o anel antes que voc�� o recu-

pere?

- N��o h�� a menor chance disso acontecer, n��o ��?

Em todo o caso, o anel �� seu. Pode fazer com ele o

que bem entender.

- Sim, posso. Mas n��o foi por isso que liguei.

Quero que venha jantar aqui esta noite. Voc�� n��o tem

nenhum compromisso, tem?

- Voc�� est�� brincando!

- N��o.

- De jeito nenhum.

- Raphael, n��o fa��a assim. Voc�� n��o gostaria que

a sua av�� ficasse segurando vela, n��o ��? Os Holder-

ness tamb��m v��m, voc�� sabe.

- E isso me interessaria porque...?

- Sei que voc�� e Lady Holderness s��o velhos ami-

gos.

- Somos amigos. J�� contei qual �� a minha rela����o

com Liv. Ela passou aqui esta manh��, na verdade. Ela

e os seus h��spedes chegaram juntos.

- Que simp��tico! Bem? O que me diz?

Voltar a Tregellin enquanto Juliet estivesse l�� n��o era

boa id��ia. E v��-la com Cary... Rafe encolheu os ombros.

Ele seria muito burro se aceitasse o convite...





1 0 4


A N N E M A T H E R

D E S A N I M A D A , Juliet arrumou-se para o jantar. Por��m, lembrou-se, era a ��ltima noite em Tregellin. Amanh��

eles partiriam cedo e ela poderia tirar Rafe Marchese

da cabe��a.

E esqueceria tudo o que aconteceu naquele dia,

acrescentou. Minha nossa, o que deu nela para per-

mitir que aquele homem a tocasse outra vez? O su-

jeito era um descarado.

E quanto ��quela hist��ria do retrato de Liv Holder-

ness? Seria poss��vel que Lorde Holderness quisesse

que todo mundo visse a esposa nua? Claro, podia ser

s�� um pretexto de Liv para visitar Rafe. Mas por melhor

que fossem, era improv��vel que os esbo��os se trans-

formassem em um retrato em tamanho natural.

Uma natureza morta, talvez, pensou maliciosa. No

entanto, apesar das reservas, ela precisava admitir que

o talento de Rafe era extraordin��rio.

Deveria estar preocupada com o que Lady Elinor

faria, caso revelasse o seu segredinho s��rdido. Inevi-

tavelmente, Cary ficaria humilhado. Ele jamais a

perdoaria. Por��m, pensou Juliet, isso seria t��o ruim

assim?

E ela precisava enfrentar aquele jantar, pois era

algo que devia a si pr��pria. Ela n��o era m�� pessoa,

pensou. Era s�� ridiculamente ing��nua e fraca.

O vestido preto de renda, com forro de cetim e

mangas de chiffon, era lindo. Um pouco acima da

altura dos joelhos, mas as meias de seda pretas escon-

diam as coxas esguias. As sand��lias de saltos de dez

cent��metros amea��avam torcer um tornozelo, mas

eram o ��nico par de sapatos no estilo da roupa.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

105

Juliet hesitou ao escolher que brincos usar e, enfim,

optou pelas argolas douradas que combinavam com

o colar. Colocou o anel de rubi com certa relut��ncia.

Desde que Rafe lhe contara a quem pertencia a j��ia,

ela se sentia ainda pior ao us��-lo.

Mas Rafe n��o iria ao jantar, portanto, ela poderia

relaxar. E at�� inventar que esqueceu o anel na manh��

seguinte, e enfrentar a ira de Cary quando voltassem

a Londres.

Juliet se olhou no espelho e saiu do quarto. Passa-

va pouco das 19h30, mas suspeitava que Lady Elinor

j�� estivesse aguardando as visitas na sala.

Escutou vozes no corredor e ficou nervosa. J��

enganara quatro pessoas e n��o ansiava para enganar

uma quinta. E se algu��m perguntasse algo que n��o

conseguisse responder?

Juliet sentiu-se t��o tensa ao entrar na sala, que

pensou que estivesse tendo alucina����es. O homem de

p�� ao lado da lareira era muito familiar. Todo vestido

de preto - cal��a social, camisa de gola rul�� e at�� o

palet�� de veludo preto - Rafe parecia �� vontade. O

sujeito encharcado de suor que os recebera de manh��,

ou o artista descal��o com quem trocara aqueles beijos

avassaladores, talvez fossem dois estranhos. Este era

Rafe Marchese, o neto de Lady Elinor.

Juliet engoliu em seco e Lady Elinor, sentada no

sof��, acenou simp��tica.

- Entre, querida - disse ela. - Pensei em convidar

Raphael para unir-se a n��s. Raphael, por que n��o

oferece um drinque a Juliet?

CAP��TULO DEZ

L A D Y Elinor esperava que Juliet acompanhasse Rafe

at�� o arm��rio de bebidas. Na verdade, uma vodca pura

n��o cairia mal, mas era mais sensato manter a cabe��a

no lugar.

- O que vai ser? - indagou Rafe, percebendo a sua

relut��ncia. Droga, ele tamb��m preferia n��o estar aqui.

- Xerez... ou uma bela dose de cicuta com gelo?

Juliet fitou-o, aborrecida.

- Suponho que esteja se divertindo, n��o ��? - cochi-

chou. - Por que n��o contou que viria?

- Voc�� acreditaria se eu dissesse que s�� soube

disse ontem?

- N��o.

- Mas �� verdade. A vov�� gosta de manter os con-

vidados na coleira. N��o reparou nisso?

- N��o tive tempo ainda.

- Verdade? Para mim �� como se voc�� estivesse

aqui h�� semanas.

- Por que tenho a sensa����o de que isso n��o foi um

elogio?

- O que voc��s dois est��o fazendo? - Rafe n��o

demonstrou surpresa diante da irrita����o da av��. - N��o

sabem que cochichar �� falta de educa����o?

Juliet virou-se.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

107

- Desculpe...

- Ela ainda n��o resolveu o que quer - explicou

Rafe. - Vamos, Juliet. Decida.

Juliet lan��ou-lhe um olhar fulminante.

- Xerez. Obrigada.

- O prazer �� meu.

Lady Elinor observou Juliet com aten����o.

- O que Raphael lhe falou? Alguma coisa inade-

quada?

- N��o. Eu... Rafe... quer dizer, Raphael s�� sugeriu

o que... o que eu devia tomar.

- S�� isso? Voc�� n��o andou intimidando a mo��a,

n��o ��, Raphael?

- Ora, por que voc�� pensaria uma coisa dessas,

vov��? N��s mal nos conhecemos.

- Mas ela visitou o ateli�� hoje de manh�� - insis-

tiu Lady Elinor, que tornou a dirigir-se �� h��spede.

- Raphael lhe mostrou algum trabalho dele?

- Oh, sim - confirmou Juliet, evitando olhar para

Rafe.

- E, o que achou? O menino tem talento?

O menino! Juliet conteve um gemido.

- Eu... aposto que sim. Mas... n��o sou nenhuma

especialista.

- A resposta clich�� - Lady Elinor retrucou, irritada.

- Voc�� mora em Londres, n��o mora? Deve ter visitado

outras galerias.

- Eu n��o tenho uma galeria, vov�� - interveio Rafe.

- E n��o pode esperar que Juliet lhe d�� um relat��rio.

- �� claro que voc�� diria isso. Ah, onde est�� o Cary?

Os Holderness chegar��o logo.

108

A N N E M A T H E R

- Na verdade, achei uma das pinturas que ele me

mostrou incrivelmente boa - Juliet comentou de re-

pente, lamentando ser t��o impulsiva quando o supos-

to noivo entrou saltitante na sala.

- S��rio? - Apesar de reclamar do atraso do neto,

agora Lady Elinor ignorou Cary para observar Juliet.

- Por que me deixou pensar que n��o tinha ficado

impressionada com o trabalho de Raphael?

- Porque n��o ficou! - Cary exclamou, desdenho-

so, intrometendo-se na conversa. - Santo Deus, vov��,

foi por isso que nos chamou aqui? Para espionar de

gra��a?

- Cuidado com a l��ngua, Cary. Para algu��m que

ganha a vida como seguran��a de um cassino, n��o creio

que deva criticar o seu primo por tentar conquistar o

sucesso.

O queixo de Cary caiu.

- Quem lhe contou que trabalho em um cassino?

- perguntou Cary. - Se a Jules...

- N��o foi a sua noiva - Lady Elinor replicou, sar-

c��stica. - Nem o Raphael. N��o sou uma idiota com-

pleta, Cary. Tenho amigos na cidade. Eles me mant��m

informada sobre o que voc�� faz. E por que n��o? Voc��

n��o tem nada a esconder, tem?

- N��o!

Cary ficou indignado, e seu rosto vermelho denun-

ciou a mentira. Mais uma vez, Juliet lamentou ter se

envolvido nas arma����es dele. Independente do que

ela achava do comportamento de Rafe, o seu era

muito pior.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

109

Aliviada, ouviu vozes no corredor, anunciando a

chegada dos outros convidados. Ela se levantou para

cumprimentar Lorde e Lady Holderness com um

semblante am��vel. E se julgou o decote ousado e a

cal��a de seda bufante de Liv pouco adequadas, nin-

gu��m desconfiaria.

Robert Holderness beirava a casa dos 60 anos, um

homem cuja simpatia disfar��ava o orgulho da jovem

esposa. Vestindo palet�� preto e gravata, fez Liv entrar

na sua frente e cumprimentou Rafe antes de aceitar a

m��o estendida de Lady Elinor.

- Desculpe o atraso, Ellie - disse ele, e por um

instante, Juliet n��o entendeu a quem Lorde Holderness

se dirigiu. Ent��o, Elinor - Ellie - se aproximou e

Juliet notou que Rafe a observava.

- N��o se preocupe, Bob - Lady Elinor assegurou

contente. - E esta deve ser a sua nova esposa. Olivia,

n��o ��? Raphael contou que voc��s dois s��o velhos

amigos.

Liv mostrou-se surpresa.

- Eu... sim - admitiu, nervosa. - Que... casa ado-

r��vel a sua, Lady Elinor.

- Gosto dela. - A resposta da velha senhora n��o

mencionava o fato de que o lugar estava praticamen-

te caindo aos peda��os. - Raphael, voc�� faria a genti-

leza de oferecer um aperitivo aos convidados?

- Eu cuido disso. - Cary passou esbarrando pelo

primo e postou-se em frente ao arm��rio. - O que vai

querer, milorde? U��sque e soda? Um mart��ni?

- Talvez deva perguntar primeiro �� minha esposa

- argumentou Lorde Holderness, meio petulante.

Virou-se para Liv. - O que voc�� quer, meu anjo?

110

A N N E M A T H E R

- Ah... hum, vinho, por favor - disse ela, embora

Juliet reparasse que Liv olhava para Rafe, e n��o para

Cary. - Acho que voc�� devia tomar o mesmo, querido.

Lembre-se do que o dr. Charteris falou.

- Charteris �� uma comadre velha - declarou o

marido, e Lady Elinor bateu palmas.

- Bravo - disse ela. - Concordo em n��mero, g��ne-

ro e grau, Bob. J�� conhece Juliet, a noiva de Cary?

- Ora, n��o. - Lorde Holderness apertou a m��o de

Juliet. - Como vai, querida? Eu n��o sabia que o seu

neto tinha uma namorada firme.

- Nem a gente - Lady Elinor murmurou risonha,

mas o sorriso para Juliet implorava perd��o.

- Deixe-me apresentar a minha esposa - continuou

Lorde Holderness. - Aposto que as duas t��m muito

em comum. O que me diz, Olivia?

Juliet achou que Liv pareceu incomodada, mas n��o

conseguia simpatizar com ela. Pelo amor de Deus, a

mulher tra��a o marido.

- Para falar a verdade... - come��ou, ignorando a

s��plica nos olhos da outra. Mas antes que pudesse

revelar que havia conhecido Lady naquela manh��,

Cary os interrompeu.

- S��o dois vinhos ent��o, certo? - indagou, ressen-

tido por ter sido ignorado. E grata, Liv virou-se na

dire����o dele.

- Por favor. Tudo bem, Bobby?

- Tudo o que Lady Holderness mandar - o marido

declarou. - Eu apenas cumpro ordens.

- Ah, Bobby, isso n��o �� verdade - protestou Liv,

tomando a frente de Juliet outra vez. E Lady Elinor

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





111


aproveitou a oportunidade para convid��-la a se sentar

ao seu lado no sof��.

- Quero saber tudo sobre como os dois se conhe-

ceram - afirmou. - Bob �� t��mido demais quando se

trata de detalhes pessoais.

Sem d��vida, agora Liv parecia mesmo nervosa e

Juliet n��o a culpava. Ela pr��pria tinha passado por um

interrogat��rio semelhante.

- Ent��o... Juliet, n��o ��? H�� quanto tempo voc�� e o

neto de Ellie saem juntos? - Lorde Holderness, obvia-

mente, decidiu conduzir apropria investiga����o. - Voc��

conheceu Cary antes que ele fosse para a ��frica do

Sul?

- Eu... bem, sim - Juliet sentiu-se confusa, mas

para a sua surpresa, Rafe correu em seu aux��lio.

- Eles se conheceram quando eram crian��as - expli-

cou. - N��o �� mesmo, Cary? Antes de voc�� vir morar

aqui, certo?

Cary entregou as ta��as de vinho e lan��ou um olhar

ressentido para o primo.

- Voc�� sabe que sim - retrucou, ingrato.

- Foi o que pensei - Rafe comentou, risonho.

Enquanto observava os dois, Juliet sentiu-se im-

potente para intervir. Talvez acreditasse que Rafe s��

estava usando Cary para proteger o relacionamento

com Liv, mas agora ela receava contar a Lorde Hol-

derness que a esposa tinha um caso com um homem

mais jovem. Ele parecia ser um sujeito sincero demais

para ser magoado assim.

Felizmente, Cary mostrou-se mais disposto a me-

lhorar a impress��o que Lorde Holderness tinha dele





112


A N N E M A T H E R

do que a brigar com Rafe. E, enla��ando-a pela cintu-

ra, comentou:

- Eu me considero um homem de muita sorte,

milorde.

Rafe, assistiu ��s atitudes de Cary com uma irrita����o

injustificada. Ver o primo colocar as m��os em Juliet

provocou-lhe uma ira insuport��vel.

O que n��o era t��pico dele, pensou. Mantendo os

olhos afastados do rosto ruborizado de Juliet, Rafe

tentou analisar o que se passava em seu ��ntimo. Ora,

ele n��o era nenhum troglodita. Mas, pela primeira vez

na vida, Rafe devia aceitar que Juliet despertava-lhe

sentimentos que ele se recusava a analisar. Ele a que-

ria, reconheceu, frustrado.

Ou talvez, sem romantismo, quisesse apenas dor-

mir com ela. Voltando a prestar aten����o na conversa,

escutou Cary dizer:

- Liv �� uma mulher extraordin��ria - disse Cary.

- Sempre achei isso.

- J�� conhecia a minha esposa, Daniels?

- Oh... Bem, sim. Todo mundo conhece! Pela fama,

l��gico.

- Pela fama!

Lorde Holderness quase botou fogo pelas ventas

e Rafe sentiu-se obrigado a intervir.

- Acho que Cary quis dizer que, como filha de Ken

Melrose, Liv naturalmente conheceu muita gente. N��o

��, Cary?

- Bem, sim - resmungou Cary.

- Entendo, porque o pai dela �� dono do Dragon

Hotel - Lorde Holderness retrucou, mais calmo. - Mas

ela nunca trabalhou no bar, sabe.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





113


N��o? Rafe trocou um olhar c��mplice com Liv, mas

n��o desmentiu o lorde. Quando Josie apareceu para

anunciar que o jantar estava servido, foi um al��vio

geral.

Todos comeram no jardim de inverno, dispensan-

do a dignidade question��vel da sala de jantar. A pr��pria

Lady Elinor havia escolhido a arruma����o da mesa,

que presidia com eleg��ncia. Sugestivamente, ela e

Lorde Holderness sentaram-se nas cabeceiras, com

Juliet e Cary de um lado, e Olivia e Rafe do outro. Juliet

percebeu que Rafe a observou com uma freq����ncia

perturbadora durante a refei����o, e notou tamb��m a

indigna����o de Cary porque a av�� o colocou de frente

para Rafe.

- Que diabos ela pensa que est�� fazendo? - res-

mungou para Juliet, enquanto os outros debatiam os

pr��s e contras da independ��ncia da Cornualha. - ��

para me castigar, n��o ��? Porque ela descobriu que n��o

tenho um emprego chato na cidade.

- Rafe �� seu primo - ressaltou Juliet. - Pelo amor

de Deus, Cary, o que isso importa? Vamos para casa

amanh��.

- Eu sei. Mas preciso levar em conta o que ele fala

na minha aus��ncia.

- Voc�� �� paran��ico - Juliet protestou e, ent��o,

corou ao flagrar Rafe olhando na sua dire����o. - N��o

se esque��a, ele o livrou de uma enrascada hoje.

- ��. Me pergunto por qu��. O que acha? Ele e Liv

t��m um caso? Ela parece conhecer o apartamento dele

muito bem. E n��o gostou quando voc�� e ele voltaram

sozinhos ao ateli��, por mais simp��tica que parecesse.

114

A N N E M A T H E R

O est��mago de Juliet embrulhou. Ouvir a pr��pria

opini��o vinda de outra pessoa foi muito pior do que

acreditar que era a ��nica que sabia a verdade.

- Voc�� n��o est�� comendo, Juliet.

Lady Elinor percebeu que ela mal tocou no frango

temperado com alecrim.

- A h . . . n��o estou com muita fome - murmurou

sem gra��a.

- Voc�� n��o gosta de frango?

- C��us, sim. N��o �� a comida...

- Ent��o, �� o qu��...?

- Voc�� a est�� envergonhando, vov��. - Rafe encarou

Lady Elinor. - Por que n��o dedica as suas energias

para tocar a campainha e chamar a Josie? Aposto que

os convidados apreciariam outra garrafa deste exce-

lente Chardonnay.

Lady Elinor franziu os l��bios.

- Eu agradeceria se guardasse as suas opini��es para

si, Raphael - declarou irritada, e Juliet notou o sorri-

so triunfante de Cary perante a humilha����o de Rafe.

Mas as palavras de Rafe surtiram o efeito desejado e,

um segundo depois, Lady Elinor puxou a campainha.

Entretanto, Rafe reparou que isso n��o impediu que

ela lan��asse um olhar ressabiado para ele e Juliet, e

deduziu que o gesto de defender a mo��a n��o havia

passado despercebido.

Todos foram para a sala ap��s a sobremesa - um

delicioso pudim de frutas vermelhas. Desta vez, Cary

tratou de se sentar perto de Lorde Holderness, e depois

que Josie serviu o caf��, puxou a conversa ao comen-

tar, ingenuamente:

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





115


- Vov�� contou que voc�� mora num castelo, milor-

de. Que maravilha! �� muito antigo?

Lorde Holderness se aborrreceu.

- O que voc�� andou dizendo, Ellie? Sabe muito

bem que Trelawney �� s�� uma casa de campo.

- Creio que o que eu disse, na verdade, �� que Tre-

lawney lembra um castelo - retrucou, fuzilando o neto

ca��ula com o olhar. - Ali��s, n��o entendo porque isso

lhe interessaria, Cary.

- Ah, voc�� se engana. Sempre estou interessado

em im��veis antigos. Quer dizer, sempre me admiro

com as despesas de manuten����o hoje em dia. N��o

imagino como voc�� - voc��s dois - conseguem.

Agora Juliet ficou horrorizada.

- Apesar de tudo, conseguimos - Lorde Holderness

replicou, constrangido. - Sacrificar uma heran��a no

altar do capitalismo seria vergonhoso.

- Concordo. - Cary tentou soar sincero. - Amo essa

velha casa, mas ela est�� apodrecendo. Adoraria que

existisse um meio de ajud��-la, vov��. J�� pensou em ven-

der parte da terra? Para levantar algum capital de giro.

- Basta, Cary.

Foi Rafe quem falou. Juliet percebeu que ele ficou

furioso. Ela mesma se aborreceu, pensou, e sequer era

membro da fam��lia.

- N��o falei com voc�� - retrucou Cary. - Voc�� deve

concordar comigo, vov��. Tregellin vai desabar sobre

a sua cabe��a a menos que tome provid��ncias.

-Cary...

- Tudo bem, Raphael. Cary tem as pr��prias opini��es,

claro. E estou curiosa para conhecer os planos dele





116


A N N E M A T H E R

para Tregellin. Devo considerar a sugest��o de vender

a propriedade.

- A casa n��o - interrompeu Cary. - S��... uma ou

duas fazendas, talvez.

- Creio que sei o que �� melhor para Tregellin, Cary.

Agora - dirigiu-se a Lorde Holderness - a sua esposa

joga bridge, Bob?

N��o jogava, mas a anfitri�� a convenceu a aprender.

E com Cary, que ansiava por fazer as pazes, eles for-

maram duas duplas.

- Voc�� n��o se importa, n��o ��, Juliet? - indagou

Lady Elinor. - Raphael, entretenha nossa jovem h��s-

pede, sim? Mostre-lhe as pinturas da sua m��e. Voc��

encontrar�� uma ou duas na biblioteca.

CAP��TULO ONZE

RAFE abriu a porta da biblioteca para Juliet, que relu-

tava em entrar. Ele estava se esfor��ando muito para

tentar esconder a raiva que sentia de Lady Elinor. Ela

o havia manipulado, pois ele era a ��ltima pessoa cuja

companhia Juliet desejava. Droga, n��o queria passar

o resto da noite com uma mulher que n��o confiava

nele. N��o quando a presen��a dela era uma tenta����o

irresist��vel.

Outra fonte de irrita����o foi a presen��a de alguns

quadros da m��e. Durante todo o tempo em que viveu

em Tregellin, jamais vira qualquer uma das suas

aquarelas. De fato, sempre acreditou que a av�� havia

destru��do tudo ap��s a morte dela.

Agora, pasmo de assombro, Rafe respirou fundo.

Como sempre, os livros que o av�� colecionou quando

vivo enchiam duas paredes inteiras. No entanto, as

outras se transformaram numa aut��ntica exposi����o

n��o s�� das obras da m��e, mas tamb��m das suas.

Ilustra����es em pastel do crep��sculo nos canais de

Veneza se misturavam ��s paisagens r��sticas da Cor-

nualha. Rafe acreditava que as suas primeiras pinturas

foram adquiridas por colecionadores an��nimos.

- Dio - exclamou, perplexo.

Juliet lan��ou-lhe um olhar ressentido.

118

A N N E M A T H E R

- Ei, eu n��o gosto disso mais do que voc��! - exas-

perou-se. E ent��o, notando a express��o dele - Qual ��

o problema?

- Nada. Tudo. H�� quanto tempo ser�� que a vov��

guarda isso?

- As pinturas da sua m��e? Essas aquarelas s��o

dela?

Rafe confirmou.

- Ela amava a It��lia. Especialmente a Toscana.

Passamos muito tempo l�� quando eu era novo.

- Quantos anos voc�� tinha quando a sua m��e fale-

ceu? - curiosa, Juliet deixou escapar. - N��o responda.

N��o �� da minha conta.

- Eu tinha 7 anos. N��o havia ningu��m para cuidar

de mim, ent��o as autoridades me mandaram para a

Inglaterra.

- Para a sua av��?

- Sim. No come��o, eu detestei. Faz muito frio na

Inglaterra!

Juliet imaginou como deve ter sido terr��vel. Ela

quis perguntar onde o pai dele se encontrava na ��po-

ca, mas seria indiscri����o demais.

- E voc�� n��o sabia que Lady Elinor possu��a esses

quadros?

- Entrei aqui, nesta sala, h�� menos de uma semana.

Nenhum deles estava aqui.

- As suas pinturas, quer dizer?

- Pode-se chamar assim. Eu pintei esses... oh,

talvez h�� 15 anos.

- E o que aconteceu com eles?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





119


- Recebi um telefonema de um advogado de Bodmin,

que disse ter ouvido falar do meu trabalho. Ele veio,

viu tudo e disse que gostou. Pensei ter tido sorte por

encontrar um comprador. At�� senti pena do pobre

diabo.

- N��o seja t��o severo. S��o todos muito bons. Esse

advogado deve ter pensado o mesmo, ali��s.

- Ah, n��o. Voc�� n��o entende que... n��o havia advo-

gado algum? S�� a vov�� me manipulando outra vez.

Eu ainda morava aqui, em Tregellin. N��o tinha casa

pr��pria, mas ela sabia que eu tinha improvisado um

ateli�� numa das cocheiras. E ela n��o perdia a chance

de dizer que eu jamais conseguiria produzir nada

decente. Repetia a mesma coisa para a minha m��e.

Por isso ela se recusou a voltar para a Inglaterra.

- Ent��o, por que ela comprou os quadros?

- Quem sabe? Outro dos joguinhos dela, talvez.

Se, por um incr��vel golpe do destino, eu me tornar

bem-sucedido, ela poderia mostr��-los e alegar que

sempre soube que eu era talentoso. Sen��o, ningu��m

acreditaria.

- Voc�� acredita que ela �� t��o maquiav��lica assim?

- ��s vezes ��, portanto, cuidado.

Ser�� que Rafe estava tentando avisar que Lady

Elinor tinha um plano para ela, tamb��m?

- Isso n��o me diz respeito.

- Mas dir��, quando se casar com Cary - afirmou

Rafe, calando seus l��bios com o polegar. Foi um

gesto t��o sensual que Juliet imaginou se a raiva o

cegara para as pr��prias atitudes.

120

A N N E M A T H E R

- Voc�� vai mesmo se casar com aquela porcaria de

homem?

- Ele n��o �� uma porcaria de homem. E voc�� n��o

est�� em posi����o de julgar. - Esquivou a cabe��a para

evitar aquela car��cia ��ntima, mas s�� conseguiu desviar

o foco da aten����o de Rafe, cujos dedos longos afaga-

ram os m��sculos tensos da nuca.

Juliet podia sentir a for��a fluida com a qual Rafe

a segurava, conforme explorava a pele sens��vel das

suas costas. Tudo o que Juliet sentia eram aqueles

olhos fixos nela, observando-a atentamente, como um

predador prestes a atacar.

- V�� em frente - Rafe provocou. - Diga o que

pensa. Que me despreza. Mas o que o Cary tem que

a deixa nas nuvens? O que ele tem que atrai voc��? ��

a personalidade? A boa apar��ncia? O qu��?

- Eu n��o tenho que lhe contar nada - retrucou

Juliet, e Rafe se enfureceu por, mais uma vez, ser

for��ado a agir como um selvagem. Mas que se dane

tudo, pensou, vendo que as pinturas evocaram o

que havia de pior dentro de si. Assim como Lady

Elinor havia planejado, deduziu, tristonho.

- O gato comeu a sua l��ngua? - gracejou. - Para al-

gu��m que alega ser noiva de outra pessoa, voc�� �� muito

permissiva. Diga, voc�� pensou em ��ary quando a beijei,

quando coloquei a minha l��ngua na sua boca...?

- Pare!

Juliet tentou esquivar-se mas, quando seus dedos

tocaram a l�� fina do su��ter de Rafe, tudo o que ela

sentiu foi o corpo dele sob as roupas, deixando-a em

brasa.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





121


- Como ele �� na cama? - Rafe parecia possu��do

por um dem��nio que se comprazia nos in��teis esfor-

��os de Juliet para escapar. - Ele �� melhor ou pior do

que o seu ex-marido? Acho que deve ser muito melhor.

Por que mais voc�� se casaria com aquele infeliz?

- Voc�� n��o tem o direito de criticar Cary. Pelo me-

nos, ele n��o tem um caso com uma mulher casada!

- Eu n��o tenho caso com mulher casada nenhuma!

Se aqueles esbo��os ainda aborrecem voc��, eu j�� ex-

pliquei do que se trata. Por que �� t��o dif��cil acreditar

que Liv me contrataria?

- Oh, eu n��o sinto a menor dificuldade em acredi-

tar nisso - disse, sarc��stica. - Para onde mais ela

costuma ir quando quer um homem mais jovem na

pr��pria cama?

- Voc�� �� doida! Liv ama o marido. S�� porque voc��

ficou toda ouri��ada quando a viu nua naqueles esbo-

��os n��o significa que eu sinta o mesmo.

- Eles n��o o excitam, ent��o?

- Se eu me animasse com todo nu que vejo, vive-

ria num constante estado de excita����o.

- Voc�� �� nojento!

- E voc�� �� incr��vel - sussurrou Rafe. - Se eu n��o

soubesse a verdade, diria que Cary inventou essa

hist��ria toda s�� para proteger a pr��pria carca��a. E

voc�� n��o �� melhor do que ele. Est�� pronta a se pros-

tituir para ganhar uma parte do dinheiro da vov��...

Rafe foi interrompido pela palma da m��o de Juliet

estalando no seu rosto.

- Seu... seu... - Juliet engasgou, incapaz de pensar

em um nome digno de Rafe naquela situa����o.





122


A N N E M A T H E R

- Ei, me chame de bastardo, por que n��o? Voc��

n��o seria a primeira. - Empurrou-a com tanta for��a

que ela quase caiu. - Voc�� �� igual �� vov��, sabia? N��o

gosta de ouvir a verdade, nem quando ela est�� bem

debaixo do seu nariz!

- Isso n��o �� verdade!

Juliet sentiu que estava quase pondo para fora o

pouco que comera no jantar. Sabia que Rafe tinha a

capacidade de mago��-la, s�� n��o sabia o quanto. E

abafando um gemido, virou-se e saiu.

Ele n��o tentou det��-la, e l�� em cima, no quarto,

Juliet correu para o toalete.

Estava escovando os dentes, para tirar aquele gos-

to desagrad��vel da boca, quando bateram na porta.

Julgando improv��vel que Rafe fosse atr��s dela, secou

os l��bios com o dorso da m��o e foi atender.

- Quem ��? - gritou, mas ningu��m respondeu.

Sequer bateram de novo, mas ela entreabriu a

porta, relutante.

Rafe estava parado l�� fora, uma express��o resig-

nada no rosto sombrio. Tentou bater a porta na cara

dele, mas Rafe colocou o p�� na fresta e entrou.

- Desculpe - disse, os olhos tristes revelando tudo.

Estendendo os bra��os, puxou-a para si. - Eu sou um

tremendo idiota. Por favor, diga que me perdoa.

Juliet emudeceu. Ela tremia tanto que ficou admi-

rada por continuar de p��. Preciso me sentar, pensou.

Ou me deitar, uma vozinha provocante insinuou. O

que a tornava n��o muito diferente de Liv.

- Ah, querida. - Ele a segurou pela nuca e Juliet

fechou os olhos quando sentiu a boca de Rafe na sua.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

123

Com delicadeza, os l��bios firmes tocavam os seus, a

l��ngua acariciava e se insinuava na boca entreaberta.

Sensualmente, ele a persuadiu a participar com a

pr��pria l��ngua. E, ent��o, conforme o desejo aumen-

tava, Rafe a beijou com mais for��a, at�� que ela per-

desse a vontade de resistir. Os beijos inebriaram os

sentidos de Juliet, marcaram seus l��bios, deixaram-na

sem f��lego. Rafe afagava-lhe as costas, alisando as

n��degas com avidez, agarrando-a junto a si at�� Juliet

sentir todo o vigor da sua virilidade.

- Sabia que eu viria atr��s de voc��, n��o ��? - brincou

ele, ro��ando a face de Juliet com os l��bios.

- N-n��o. N��o. - Juliet soou rouca, a voz fraca, en-

quanto os dedos de Rafe desceram pela sua coxa, para

erguer-lhe a perna e encaix��-la no quadril. - Eu... nem

imaginava que voc�� sabia em que quarto eu estava.

- Ah, eu sabia - murmurou Rafe, insinuando a m��o

por baixo do vestido curto para acarici��-la. - A vov��

me contou.

Juliet respirou fundo quando os dedos longos per-

correram a seda fina da meia, buscando a maciez da

pele nua. Sentiu-se ��mida e vulner��vel, e o gemido

de satisfa����o de Rafe provou que ele descobriu a

mesma coisa.

- Voc�� me quer - sussurrou tr��mulo, como se n��o

tivesse tanta autoconfian��a, afinal.

- N��o diga nada - pediu Juliet, afagando-lhe o

rosto e sentindo a barba por fazer. Aproximou os l��bios

dos seus. - �� muito melhor usar a boca desse jeito.

- Acho que conhe��o outro melhor - murmurou

Rafe, sem recusar o convite. Ele prendeu o l��bio in-

124

A N N E M A T H E R

ferior de Juliet entre os dentes, mordiscando a carne

tenra com avidez, misturando prazer e dor.

Juliet aninhou-se no corpo de Rafe, agarrando-o

pelo su��ter sem notar que arrancava os p��los do pei-

to. S�� percebeu o que fazia quando ele soltou um

gemido.

- Desculpe - sussurrou, junto aos l��bios dele.

- Est�� perdoada - murmurou Rafe, apertando-lhe

as n��degas com uma voracidade lasciva no olhar.

Rafe n��o conseguiria esperar muito para possu��-la.

Queria rasgar as roupas de Juliet, ver os seios que

arfavam com tanta sensualidade. Ser�� que ela estava

usando suti��? Ele achava que n��o.

- Que tal procurarmos um lugar mais confort��vel?

Juliet hesitou, afastando-se um pouquinho quando

Rafe tentou pux��-la para si.

- N��o quer que eu a toque? - indagou ele, a m��o

deslizando at�� o vale entre os seios. - Pensei que

quisesse. Porque �� o que eu quero, Juliet. Voc�� n��o

imagina o quanto.

- Eu queria. Quero!

Surpreso, Rafe compreendeu que ela estava nervo-

sa. Esta mulher, que foi casada durante seis anos, esta-

va nervosa. O que o desgra��ado havia feito com ela?

Juliet n��o se sentia segura para fazer sexo com ele.

Aproximando-se, Rafe a segurou no colo, de ma-

neira que Juliet foi for��ada a enla��ar-lhe o quadril

com as pernas. Extasiado, Rafe sentiu Juliet abrir-se

para a sua virilidade, as coxas expostas, o perfume

��ntimo e sedutor a penetrar-lhe as narinas.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

125

- Vamos parar de fingir, combinado? Voc�� me

deseja, e Deus sabe o quanto a desejo. Estou certo?

- Sim. Sim. - Juliet disse, ofegante. - Mas... eu

sou...

- Noiva. Sim, eu sei.

- N �� o . Eu s�� queria avisar que... n��o sou muito

boa nisso.

- Cary disse isso?

- N��o. David.

Rafe n��o queria tocar no assunto, mas era inevit��vel.

- E Cary?

- Eu n��o dormi com Cary - admitiu, e Rafe quis

uivar de alegria. - Nem mesmo sei se esta �� a coisa

certa a fazer.

- Confie em mim, �� a ��nica coisa a fazer - garan-

tiu Rafe, carregando-a nos bra��os at�� a cama. - Acre-

dite, isso j�� foi longe demais para qualquer um de n��s

voltar atr��s.

- Bem, sim. Eu... n��o estou arrependida, mas...

- Sem "mas", - ordenou, acariciando o rosto dela.

- Relaxe, querida. N��o vou machuc��-la.

Foi muito dif��cil manter o controle. Ali, deitada,

inocentemente sedutora, Juliet deixou-o ansioso para

t��-la. Rafe s�� queria rasgar-lhe as roupas e possu��-la

com paix��o. Sem tirar os olhos de Juliet, Rafe jogou

o palet�� no ch��o. De joelhos, deixou a m��o descer

da nuca at�� o decote provocante da lingerie. Trilhan-

do a gola de renda, insinuou um dedo sob o tecido,

descobrindo, como previra, que Juliet n��o usava um

suti��.

126

A N N E M A T H E R

Felizmente, havia uma fileira de bot��es do decote

at�� a cintura. Atrapalhou-se, mas conseguiu desabo-

toar quatro, afastando o cetim recoberto de renda para

revelar seios redondos e cheios, intumescidos de

desejo.

- Juliet - murmurou, aninhando-se sobre ela. Co-

lheu um dos mamilos rosados entre os dentes e ouviu

Juliet ofegar enlouquecida. A l��ngua circundou o

mamilo, e Rafe provou a sua do��ura. Em seguida,

massageou a carne tenra com uma avidez quase tor-

turante, antes de colher a aur��ola na boca. Juliet fincou

as unhas na coberta, sentindo uma palpita����o aflitiva

entre as coxas. Os seios arfavam e ela queria abrir-se

para Rafe, para ganhar car��cias mais ousadas. Mas

n��o poderia contar isso a ele, n��o ��? Ela n��o era des-

se tipo de garota.

Ou era?

Rafe ergueu a cabe��a. Os olhos pareciam turvos e

sensuais, e Juliet estremeceu ao prever o que ele faria

a seguir.

- Me ajude - pediu ele.

Os bot��es se abriram e ela puxou a boca de Rafe

para si. A cabe��a girava enquanto ele a beijava, beijos

longos, inebriantes, que deixaram o corpo l��nguido

de desejo. Ela nunca se sentira assim com ningu��m,

particularmente com David, e contorceu-se sem ces-

sar, tentando demonstrar a sua satisfa����o.

Enfim, Rafe recuou, e ela gemeu em protesto.

- Estamos vestidos demais - explicou ele, acari-

ciando a coxa exposta pela agita����o. - Diga, como eu

tiro isso?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

127

- Deixe-me tentar - disse ela, excitada demais para

ser reticente. N��o sentir vergonha de que ele visse o

seu corpo foi libertador.

Mesmo assim, quando Rafe admirou a calcinha de

renda, a ��nica pe��a que vestia agora, n��o foi f��cil

resistir ao instinto de se cobrir. Em outra ��poca, ela

n��o ousaria ser t��o desinibida. Mas agora, estava se

deliciando com o olhar admirado de Rafe. Entretanto,

quando ele puxou-lhe a calcinha com o indicador,

Juliet prendeu a respira����o, apavorada. E quando o

mesmo dedo se insinuou por baixo dos carac��is que

escondiam a sua feminilidade, custou-lhe todo o au-

tocontrole para n��o cruzar as pernas.

- Pelo amor de Deus, Rafe.

- Que foi? - indagou, embora soubesse muito bem

por que ela havia ficado apreensiva. - Fiz alguma

coisa errada? Talvez voc�� pudesse me mostrar como

prefere.

- Eu gostei de tudo - confessou, hesitante, fechan-

do os olhos. - Por favor, Rafe - sussurrou, indecisa

quanto ao que desejava pedir. E murmurando um

palavr��o, Rafe baixou a cabe��a e enterrou o rosto

entre as suas pernas.

O cheiro era delicioso, e o gosto ainda melhor.

Sentiu a tenta����o de introduzir a l��ngua por entre as

dobras e saborear o seu ��xtase. Mas o anseio palpi-

tante na virilha impediu tamanha generosidade. Du-

vidava que conseguisse aguentar muito tempo para

alcan��ar o pr��prio al��vio.

Obrigando-se a ser paciente, Rafe sentou-se e ar-

rancou o su��ter. Depois, desaf��velou o cinto e abriu o

128

A N N E M A T H E R

bot��o da braguilha. N��o baixou o z��per, pois assim

seria incapaz de controlar a excita����o. Ele a desejava

muito e havia tanto a desfrutar naquele estado.

Juliet abriu os olhos e admirou o torso moreno,

cujos p��los negros desciam at�� o umbigo, desapare-

cendo no quadril, convidando-a a descobrir onde se

esconderam.

Rafe arrancou-lhe a calcinha e ela precisou recon-

siderar. N��o estava acostumada a ser despida por

homem nenhum, pois jamais partilhara do prazer de

ser c��mplice da pr��pria sedu����o. David sempre espe-

rava que ela mesma tirasse as roupas, at�� na lua-de-

mel. E depois, ele a tomava sem qualquer tipo de

caricias preliminares.

Naquela ��poca, Juliet considerou a experi��ncia

completamente desagrad��vel, para n��o dizer doloro-

sa. E mais tarde, mostrava-se insens��vel quando ele

queria sexo. At�� pensou que havia sido por isso que

David cansara-se dela, sempre pronto a culp��-la pelos

pr��prios erros.

Agora, por��m, sabia que a culpa n��o era dela.

Quando Rafe tirou as meias, e trilhou com beijos

desde o dorso do p�� at�� a parte interna da coxa, a

ansiedade aumentou. Mal podia esperar que ele tiras-

se a outra meia e repetisse a experi��ncia. Intuitiva-

mente, afastou as pernas, as m��os entre as coxas.

Rafe rosnou, pois a provoca����o inocente causou-

lhe uma dor verdadeira sob o jeans. Ela era t��o c��m-

plice, t��o d��cil. Ser�� que Juliet imaginava o que fazia

com ele?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

129

Olhando-a nos olhos, Rafe despiu a cal��a e a cue-

ca samba-can����o. Depois, vendo que Juliet o obser-

vava, tamb��m, ele aninhou-se entre as pernas dela.

- Voc�� �� muito grande, n��o ��?

- Tamanho n��o �� tudo - murmurou, tentando man-

ter a sanidade. Mas quando ela o tocou, Rafe temeu

perder o controle.

Imediatamente, Juliet sentiu a virilidade pujante de

Rafe sondar os rec��nditos mais ��ntimos do seu corpo.

E, embora estivesse muito relaxada, de repente, o que

estava prestes a fazer n��o pareceu t��o f��cil. Talvez ela

fosse fr��gida, pensou apavorada, assim como David

insistia. Preliminares eram uma coisa, mas deixar que

um homem a possu��sse era bem diferente.

Rafe percebeu no ato quando a cumplicidade se

transformou em rejei����o. Deus, o que o marido dela

tinha feito para torn��-la t��o insegura?

- Tudo bem - disse ele, encontrando o bot��o intu-

mescido que saboreara pouco antes. Massageando

com delicadeza, sentiu o corpo dela relaxar e apro-

veitou a oportunidade para penetr��-la. Juliet paralisou,

mas os m��sculos pareceram agir por vontade pr��pria,

expandindo-se e envolvendo-o na cavidade macia.

Juliet soltou um suspiro tr��mulo quando Rafe a pre-

encheu. A tens��o cedeu lugar �� excita����o, que avultou

outra vez.

- Santo Deus - gemeu, rendendo-se ��s emo����es.

- Apenas... fa��a, hum? Por favor, Rafe, eu quero voc��

agora.

Como se ele tivesse escolha, Rafe pensou ir��nico.

Mas ele nunca fez sexo com uma mulher sem oferecer

o mesmo prazer que recebia.





130


A N N E M A T H E R

- Se voc�� estiver pronta. Relaxe, querida. Quero

mostrar como �� bom.

No come��o, Rafe movia-se devagar, recuando

quase a ponto de sair. Depois, estocava lentamente

dentro dela. Juliet gemeu e ele a silenciou com um

beijo. Em seguida, acariciando-a, Rafe repetiu o exer-

c��cio, e sentiu os m��sculos retesarem em torno dele

por um motivo ��bvio.

E justo como esperava, a respira����o nervosa ace-

lerou para sincronizar com a sua. Com um gritinho,

ela o envolveu com as pernas, e Rafe arremeteu mais

fundo do que nunca. Mas, movido por um desejo

desenfreado, conforme Juliet se debatia, Rafe permi-

tiu-se alcan��ar o al��vio. Poucos segundos depois,

sentiu o calor do cl��max de Juliet, antes de estremecer

de ��xtase, jorrando a pr��pria semente dentro dela na

agonia do al��vio...

C A P �� T U L O D O Z E

D R O G A !

Rafe abriu os olhos e flagrou-se estirado sobre o

corpo inerte de Juliet. Estava aninhado entre as suas

pernas convidativas. Ele ainda permanecia dentro

dela, esperando apenas o menor est��mulo para enri-

jecer num pulsar de vida.

O que ele n��o deveria permitir que acontecesse!

Sufocou o palavr��o que lhe veio aos l��bios e tentou

esquecer a gravidade daquela situa����o. Embora de-

terminado a se conter, fizera amor com a noiva do

primo. Agora, toda a repulsa que sentia pelas atitudes

de Cary se voltou contra ele. Com uma perna enros-

cada na dele, Juliet parecia exausta e alheia ��s poss��-

veis conseq����ncias daquele ato.

T��o logo abrisse os olhos, e compreendesse que

ele havia se aproveitado da sua inexperi��ncia, Juliet

ficaria horrorizada. Talvez jamais o perdoasse. Jamais

entenderia o quanto ele se odiava agora.

Como pude fazer tal coisa? Tudo bem. Ela era

deliciosa, sexy, estranhamente inocente e, ah, muito

doce. Boa demais para Cary, que nunca a faria feliz

porque era muito ego��sta.

Mas ser�� que ele pr��prio era muito diferente?

132

A N N E M A T H E R

Rafe n��o encontrou resposta. Foi ele quem a sedu-

ziu, n��o o primo. Decerto a procurou na melhor das

inten����es. Pretendia pedir desculpas pelo modo como

a tratara mais cedo. Entretanto, o que acabou fazendo,

na verdade, foi lev��-la para a cama, a forma mais

s��rdida de trai����o.

Precisava se mexer. Entre outras coisas, sentia

c��imbra nas pernas. Seria pura maldade continuar

deitado ali, ansioso para que Juliet acordasse e o dei-

xasse recome��ar tudo de novo. Caso lhe restasse al-

gum ju��zo, iria embora antes que a av�� terminasse a

partida e desse pela falta de ambos.

��s pressas, recolheu as roupas no ch��o e vestiu-se.

Detestava a id��ia de deixar Juliet sozinha. Tal gesto

seria mal interpretado.

Mas n��o acreditava que Juliet aceitaria o seu arre-

pendimento tardio como qualquer tipo de consolo.

Imposs��vel. Juliet nunca o perdoaria. Era melhor

apanhar as roupas e recolher-se �� pr��pria insignifi-

c��ncia.

- Onde voc�� vai? - perguntou Juliet, sonolenta,

enquanto Rafe enfiava uma das pernas na cueca samba-

can����o.

- Hum... acho melhor sair e ver como andam as

coisas - resmungou. Devia ter previsto o que dizer

antes de come��ar a se vestir.

- Algum problema?

Juliet apoiou-se nos cotovelos e a manta com a

qual ele a cobrira escorregou, revelando os seios

perfeitos. Santo Deus, pensou Rafe, isso n��o era jus-

to. Ele era apenas humano. Ser�� que ela n��o percebia

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

133

o que aquela vis��o fez com ele? Ah, sim, percebeu.

Juliet baixou o olhar l��nguido para o volume sob a

cueca.

-Numa... situa����o normal, n��o. Mas �� poss��vel

que... o seu noivo esteja �� sua procura.

- E isso importa? Ah, j�� entendi. Fazer sexo com

a noiva do seu primo pode, desde que voc�� n��o seja

apanhado, certo? Deus me livre de t��-lo interpretado

mal.

Rafe lamentou criar aquela situa����o. Devia ter

sa��do quando teve chance. Antes de meter os p��s

pelas m��os e faz��-la pensar que se arrependia do que

aconteceu. Claro que se arrependia, mas n��o pelas

raz��es que ela acreditava.

Mesmo assim, Juliet era noiva de Cary. Isso devia

significar alguma coisa, n��o ��? Podia achar que o

sujeito era um parasita, mas Juliet era noiva ele. N��o

acreditava que Juliet estivesse preparada para dispen-

sar Cary s�� porque fizera sexo com ele, por melhor

que a id��ia lhe parecesse. No entanto, precisava des-

cobrir antes que entregasse o segredo por completo.

- Do que voc�� est�� falando? - ele indagou, apa-

nhando a cal��a. - Est�� tentando me dizer que o que

acabamos de fazer mudou os seus sentimentos por

Cary? Nos conhecemos h�� apenas dois dias, Juliet.

Espera que eu acredite que se apaixonou loucamente

por mim, e que quer ter um filho meu? Parece muito

lisonjeiro, mas voc�� pretende romper o noivado para

ficarmos juntos?

Juliet engoliu em seco, sentindo o peso da pr��pria

decep����o desabar sobre os ombros. L��gico, ele tinha

134





ANNE MATHER


raz��o. Qualquer outra coisa era pura fantasia da parte

dela. Ali��s, n��o era o que Rafe queria, isso era ��bvio.

- Eu... n��o posso - murmurou. Era prefer��vel que

Rafe achasse que ela era uma aproveitadora do que uma

mulher pat��tica, com mais imagina����o que ju��zo.

- Foi o que pensei - zombou Rafe.

- N��o, voc�� n��o entende...

- N��o fique t��o certa disso - retrucou, soando con-

traditoriamente amargo. - Entendo muito bem o que

voc�� quer, e n��o �� o neto ileg��timo de Lady Elinor!

RAFE estava trabalhando quando algu��m bateu na

vitrine do ateli��. Havia fechado as cortinas de prop��-

sito, ap��s escancarar as portas dos fundos para per-

mitir a entrada dos p��lidos raios de sol. N��o queria

ver nem conversar com ningu��m, e imaginou quem

teria a ousadia de perturb��-lo em plena manh�� de

domingo.

Ouviu a batida irritante outra vez, mas ignorou.

N��o podia ser ningu��m que desejasse receber. Segun-

do a av��, os h��spedes partiriam esta manh��.

A menos que Cary houvesse descoberto...

- Rafe! Rafe! Droga, sei que est�� a�� dentro. Tenha

a dec��ncia de abrir a porta.

Ent��o, n��o era Cary. Devia ter previsto que s��

havia uma ��nica pessoa capaz de vir at�� aqui atr��s de

uma explica����o pelo modo como havia se comporta-

do na noite anterior. E n��o era Lady Elinor.

Escancarando a porta com um gesto agressivo,

encarou a mulher que o aguardava na soleira com um

olhar fulminante.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

135

- O que voc�� quer?

- Oh, querido, quanta esperteza! - Sem esperar

convite, Liv passou espremida por ele e entrou. - Voc��

est�� sozinho?

- O que voc�� quer, Liv? N��o creio que tenhamos

compromisso hoje.

- N��o t��nhamos. S�� pensei que talvez quisesse me

contar o porqu�� do jantar de ontem.

- Ontem? Voc�� se divertiu?

- N��o tanto quanto voc��, aposto. Por que raios n��o

me disse que estaria l��?

Rafe amarrou a cara. Algu��m que ele estava ten-

tando esquecer a todo custo havia perguntado a mes-

ma coisa. E ele n��o gostou que Liv viesse at�� aqui

para lembrar-lhe tal fato.

- Eu n��o sabia. S�� fui convidado depois que voc��s

foram embora.

- Sim, claro.

- �� verdade. - Rafe esfor��ou-se para n��o perder a

paci��ncia. - Agora, se isso �� tudo o que veio me dizer...

- N��o ��. Por que Lady Elinor o convidou? Voc��

sabe?

- Nas altas-rodas sociais, �� comum acomodar o

mesmo n��mero de homens e mulheres na mesa de

jantar...

- N��o me subestime, Marchese!

- Ent��o n��o finja que se importa com o motivo

pelo qual fui convidado. Eu estava l��. Pronto. Se o

seu marid��o n��o gostou do que foi dito, que tire sa-

tisfa����es com o Cary, n��o comigo.

136

A N N E M A T H E R

- Para falar a verdade, Bobby adorou a noite. Ele

e a sua av�� se d��o muito bem.

- E por que n��o? Os dois se conhecem h�� muitos

anos.

- Quer dizer, ela �� de uma faixa et��ria mais pr��xi-

ma de Bobby do que eu.

- Eu n��o falei isso.

- N��o, mas pensou. Em todo o caso, j�� que apa-

renta me conhecer t��o bem, por que n��o me conta o

motivo da minha visita?

- Ah, n��o. Voc�� n��o espera que eu adivinhe como

a sua mente funciona.

- Cretino!

- J�� me xingaram de coisas piores.

E muito recentemente, ponderou, mais uma vez

surpreso pela facilidade com que a lembran��a de

Juliet o abalava.

Por um segundo angustiante, Rafe temeu que ela

houvesse adivinhado o que se passava na cabe��a dele.

Mas tudo o que ela fez foi fit��-lo calada e dizer:

- Tudo bem. Ent��o me conte, por que foi embora

da festa sem sequer se juntar a n��s para um ��ltimo

drinque?

- N��o bebo antes de dirigir. N��o tenho motorista

para me levar para casa.

- A gente podia ter levado voc��. Mas nem tivemos

a chance de lhe oferecer carona.

- Desculpe.

- Ent��o, por que saiu daquele jeito? Notei que Lady

Elinor n��o ficou satisfeita.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

137

- �� mesmo? Eu estava cansado, sabe? Andei tra-

balhando muito ultimamente. Suponho que voc�� n��o

entenda nada do assunto.

- Certo, certo. Ent��o a sua sa��da n��o teve nada a

ver com... qual �� mesmo o nome dela... Juliet?

Com esfor��o, Rafe conseguiu manter o semblante

impass��vel.

- Juliet? N��o. Por que deveria?

- Ah, por favor. Voc�� passou a maior parte da

noite com ela!

- Alto l��! - Rafe orgulhou-se do pr��prio tom in-

dignado. - Passamos - deixe-me ver - meia hora

juntos na biblioteca, olhando os quadros. - Franziu a

testa, fingindo lembrar. - Depois, ela subiu para o

quarto, e eu li um pouco at�� voc��s terminarem o

jogo.

- Jura?

- Sim, claro - garantiu, rezando para que Deus o

perdoasse por tantas mentiras. - Agora, se me der

licen��a...

Liv suspirou.

- Mas o que voc�� acha que Lady Elinor pretendia

quando praticamente a empurrou para cima de voc��?

Quer dizer, sei que Cary �� um puxa-saco, mas faz��-lo

jogar cartas enquanto a noiva fica sozinha com outro

homem n��o me parece digno.

- Quando voc�� conhecer melhor a minha av��,

entender�� que jogo limpo n��o faz parte do vocabul��-

rio dela - gracejou Rafe. - Agora, importa-se de sair

daqui? J�� perdi tempo demais.

138

A N N E M A T H E R

Ao CAIR da tarde, Juliet e Cary voltaram para Londres.

Embora Cary preferisse esperar at�� o fim do dia, Juliet

lembrou-lhe do acordo e, contrariado, ele foi for��ado

a ceder. Cary visitou a av�� antes de partirem, talvez

na esperan��a de que ela convencesse Juliet a ficar

mais. Por��m, Hitchins encurtou a visita, e a senhora

n��o demonstrou lamentar v��-lo ir embora.

- �� tudo culpa daquele miser��vel do Rafe - res-

mungou Cary, acelerando para pegar a rodovia prin-

cipal. - Se ele n��o abrisse a boca ontem, a velha talvez

come��asse a enxergar a sensatez da minha sugest��o.

Na verdade, Juliet estava com dor de cabe��a, e n��o

se sentia disposta a aturar os chiliques de Cary. Con-

tudo, essa acusa����o deu-lhe nos nervos.

- Se o Rafe n��o interferisse, voc�� estaria muito

mais encrencado. Voc�� n��o �� sutil, Cary. Acho que

ficou ��bvio que voc�� leu aquela carta.

- Eu n��o acho.

- Bem, eu sim. Por que pensa que ela o convidou

para formar uma dupla no bridge, no lugar de Rafe?

Para castig��-lo, s�� isso. Apenas reze para que ela j��

tenha se esquecido de tudo na sua pr��xima visita.

- Ah, l��gico. E quando eu aparecer sem voc��, o

que acha que ela vai dizer?

Juliet suspirou. Ela n��o merecia isso.

- Cary, voc�� sabe que o trato valeu por uma oca-

si��o. E deve ter percebido que Lady Elinor ficar��

desapontada quando n��s... bem, rompermos.

Cary xingou o motorista que buzinou porque ele

tentou cortar sem sinalizar.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

139

- N��o creio que... isto ��, voc�� n��o reconsidera-

ria...?

- Repetir a dose? Voc�� s�� pode estar brincando!

- Por que n��o? N��s nos sa��mos bem, n��o foi? Nin-

gu��m suspeita que n��o somos um casal, suspeita?

- N��o. Mas n��o farei isso de novo de jeito nenhum.

Detestei a experi��ncia. Me senti... suja.

- Ah, por favor. Voc�� se divertiu. N��o finja que

n��o. Devia me agradecer. As pessoas na sua situa����o

raramente conseguem uma segunda chance para con-

seguir alguma coisa na vida.

- Voc�� acha mesmo que fingir ser noiva �� conseguir

alguma coisa da vida?

Cary calou-se, e Juliet pensou que houvesse com-

preendido o que ela disse e desistido. Mas ele voltou

ao assunto.

- N��o precisa ser fingimento - sugeriu, e o queixo

de Juliet caiu.

- Qu��?

- Ei, n��o fique t��o chocada. - A express��o de des-

d��m de Cary transformou-se num sorriso malicioso.

- Estou fazendo uma proposta aqui. Por que n��o

pensei nisso antes? Preciso de uma esposa e voc�� de

um emprego. N��o �� conveniente?

CAP��TULO TREZE

RAFE dobrou na estrada rumo a Tregellin e, resignado,

dirigiu at�� a casa. N��o visitava a av�� h�� duas semanas,

desde aquela noite desastrosa do jantar. E n��o estaria

aqui agora n��o fossem os telefonemas insistentes de

Josie.

- Voc�� tem que vir, Rafe - a governanta implorou

hoje pela manh��. - Estou preocupada. Aquele resfria-

do voltou, e ela n��o anda se cuidando direito.

- Ent��o chame o Charteris - aconselhou Rafe,

ainda se recuperando do choque de ver as pinturas da

m��e e as suas na biblioteca, e do encontro com Juliet.

A av�� tinha muito a explicar, e ele n��o sentia a menor

obriga����o de preocupar-se com ela.

Entretanto, ali estava ele, apenas duas horas depois,

fazendo uma viagem a Tregellin s�� para v��-la. Podia

repetir para si mesmo que havia feito isso por Josie

at�� ficar roxo, mas a verdade �� que se importava com

a velha. Ela era sua av��, afinal, por mais que ambos

lamentassem o fato.

Estacionou no lugar de costume e contemplou o

rio por alguns instantes. Um chuvisco fino molhou

seus cabelos e escorreu pelas faces. Recolheu as coi-

sas que trouxera no bagageiro e encaminhou-se para

os fundos da casa. Como sempre, Josie estava na

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





141


cozinha e, quando Rafe abriu a porta, Hitchins pulou

nas suas pernas.

- Ei, coisinha de nada - disse ele para o cachorro,

depositando as sacolas na mesa. - O que foi?

Na pia, Josie virou-se, com um sorriso de al��vio

no rosto enrugado.

- Obrigada por vir, Rafe. Sentimos sua falta.

- Sim, l��gico. Passei no supermercado no caminho.

- Voc�� �� bom demais! - exclamou Josie, recolhen-

do uma das sacolas e retirando o conte��do. - Oh,

salm��o defumado! Talvez eu consiga convencer Lady

Elinor a comer um pouquinho.

- Ela n��o est�� comendo?

- Muito mal. Ela n��o anda bem desde aquela in-

fec����o respirat��ria, que teimou que era s�� um res-

friado. A tosse nunca sarou direito, embora ela n��o

admita.

Rafe sentiu uma pontada de ang��stia.

- Ent��o, por que n��o chamou o Charteris?

- Eu chamei. Ele veio, mas ela n��o quis v��-lo.

Mandou que eu parasse de meter o bedelho na vida

dela.

- Que velha maluca! E por isso voc�� me ligou sem

parar.

- Bem, voc�� �� a ��nica pessoa que ela escuta. O

mundo dela gira em torno de voc��, Rafe. Ela pode

n��o demonstrar, mas sente muito orgulho de voc��.

Rafe riu.

- E suponho que voc�� soubesse tudo sobre aqueles

quadros - insinuou, e Josie enrubesceu.

142

A N N E M A T H E R

- Sim - assentiu, contrariada. - Mas me mandaram

n��o contar nada a ningu��m, portanto...

- Voc�� guardou segredo.

- N��o foi bem assim, Rafe.

- Ent��o, como foi? Quando a vov�� me contaria?

E por que mostr��-los naquela noite, sem avisar?

- Eu n��o sei.

- E quem pendurou as pinturas? N��o me diga que

foi voc�� quem arrastou as estantes de livros e pendu-

rou os quadros. Foi o Cary?

- C��us, n��o! Cary n��o sabe nada sobre isso. Du-

vido que gostaria muito de saber. Ela chamou o Jem

Helford para arrumar tudo. - Jem e a fam��lia cultiva-

vam as terras de Tregellin acima do vale, Rafe recor-

dou. - Ele e o filho levaram tr��s horas para colocar

tudo no lugar.

- Mas... por qu��?

- Pergunte �� Lady Elinor.

- Onde ela est��? No jardim de inverno, como

sempre?

- Na verdade, n��o, ela est�� de cama - Josie admi-

tiu, tristonha. - Agora acorda cada vez mais tarde.

Certos dias, nem chega a se levantar.

Rafe prendeu o f��lego.

- Mas isso n��o �� ruim para voc��? Quer dizer, ter

que subir e descer a escada...

- Isso me faz bem. E se subo e des��o escadas n��o

�� por Lady Elinor. Ela n��o me pede nada. Nem mes-

mo as refei����es.

- Dio!- exclamou Rafe. A situa����o era muito pior

do que esperava e, para variar, sentiu-se culpado pela

pr��pria aus��ncia.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

143

Abatido, saiu da cozinha para subir a escada, sal-

tando dois degraus de cada vez. Quando chegou ao

quarto de Lady Elinor, parou para se recompor. A av��

n��o gostaria de saber que ele se preocupou com ela.

Ent��o, ap��s ajeitar o cabelo, bateu na porta.

Uma voz fraca ordenou:

- Entre, Raphael. Se quiser.

Rafe sufocou o ressentimento que tais palavras

inspiraram, e estampou um sorriso na cara. Certamen-

te, ela ouvira o carro e estava apenas tentando abor-

rec��-lo. Mas n��o conseguiria. Abriu a porta e entrou

saltitante.

- Ol��, velhota - cumprimentou, com irrever��ncia.

- Sabe que horas s��o?

Ele falou descontra��do, mas a apar��ncia da av�� o

chocou. Ela parecia t��o p��lida, os cabelos formavam

uma cortina cinzenta sobre os ombros esqu��lidos.

Recostada nos travesseiros, ela aparentava ter cada

um dos seus 80 anos de vida, e Rafe sentiu um n�� na

garganta.

- Creio que passa do meio-dia - declarou ela,

afinal. - O que deu em voc��, Raphael? Parece que

n��o liga mais para mim.

- N��o �� verdade, vov��. Ali��s, por que n��o avisou

que queria me ver?

- E ouvir que voc�� n��o tem tempo para uma velha

que odeia e despreza? Acho que n��o.

Rafe suspirou.

- Eu n��o odeio e nem desprezo voc��. O que, ou

melhor, quem, lhe deu essa impress��o?

- O que mais eu deveria pensar, j�� que voc�� n��o

disse uma palavra sobre a pequena exposi����o que

144

A N N E M A T H E R

arrumei para voc��? Na verdade, me parece ��bvio que

ficou furioso com o meu pequeno truque, e por isso

se afastou. Sem mencionar a maneira ofensiva como

voc�� saiu daqui h�� duas semanas, sem sequer agrade-

cer a gentileza de ter sido convidado.

- Gentileza? N��o houve nada de gentil em me

confrontar com os quadros que eu julguei ter vendido

h�� anos. E desde quando voc�� tem aquelas pinturas

da minha m��e? Voc�� me deixou pensar que tudo o que

ela fez tinha se perdido depois que ela morreu.

- Quando ela se suicidou, quer dizer? - Lady Eli-

nor falou sem rodeios, e Rafe emudeceu de pasmo.

- Ah, Raphael, voc�� n��o tolera as fraquezas dos ou-

tros, n��o ��? Como acha que me senti quando descobri

o que aconteceu? Christina era minha filha. Eu a

amava muito. Por��m, ela me abandonou para correr

atr��s de um campon��s italiano sem eira nem beira,

que a tratava t��o mal que ela foi obrigada a fugir.

- N��o �� verdade!

- Receio que seja.

- N��o. Quer dizer... - Fitou-a com os olhos tortu-

rados. - Sei que o meu pai a maltratou algumas vezes.

Lembro das brigas, das discuss��es que duravam horas.

Mas a minha m��e n��o cometeu suic��dio. Ela... caiu.

Da sacada de um hotel.

- Essa foi a hist��ria que eu contei a todo mundo.

Eu receava que, se voc�� descobrisse que a sua m��e

havia se suicidado, tivesse alguma esp��cie de trauma.

Durante anos, pensei que nunca contaria. Mas agora

voc�� �� um homem, e n��o ag��ento mais carregar este

fardo sozinha.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

145

Rafe puxou uma cadeira, virou-a ao contr��rio e

sentou-se de frente para a av��.

- Ent��o me conte o que realmente aconteceu. Ela

se matou por causa do meu pai? Foi isso?

- N��o. N��o. Nada t��o dram��tico assim, Raphael.

Christina tinha algum dinheiro, portanto, ela pegou

voc�� e voou para a Su����a. Infelizmente, ela come��ou

a beber. Quase n��o pintou mais depois que deixou a

It��lia. Ent��o, certa noite, ela trepou na grade que

cercava a sacada do hotel de voc��s. E, segundo teste-

munhas, simplesmente atirou-se no ar.

Rafe sentiu os l��bios secos.

- E caiu?

- Sim, caiu. - A av�� soou pesarosa. - Mas resta

pouca d��vida quanto ao que ela pretendia. Veja bem,

Christina me escreveu uma carta, que recebi dois dias

depois. Ela queria saber se, caso falecesse, eu o traria

de volta para a Inglaterra e lhe daria um lar.

Rafe suspirou, enterrando o rosto nos bra��os.

- Ent��o �� por isso que voc�� nunca gostou de

mim.

- Nunca gostei de voc��? - Lady Elinor se emper-

tigou. - N��o sei do que est�� falando, Raphael. Eu amo

voc��. Sempre amei, desde o primeiro momento em

que o vi naquela creche em Interlagos. - Ela assoou

o nariz num len��o de papel, e Rafe ficou surpreso ao

ver que tinha l��grimas nos olhos. - Colocaram voc��

com as crian��as menores, mas eu o reconheci na

mesma hora. Voc�� era t��o alto, t��o bonito. T��o pa-

recido com Christina que senti vontade de chorar. -

Assoou o nariz de novo. - Jamais sequer pensei em

146





ANNE MATHER


tentar contactar o seu pai. Por mim, voc�� �� filho da

Christina, meu neto, e nada mais importa. Mais tarde,

como creio j�� ter comentado, descobri que o seu pai

havia morrido num acidente de carro logo depois que

Christina o deixou. Ocorreu-me que, por isso, ela fez

o que fez, mas nunca saberei com certeza. O impor-

tante, na minha opini��o, foi que, na hora do desespe-

ro, ela confiou voc�� a mim. E jamais me arrependi.

Rafe n��o sabia o que pensar. No caminho at�� aqui,

sequer desconfiou que a av�� faria uma revela����o t��o

bomb��stica. Contudo, fazia sentido. Agora, adulto,

podia compreender.

- No que est�� pensando?

Ansiosa, Lady Elinor fitava Rafe, que abra��ou o

encosto da cadeira.

- Que voc�� foi muito forte, vov��. N��o deve ter sido

f��cil perder os dois filhos antes que completassem 40

anos.

Lady Elinor conteve o que pareceu ser um solu��o.

- Sim, a morte de Charles tamb��m foi um golpe

devastador. Durante anos vivi sozinha e, de repente,

tinha dois meninos para cuidar. - Fez uma careta meio

brincalhona. - Mas, sabe que suspeito de que voc�� e

Cary salvaram a minha sanidade?

Rafe arqueou as sobrancelhas.

- Tudo bem. Mas por que me deixou acreditar que

tudo o que pertencia a minha m��e havia se perdido

ou foi destru��do?

- Foi mais f��cil assim.

- Mais f��cil?

- Mais f��cil para mim - confessou, arrependida.

- Demorei anos para perdoar Christina pelo que fez.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

147

Ficar com o filho dela era uma coisa. Ficar cercada

pela sua arte - a coisa que a havia tirado de mim - era

outra.

- E da��?

- Da�� mandei empacotar e guardar tudo no s��t��o.

Junto com aqueles seus primeiros quadros, que um

intermedi��rio comprou para mim.

- O advogado de Bodmin.

- Sim, ele mesmo.

- Mas por que fez isso?

- Voc�� n��o adivinha? Pensei que, se eu comprasse

as suas pinturas, elas n��o seriam vistas por outros

colecionadores. Eu j�� havia perdido a minha filha por

causa do seu amor pela pintura. Tinha muito medo de

perder voc�� da mesma maneira.

Rafe levantou e sentou-se na cama, ao lado dela.

- Voc�� nunca vai me perder, vov�� - resmungou,

tomando aquele corpo fr��gil nos bra��os. - Voc�� pode

ser uma galinha velha e teimosa, mas �� a minha gali-

nha velha, e nada mais importa.

Lady Elinor recostou-se nele. Ent��o, com uma agi-

lidade extraordin��ria para a sua idade, ela o repeliu.

- Eu estava certa - afirmou, com a voz embargada

- voc�� �� igualzinho a sua m��e. N��o tolero toda essa

emo����o. Sou uma mulher pr��tica.

Rafe sorriu com ternura.

- Nada como manter a harmonia com m��o-de-

ferro, certo?

- N��o entendi. - Mas a voz pareceu ganhar for��a

e um toque de cor subiu-lhe ��s faces. - Voc�� me per-

doa por obrig��-lo a passar a noite com Juliet?

148





ANNE MATHER


Rafe se levantou, e se p��s a andar em c��rculos pelo

quarto.

- O que h�� para perdoar? - retrucou afinal, orgu-

lhoso do pr��prio tom indiferente. - O meu palpite ��

que Cary n��o gostou.

- Acha mesmo? Bem, talvez por sua causa, sim.

Mas n��o acha que o Cary foi gentil demais com a

noiva?

- Gentil?

- Sim. Fiquei pensando em que tipo de noivado ��

esse. Juliet devolveu o anel da sua m��e, sabia?

Rafe n��o sabia. Mas como poderia? Esta era a sua

primeira visita a Tregellin desde aquele fim de sema-

na fat��dico.

- Tomara que o Cary lhe compre um anel - retru-

cou, impass��vel, sem se permitir analisar o gesto de

Juliet.

- Hum. O que voc�� achou dela?

- Juliet?

- Quem mais? Josie acredita que o noivado n��o

durar�� muito. Ela acha que Juliet tem mais coisas em

comum com voc��.

- Voc�� est�� brincando!

- N��o, n��o estou brincando. Josie tem direito a ter

uma opini��o, n��o tem?

- Ora, sim, mas...

- Quer dizer, voc�� nunca pensou nela de outra

forma?

- Claro que pensei em Juliet de outra forma. Ela ��

uma bela mulher. Um homem precisa ser cego para

n��o notar isso.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

149

- E voc�� n��o �� cego, ��, Raphael? N��o se metade

das hist��rias que ouvi forem verdadeiras.

Rafe riu.

- N��o devia acreditar em tudo o que dizem.

- Ah, e n��o acredito. Mas, desta vez, concordo com

a Josie. Juliet �� boa demais para o Cary. Vamos torcer

para que ela descubra isso a tempo, hein?

CAP��TULO CATORZE

JULIET achou a carta na caixa de correio assim que

chegou do trabalho.

Ela n��o costumava receber correspond��ncias, exceto

as contas, claro. Mas o papel fino do envelope advertia

que n��o se tratava disso. Sem dar import��ncia, colocou

a carta na bolsa e subiu a escada, imaginando se tinha

alguma rela����o com David. Mas o ex-marido jamais a

procurou, e era improv��vel que houvesse regressado ��

Inglaterra. Com uma poss��vel acusa����o de transfer��n-

cia fraudulenta de fundos pesando nos ombros dele,

ela duvidava que tornaria a v��-lo.

O apartamento ficava no segundo andar, e Juliet

largou o casaco e os sapatos de salto alto no hall es-

treito. Era a segunda semana de julho, em pleno ver��o,

e a casa estava abafada. Juliet abriu as janelas. Em

seguida, ap��s respirar a brisa de ar fresco, voltou para

a sala. Precisava de um banho, pensou, espiando a

mancha horrorosa de catchup na saia. Os pais n��o

deviam deixar as crian��as comerem hamb��rgueres no

��nibus, pensou melanc��lica. Depois que o seu filho

de seis anos deixa um hamb��rguer cair no colo do

passageiro ao lado, desculpar-se n��o �� suficiente.

Ela j�� passava um verdadeiro sufoco para manter

as roupas limpas, sem tempo o bastante para cuidar

disso. Embora trabalhar numa pequena butique exi-

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





151


gisse que se apresentasse razoavelmente arrumada.

Sem contar que as saias curtas e os decotes exagera-

dos que a gerente esperava que usasse n��o eram bem

o que se chama de alta costura. Mas a clientela da loja

tinha certas prefer��ncias, e Juliet sentia-se t��o grata

por ter um emprego que n��o pensava em reclamar.

N��o que pretendesse continuar na butique mais do

que o necess��rio. Estava freq��entando um curso no-

turno de inform��tica e gerenciamento de escrit��rio,

com o objetivo de encontrar um cargo mais interes-

sante antes do final do ano. Sentia-se otimista quanto

a atingir a meta. O professor, um programador de

computador aposentado, havia dito que ela tinha um

verdadeiro talento para a profiss��o.

N��o foi nada f��cil. Particularmente depois de recusar

o dinheiro que Cary lhe ofereceu quando retornaram da

Cornualha. Ele a chamou de tola, mas Juliet j�� se sentia

mal demais para aceitar o que suspeitava ser dinheiro de

Lady Elinor. Ap��s penhorar o rel��gio, ela conseguiu se

sustentar, e a refer��ncia que Cary lhe deu bastou para

Sandra Sparks, a gerente da butique, contrat��-la.

Mas, agora, ela n��o podia mais protelar para abrir

a carta. Apanhou uma faca e rasgou o envelope. Logo

reparou que a carta fora enviada por uma firma de

advogados de Bodmin. Bodmin! O cora����o disparou

e a m��o que segurava o papel come��ou a tremer. A

carta informava o falecimento, o falecimento!, de

Lady Elinor Margaret Daniels de Tregellin House,

Tregellin, Cornualha, e a convidava para a leitura do

testamento, que aconteceria na segunda-feira, 2 de julho,

ap��s a cerim��nia f��nebre na igreja de St. Mawgan, em

Tregellin.

152

A N N E M A T H E R

Juliet desabou na cadeira. Sentiu-se enjoada e

comovida, o olhar fixo na carta, incapaz de acreditar

no que acabara de ler. Lady Elinor, aquela senhora

esperta, indom��vel, estava morta. Santo Deus, como

Rafe devia estar se sentindo? Ele amava a av��. E

agora Cary herdaria Tregellin e a antiga casa seria

vendida.

Curiosamente, n��o sentiu muita compaix��o por Cary.

Desde o inicio, os interesses dele eram ��bvios. Queria

vender Tregellin, avaliar o potencial da propriedade para

investimentos imobili��rios. Talvez at�� j�� planejasse o

que faria ap��s o fechamento do invent��rio.

Mas Rafe era diferente. Ele amava Tregellin e

defendeu a propriedade quando Cary sugeriu que a

vendessem. Por��m, agora que Lady Elinor se foi, nada

impediria Cary de fazer o que bem entendesse. Oh,

Rafe...

Juliet se levantou e andou em c��rculos pelo apar-

tamento. Esfor��ou-se muito para esquec��-lo, e quase

conseguiu. O tempo cura tudo. Aprendeu isso quando

o pai morreu e David a traiu. Esperava que, com o

passar do tempo, conseguiria pensar em Rafe sem

emo����o, mas a situa����o ainda n��o era bem essa.

Al��m do mais, foi tolice imaginar que esqueceria

tudo sem sofrimento, apesar da lembran��a daquele

final de semana parecer um sonho. Foi muito real,

admitiu. Foi ela quem a tornou ilus��ria. Fingindo ser

a noiva de Cary, enganando todo mundo, especial-

mente Rafe.

E agora Lady Elinor morreu, talvez acreditando

que ela e Cary se casariam. Por que mais a convidaria

IRRESIST��VEL ATRA����O

153

para a leitura do testamento? Juliet sentiu-se muito

envergonhada.

Escreveria para o advogado, o sr. Peter Arnold, e

explicaria que ela e Cary haviam rompido. Rompido!

Independente do que Cary havia dito ou deixado de

dizer, tratava-se de uma ocasi��o familiar, e ela n��o tinha

nada a ver com isso. Simplesmente escreveria um bi-

lhete educado, expressando as suas condol��ncias ��

fam��lia e justificando a aus��ncia por motivos profis-

sionais. Era verdade, em todo o caso. Ela n��o trabalha-

va na butique h�� tempo o bastante para merecer regalias.

Todavia, quando as l��grimas inundaram os olhos, Juliet

compreendeu que n��o queria recusar o convite. Gos-

tava de Lady Elinor. Lamentava a morte dela de fato.

E desejava prestar-lhe a ��ltima homenagem.

Saber que encontraria Rafe no funeral n��o era um

problema, pensou. Como n��o havia recebido not��cias dele

desde que voltara, era ��bvio que o que aconteceu n��o

significou nada. Al��m do mais, ele j�� devia t��-la desmas-

carado como a mentirosa que era. Cary n��o conseguiria

encobrir a farsa. N��o sem a coniv��ncia dela.

Quando se deitou naquela noite, Juliet continuava

indecisa quanto ao que fazer. Sob qualquer ��ngulo, a sua

presen��a seria uma intromiss��o no luto da fam��lia.

Ap��s a noite agitada, Juliet decidiu ligar para o

advogado em Bodmin. Queria explicar que ela e Cary

n��o estavam mais "juntos" e que, embora desejasse

ir ao funeral, preferia n��o comparecer �� leitura do

testamento.

Juliet precisou aguardar o intervalo matinal para

telefonar. E, ent��o, fizeram-na esperar alguns minutos

at�� que um homem atendesse.

154

A N N E M A T H E R

- Srta. Lawrence? - Juliet confirmou. - Ah... ��ti-

mo. O que posso fazer por voc��? Sou Stephen Arnold,

o filho dele. Receio que meu pai esteja ocupado com

outro cliente.

Juliet conteve um suspiro e explicou resumidamen-

te porque havia telefonado. N��o entrou em detalhes,

mas deixou claro que j�� n��o tinha nenhuma liga����o

com a fam��lia Daniels.

- Gostaria de comparecer ao funeral - prosseguiu

- mas regressarei a Londres assim que terminar. Acho

que o convite para comparecer �� leitura do testamen-

to foi um engano.

- Oh, n��o. Voc�� �� uma das herdeiras, srta. Lawrence.

Juliet quase engasgou.

- N��o... n��o �� poss��vel. N��o sou membro da fam��lia.

- Meu pai sabe disso, srta. Lawrence. Mas Lady

Elinor incluiu a cl��usula a seu favor, e contou a ele

que voc�� era uma mo��a que ela gostava e admirava.

Admirava!

Juliet morreu de vergonha. Se ao menos houvesse

revelado a verdade �� senhora...

- Ent��o, voc�� estar�� presente? Meu pai est�� ansio-

so para conhec��-la.

Jura? Juliet n��o disse a palavra em voz alta, mas

deve ter respondido alguma coisa coerente, porque

segundos depois a liga����o caiu e ela colocou o fone

no gancho.

- Algum problema?

Juliet ainda estava sentada no escrit��rio, olhando

fixo para o telefone quando Sandra Sparks apareceu.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

155

A jovem gerente fitou a mais nova funcion��ria com

preocupa����o e Juliet confirmou com a cabe��a.

- Pode-se dizer que sim. Tudo bem se eu tirar uma

folga na pr��xima segunda-feira? Preciso ir a um en-

terro.

Sandra fez uma cara aborrecida.

- Algum parente, ��?

- N��o.

- Oh, querida. Os empregados s�� podem tirar fol-

ga para comparecer ao enterro de familiares. Uma

licen��a solid��ria, por assim dizer. Sinto muito mesmo,

Juliet, mas n��o posso permitir que v��.

- Mas eu tenho que ir! Eu... prometi. �� importan-

te, Sandra.

Sandra suspirou de novo.

- Onde �� o enterro? Talvez eu possa deixar que

voc�� se ausente por umas duas horas. Precisa guardar

segredo, l��gico. Se espalharem por a�� que tenho o

cora����o mole, todas as garotas v��o usar isso como

desculpa.

- Duas horas n��o bastam, infelizmente. O funeral

�� na Cornualha. Num lugar chamado Tregellin. Lady...

Lady Elinor Daniels ��, ou melhor, era, algu��m que

conhe��o h�� muito tempo.

O que n��o foi um exagero t��o grande assim.

- Lady Elinor Daniels? Ent��o, voc�� a conheceu?

- �� uma longa hist��ria. Ela conhecia o meu pai.

S�� recentemente, muito recentemente, passei alguns

dias na casa dela. Poder dizer adeus significaria mui-

to para mim.

- E voc�� s�� precisaria de um dia?

Juliet assentiu.





156


A N N E M A T H E R

- Eu parto no domingo e volto na segunda �� noite.

Aposto que n��o faltar��o vagas nos trens. �� tempora-

da de f��rias, afinal.

E N T �� O , eles continuavam juntos.

Cary confirmou que sim, mas Rafe recusou-se a

acreditar. Da ��ltima vez em que Cary visitou a av��,

Juliet n��o foi junto. Cary inventou uma desculpa

qualquer, alegando que ela estava gripada e n��o que-

ria contagiar Lady Elinor, mas Rafe desconfiou.

Apesar de n��o ter coragem o bastante para conferir

por si pr��prio.

O que n��o era um problema, dadas as circunst��n-

cias, pensou melanc��lico, os olhos fixos no casal

parado do lado oposto da sepultura. Mas isso n��o

impedia que sentisse raiva. Tanta raiva que quase o

sufocava.

Talvez esperasse que Juliet n��o comparecesse, que

ainda lhe restasse um pingo de dec��ncia. Ela j�� era

noiva de Cary quando fez amor com ele e, apesar da

apar��ncia inocente, ainda o era. Como aguentava estar

ali, ao lado de Cary, bancando a manteiga derretida,

quando ele sabia muito bem como ela era quente?

De bra��os dados com Rafe, Josie fitou-o, curiosa.

Os olhos, embora atentos, permaneciam inchados de

tanto chorar.

- Qual �� o problema?

- Que problema? - Rafe indagou, amargurado. - A

velha est�� morta e Cary mal pode esperar para colocar

as m��os em Tregellin. Perfeito.

- Voc�� n��o devia tirar conclus��es precipitadas,

Rafe. A sua av�� podia ser velha, mas n��o era burra.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





157


D��-lhe algum cr��dito, est�� bem? Pensei que descobrir

tudo sobre as pinturas lhe ensinaria que ela tamb��m

tinha alguns segredos.

- Tamb��m? Eu n��o tenho segredos. A minha vida

�� um livro aberto.

- �� mesmo? Ah, ��timo, logo saberemos. Quando

o sr. Arnold ler o testamento.

Rafe riu. Seria t��o hip��crita ficar l��, parado, espe-

rando para ver o quanto a av�� lhe deixou. Cary esta-

ria l��, e Juliet tamb��m. Carniceiros, todos os dois,

pensou furioso. Ambos se mereciam.

Mesmo assim, n��o conseguiu impedir que as ima-

gens da ��ltima vez em que viu Juliet invadissem a sua

mente. Talvez preferisse esquecer como ela pareceu

despudoradamente bela quando lhe contou que n��o

pretendia romper o noivado, mas era inevit��vel. E

naqueles tr��s meses desde que ela deixou Tregellin,

ele viveu em completo celibato. Nunca foi muito

prom��scuo, por��m, nunca sentiu tamanha avers��o a

fazer sexo com uma mulher qualquer. Talvez esse

fosse o problema, ponderou, tenso. N��o apenas ver

Cary e Juliet juntos, e sim o fato de que se passaram

meses desde a ��ltima vez em que fez amor. Assim que

essa farsa rid��cula terminasse, ele dirigiria at�� Bodmin,

tomaria umas cervejas e arranjaria uma mulher. Qual-

quer mulher servia, pensou. Desde que conseguisse

expulsar Juliet dos pensamentos.

Enquanto isso, Juliet n��o percebeu que Rafe a en-

carava do outro lado do t��mulo. Se ainda duvidasse da

natureza dos sentimentos dele, agora podia ver o quan-

to foi tola. Ele n��o gostou de v��-la ali, ��bvio. Aquela

aventura sexual foi algo que ele logo esqueceu.

158

A N N E M A T H E R

Certo, ela era culpada por n��o contar a verdade

quando ele perguntou sobre o noivado com Cary. Mas

ela estava num beco sem sa��da, sabendo que tudo que

dissesse prejudicaria Cary. Com certeza, o fato de que

ela e Cary haviam rompido, na vis��o dele, poderia

significar alguma coisa. Caso Rafe se dignasse a ou-

vir, ela se explicaria. O que evidentemente ele n��o

queria, a julgar pela sua atitude. Juliet suspirou e Cary

olhou para ela.

- J�� vai acabar - avisou ele. - Depois vamos vol-

tar para a casa.

Ou melhor, "saber o que o testamento diz", Juliet

deduziu tristonha.

A cerim��nia terminou e Rafe agachou-se para jogar

um punhado de terra sobre o caix��o.

- Descanse em paz, minha velha - sussurrou bai-

xinho, antes de voltar para o estacionamento.

Juliet tentou correr atr��s dele, mas Cary a deteve.

- Onde voc�� pensa que vai?

- E isso �� da sua conta? - Desde que voltou a

Tregellin, Cary a tratava com um ar possessivo. - Eu

o encontro na casa.

- Voc�� quer falar com ele, n��o ��? Bem, esque��a

isso, querida. �� comigo que voc�� deve ser vista.

- Por qu��?

- Porque... ainda pensam que somos um casal - res-

mungou Cary. - O que mais eu poderia dizer? Voc��

queria que a vov�� descobrisse que andei mentindo?

Horrorizada, Juliet n��o acreditou no que ouviu.

- Ent��o, voc�� acha que s�� fui convidada por sua

causa?

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

159

- Parece que sim.

- N��o acredito em voc��. Bem, �� melhor avisar a

todo mundo que o "noivado" acabou. E n��o me siga,

Cary. A menos que deseje que eu anuncie o fato de

que nunca existiu noivado nenhum.

Recostado num dos carros f��nebres, �� espera de

Josie, Rafe viu Juliet se aproximar. Preferia ter usado

o pr��prio autom��vel, mas Josie insistiu que ele a

acompanhasse numa das limusines.

Sentiu os m��sculos da face retesarem quando Juliet

parou ao lado dele. N��o seria o primeiro a falar, pen-

sou, numa atitude infantil. Apesar da proximidade

afetar o seu equil��brio.

Juliet parecia t��o inocente, reconheceu, ressentido.

O terninho cinza claro e a blusa salm��o de Juliet de-

monstravam a medida exata de respeito, pois Lady

Elinor jamais desejaria que ningu��m usasse preto. De

saltos altos, ela s�� precisava erguer o queixo um pou-

quinho para olh��-lo nos olhos. Os cabelos sedosos

estavam presos num coque frouxo.

- Oi - disse Juliet, e Rafe a cumprimentou com um

aceno da cabe��a. - S�� queria dizer o quanto lamento a

passagem de Lady Elinor. Ela... parecia t��o forte. Fiquei

chocada quando recebi a carta do sr. Arnold.

Este detalhe chamou a aten����o dele.

- Arnold lhe escreveu?

- Isso mesmo.

- Por qu��?

- Eu n��o sei. Liguei para ele. Pensei que devia ser

algum engano. Ele, ou melhor, o filho, disse que n��o.

160

A N N E M A T H E R

- Est�� dizendo que Cary n��o lhe contou sobre a

doen��a dela? Perdoe-me, mas at�� para Cary isso pa-

rece improv��vel.

- Como ele poderia me contar? N��o o vejo desde

que voltamos da Cornualha.

Rafe n��o conseguiu disfar��ar a raiva.

- Espera que eu acredite nisso? Que tipo de rela-

cionamento voc��s t��m? Aberto, claro. Mas fingir que

n��o o viu...

- N��o me encontrei com ele desde aquela ��poca!

Ah, por que me preocupar? Voc�� n��o acreditaria

mesmo. Cary encheu a sua cabe��a com tantas menti-

ras que nada que eu diga faria qualquer diferen��a.

- Certamente, n��o.

- Ah, acredite no que voc�� quiser. Acaso lhe inte-

resse, nunca existiu noivado nenhum. Cary me per-

suadiu a fingir que era namorada dele. Foi id��ia de

Cary. Concordei porque precisava de dinheiro. E ele

prometeu me dar uma carta de refer��ncia para que eu

conseguisse arranjar um emprego decente...

Rafe encarou-a, incr��dulo.

- Cary pagou voc��!

- Era o combinado, mas... no final, eu n��o aceitei

o dinheiro. Depois de... conhecer Lady Elinor, me

senti uma... uma...

- Cobra?

- . . . uma vigarista - completou baixinho, sentindo

as l��grimas arderem nos olhos. Mas Rafe n��o se co-

moveu.

- Meu Deus, n��o �� de se admirar que se mostrasse

t��o angustiada quando perguntei se pretendia romper

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





161


o noivado. A vov�� teria chutado os dois para fora daqui

se soubesse a dupla de mentirosos que voc��s s��o.

- Acha que eu n��o sei?

- Ent��o, voc�� n��o se arrepende?

- Oh, Deus, claro que sim! Mas n��o podia preju-

dicar o Cary, sabe? Voc�� n��o v��?

- Vejo uma mulher gananciosa e oportunista: Mas,

ei, ainda n��o est�� na hora de terminar o noivado,

mocinha. N��o quando Cary est�� prestes a faturar uma

bolada.

Juliet gelou.

- J�� disse, n��o existe noivado nenhum!

- Ent��o, quem sabe chegou a vez de reconsiderar

essa hip��tese?

- Acha que eu ligo para dinheiro? - perguntou,

amargurada.

- Costumava ligar.

- N��o! Eu estava praticamente falida. Precisava

de algumas libras, mais nada. S�� para me sustentar

at�� encontrar trabalho. Mas agora tenho um emprego,

portanto, n��o preciso da caridade de ningu��m. E nada,

nada, me convenceria a casar com Cary Daniels. Eu

sequer gosto dele. - Sentiu uma leve tontura, mas

quando Rafe tentou ampar��-la, Juliet se esquivou.

- Assim que tudo isso acabar, eu vou embora.

C A P �� T U L O Q U I N Z E

O T R E M sacolejou nos trilhos e recuperou o ritmo

normal. N��o estava cheio. Apesar da ��poca, o avan��ar

da hora aparentemente intimidou mesmo os turistas

inveterados. Juliet teve muita sorte de encontrar um

lugar no canto. Assim, n��o precisaria conversar com

ningu��m.

Recostando a cabe��a no assento, fechou os olhos

e tentou dormir. Mas a mente girava ��s tontas com

imagens daquele dia, tornando imposs��vel buscar

ref��gio no sono. At�� agora n��o tinha conseguido as-

similar o que aconteceu. Evidentemente, Cary sentia

o mesmo.

N��o que ela se importasse com Cary. Descobrir

que ele havia continuado a enganar Rafe com a his-

t��ria do noivado destruiu qualquer pingo de simpatia

que ainda lhe restasse. O ��nico consolo �� que ele n��o

conseguira enganar a av��. Lady Elinor tinha tomado

provid��ncias para descobrir tudo sobre o neto e a

"namorada". De acordo com o sr. Arnold, o relacio-

namento de Cary com uma stripper do cassino onde

trabalhava n��o passou despercebido.

Cary tentou negar. Inclusive, teve o descaramento

de pedir que Juliet o ajudasse. Por��m, Juliet respondeu

que n��o queria mais nada com ele. E, ent��o, a surpre-

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

163

sa que o sr. Arnold lhe entregou levou Cary a acus��-la

de ter se aproveitado de Lady Elinor.

Tudo foi muito desagrad��vel e Juliet foi incapaz

de olhar para Rafe. Com certeza, ele pensava o mes-

mo que Cary. Que ela havia mencionado a sua situa-

����o financeira e Lady Elinor resolvera ajud��-la. N��o

era verdade. Mas quem acreditaria nela agora?

Em todo o caso, Lady Elinor deixou para ela os tr��s

an��is que lhe oferecera naquela tarde em Tregellin.

Havia o anel de rubi, que pertencera �� m��e de Rafe, o

anel de esmeralda e o solit��rio. Agora Juliet poderia

us��-los ou vend��-los, como bem entendesse.

Juliet ficou t��o comovida quanto constrangida. Os

an��is faziam parte da heran��a, e ela sentiu que n��o

tinha o direito de remov��-los da propriedade. Mas o

sr. Arnold insistiu que a cl��usula adicionada ao testa-

mento semanas atr��s, atendendo ��s instru����es da Lady

Elinor, estipulava que ela desejava que Juliet recebes-

se os an��is com a sua b��n����o.

Josie, que se sentou ao lado dela durante a leitura

do testamento na biblioteca, apertou-lhe a m��o.

- Elinor gostava de voc�� - falou baixinho. - Que-

ria que voc�� guardasse alguma lembran��a dela.

E Juliet, independente do que acontecesse, guar-

daria aqueles an��is. Dois, pelo menos. O que perten-

cera �� m��e de Rafe, ela devolveria assim que voltas-

se a Londres. Assim, ele jamais teria a chance de

acus��-la.

Outras doa����es se seguiram, para pessoas de quem

Juliet nunca ouviu falar, e para o m��dico, que ela

conhecia. E Josie, claro. Al��m de um pequeno chal��,

164

A N N E M A T H E R

onde poderia morar quando se aposentasse, a gover-

nanta recebeu a generosa quantia de cem mil libras,

o que fez Cary engasgar de susto. At�� Rafe se surpre-

endeu com a sorte de Josie. Por��m, ao contr��rio de

Cary, foi o primeiro a aplaudir a decis��o da av��.

- Voc�� merece - garantiu, perscrutando a face

corada de Juliet. - Sem o seu carinho e apoio, ela

jamais conseguiria manter esse lugar em ordem.

- E isso �� motivo para recompens��-la? - Cary foi

ferino. - Sei que a velha n��o era t��o durona quanto

fingia ser. Mas abrir m��o de cem mil! �� rid��culo!

- O dinheiro era dela, sr. Daniels. - O advogado

encarou-o com um olhar severo. - Mas agora vamos

�� partilha do patrim��nio de Lady Elinor.

Caiy se calou, e agora Juliet estremeceu ao relem-

brar os eventos que se sucederam. Ningu��m estava

preparado para a not��cia que o sr. Arnold relatou, mas

ela sup��s que todos entenderam a dica quando anun-

ciou que Cary herdara duzentas mil libras em t��tulos

do tesouro. O resto da propriedade - incluindo a casa,

as fazendas que a cercavam e o conte��do de um cofre

depositado no banco em Bodmin - foram deixados

para o neto mais velho de Lady Elinor.

- Mas este sou eu! - Cary exclamou, confuso. - Eu

sou o ��nico neto leg��timo da vov��. Rafe... Ele �� um

bastardo, em todos os sentidos.

- Receio que n��o. - Antes que o advogado tornasse

a falar, Juliet notou a dor que assomou o semblante de

Rafe. Mas, ent��o, o sr. Arnold tirou outro envelope da

pasta e estendeu para Rafe com um sorriso curioso. -

Isto lhe pertence, creio. A sua av�� me pediu para lhe

entregar junto com um pedido de desculpas.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





165


- O que ��? - indagou Cary, o rosto vermelho de

raiva.

Rafe ignorou, sacando o documento em meio ao

sil��ncio mortal que se abateu sobre a sala. Ent��o, a

pr��pria express��o traiu o choque que acabara de re-

ceber. Ficou t��o p��lido que Juliet pensou que ele

desmaiaria. Entretanto, o sr. Arnold explicou que era

a certid��o de casamento dos pais de Rafe. Uma cer-

tid��o datada de 32 anos atr��s, antes de Rafe nascer.

L��gico, Cary enfureceu-se e arrancou o documen-

to das m��os tr��mulas de Rafe, brandindo o papel na

cara do primo, enquanto o insultava com todos os

palavr��es imagin��veis.

- �� uma farsa - rosnou. - A vov�� perdeu o ju��zo!

- Virou-se para o sr. Arnold. - Quem falsificou isso?

N��o, nem se incomode em responder. O pr��prio Mar-

chese cuidou disso, claro.

- N��o �� nenhuma farsa - informou o advogado, to-

mando-lhe a certid��o por precau����o. - Desculpe, Rafe.

Sei que ela queria lhe contar antes, mas temia perd��-lo,

caso o fizesse. Tregellin �� sua. Acho que agora voc��

entende que essa sempre foi a inten����o dela.

Juliet sentiu os olhos cheios de l��grimas. Querida

Lady Elinor, pensou. Voc�� sabia qual dos dois netos

realmente gostava de Tregellin. Devia ser complicado

para Cary, pois ele esperava herdar a propriedade.

Por��m, neste caso, ele a venderia sem hesita����o. E

Rafe, apesar das dificuldades, faria tudo ao seu alcan-

ce para manter o patrim��nio intacto.

Enquanto o sr. Arnold explicava os procedimentos

legais a Rafe e a Josie, Juliet esgueirou-se para fora.

166

A N N E M A T H E R

A sua presen��a n��o era mais necess��ria e ela n��o

pretendia se envolver nos planos de vingan��a de Cary.

N��o seria estranho caso ele tentasse contestar o tes-

tamento, se pudesse. Todavia, Juliet acreditava que o

sr. Arnold era mais do que p��reo para ele.

Dois dias depois, Juliet viu Cary outra vez. Estava

saindo da butique no hor��rio do almo��o quando ele a

abordou.

- Ei - disse Cary. - Onde voc�� se meteu na outra

tarde? Pensei que quisesse dar uma ��ltima olhada na

propriedade, mas procurei voc�� por toda parte e n��o

a encontrei.

- Ah... eu... n��o devia estar ali - explicou, cons-

trangida. - Como descobriu onde me achar?

- Bem, fui ao seu apartamento. E uma senhora me

contou que voc�� arrumou emprego numa butique na

cidade. Ela disse que a loja se chamava Close To You,

ou algo parecido e, por sorte, me lembrei de um lugar

chamado Close-Up. Juliet fez uma careta. S�� a sra.

Heaton daria tal informa����o. A vizinha idosa n��o

passava muito bem ultimamente, e como Juliet ia ��

cidade todo dia, fazia umas componhas para ela.

Claro, a sra. Heaton perguntou onde trabalhava, e

Juliet n��o viu mal nenhum em contar. Agora lamen-

tava n��o ter sido mais discreta.

- Ent��o, o que voc�� quer? S�� tenho meia hora de

almo��o. Preciso voltar �� loja ��s 13h30.

- Ei, �� assim que se trata o ex-noivo?

- Ora, Cary, o que voc�� quer?

- Vamos, me deixe pagar-lhe o almo��o. Depois eu

conto. - Ergueu a m��o quando ela esbo��ou um

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

167

protesto. - Tudo bem, s�� um sandu��che. Tem uma

cafeteria na esquina.

- Eu sei. - Era onde Juliet almo��ava ��s vezes.

Quando trazia os livros da faculdade, usava a hora de

almo��o para estudar.

- Tudo bem, ent��o. - Cary colocou a m��o no om-

bro dela. - Vamos.

Era mais f��cil acompanh��-lo do que discutir. A

��ltima coisa que Juliet queria era que Cary armasse

um esc��ndalo na porta da loja. Mas soltou o bra��o

com for��a, antes de atravessarem a rua.

- Voc�� n��o est�� usando nenhum dos an��is - obser-

vou Cary, quando ela aceitou um caf��. - N��o sei se

voc�� sabe, mas aqueles an��is foram avaliados em um

quarto de milh��o.

O queixo de Juliet caiu.

- Voc�� n��o est�� falando s��rio!

- Claro que estou. Certa vez, peguei um deles

emprestado e levei para Bodmin. O joalheiro falou

que me daria mais de um milh��o pelo lote.

- Mas voc�� acabou de dizer que...

- Na avalia����o do seguro - esclareceu. - Em todo

o caso, pensei se n��o estaria disposta a emprest��-los,

como... fian��a para um empr��stimo.

- N��o posso.

- Como assim, n��o pode? - Cary imediatamente

variou de amig��vel para agressivo.

- N��o tenho todos os an��is. Enviei o anel de rubi

de volta para Rafe ontem.

- Sua imbecil! N��o sabe que esse era o mais va-

lioso dos tr��s? Ah, eu n��o pensei nisso antes, mas de





1 6 8


A N N E M A T H E R

acordo com o joalheiro, trata-se de um rar��ssimo rubi

burm��s.

- Ora, ��timo. - Juliet sentiu-se grata por estarem

na cafeteria. Tinha a sensa����o de que Cary n��o res-

pondia pelos pr��prios atos. - Estou feliz por devolv��-

lo a Rafe. Enfim, se isso era tudo o que voc�� queria,

voltarei para a loja.

- Mas e os outros an��is?

- O que t��m eles?

- Bem, n��o vai me emprestar como pedi? Voc�� me

deve uma, Juliet. Sem aquela carta de refer��ncia que

lhe dei, voc�� n��o conseguiria emprego.

Juliet contou at�� dez.

- J�� se esqueceu de que cumpri a minha parte no

trato? E n��o lhe custou nenhum centavo, ali��s. Use o

dinheiro que Lady Elinor deixou. Deve bastar para

financiar qualquer empreendimento que planeje.

- Voc�� s�� pode estar brincando! Aquilo mal pagou

as minhas d��vidas. A prop��sito, se espera que Mar-

chese agradecer�� a devolu����o do anel, esque��a. A boa

e velha Liv j�� anda calculando os lucros.

Juliet n��o acreditou, por��m, mais tarde, enquanto

comia a pizza que preparara no microondas, n��o con-

seguiu evitar pensar no que Rafe faria. Herdar Tre-

gellin foi maravilhoso, mas sustentar o lugar seria

bem diferente. Era poss��vel que fizesse como Cary

sugeriu e vendesse uma das fazendas para obter ca-

pital. N��o restava d��vida de que a casa carecia de uma

reforma urgente. E Rafe n��o poderia protelar isso

indefinidamente, n��o se pretendesse que a antiga re-

sid��ncia resistisse.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

169

Entretanto, isso n��o era da conta dela, lembrou-se.

No m��ximo, o seu envolvimento foi transit��rio, e

ainda sentia que n��o merecia o legado que Lady Eli-

nor lhe deixou. O ��nico consolo �� que Cary, sabendo

dos an��is, talvez os vendesse sem hesita����o assim que

a av�� morresse. Possivelmente, sem contar nada a

Rafe.

Juliet lavava os pratos quando algu��m tocou o

interfone, e preparou-se para atender algum desco-

nhecido que apertou o bot��o errado.

- Al��?

- Juliet?

A boca ressecou imediatamente.

- Sim?

- Posso subir?

A m��o tremia. Queria despach��-lo. Mas o desejo

de v��-lo outra vez foi mais forte.

- Tudo bem - retrucou, apertando o bot��o. - Em-

purre a porta. Est�� aberta.

Juliet correu para o banheiro. N��o havia tempo

para lavar o rosto, trocar de roupa, ou se maquiar.

Mas, pelo menos, ela passou um pente nos cabelos,

prendendo-os num rabo-de-cavalo. Sempre que che-

gava do trabalho, tirava o el��stico e trocava a bata de

renda e a minissaia por uma camiseta rosa bem des-

botada e um short cinza que j�� vira dias melhores.

Ele bateu poucos instantes depois, e Juliet correu

de volta para a sala. Respirou fundo antes de abrir a

porta.

- Oi.

Rafe ficou parado na soleira, vestindo um jeans

preto e camiseta. S�� mesmo nele roupas t��o casuais

170

A N N E M A T H E R

adquiriam aquela eleg��ncia despojada, insinuando os

m��sculos rijos que cobriam.

Mas foi a folha grossa de desenho que ele segura-

va que a distraiu. Era um esbo��o em carv��o de Juliet

deitada na cama. Um desenho delicado, inocente,

embora sensual. Uma interpreta����o lisonjeira da apa-

r��ncia dela na noite em que fizeram amor.

Juliet engoliu em seco, e Rafe aproveitou a opor-

tunidade para dizer:

- �� bom ver voc��, Juliet. Vai me convidar para

entrar?

Juliet paralisou, tentando n��o se deixar seduzir pelo

sorriso l��nguido de Rafe. Era ��bvio que trouxera o

desenho para desarm��-la.

- Pensei que eu fosse a ��ltima pessoa que voc��

quisesse ver.

- O que s�� demonstra o quanto est�� enganada.

Tome. - Entregou-lhe o desenho. - Isto �� para voc��,

se quiser. Eu tenho d��zias semelhantes em casa.

- Espera que eu acredite nisso?

- Eu n��o minto. Se aceitar visitar o ateli�� nova-

mente, posso provar.

- Mas o que voc�� quer? - indagou, tristonha, apoian-

do o desenho no cabideiro logo atr��s da porta.

- Conversar. Pedir desculpas, acho. Agi feito um

imbecil no enterro. Parece que voc�� provoca o que h��

de pior, e melhor, em mim.

Juliet suspirou.

- Ora... tudo bem. V�� em frente. A sala �� logo ali.

Quando Rafe entrou, ela foi assaltada pelo perfume

da lo����o de barba, pelo aroma ��nico do seu corpo. Ele

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





171


pareceu hesitar, mas encaminhou-se at�� a sala, obser-

vando tudo com um olhar atento.

- Aceita um drinque?

- Um refrigerante cairia bem - disse Rafe, embo-

ra n��o estivesse dirigindo. Mas o ��lcool apenas au-

mentaria o seu constrangimento.

- Coca-Cola diet ou suco de laranja? - indagou

Juliet, fingindo estudar o conte��do da pequena gela-

deira. - Pode escolher.

- Um suco seria ��timo. - Ent��o, vendo que ela

apanhou um copo, Rafe aproximou-se. - Eu bebo na

lata mesmo.

Os dedos de ambos se tocaram e ela sentiu peque-

ninas fagulhas de energia dardejarem pelo bra��o.

Entretanto, Rafe n��o pareceu notar e abriu a lata,

bebendo sofregamente.

- Eu precisava disso. Obrigado.

- Por que n��o se senta?

Ele era uma figura intimidante, sentado na beira

do sof��, as pernas esticadas, ainda segurando a lata

vazia.

- Por que n��o se junta a mim?

- Prefiro continuar de p��. Ent��o... mais alguma

coisa?

- Evidentemente, voc�� acha que n��o.

- Bem, voc�� falou que queria pedir desculpas, e j��

aceitei. O que falta mais? Ah... - Juliet continuou

quando uma id��ia lhe ocorreu. - Fiquei feliz porque

a sua av�� deixou Tregellin para voc��. Tenho certeza

de que voc�� merecia isso muito mais do que o Cary.

Rafe contemplou a lata antes de deposit��-la na

mesinha ao lado.

172

A N N E M A T H E R

- Foi por isso que voc�� fugiu? N��o foi uma atitude

meio infantil?

- Eu n��o fugi. Para come��ar, eu nem queria com-

parecer �� leitura do testamento. E voc�� n��o estava

interessado em nada do que eu tinha a dizer. Gostaria

de ter me despedido de Josie, mas voc�� e ela estavam

conversando com o advogado. Apenas fui at�� a vila

e chamei um t��xi. J�� tinha o bilhete de trem para

voltar a Londres.

- Voc�� viajou com o Cary?

- N��o! Ele disse isso?

- Talvez tenha comentado algo a respeito. Imagino

que voc�� o encontrou. Apesar dos seus protestos, pelo

jeito o meu primo ainda faz parte da sua vida.

- N��o �� verdade. Se quer mesmo saber, ele veio

me pedir emprestado os an��is que a sua av�� me dei-

xou. Eu n��o emprestei. Temi que jamais os veria

novamente.

- E n��o �� verdade? Meu Deus, o sujeito n��o tem

nenhum escr��pulo.

- Acho que ele n��o concorda que eu mere��a os

an��is. E, com toda a franqueza, nem eu.

- Bobagem. - Rafe levantou-se, admirando-a com

uma intensidade perturbadora. - A vov�� queria que

voc�� ficasse com eles. - Colocou a m��o no bolso da

cal��a e tirou o estojo de veludo que Juliet lhe devol-

vera. - Incluindo esse.

Quando Rafe levantou a tampa, Juliet viu o rubi

burm��s aninhado no forro de cetim branco.

- Lindo, n��o ��? Tome. Aceite.

- N��o. - Propositalmente, Juliet colocou as m��os

para tr��s. Rafe imaginou que ela n��o percebeu que,

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





173


ao faz��-lo, revelou que n��o estava usando um suti��.

- �� seu. Ele pertenceu a sua m��e. Ningu��m tem mais

direito a guard��-lo do que voc��. Foi por isso que o

devolvi.

Rafe tentou ignorar a excita����o s��bita e se concen-

trar no que ela falava.

- Ent��o, n��o foi s�� porque o anel era da minha

m��e?

- N��o. - Nada poderia passar mais longe da ver-

dade.

- Ent��o, talvez voc�� o devolveu na esperan��a de

que eu viesse traz��-lo de volta pessoalmente.

- N��o. - Agora ela ficou indignada para valer. - Eu

n��o lhe daria tal satisfa����o. Al��m do mais, Cary con-

tou que voc�� e... Lady Holderness andam muito...

��ntimos.

- Ah, �� mesmo? Eu esperaria algo assim dele, mas

n��o de voc��.

- Por que n��o? N��o pode negar que ela conhecia

bem o seu apartamento. E quanto ��queles dese-

nhos...

- Quer dizer, os esbo��os? J�� lhe contei tudo. Liv

queria que eu pintasse o retrato dela para dar de pre-

sente ao marido. Era para ser uma surpresa. O que eu

deveria fazer? Recusar a comiss��o?

- Ent��o voc�� fez? Pintou o retrato dela?

- Sim, pintei. E ela o deu de presente ao marido.

Parece que ele adorou, portanto, n��o �� mais nenhum

segredo.

- Sinto muito.

- ��, eu tamb��m.

174

A N N E M A T H E R

- Voc�� n��o pode negar que ela... bem, ela gosta de

voc��.

- E eu gosto dela. Em doses homeop��ticas. Juliet,

quando eu aceitei pintar esse retrato, eu sequer co-

nhecia voc��.

- Eu sei. - Juliet sentiu-se envergonhada. Espiou

na dire����o do hall. - O desenho que voc�� trouxe... ��

muito bom.

- Ent��o n��o vai rasg��-lo assim que eu sair pela

porta.

- N �� o !

- Mas devolveu o anel.

- E voc�� sabe por qu��.

- Independentemente da opini��o do Cary?

- Independentemente da opini��o do Cary. Ele �� um

mentiroso. Agora eu sei.

- Ah, sim. Mas ele queria que eu financiasse um

saque a descoberto, dando-lhe permiss��o para vender

o anel. Como indeniza����o por priv��-lo da pr��pria

heran��a.

- N��o �� verdade. Priv��-lo, digo.

- Eu sei. Mas como voc��, me senti culpado pelo

modo como a vov�� o tratou.

- A maioria das pessoas consideraria duzentas mil

libras mais do que suficientes.

- Sim. Mas tudo �� relativo, suponho, e ningu��m

falou que o Cary custava barato.

- E da��?

- Em troca, ofereci o ateli�� e o apartamento. Disse

que ele poderia alugar ou vender. N��o preciso deles.

Reformei a velha cocheira onde costumava trabalhar,

e pretendo me mudar para Tregellin. Josie falou que

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

175

fica comigo at�� eu decidir substitu��-la. Com as obras

e tudo o mais, eu n��o poderia passar sem ela.

- Ent��o, como voc�� vai... - Calou-se de repente.

- Esque��a. N��o �� da minha conta.

- Como financiarei a reforma? Lembra-se do cofre

do banco que o velho Arnold mencionou? Ele guarda

d��zias de t��tulos de investimentos que a vov�� juntou

desde que o meu av�� morreu. Arnold falou que eu

podia vend��-los e vendi. Paguei o imposto, l��gico,

mas mesmo assim sobrou mais do que dinheiro sufi-

ciente para reformar Tregellin, e ainda financiar a sua

manuten����o por um longo tempo.

- Ora... que bom. Fico muito feliz por tudo estar

dando certo para voc��.

- Fica mesmo? - Juliet estava completamente

desprevenida quando ele passou a m��o tr��mula na sua

face abrasada. - Voc�� faz alguma id��ia do motivo pelo

qual vim at�� aqui? Sabe como lhe sou grato por de-

volver o anel e me dar um pretexto para v��-la?

Juliet estremeceu.

- Voc�� precisava de um pretexto?

- Depois do que aconteceu no funeral? Acho que

sim.

Juliet cravou as unhas nas palmas das m��os.

- Voc�� s�� disse o que pensava de mim...

- N��o! Nada disso.

- Sim. E n��o o culpo. O que eu fiz �� imperdo��vel...

- Juliet...

- Por favor, me desculpe, sim? A minha ��nica

justificativa �� que estava muito desesperada naquela

��poca...

176

A N N E M A T H E R

- Como eu estou agora - Rafe interrompeu brus-

camente, capturando o rosto perplexo de Juliet entre

as m��os e fitando dentro daqueles olhos tristes. - Mi-

nha querida, ou��a. Eu me arrependo de cada palavra

que eu disse. Sim, eu estava zangado, acreditava que

voc�� e Cary continuavam juntos. E sim, eu estava

cego de ci��mes. Mas j�� estava sofrendo, e v��-la com

Cary acabou comigo.

- Compreendo. A morte da sua av�� deve ter sido

um choque terr��vel.

- Sim, foi. Eu amava muito aquela velha. Mas n��o

foi s�� isso. Antes de falecer, ela me contou que a

morte da minha m��e n��o foi um acidente como sem-

pre pensei. Ela disse... que a minha m��e cometeu

suic��dio. Que ela se jogou da sacada do hotel.

Juliet engasgou.

- Mas como ela podia saber uma coisa dessas?

Pensei que as duas n��o fossem ��ntimas.

- E n��o eram. Mas ela escreveu para a vov�� um dia

antes de morrer, pedindo para que cuidasse de mim.

- Oh, Rafe!

- Sim. Acho que n��o �� o que voc�� esperava ouvir.

Faz alguma diferen��a?

- Diferen��a em rela����o a qu��?

- O que voc�� acha? Deve saber que gosto de voc��.

- Respirou fundo. - Santo Deus, Juliet, eu sou apai-

xonado por voc��.

Juliet emudeceu.

- N��o sei o que dizer.

- Diga que sente o mesmo - pediu baixinho. Bai-

xou o olhar para os l��bios dela. - Sabe o quanto eu

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

1 7 7

quero beij��-la agora? Deixe-me beij��-la. Voc�� n��o

sabe, mas tem a boca mais incr��vel do mundo...

Murmurou a frase junto aos l��bios dela, enquanto

Juliet deliciava-se com o seu gosto. Rafe segurou-a com

for��a, a l��ngua invadindo e acariciando, mostrando o

quanto precisava dela com esse simples gesto de amor.

E Rafe era um mestre na arte de amar. Quando

segurou a barra da camiseta dela, Juliet ajudou. Ela

se derreteu por dentro conforme ele a acariciava, a

l��ngua possuindo cada um dos mamilos rijos. Ela

tremia nos seus bra��os. Desejou tanto que ele a abra-

��asse de novo. E Juliet sussurou:

- Claro que eu amo voc��.

- Voc�� n��o faz id��ia do quanto eu fiquei desespera-

do quando voc�� foi embora - disse ele, puxando-a para

si, para que ela sentisse o que tal confiss��o lhe provo-

cou. - Pensei que havia estragado tudo, e que voc��

sequer soubesse sobre a minha m��e. Deus, eu n��o

durmo desde que voc�� me deixou. Sem mencionar que

eu achava que voc�� e Cary continuavam juntos.

- N��s nunca estivemos juntos. Voc�� acredita em mim,

n��o ��? E lamento pela sua m��e, mas se voc�� ainda vi-

vesse na It��lia, n��s jamais nos conhecer��amos.

- Acredito em voc�� - garantiu, sentindo o sangue

pulsar abrasado. - Mas, Santo Deus, podemos guardar

as explica����es para depois? Eu quero voc��, quero

entrar em voc��.

Juliet abriu um sorriso.

- Oh, sim. Gostaria de conhecer o meu quarto?

- Desde voc�� entenda que n��o pretendo dormir.

Certo, mostre-me. Talvez eu pense em outra coisa

para lhe mostrar.

178

A N N E M A T H E R

Rafe n��o deixou Juliet fechar as cortinas.

- Se algu��m quiser assistir, tudo bem. Eu amo

voc��, Juliet. N��o temos nada a esconder.

Ambos despiram um ao outro, lentamente de in��cio

e, ent��o, com um desespero cada vez maior. A camiseta

e o short de Juliet foram f��ceis de tirar, mas ela demorou

um pouquinho para livr��-lo do cinto e da cal��a.

- Juliet, permita que... - sugeriu Rafe, as m��os

tr��mulas quando abaixou o jeans at�� as coxas. - tenho

mais experi��ncia do que voc��. - Ela o encarou ressa-

biada. - N��o tanta assim. E nunca disse a uma mulher

que a amava. Exceto a vov��, l��gico. Mas ela era es-

pecial.

Os beijos foram t��o vorazes, e Rafe explorava os

seios com as m��os, massageando os bicos t��rgidos

com os polegares.

- Voc�� �� t��o linda. N��o acredito que a deixei partir

sem dizer o que sinto por voc��. Minha ��nica desculpa

�� que eu s�� descobri que voc�� foi embora depois.

- Eu mal podia esperar para fugir dali - confessou.

- Achava que voc�� devia me odiar. E n��o o culparia

por isso. Eu mesma me odiava.

- E o que sente por mim?

Ela arregalou os olhos.

- Precisa perguntar?

- Acho que sim. Depois do jeito como a tratei.

- Ah. - Juliet repousou a testa na dele. - Creio que

me apaixonei por voc�� desde aquela primeira manh��

em Tregellin. Voc�� e Hitchins vieram nos receber e

pensei que formavam a dupla mais simp��tica que eu

j�� vi.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O

179

- Tem certeza? Hitchins n��o �� muito simp��tico.

Juliet riu.

- N��o, n��o ��. Onde ele est��, a prop��sito? Eu meio

que me apeguei ��quele cachorrinho.

- Est�� onde devia estar, em Tregellin - contou

Rafe, que circundou os l��bios dela com a l��ngua. -

Voc�� logo o ver��. Ele �� um excelente juiz de car��ter.

Por��m, ele n��o aguentaria esperar mais. Fazendo

com que ela se recostasse nos travesseiros, Rafe en-

terrou o rosto entre os seios de Juliet.

- Eu amo voc��. Muito - declarou, aconchegando-se

sobre o corpo dela. - Nunca mais me deixe. Eu n��o

suportaria. Enchi a casa de desenhos seus, mas eles n��o

s��o bons o bastante. Nada... - e abaixou o tom, num

sussurro sensual - ...nada se compara ao original...

EP��LOGO

O P R I M E I R O Natal de Juliet em Tregellin foi o mais feliz da sua vida. Ela e Rafe decoraram a velha casa

juntos, e o aroma peculiar dos ramos de visco e aze-

vinho se misturou �� deliciosa fragr��ncia de pinho da

enorme ��rvore que enfeitava o hall.

Eles se casaram em outubro. O pastor comandou

a cerim��nia na igrejinha da vila de Tregellin, para

apenas uma d��zia dos amigos mais ��ntimos. Depois,

ambos passaram duas semanas numa ilha no Oceano

��ndico, antes de retornarem para a rec��m-reformada

Tregellin House e �� vida que partilhariam.

Rafe queria que ela pedisse demiss��o e voltasse

com ele no ver��o. Por��m, apesar da tenta����o, Juliet

decidiu terminar o curso de computa����o. Embora ele

garantisse que a amava, ela temia que Rafe estivesse

vulner��vel devido �� como����o pelo falecimento de

Lady Elinor. Tinha muito medo de que ele se arrepen-

desse de ser t��o impulsivo quando pensasse melhor.

L��gico, ela se enganou redondamente. Rafe passou

os tr��s meses seguintes indo e voltando de Tregellin

a Londres, sempre que o trabalho permitia. Freq��en-

tava tanto o apartamento dela que a velha sra. Heaton

perguntou se Rafe havia se mudado para l��.

- Se ela me desse chance - assegurou, bem-humo-

rado. E Juliet corou quando ele olhou para ela.

I R R E S I S T �� V E L A T R A �� �� O





181


Desde que retomaram da lua-de-mel, Juliet prati-

camente assumiu a administra����o da propriedade. As

novas habilidades em inform��tica possibilitaram que

ela controlasse todas as contas, e Rafe entregou-lhe a

incumb��ncia mais do que satisfeito.

A pr��pria carreira ia de vento em popa. Recebera

v��rias comiss��es desde o retrato de Lady Holdemess,

e o talento foi reconhecido por outras galerias do pa��s.

Rafe trabalhava tanto que precisou parar de lecionar,

mas sempre pensava primeiro em Juliet.

At�� onde sabiam, Cary estava morando em Nova

Iorque. Ele partiu logo ap��s o casamento, deixando

uma pilha de d��vidas para tr��s. Rafe pagou a maioria

delas, sob os protestos do advogado. Por��m, confessou

�� Juliet que s�� fez isso por Lady Elinor.

Ent��o, em janeiro, aconteceram duas coisas que

causaram um grande impacto na vida dos dois.

A primeira foi que Juliet descobriu que estava

gr��vida. Ela e Rafe nunca discutiram sobre quando

come��ariam uma fam��lia, e Juliet receava dar-lhe a

not��cia. Mas Rafe ficou encantado, s�� um pouco

apreensivo quanto �� rea����o dela.

- Preciso admitir, nem sempre fui t��o cuidadoso

com os preservativos como deveria ser.

- Oh, querido! - Juliet enla��ou-o pelo pesco��o e

aninhou o corpo inteiro junto ao dele. - Eu n��o pode-

ria estar mais realizada. Nada seria mais gratificante

do que sentir o seu filho crescendo dentro de mim.

Claro, Rafe se esfor��ou muito para assegurar que

concordava, e quando desceram do quarto, j�� era fim

de tarde. Nevava l�� fora, o tipo de flocos delicados

que se espera ver no Natal.

182

A N N E M A T H E R

- Pense nisso - murmurou Rafe, puxando o corpo

esguio da esposa para si. - No pr��ximo inverno, n��s

seremos um trio. - Beijou-lhe a nuca e acariciou-lhe

o ventre. - Portanto, suponho que devo aproveitar ao

m��ximo, enquanto tenho voc�� s�� para mim.

O segundo acontecimento foi completamente di-

ferente. No final do m��s, quando Juliet come��ou a

sofrer os efeitos do enj��o matinal, ela recebeu uma

carta dos advogados do pai. Eles informavam que o

seu ex-marido, David Hammond, morrera em George

Town, nas Ilhas Caymans. Aparentemente, David

desenvolvera uma forma virulenta de c��ncer h�� seis

meses, e deixou um testamento tornando-a sua ��nica

benefici��ria.

Dizer que Juliet ficou assombrada seria pouco. A

carta chegou quando ela preparava uma x��cara de ch��,

e ela precisou sentar-se alguns minutos para se acal-

mar. Embora Josie ainda trabalhasse na casa, a sobri-

nha, Connie Boswell, assumiu a maior parte das ta-

refas dom��sticas. Entretanto, as duas n��o chegavam

antes das 9h, portanto Juliet geralmente aproveitava

para ter um pouco de privacidade.

Agora, por��m, ela arrumou as x��caras e o bule numa

bandeja e levou para o marido. Apesar do sistema efi-

ciente de aquecimento, ainda estava frio, e Juliet sentiu-

se grata por poder tirar o robe e voltar para a cama.

- Hum, voc�� est�� gelada - murmurou Rafe, quan-

do ela enroscou os p��s frios nas pernas dele. - Venha

c��, me deixe aquec��-la.

- Ainda n��o. - Apesar de render-se a um beijo

l��nguido, Juliet insistiu em se sentar. - Ou��a isto

- e resistindo aos protestos de Rafe, ela leu a carta.

IRRESIST��VEL ATRA����O





183


- Nossa! Voc�� est�� muito triste?

- Triste? - Juliet arqueou as sobrancelhas e Rafe

pensou como ela estava maravilhosa naquela cami-

sola, cuja al��a escorregou num dos ombros. - N��o

acho que seja tristeza, exatamente. Choque, talvez.

Ele ainda era muito jovem.

- Ent��o, como se sente? - persistiu Rafe, afagando-

lhe a nuca. - Voc�� parece muito p��lida.

- �� porque fiquei enjoada de novo. - E quando ele

tentou reclamar porque ela n��o o acordou, Juliet fez

uma careta.

- O que voc�� poderia fazer? - indagou, acarician-

do os l��bios dele com o indicador. - Al��m do mais,

est�� tudo bem, mesmo. O dr. Charteris falou que isso

n��o dura muito.

- Tanto faz... E quanto a David? Afinal, o sujeito

tinha uma consci��ncia.

- Hum. - Juliet ficou pensativa. - Acho que en-

frentar o que corresponde a uma senten��a de morte

mude a mentalidade das pessoas. Mas lamento, claro.

Ningu��m merece morrer assim. S�� que eu nunca amei

o David. - Deu um sorriso t��mido. - Agora eu sei.

Rafe puxou-a para si.

- Parece que voc�� voltou a ser uma mulher rica -

comentou, melanc��lico, mas Juliet simplesmente

aninhou-se nele e balan��ou a cabe��a.

- Eu n��o quero o dinheiro. Por muito ou pouco que

seja. - Beijou-o. - Importa-se se eu doar para a cari-

dade? - E continuou, com um sorriso de aprova����o.

- Eu j�� tenho tudo o que preciso bem aqui.





HARLEQUIN


�� PROCURA DO AMOR





Helen Brooks


- Voc�� disse que n��o sente atra����o por mim e que quer

ser apenas meu amigo. Ent��o �� claro que estas regras n��o

podem ser de seu interesse, certo?

- Ah, mas eu menti, Beth. - Os olhos cinzentos seguiram

encarando-a.

- O qu��?! - Ela foi pega de surpresa.

- Menti. - Um sorrisinho se formou no canto da boca de

Travis, e ela sentiu que estava boquiaberta. - Sabe? Faltar

com a verdade? Inventar? Deturpar?

- Sei o que significa mentir - ela rebateu, n��o t��o incisi-

vamente quanto gostaria. Era dif��cil ficar furiosa ao mesmo

tempo em que sentia pequenos -arrepios de cima a baixo da

coluna. - Por qu��? Por que mentiu sobre...

- Sobre n��o me sentir atra��do por voc��? - ele completou,

e ela ficou ainda mais arrepiada. - Porque voc�� parecia pres-

tes a entrar em p��nico, e n��o quero perturb��-la e fazer com

que mude da casa que alugou. Come��amos com o p�� esquer-

do, eu sei disso, mas sair para caminhar no campo por horas

para me evitar me pareceu um ato de desespero. Mas menti

apenas em parte.

- Em parte? O que quer dizer?

- Disse que acho voc�� interessante como pessoa, e acho.

- Ele se aproximou, e ela sentiu cada nervo de seu corpo. - N��o sou nenhum adolescente vol��vel, Beth, cuja ��nica id��ia de

relacionamento �� descobrir como nascem os beb��s. J�� tive

mulheres, n��o nego, e seria mentira dizer que n��o quero lev��-

la para a cama. Mas n��o agora, s�� quando voc�� quiser. Quero

conhecer voc��, e quero que voc�� me conhe��a. Ent��o, se voc��

quiser que as coisas prossigam...

- E se eu n��o quiser? - Ela tremia tanto que sabia que ele

estava percebendo. - O que vai acontecer?

- Ent��o cada um segue seu rumo.

Ela passou a m��o tr��mula pelo rosto.

- N��o... N��o estou pronta para entrar em um relaciona-

mento, por mais lentamente que seja. Ainda �� cedo demais...

depois de tudo que aconteceu.

Ele se posicionou de um modo que deixava claro que iria

beij��-la. Algo aconteceu e mudou no ��ltimo instante, algo

indefin��vel, mas muito poderoso. Ela olhou fixamente para

seus olhos profundamente cinzentos, e ent��o sua boca se uniu

�� dele, mas n��o da maneira leve e educada das outras vezes.

Agora, seus l��bios estavam quentes e ansiosos, inebriantes.

Ele n��o fez men����o a abra����-la quando o beijo se intensificou.

N e m precisava. Um calor ardente flu��a pelas veias de Beth.

Ela sabia que ele devia beijar assim. Desde a primeira vez

em que o vira e at�� pelos leves beijos casuais nos l��bios. Uma sensualidade de quem sabe das coisas...







---------- Forwarded message ---------
De: Bons Amigos lançamentos




O Grupo Bons Amigos lança mais uma obra nos formatos : Pdf,txt e epub
para atender aos deficientes visuais !

Irresistível Atração - Anne Mather
Livro doado por Neilza e digitalizado por Fernando José

Sinopse:
Juliet conhece Raphael um belo e soturno italiano logo nasce uma perigosa atração

Sobre a autora:


Mildred Grieveson (Inglaterra, 10 de outubro de 1946) conhecida pelos pseudônimos Anne Mather, Caroline Fleming e Cardine Fleming, é uma das maiores escritoras inglesas de ficção romântica da atualidade, já tendo vendido (2006) mais de 85 milhões de livros no mundo todo [carece de fontes]. Seu primeiro romance, "Caroline", foi publicado em 1966 e teve sucesso imediato.

Anne Mather escreveu mais de 150 romances, sendo um dos último, Paixão Selvagem, um best seller de grande êxito mundial. Seus livros foram traduzidos para diversos idiomas e editados em muitos países. Sua obra "Leopard in the Snow" tornou-se um filme de sucesso e seu romance, "Stormspell", também um best seller.

Lançamento    Só Livros com sinopses e Grupo Bons Amigos:

)https://groups.google.com/forum/#!forum/solivroscomsinopses  







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