D A M E S M A A U T O R A :
A D E L A I D E C A R R A R O
L . O R E N
EDITORA E DISTRIBUIDORA DE LIVROS LTDA.
S��O PAULO
Capa de
MARIO DECIO CAPELOSSI
Direitos autorais adquiridos por:
L. OREN ��� Editora e Distribuidora de Livros Ltda.
Escrit��rio: Avenida Ipiranga, 1.100 - Sala 22
Fone: 34-5338 - S��o Paulo
Impresso no Brasil
1 9 7 4
�� N D I C E G E R A L
I Virgens Neur��ticas 11
II Filosofia? Cada Dia um Homem! 35
III 40 Anos. Seios Duros 47
IV Dinheiro ? Os Homens me dar��o 59
V Dr. Voc�� ter�� uma filha Prostituta 63
VI Gr��vida? P��lulas 79
VII Meus 15 Anos Fervem 85
VIII Largue-me... doi 93
IX Festa do Vale Tudo 103
X O Sem Vergonha 109
XI Oito Homens. Duas Meninas 129
XII Aquela?!? Dorme com o Diretor 155
XIII De uma Chupadinha 179
XIV Juventude.. . Pare 195
P R E F �� C I O
�� bem dif��cil classificar mais um livro de ADE-
LAIDE CARRARO. Quando ela lan��ou o livro "Eu E O
GOVERNADOR", pensei tratar-se apenas de "fofocas", para fins comerciais. Mas, na propor����o em que foram
saindo os seus livros, percebi a t��trica realidade. ADE-
LAIDE CARRARO conta em seus livros toda a verdade
n��a e crua. Verdades que j�� foram notici��rios de Im-
prensa Falada, Televisionada e Escrita. ADELAIDE
CARRARO, uma fr��gil mulher, quase que desamparada,
tem enfrentado sozinha graves problemas com os seus
livros, mas a corajosa escritora n��o deixa de rasgar o
v��u das apar��ncias para revelar-nos, ao vivo, quase todas
as chagas que trituram a nossa sociedade. Neste livro
"ESCURID��O", ADELAIDE CARRARO, na sua natu-
ridade, chega a causar-nos arrepios. Ficamos choca-
dos ao ler este livro, pois n��o acreditava-mos que fosse
poss��vel existir indiv��duos como o pai de Ivete, desti-
tu��do de qualquer freio psicol��gico. Porisso somos obri-
gados a acreditar que existe gente sem escr��pulo e as
vezes as encontramos no mais alto escal��o da socie-
dade.
Toda essa est��ria faz de "ESCURID��O", a nascente
da deprava����o, um fogo vivo em nossas m��os.
Quer um conselho? Deixe de lado a classifica����o li-
ter��ria e veja, depois de terminar de ler mais esta fan-
t��stica obra da querida e corajosa escritora, que resta-
r�� um ardor de fogo, uma brasa viva dentro de voc��.
JO��O DA SILVA PEREIRA
I
Virgens Neur��ticas
Estamos no m��s de Fevereiro. Em S��o Paulo, o ca-
lor �� infernal. Tem horas que chega aos trinta e oito
graus. Isto, para os paulistas, �� um calor de amargar.
Principalmente para n��s, as alunas do Col��gio Sinai,
um dos mais luxuosos dessa cidade, pois as freiras n��o
permitem que usemos trajes mais leves. �� por demais
horr��vel termos que nos abafar dentro destas saias
azuis de um pano um pouco mais grosso que tergal.
Ainda por cima, completando esse torturante uniforme,
temos meias tres-quartos, sapatos pretos pesados e cor-
pete tamb��m azul, sob as saias ��� por si s�� just��ssimas.
Sentimo-nos mais ou menos como v��timas daqueles tor-
niquetes medievais...
O col��gio �� um casar��o estilo colonial, com um mon-
te de janelas amea��adas de desaparecer (por causa das
trepadeiras que sobem pelas paredes, sempre muito bem
cuidadas) e com grupos de chamin��s apontando o c��u,
como se fossem de uma f��brica ou como se fossem imen-
sos falos. Todo o grande edif��cio �� de tijolos expostos e
��� 11 ���
telhas na mesma cor ��� um fosco e escuro alaranjado
��� e �� cercado por um gigantesco parque. Quando che-
guei aqui, logo que bati os olhas nele, fiquei deveras
impressionada. Achei o parque, e tudo o mais, uma be-
leza.
�� uma boa lembran��a e s s a . . .
Agora, eu estou sentada, n��a, ao lado da janela.
Lia um livro chamado "Asco", e j�� n��o me concen-
trava mais na leitura. Depositei o livro no colo e fixei
os olhos no quente ver��o que trazia para dentro do
meu quarto o embriagante perfume de rosas. Elas se
espalham, at�� hoje, por toda a volta do col��gio. Era um
perfume que embalsamava at�� o menor cantinho do ca-
sar��o. Depois do roseiral, se estendia a grama, de um
verde brilhante, que chegava a ofuscar os olhos da gen-
te, quando estavam, como agora, batidas pelos raios do
sol. No meio da grama, tamb��m numa constru����o ao
estilo antigo, d o r m e a grande piscina de ��guas azula-
das, onde era permitido ��s meninas um banho de al-
guns minutos. Isso uma vez por semana e, assim mesmo,
de cal����o e malha, o que nos tornava um bocado rid��-
culas, mesmo depois que nos acostumamos a rocambo-
lesca vis��o de uma a outra. Enfim, bem distante do pon-
to de vista da minha janela, l�� embaixo, as frondosas
��rvores, enfeitadas com mesinhas e bancos de pedra,
onde se permitia a presen��a de visitas, em dias determi-
nados. Agora aquilo tudo parecia long��nquo, apesar de
eu ainda estar ali.
Absorvi-me a contemplar o morrer do sol, quando
Ivete, a minha companheira de quarto, entrou e veio
at�� a janela, para o meu lado.
��� ��, Regina, as rosas coloridas fazem um belo con-
traste com o verde escuro das ��rvores... �� uma be-
leza.
Ivete ficou observando alguns segundos na mesma
dire����o que eu e depois continuou:
��� 12 ���
��� O Ver��o, em S��o Paulo, �� muito mais bonito do
que esperava, quando vim para c��. Agora, quando vol-
tar para Recife, vou poder falar da beleza de tudo isto.
Ivete fez um muxoxo, bastante brejeiro, franzindo
o nariz e apontando para nossa direita.
��� Mas? daqueles vasos cinzentos, com aquelas flo-
res amarelas eu n��o gosto. N��o s��o l�� uma grande ma-
nifesta����o de "prefer��ncia". O decorador falhou ali.
Nisso, sentindo a falta da minha participa����o, Ive-
te olhou para o meu colo e viu o livro "Asco". Escanda-
lizou-se, como eu j�� esperava.
��� Nossa, menina! Voc�� quer ter outro dem��rito por
estar lendo um livro n��o permitido?
S�� a�� eu acordei. Fui quase intempestiva.
��� Dem��rito n��o me importa! Posso ter d��zias deles
que vou continuar lendo este l i v r o ! . . .
Ivete n��o entendeu bem a minha pequena explo-
s��o. N��o tinha condi����es de entender. Apenas balbu-
ciou:
��� Mas por que?
Continuei no mesmo tom, pomo se n��o tivesse in-
terrompido a minha frase anterior:
��� Ele me lembra muit��ssimo o problema da minha
m��e! Como voc�� sabe, ela n��o sai das televis��es! Pica
l�� se arrastando aos p��s daqueles imundos, em busca
de um lugar em alguma novela! Essa autora foi mui-
to feliz fazendo este livro! �� um grande exemplo! Prin-
cipalmente para as mocinhas gananciosas e, ao mesmo
tempo, ing��nuas, que querem o estrelato f��cil e acabam
perdendo tudo sem conseguir nada!
Ivete estava um pouco em estado de confus��o quan-
do eu me interrompi.
��� 13 ���
��� Mas, se a Madre souber que voc�� est�� lendo "isso",
vai ter um frege neste col��gio!
V�� que Ivete n��o iria compreender com facilidade.
Procurei encurtar a conversa, ent��o.
��� Eu digo a ela que pensei que o livro estivesse na
lista de autores permitidos.
��� De qualquer maneira, voc�� tinha que pedir per-
miss��o ao Servi��o de Censura de Livros do col��gio.
Ivete n��o estava sendo inteligente, era f��cil de ver
��� Digo que presumi que isso n��o fosse necess��rio.
Voc�� sabe que eu n��o gosto de dar satisfa����es do que
fa��o, a essa gente. N��o dou satisfa����es do que fa��o, nem
aos meus pais.
Ivete enveredou por outro caminho. No fundo, es-
tava gostando da minha atitude.
��� A Mestra me disse, hoje, que voc�� �� uma menina
brilhante e que deve ajudar a endireitar a sua compa-
nheira de q u a r t o . . .
Agora fui eu quem se surpreendeu e ficou um pou-
co em confus��o. Ivete soltou uma gostosa gargalhada.
��� Imagine, uma menina de quinze anos como voc��,
endireitar uma louca como e u ! . . .
Ivete come��ou a circular pelo quarto, de bra��os aber-
tos, quase dan��ando, como uma lev��ssima gazela. N��o
se interrompeu, e agora, atingia as bordas da ironia,
de uma ironia contida, amarga, como se estivesse com
vontade de chorar.
��� Ivete Cerqueira Cesar, da mais rica fam��lia de
Pernambuco, que d�� milh��es e milh��es pra sustentar
este imenso santu��rio de meninas que est��o loucas pra
sair por a��, abrir as pernas e dar a virgindade a quem
de boas condi����es pra entender por que elas est��o dando!
��� 14 ���
Ivete, enfim, parou no meio do quarto, deixou cair
os bra��os, suspirou fundo e concluiu entredentes:
��� Eu sou a primeira a querer pular essas grades,
pois sinto coisas muito boas quando estou perto de ho-
mem! Eu n��o gosto de escola, nem no Ver��o, nem no
Inverno, nem em qualquer outra esta����o!...
Ent��o, como eu em certas ocasi��es, sem sair do tom
empregado, Ivete mudou completamente o caminho do
assunto.
��� S�� gosto das f��rias! E, por falar em f��rias, eu
aproveitei um bocado as ��ltimas! Espero que voc�� tam-
b��m tenha aproveitado as suas ��� quero dizer, com a
sua fam��lia, com a sua m��e, o seu pai.
Demorei alguns segundos para me levantar da li-
geira letargia em que Ivete havia me lan��ado. Mas con-
segui .
��� Ah, isso de ficar com papai e mam��e n��o faz
diferen��a nenhuma. Falei, deixando o livro sobre a
pequena mesinha pr��xima a janela e me enrolando nu-
ma toalha. ��� Eles sempre jogam a culpa um no ou-
tro por n��o poderem passar as f��rias comigo. Mas eu
n��o ligo. Tenho sempre uma amiga �� disposi����o, e fa��o
da fam��lia dessa amiga a minha fam��lia. Quando a mi-
nha m��e fica sabendo onde eu estou, vai me buscar e
diz que a culpa �� de meu pai. Ela diz que nas minhas
f��rias ele sempre arranja um monte de servi��os extras
e viaja pros confins do judas, l�� pro estrangeiro. Quan-
do ele volta, diz que a culpa �� da minha m��e que me
deixa no col��gio nos feriados e na casa de amigos nas
f��rias. Minha m��e grita que o contrato na tv n��o per-
mite que ela saia quando lhe d�� na bola e que meu pai
�� quem tem obriga����o de vir me buscar.
Aqui, n��o pude evitar ser tamb��m um pouco
amarga.
��� 15 ���
��� Nas minhas f��rias h�� sempre grandes "arranca-
-rabos" l�� em casa. Fazem dramalh��es anormais pela mi-
nha aus��ncia. E imagine voc�� que est��o separados...
Por a�� j�� d�� pra voc�� fazer uma id��ia do que passei
quando estavam juntos. Era um inferno, uma briga
atr��s da outra, e eu ��a sempre a favor da minha m��e.
Parecia que eu me recuperava daquela neurose. Es-
tava ficando melhor a lembran��a.
��� Como eu lhe disse uma vez, eu e ela nos compre-
endiamos muito bem. Pelo menos naquela ��poca, pois
hoje n��s apenas fingimos que nos damos bem.
N��o sei por que, voltei a mim, voltei a enxergar
Ivete. Talvez fosse o meu estado de consci��ncia, a cons-
tante depress��o... Ivete estava deitada na cama, ba-
lan��ando as pernas para o ar. Perguntei, de s��bito:
��� Existe alguma afinidade entre voc�� e seus pais?
Ivete, que parecia n��o se inteirar do meu proble-
ma ou do que eu dizia, parou de balan��ar as pernas no
ar, naquela inoportuna gin��stica, e ficou mais ou me-
nos avermelhada, enquanto gaguejava para responder:
��� Meu pai �� um velho �� antiga. N��o gosta que eu
frequente festas e saia com rapazes. Mas eu saio assim
mesmo e dou aos rapazes todas as liberdades poss��veis
e imagin��rias. As vezes chego em casa com o batom
todo deformado e �� a�� que as coisas esquentam. Eu acho
infernal o meu pai gritando: "Qualquer dia eu te mato!
Voc�� tem que se portar como uma Cerqueira Cesar, n��o
andar por a�� deixando-se bulinar por esses cabeludos
de cal��as apertadas! Eu te mato! Juro que te mato! Voc��
tem que se casar virgem, de v��u e grinalda, como man-
da a tradi����o da fam��lia! E se algum dia, eu n��o a sou-
ber virgem, juro que te mato!"
Ivete riu nervosamente, uma risadinha ir��nica, e,
ap��s a explos��o, debru��ou-se sobre a janela e ficou olhan-
��� 16 ���
do para o parque. Tinha um belo corpo a minha com-
panheira de quarto, um corpo jovem, quente e colan-
te. N��o sei por que, ela topou naquele assunto, e justa-
mente naquele m o m e n t o . . .
��� Voc�� sabe, Regina, que neste intrenato de vir-
gens neur��ticas, quase todas sentem um pequeno for-
migamento pelas outras e at�� mesmo pelas professo-
ras . . .
N��o entendi a princ��pio, mas, logo em seguida, Ive-
te tornou-se mais clara:
��� Voc�� sabe que desconfiam de n��s? Isso �� devi-
do ao fato de voc�� ter cortado contacto com o resto das
meninas e se concentrado mais em mim. Elas s��o umas
invejosas...
S�� n��o entendi aonde Ivete queria chegar.
��� E da��?
��� Da�� que elas pensam que voc�� me ama.
N��o me preocupei muito com aquilo.
��� Elas que v��o pro inferno!
��� De mim elas n��o podem dizer nada, pois eu j��
tive muitos homens e vida livre fora do col��gio.
��� E a meu respeito eu n��o me importo com o que
possam pensar.
Ivete, ent��o, desviou os olhos do parque l�� fora para
mim.
��� Eu acho, Regina, que voc�� devia viver melhor,
por que, queira ou n��o, voc�� poder�� ser escolhida a Rai-
nha da Primavera este ano. Eu sei que vai fazer voc��
muito feliz e voc�� deve ficar mesmo muito feliz por que
��, realmente, a mais bonita de todas n��s. Mas voc�� sabe
que a escolha �� atribu��da por m��ritos, que s��o uma es-
p��cie de atestado moral. Assim, �� necess��rio compreen-
der que se voc�� deseja ser aceita, n��s devemos, cortar
��� 17 ���
as nossas liga����es. Se n��o tomarmos cuidado, podemos
acabar numa situa����o dif��cil. Acho que para o nosso
bem devemos nos separar. Voc�� poder�� ficar no quar-
to da Arlete, eu j�� falei com ela.
��� Mas eu gosto �� de voc��, Ivete, eu amo �� a voc��.
Algu��m j�� disse que devemos amar-nos uns aos outros.
Se nos separarmos agora, vai ser uma esp��eie de con-
firma����o a esses falat��rios, penso eu.
Ivete voltou novamente os olhos para o parque l��
fora.
O que pensam, essas idiotas, que fazemos?
��� Elas pensam que fazemos amor.
��� Pois se eu nem mesmo sei como se faz isso entre
duas mulheres. Voc�� est�� transformando o pensamen-
to das alunas em algo repulsivo.
Ivete, que nessa altura j�� tinha se colocado mais
�� vontade, come��ou a procurar pincel e esmalte para
pintar as unhas. Logo os encontrou, enquanto continuou
no nosso assunto.
��� �� uma caceteac��o dos diabos pra mim o que
est�� acontecendo. Esse falat��rio me deixa com a cuca
fundida. Eu sempre digo a essas meninas que durante
a noite falamos de livros. Digo que voc�� me empresta um
livro e, depois que eu leio, falamos a respeito dele.
Ivete deixou os apetrechos de pintura sobre a sua
cama e come��ou a despir-se. Mais do que nunca, seu
corpo me parecia lindo. N��o se interrompeu a�� tamb��m,
e nem me deu chance de um aparte.
��� Digo que �� pelos livros que nos damos bem assim.
Eu gosto, voc�� gosta, e assim vamos indo. Digo tamb��m
que voc��, apesar de ter s�� quinze anos, �� dona de uma
��� 18 ���
esp��cie de tranquilidade muito original. Digo que �� cal-
ma, ponderada, consciente, de uma consci��ncia dif��cil
de encontrar em adolescentes, hoje em dia.
N��a, com os seios balan��ando gelatinosamente de
acordo com os movimentos do corpo, Ivete se interrom-
peu. Ficou bastante p��lida, olhando para mim, e teve
coragem, ou for��as, de continuar. Ela, sobretudo, n��o
era mentirosa nata. S�� conseguia mentir tranquilamen-
te para os pais. Procurei ser ao m��ximo objetiva, ent��o.
��� Olha, Ivete, vamos ficar aqui neste quarto, e
sem ligar a seja l�� o que for que possam dizer ou pen-
sar! Eu j�� estou cheia de tudo isso! E depois, voc�� tam-
b��m �� inteligente o bastante pra n��o se importar com
mexericos! Isso �� coisa pra crian��a!
Ivete se irritou mais ainda com a minha observa����o.
��� Crian��a n��o tem vida social e sexual fora da es-
cola! E eu tenho!
��� De uma forma ou de outra, voc�� n��o precisa ser
t��o agressiva. Eu estou apenas tentando ajudar. N��o
acho direito voc�� ficar sofrendo por causa desses fala-
t��rios .
Ivete n��o aproveitou a pausa que dei. Passou a pin-
tar as unhas dos p��s. E n��a. o aue, pelas vis��es que
proporcionava, me deixava pouco �� vontade. Mas con.
tinuei assim mesmo.
��� Voc�� diz que tem vida social e sexual l�� fora,
diz que tem quantos homens queira e n��o sei mais o
que, mas lembre-se de uma coisa: do que eu aprendi em
apenas um ano, lendo livros que a professora de Ingl��s
me empresta, voc�� n��o faz nenhuma id��ia.
Sem tirar os olhos das unhas dos p��s, Ivete retru-
cou:
��� 19 ���
��� Voc�� s�� sabe de teoria. Na pr��tica �� mais di-
vertido e, na pr��tica, eu sei tudo.
��� Eu tamb��m posso ser t��o "entendida" quanto
voc��, se me ajudar. Mas enquanto estamos aqui den-
tro, sinto que h�� qualquer coisa em que posso me apoiar
pra ser superior. Aqui dentro, �� poss��vel conversar com
as professoras que gostam da gente, com a Madre e
com as outras, sem precisar ficar me defendendo de
"coisas".
��� N��o adianta nada perder tempo. Ou a gente co-
nhece "coisas" agora ou nos arrependemos pro resto
da vida, n��o importa o que se conhe��a depois. O que
n��o temos �� sempre mais importante do que o que te-
mos. Se voc�� espera, depois vai �� conhecer os amigos
de mam��e. Aqueles que a mam��e indica. E s��o sempre
da nossa idade.
��� A�� �� que est�� a quest��o, Ivete. Voc�� diz que as
pessoas da nossa idade a aborrecem e fica se preocupan-
do com o que elas pensam a nosso respeito. Voc�� nun-
ca vai aprender a viver no seu tempo se for atr��s de
conversa f��til, seja de velhos ou de jovens. Realmente,
n��o a compreendo. Acho que aqui dentro do col��gio
voc�� tem uma ��tima oportunidade de aprender, se gos-
ta de gente velha ou mo��a. �� uma experi��ncia impor-
tante, que s�� a conviv��ncia com as meninas do col��-
gio pode dar a voc��.
Houve alguns segundos de sil��ncio e depois Ivete
atirou com toda for��a o vidro de esmalte contra a pa-
rede. O vidro se espatifou, sujando tudo de vermelho.
Havia se convencido de que eu tinha raz��o. Esperei pas-
sar a explos��o para depois continuar. Apontei a parede.
��� Olhe a parede. Com essa mancha voc�� vai ter
uns mil dem��ritos. Aposto que vai ser dif��cil at�� conse-
guir permiss��o para sair do quarto agora.
20 ���
Ivete encarou-me, os olhos fuzilando:
��� Ora! E quem vai ver? E que me importa a pa-
rede!
��� H�� o risco de uma inspe����o! Eu s�� quero �� sair
daqui! Estou louca pra fumar, pra beber, pra ter os ho-
mens! �� s�� o que eu quero!
Preferi me calar. N��o adiantava nada mesmo. Ive-
te jogou-se na sua cama e ficou de olhos pregados no
teto. Eu fui arrumar meus livros e a�� chegou Arlete.
Ela entrou no quarto, como sempre fazia, intempestiva-
mente, falando em altos brados. Era tamb��m uma be-
l��ssima jovem, alta, com um corpo escultural.
��� Oi, gente, olhem o que estou trazendo.
Arlete tinha um cigarro esquisito nas m��os, nada
constru��do profissionalmente, industrialmente. Parecia
mais um cigarro de palha, desses que os homens do cam-
po fazem com tanto carinho. E a rec��m-chegada foi di-
reto a Ivete, que, j�� sabendo do que se tratava, pulou
da cama.
��� Primeiro eu!
Arlete sentou-se �� beira da cama, junto com Ive-
te, as duas comentando aquele estranho cigarro. Arlete
parecia n��o reter o contentamento. Estava exfuziante.
��� Vamos encher a caveira hoje! Vamos voar!
Ivete j�� estava com o cigarro nas m��os, e Arlete
percebeu a sofreguid��o com que a primeira vivia o mo-
mento.
��� �� s�� uma tragadinha, heim! Pois o "pacau" cus-
tou caro �� bessa!
Ivete n��o ouviu a recomenda����o de Arlete. Sugou
violentamente o cigarro.
��� Isso deixa a gente pensar que est�� no meio de
um monte de h o m e n s . . .
��� 21 ���
Arlete insistiu na recomenda����o. As duas tinham
se esquecido de mim. Era como se eu n��o estivesse pre-
sente .
��� N��o aspire com tanta for��a. Esse �� dos melhores
que existem.
Ivete j�� tinha queimado o fumo a uma boa quan-
tidade. Ent��o come��ou a tossir, at�� ficar quase verme-
lha. Arlete n��o tinha outra coisa a fazer sen��o rir. Eu
ainda n��o havia me recuperado da surpresa inicial. Foi
tudo muito r��pido.
��� Porra, n��o �� que �� forte m e s m o . . . !
Arlete n��o deu tempo a que Ivete se recuperasse.
Tomou-lhe o cigarro das m��os e veio na minha dire����o.
��� Agora voc��, Regina!
Sem querer ser polida, recusei a oferta. Aquilo me
assustava.
��� N��o, eu n��o quero esse neg��cio. Fica pegando
na garganta da gente.
��� Mas aspirando bem devagarinho n��o vai acon-
tecer nada disso, n��o vai dar nem uma tossezinha. O
que aconteceu com a Ivete foi exatamente isso: ela n��o
teve paci��ncia.
Continuei na esquiva.
��� N��o, sinceramente n��o quero fumar esse ne-
g��cio.
Ivete, que se aproximara por tr��s de Arlete, tomou
novamente o cigarro das m��os dela.
��� Deixa pra mim. Eu fumo.
E Ivete tragou o cigarro parecendo gostar muito.
��� Olha, Arlete, vou fumar at�� a metade numa tra-
gada s��. Quero ver se o efeito fica melhor,.
��� 22 ���
Arlete se divertia com a situa����o. Era t��o invete-
rada quanto Ivete. Ou mais.
��� Fica sim. Eu j�� fiz assim uma vez.
Procurei ponderar. Se nos pegam ali, fumando da-
quela erva, certamente nos expulsariam do col��gio.
��� E melhor dar um jeito de dispersar a fuma��a.
Hoje vai haver inspe����o nos quartos e, se n��o me en-
gano, j�� estou ouvindo pessoas no corredor.
Assustadas com o meu alarme, as duas apanharam
as primeiras coisas que viram ��� as roupas de Ivete so-
bre a cama ���, e come��aram a espalhar a fuma��a pelo
ar, procurando fazer com que ela saisse pela janela. Ao
fim de poucos segundos, s�� ficou um cheirinho estra-
nho pelo quarto, isso ap��s Ivete se atirar na cama, por
baixo das cobertas, e abrir um livro de Latim. Arlete
sentou-se em uma cadeira e fingiu que lia Hist��ria. Eu,
continuei arrumando meus livros e, de vez em quan-
do, olhava para a porta, que, ap��s um suspense terr��-
vel, abriu-se, dando passagem a diretora do col��gio, que
entrou farejando o ar, como uma cadela ca��adora.
Permaneci como estava, mas deixando os livros de
lado, em aten����o �� presen��a da diretora. Arlete levan-
tou-se e Ivete tamb��m, mas procurando enrolar-se nu-
ma coberta, como se a diretora tivesse nos surpreendido.
Ao lado dela estavam duas funcion��rias, e o cigarro eu
n��o sabia onde tinha ido parar.
��� Boa tarde, mo��as.
Respondemos como nos permitia nosso estado de
esp��rito, que era suficiente para que a velha hiena n��o
percebesse nada de anormal no quarto. Em seguida, ela
deu uma volta pelo quarto, da mesma forma que as
duas funcion��rias, examinando minuciosamente todos
os cantos. Depois, fixando-nos alternadamente, ciciou:
��� Ouvi dizer que as senhoritas fumam.
��� 23 ���
Eu fiquei quieta. N��o teria tempo de responder,
mesmo que quisesse, pois Ivete e Arlete arregalaram os
olhos, exclamando quase que ao mesmo tempo:
��� N��s!?!
A diretora cruzou os bra��os, numa atitude de so-
berania .
��� Voc��s sim. Sei s�� pelo c h e i r o . . .
Ivete foi sarc��stica:
��� Eu presumo, senhora diretora, que o cheiro vem
l�� do charuto do jardineiro. Ele est�� trabalhando bem
debaixo de nossa janela.
��� Voc�� n��o deve presumir nada, senhorita Ivete.
�� bom que me apresente fatos da pr��xima vez. Se n��o
apresentar, da pr��xima vez que sentir cheiro de cigar-
ro aqui dentro, voc�� ganhar�� vinte dem��ritos. E com
vinte dem��ritos se perde a metade das f��rias, voc��s sa-
bem.
��� Sim, senhora diretora. ��� Murmurou Ivete, hu-
mildemente .
Depois, com al��vio, vimos a diretora sair. Eu dei-
xei-me cair sentada numa poltrona, e respirando fun-
do de satisfa����o por que a megera n��o descobrira nada,
Ivete e Arlete cairam na risada. Arlete falava, entre
uma risada e outra:
��� Se ela soubesse que cigarro ��, qual a marca que
n��s fumamos, acho que ganhar��amos o bilhete azul hoje
mesmo!
Resolvi interferir naquela manifesta����o de irres-
ponsabilidade .
��� Eu n��o disse! N��o devemos fazer nada de erra-
do, ou, pelo menos que a diretora julgue errado! A me-
lhor coisa que a gente tem a fazer �� estudar!
��� 24 ���
Arlete parou de rir. Ou melhor, continuou. Mas ja
sem a euforia de antes.
��� Eu n��o tenho nada para estudar. J�� fechei em
Franc��s, em Ingl��s, em Hist��ria, j�� fechei em tudo.
��� Eu, n��o, ��� exclamei. ��� Por isso tenho que es-
tudar .
��� Ora, por que voc�� n��o cola? ��� perguntou Ivete.
��� Pode ser uma boa solu����o. ��� confirmou Arlete.
N��o tive tempo para nada. Ivete abriu um outro
caminho na conversa, sombria:
��� Eu, nem colar posso. Da ��ltima vez que fiz isso
com uma colega, o resultado dela estava todo errado.
As duas tiramos zero e repetimos o ano. Foi muito cha-
to por que as duas provas estavam iguaizinhas.
Arlete, que j�� estava se cansando daquele assun-
to, n��o suportou mais.
��� �� melhor parar com isso. Na falta do que fazer
��� a ��nica coisa pra fazer nesse ermo ��� vamos falar
em homens. E, por falar em homens, voc�� j�� foi bei-
jada alguma vez, Regina?
��� N��o.
��� N �� o ? ? ? Voc�� est�� com quinze anos e nunca foi
beijada ? ? ?
��� E voc��, Arlete? ��� inquiriu Ivete.
��� Muitas vezes, por uma por����o de homens. E com
a l��ngua bem molhada.
��� �� bom, n��o? ��� perguntou Ivete, interessada.
Eu j�� estava meio tonta com tanta "sensualidade".
E Arlete respondeu a Ivete:
��� Experimente ser beijada por um desses tipos su-
per-machos e que esteja com a cabe��a cheia de "fu-
ma��a"
��� 25 ���
Ivete come��ava a tremer de prazer.
��� Hum, que t e z �� o . . .
Um vermelho vivo estava cobrindo o rosto de Ivete.
E e]a j�� n��o podia mais se controlar.
��� E depois vem aquela hist��ria de "voc�� tem um
lindo corpo que come��a a adquirir formas" e as m��os
bobas come��am a subir e a descer, pra baixo e pra cima,
na gente.
Houve um fr��mito da parte de Ivete. Ele estava
quase gozando na nossa frente.
��� Assim n��o h�� dignidade que resista... ?
Arlete parecia t��o interessada quanto Ivete.
��� E como voc�� reage depois que p��e a dignidade
de lado?
��� Eu n��o me mexo. Fico com o corpo mole e os
bra��os caidos.
��� U��! Por que?
��� D��i menos.
��� N��o entendi.
��� Se o cara come��a a te bulinar com os dedos, voc��
deve descontrair os m��sculos, deve relaxar.
��� Mas s�� com o dedo n��o �� ser seduzida. Quero
saber se voc�� j�� dormiu com algum homem. Se j�� teve
alguma experi��ncia de verdade.
��� Ainda sou virgem, se �� o que voc�� quer saber.
Realmente, nunca tive uma experi��ncia verdadeira, mas
j�� dormi nuazinha com muitos rapazes. Mas isso n��o
quer dizer nada. Pelo menos uma boa parte das garo-
tas que eu conhe��o gostam de dormir abra��adas a ra-
pazes .
��� 26 ���
Resolvi interceder. Aquele assunto estava me inte-
ressando. Mas me interessando tanto que cheguei a es-
tranhar. N��o estava me reconhecendo.
��� Eu nunca tive essa oportunidade ��� interferi ���
e nem saberia dizer quando poder�� acontecer.
Ivete procurou me incentivar:
��� Muito me admira voc�� falar em oportunidade,
Regina. Quando estivemos naquele col��gio misto l�� na
Guanabara, muitas noites eu dormi com rapazes. E olhe
que eu tinha apenas onze anos!
Aproximou-se mais de mim: ��� Quer ver uma outra
oportunidade? Nos fins de semana, no Guaruj��. En-
quanto os velhos jogam cartas, a mo��ada entra nos
apartamentos um do outro e surgem mil oportunidades.
Voc�� perde um punhado de coisas gostosas por passar
os fins de semana aqui no col��gio ou na casa de sua
m��e. Nem mesmo bebe, e j�� tem quinze anos. L�� nas
praias, as meninas que eu conhe��o, e os rapazes, come-
��am a encher a cara j�� nos doze.
��� Ora, voc�� sabe como a mam��e ��. Ela que vive
procurando uma oportunidade na tv, acha que a filha
tem que ser santa. Nada de fumar, nada de beber ou
namorar. ��s vezes bebo cuba-libre escondida.
��� Chiiii! Cuba??? Que tro��o mais enjoado! O ne-
g��cio �� na pinga mesmo. A gente tem que amar o Bra-
sil ou deix��-lo. E como eu o amo mais do que todo mun-
do, bebo pinga, que vem de seu solo.
Ivete rodopiou as m��os pelos ares e concluiu a sua
patri��tica manifesta����o.
��� �� uma esp��cie de homenagem ao nosso pa��s.
Voc�� deve fazer o mesmo.
��� Ora, Ivete, voc�� dizendo tudo isso perto da Ar-
lete vai fazer com que ela pense que eu sou uma ino-
cente, mas eu n��o sou t��o inocente assim, n��o. Afinal,
��� 27 ���
sei muito sobre sexo e o que temos dentro do corpo.
Sei, por exemplo, como s��o os homossexuais e posso, se
voc��s quiserem, explicar como eles se amam.
��� Isso �� velho. Eu at�� vi artistas em atitudes sus-
peitas. Ali��s, acho que voc�� n��o sabe essas coisas de ver-
dade. Fala por que leu nos livros de anatomia, n��o ��?
��� N��o senhora. Foi um rapaz que me contou. Um
rapaz do gin��sio.
��� Aposto que foi um desses repulsivos espinhudos,
que est��o sempre com as cal��as t��o justas que aparece
aquele horripilante amontoado de lado. Oh, Deus, como
os detesto. Gosto �� dos que j�� s��o homens, pois n��o vi-
vem a mostrar o que tem por entre as pernas para se-
rem valorizados. O homem de verdade procura at�� es-
conder. Nem quero conversa com meninos de gin��sio.
S��o t��o desajeitados. Meu gosto mesmo �� pra esses tipos
que sabem ser agrad��veis, que n��o abra��am muito aper-
tado, que n��o deixam cair a bebida da ta��a que seguram
na m��o.
��� Olha, Ivete, l�� vem voc�� novamente com homens
velhos. Com eles n��o h�� futuro. �� s�� dormir n��a, fumar
maconha, beber, beijar, deixar bulinar. A gente tem
mesmo que arranjar um jovem e casar, construir um
lar sadio, onde os nossos filhos aprendam o nosso exem-
plo. N��s estamos estudando no col��gio mais rico de S��o
Paulo e s�� ou��o falar em homens, bebida, sexo e tantas
outras b o b a g e n s . . . !
Arlete e Ivete cairam na gargalhada e foi Arlete
quem falou:
��� Olha a��, Santa Regina! Aposto que quer ser ca-
nonizada. N��o bebe, n��o fuma, n��o foi beijada e nunca
foi vista n��a por homem algum.
��� Voc��s est��o enganadas quanto a Santa. Mas
quanto ao resto, n��o fa��o porque me considero uma
menina. Quando fizer dezoito anos, arranjarei um noivo
��� 28 ���
que ser�� meu marido e me ensinar��, com a experi��ncia
que tiver, todas essas coisas. N��o quero aprender com
ginasianos, nem acho prazer ter qualquer homem nos
meus bra��os, encostar o meu corpo no dele s�� para
sentir o sangue ardendo nas veias. Acho tudo isso que
voc��s pensam uma grande cretinice. Quero ser pura,
levar uma vida pura e amar adoravelmente.
A campainha para o jantar tilintou. As meninas
vestiram-se rapidamente, pois no segundo toque, algu-
ma irm�� poderia surgir para verificar se todas esta-
vam bem arrumadas e com os cabelos amarrados para
tr��s. Todas deviam permanecer na porta do quarto at��
o terceiro toque, que indicava formar fila para o refei-
t��rio. Quem n��o estivesse pronta nesse momento rece-
beria um dem��rito. Eu ocuparia, como sempre aconte-
cia, uma mesa com Ivete, Alice e Renata.
Alice e Renata eram as meninas mais ordeiras do
col��gio. Eram como se esperassem que a inspe����o fos-
se de minuto a minuto. E tinham um posto importan-
t��ssimo dentro do col��gio. Organizavam todas as festas
e eram quem escolhia as jovens e a pe��a mensal que o
nosso teatro encenava. Para se chegar a isso era preci-
so ter as maiores notas em todas as mat��rias. Tamb��m
deviam ter tudo em ordem.
Alice e Renata eram um contraste comigo e com
Ivete, que faziamos do nosso quarto a maior bagun��a.
Durante os primeiros anos na escola, fiz o m��xi-
mo para ser uma aluna exemplar. Mas Ivete, como sem-
pre, com a sua influ��ncia, insistia para que eu me di-
vertisse, pois estava me tornando deprimida de tanto
estudar. Alice e Renata tamb��m faziam parte da comis-
s��o para a escolha da Rainha da Primavera. Elas acha-
vam que eu, apesar de ter uma forte personalidade, n��o
era l�� muito estimada pelo resto da comiss��o. Por isso
tinha, como Ivete me sugerira, de conviver um pouco
mais com as outras meninas, pois eu, sinceramente,
��� 29 ���
queria muito ser Rainha da Primavera. Ivete tinha ra-
z��o quando me aconselhava a estreitar mais amizade
com Alice e Renata. Por isso procurei, no refeit��rio, ser
gentil com ambas.
��� Voc�� quer, por gentileza, me passar o arroz, Re-
nata? ��� falei.
��� Oh, com prazer.
��� Deixe que eu passo, Renata ��� disse Alice, adian-
tando-se a Renata, j�� que estava mais pr��xima de mim,
��� N��o a temos visto no p��tio com as outras meninas,
ultimamente.
��� Ah, �� mesmo. Voc��s nem imaginam como tenho
estudado ��� menti.
��� Estudado?!? Mas dizem que voc�� �� s�� c��rebro,
que s�� l�� uma vez as li����es e logo aprende.
��� Nem tanto ��� respondi.
��� Que tal a sua entrada para o concurso de Rai-
nha da Primavera? ��� perguntou Alice. ��� J�� tem mui--
tos votos?
��� Olha, pra falar a verdade, nem sei se aceita,
riam a minha inscri����o. Voc��s, como s��o da comiss��o,
devem saber.
��� Claro que voc�� est�� inscrita.
��� N��o sabia, francamente. Isso me deixa muito
alegre. E u . . .
��� Se eu fosse t��o bonita quanto voc�� ��� cortou
Alice, excitada ��� ningu��m me tiraria a coroa.
��� Mas Renata j�� foi rainha, n��o foi, Renata?
��� Sim. J�� fui.
��� 30 ���
��� Diga-me uma coisa: como �� que a gente se sente
como majestade?
��� Parece que a gente est�� num outro mundo. Sen-
te-se que a gente �� a dona da festa. �� muito bom. Voc��
sabe que at�� recebi um convite da tv? Fiquei vidrada.
��� Que canal?
��� O quinze.
��� Por que voc�� n��o aceitou?
��� E voe�� acha que os meus pais deixariam? Eles
morrem de ��dio s�� em pensar que posso vir a ser atriz.
Somos de fam��lia quatrocentona; fam��lia tradicional,
como dizem os meus pais. Mas a sua m��e trabalha em
tv, n��o trabalha, Regina? Como ela diz que �� l��?
��� Aposto que �� maior bagun��a ��� emendou Ali-
ce. ��� Diretores fazendo amor com as atrizes e um mun-
do de invertidos oferecendo-se a troco de um minuto
de v��deo. Uns pisando nos outras para subirem de po-
si����o.
��� Sinceramente, eu n��o sei, pois mam��e ignora
essa infinidade de mexericos que voc��s parecem co-
nhecer t��o bem.
As duas ficaram vermelhinhas.
��� Ora, n��o precisa ficar zangada, Regina. N��s s��
quer��amos saber se tudo que sai nas revistas �� verdade.
��� Bem, em primeiro lugar mam��e nunca me fala
sobre isso. Em segundo lugar, mesmo que soubesse n��o
iria divulgar mexericos s��rdidos para duas meninas ino-
centes como voc��s.
As companheiras de mesa riram.
��� �� bom voc�� pensar sempre que estamos com o
p�� direito ��� disse Alice.
��� Bem, afinal, �� o que dizem aqui na escola a seu
respeito.
��� Puxa, como a turma se engana. Ter tantos m��-
ritos n��o quer dizer inoc��ncia.
��� ��. Mas voc��s tem sorte de estarem em todos os
primeiros lugares de moral alta aqui na escola. Tenho
tido v��rios aborrecimentos por que eu e a Ivete prefe-
rimos estudar no nosso quarto.
��� E dizem "coisas" a respeito de voc��s. Eu acho
que voc�� deveria aparecer de vez em quando l�� no nos-
so quarto para podermos estudar juntas. Sabem de uma
coisa? Leve a Ivete. Assim, estudaremos as quatro.
��� Ah, �� uma boa id��ia.
��� Sim. Talvez tamb��m Ivete, estudando bastante,
possa fazer parte da comiss��o.
��� Pois bem, falarei com ela.
Como odiava ser polida e gentil!... Quando a si-
neta deu por terminado o jantar, sa�� correndo para o
parque, e assim que me v�� entre as ��rvores e as flores,
senti como era maravilhoso ter quinze anos. Deixei-me
cair sobre a relva, debaixo de uma ��rvore, e fiquei sen-
tindo a frescura do capim nas minhas costas molhadas
de suor. Com o calor do dia, o cair da noite envolveu todo
o bosque com o perfume quente das flores. Era um al��-
vio estar ali, ao contato da relva ��mida, aspirando aque-
le inebriante perfume, ap��s sentir o odor do grande re-
feit��rio. Fiquei ali, deitada, esquecida de tudo, at�� que
as badaladas do sino que anunciava o recolhimento para
os quartos vibraram no a r . . . Nem liguei. O c��u terri-
velmente escuro e apinhado de estrelas me fez di-
vagar para outros mundos. S�� quando olhei para o ve-
lho casar��o com quase todas as luzes apagadas �� que
me lembrei que era, interna de uma escola. A�� atra-
��� 32 ���
vessei, correndo, o vasto gramado, abri a grande porta,
subi, correndo, a imensa escadaria e ao chegar ao quar-
to, atirei-me na cama.
��� Aonde diabos voc�� se meteu, Regina?
��� No mundo encantado do bosque.
��� Estava doida que voc�� chegasse para lhe per-
guntar se falou com a Renata e com a Alice, como su-
geri?
��� Claro, falei com elas.
��� E que tal? Elas foram legais?
��� Legal��ssimas. At�� nos convidavam para estudar
no quarto delas.
��� ��timo. Vamos dobr��-las. Assim, voc�� ser�� a Rai-
nha este ano.
��� N��o sonhe acordada, Ivete.
��� N��o sonho, querida. Sua coroa �� tremendamente
real.
��� Oh, sua maluquinha, voc�� �� uma boa pra��a! Por
isso eu vou dormir sonhando que estou com a coroa bem
fincada na cabe��a,
II
Filosofia? Cada Dia um Homem!
N��o fui coroada rainha, mas isso n��o me deprimiu
muito por que fui convidada pela fam��lia de Ivete a
passar as f��rias em Recife. Ficamos num lugar cha-
mado Jardim Cai��ara, convenientemente localizado, per-
to de um dos rios que cortam a cidade. Todos diziam que
aquele lugar era a Beverly Hill's do Recife. Maravilho-
sas vilas, escondidas em parques floridos e lindos ban-
gal��s que rodeavam uma encantadora pra��a particular,
pra��a que s�� podia ser usada pelos moradores das vilas
e dos bangal��s. No meio dessa pra��a existia uma enor-
me piscina, artisticamente projetada em arte moderna.
�� sua volta, centenas de mesas de m��rmore branco com
cadeiras de ferro esmaltadas de vermelho.
Ao fim do dia era hora dos que moravam nas vi-
zinhan��as vestirem roupas leves e esperarem o crep��s-
culo, tomando os mais variados refrescos, sentados ��s
mesas na beira da piscina. Era nessa hora, que alguns
diziam que crian��as deveriam estar se banhando para
dormir, que Ivete nos levava para l��. Digo levava por que
Arlete tamb��m estava com a gente. Ivete nos convidou
a entrar no bar, que era mesmo genial, pois era o ��nico
bar onde mocinhas podiam entrar desacompanhadas, sem
��� 35 ���
serem bul��nadas ou, abertamente, alvo de propostas. Sen-
tamo-nos em banquinhos altos ue rodeavam o balc��o e
o "barman" cumprimentou, gentilmente, a Ivete.
��� Como est��, srta.? J�� em f��rias? Espero v��-la
muitas vezes por aqui.
��� Gra��as a Deus estamos fora daquele infernal co-
l��gio e viemos aqui curtir a nossa. Jo��o, voc�� pode nos
servir tr��s martinis.
Polindo os copos com um alvo guardanapo, Jo��o
respondeu:
��� Sinto muito, mas a srta. deve lembrar que �� proi-
bido servir bebidas a menores de dezoito anos.
��� Ora, Jo��o, d�� escondido, como das outras vezes.
Olha, eu compro uma garrafa, escondo na saida do ba-
nho e a gente vai beber debaixo das ��rvores.
��� N��o. N��o, srta. Ivete. A lei �� severa. N��o deve-
mos servir bebidas alc��licas a menores. Por favor, n��o
insista.
Saimos do bar, deprimidas, quando Ivete levantou
um bra��o e come��ou a gesticular e a gritar:
��� A i ! A i ! Ai!
Ari era um homem j�� nos seus trinta anos, cons-
ciente do seu f��sico de pugilista. Fica ali a espera da
mais bonita garota, para conseguir obter um encontro
��ntimo no seu belo bangal�� super-decorado. Era um dos
rapazes mais ricos de Pernambuco Era um homem mui-
t��ssimo atraente para as meninas menores. Um belo
companheiro para beber, dan��ar, nadar, etc.
��� Como v��o, meninas? Solit��rias? E voc��, Ivete,
como est�� bonita! Que coxas, heim! Voc�� fica espeta-
cular dentro desse mini-biquini. S�� que tem um deta-
lhe: existem muitas marcas de gilete por a��, que ras-
pam muito bem.
��� Ora, tonto, o neg��cio aparecendo assim �� ge-
nial. Em Copacabana s�� se v�� jovens e at�� pessoas de
idade com isso aparecendo. �� excitante, n��o ��?
��� Muito escandaloso. N��o me apresenta as outras
bonecas?
��� 36 ���
��� Oh, claro. Regina, paulista, e Arlete, carioea.
As m��os se apertaram.
��� Ari ��� disse Ivete ��� chamei-o para lhe expli-
car que temos necessidade de uns golinhos. V�� l�� no
bar e compre uma garrafa de martini ou vodca, pinga,
qualquer coisa. N��s prometemos beber escondidas.
Tendo vindo a garrafa e os copos, os quatro, senta-
dos a beira da piscina, beberam abertamente. Os quatro
n��o. Tr��s, por que eu preferi um refrigerante.
��� Qual �� o assunto que abordamos, meninas? Fi-
losofia ?
��� N��o me venha com isso ��� disse Ivete. ��� A mi-
nha filosofia, agora nas f��rias, �� cada dia um novo ho-
mem. N��o me preocupo com a arte ou com os estudos,
com a guerra, com as bombas ou com os foguetes que
v��o ��. lua. Meu neg��cio �� me divertir, e muito, pois sin-
to que sou uma parte dessas coisas. Sou uma parte do
foguete, da televis��o, da guerra e da bomba. Assim, eu
preciso de um escape peri��dico.
��� Ent��o eu serei o primeiro homem dessas f��-
rias. Voc�� me aceita?
��� Estou dispon��vel ��� respondeu Ivete, apressa-
damente .
Ari sorriu um sorriso de dentes brancos e brilhan-
tes.
��� Isso me interessa profundamente. Convidarei
mais dois amigos e iremos jantar no meu bangal��.
��� Mas n��o v�� convidar nem um gigol�� ou nem um
ginasiano espinhado, est�� bem?
��� Voce, Ivete, sempre com esse problema... Tra-
rei homens ador��veis, �� claro.
��� Ent��o est�� legal.
��� Homens que amem o anseio da juventude ���
prosseguiu ele. ��� Assim como eu. A juventude de quin-
ze anos me atrai, voc�� sabe.
��� L��gico. Eu sempre soube disso.
��� Eu n��o irei, voc�� vai me desculpar, gim, Ivete?
��� 37 ���
��� Ora, n��o seja cacete e chata, Regina. Aqui, to-
dos s��o pra frente. Ningu��m vai reparar se voc�� jantou
com um ou mais homens. Que �� que vai chegar l�� no
bangal�� e espiar se voc�� est�� comendo ou f a z e n d o . . .
��� Chega, Ivete ��� cortou Ari. ��� A menina n��o co-
nhece os pernambucanos ainda. Talvez pense o diabo da
g e n t e . . .
��� N��o penso nada de anormal. S�� que n��o que-
ro ir.
��� Credo. Voc�� �� uma crian��a mimada. Quantos
anos tem?
N��o me dei ao luxo de responder.
��� Olha aqui, menina, a melhor forma que n��s,
pernambucanos, encontramos para tratar menina mi-
mada �� ignor��-la.
Ari segurou o seu copo e lentamente deu-me as cos-
tas. Eu fiquei analisando a perfei����o da cabe��a daque-
le homem, por tr��s. Sim, tinha uma bela cabe��a, talvez
mesmo pra ser ator l�� em Hollywood, um tipo assim de
Gregory Peck ou Tyrone Power.
Naquele momento em que ia me virando as costas,
Ari tinha uma express��o de arrog��ncia no rosto, uma
arrog��ncia que s�� �� permitida aos jovens milion��rios.
Nesse instante, veio se aproximando outro rapaz,
que tamb��m era bonito de morrer. Um p��o, como diriam
as meninas l�� do col��gio, quando achavam um rapaz de-
veras bonito. Quando chegou bem perto da gente, enco-
lheu os ombros num cumprimento a Ari.
��� Ol��, Ari, bebendo com tr��s bonecas e esquecendo
os amigos heim?
��� N��o sei do que voc�� est�� reclamando pois �� seu
costume que estou imitando.
��� Mas n��o vai continuar com isso, vai?
��� Est�� bem, Ney. Voc�� n��o beber�� com a gente
por que vai jantar conosco l�� em casa. Voc�� n��o devia
ser convidado, pois as garotas aqui s�� gostam de homem
de trinta. Dezoito para elas �� pirralho.
Ney sorriu.
��� 38 ���
��� Claro, meninas, se voc��s quiserem, posso lhes
mostrar o pirralho, que �� um verdadeiro homem.
��� Ora, cale a boca, Ney, pois temos entre n��s uma
santinha. ��� Virou-se para mim. ��� Olhe, �� essa a��.
Ney mediu-me dos p��s a cabe��a.
��� Olhe, garota, voc�� devia sentir-se orgulhosa de
sua beleza. �� uma das adolescentes mais esguias e bo-
nitas que conheci at�� hoje. Seus olhos s��o verdes, ou es-
t��o acentuados pela luz do sol?
��� S��o verdes respondi numa voz de criancinha,
s�� para chate��-lo. Mas ele n��o se deu por vencido e
disse:
��� Essa voz assim mimadinha faz pensar que voc��
est�� querendo flertar comigo . . .
��� Aposto que est�� mesmo ��� emendou Ari.
��� Ora, dane-se se quiser pensar assim. Jamais pre-
tendo conquistar homens me fazendo de crian��a. Quero
conquistar um homem, como j�� disse v��rias vezes, que
tenha uma esp��cie de tranquilidade especial na alma, e
nunca conheci ningu��m assim. E aposto que voc�� tam-
b��m, Ari, n��o o ��.
��� Puxa, como voc�� �� agressiva! Aposto mesmo que
nunca foi beijada.
��� Vamos mudar de assunto. Voc�� demonstra n��o
ter sensibilidade.
��� Sensibilidade ?! ? Quando se trata de coisas gos-
tosas, queridinha?!? Voc�� deve estar maluca.
��� Francamente, que conversa! Vamos parar, n��,
Regina! ��� disse Ivete. ��� Bem, vamos nos arrumar. Es-
cute Ari, onde diabo voc�� vai encontrar outro rapaz?
��� Ora, �� s�� dar um assobio que aparecem uns cem.
Voc�� quer v e r ? . . . Ah, n��o �� preciso assobio. A�� vem
Carlos.
Carlos, num short super-justo, com longos cabelos
brilhantes que lhe caiam nos ombros, era realmente mui-
to simp��tico. Morava na praia de Olinda e era grande
entusiasta de barcos a vela, por isso era o mais quei-
��� 39 ���
mado pela longa exposi����o ao sol marinho. Pouco fre-
quentava a piscina. Ele foi o meu par, ficando Ivete com
Ari e Arlete com Ney.
* * *
O bangal�� era bonitinho e finamente mobiliado. Lo-
go que entramos, Ari ligou a eletrola e serviu uisque pa-
ra todos n��s. Mas todo mundo preferiu gim-tonica, pois
em Pernambuco n��o se usa beber uisque no ver��o. Eu
hesitei, mas Carlos objetou:
��� Ora, Regina. Quinze anos e n��o beber gim ? . . .
Vamos, �� s�� um golinho.
A despeito do meu firme prop��sito de n��o come��ar
a beber t��o cedo, acompanhei Carlos no gim. Depois de
uns goles, animei-me e comecei a ficar encantada,
achando todos simp��ticos. Em pouco tempo j�� parecia
que n��s seis nos conhec��amos h�� anos. Bebi mais uns go-
les e algu��m apagou a luz. Assim dan��amos abstra��da-
mente, s�� com a luz da lua, luz que entrava esverdeada
pela janela, trazendo para o sal��o uma brisa fresca, pois,
apesar de estarmos todos s�� de biquini, o calor era in-
tenso. Da�� a pouco pude perceber Ivete sentada nos joe-
lhos de Ari e Arlete nos de Nev, cada casal em sof��s
diferentes. Carlos parou de dan��ar e me p��s nas m��os
outro copo de bebida. Como eu relutasse, pois come��ava
a me sentir esquisita, ele falou, rispidamente, que eu
n��o era soci��vel e que n��o sabia por que n��o escolhera
qualquer das outras duas garotas.
��� Uma festinha pode converter-se num aconteci-
mento cacetissimo quando se est�� em companhia de
uma garota que n��o quer nada. Nesses casos �� melhor a
gente sentar l�� fora e ficar estudando catecismo. O que
voc�� acha?
��� 40 ���
Apanhei o copo e comecei a ser "soci��vel", pois n��o
iria fazer uma cena. Simplesmente n��o podia estragar a
festa. Carlos segurou-me pela cintura e apertou-me bem
junto ao seu short. Decidi ignorar o que senti DO��S ti-
nha um desejo muito s��rio de me casar toda de branco.
Ningu��m iria manchar o meu vestido de noiva, pensava
enquanto aquilo acontecia.
��� Puxa, voc�� �� fria como gelo ��� disse Carlos, em-
purrando-me para longe dele.
Ari riu, Carlos n��o gostou.
��� �� . . . Voc�� fica a�� com uma garota legal e eu
aqui, morrendo de vontade. O neg��cio �� a gente trocar.
��� Essa aqui tamb��m �� virgem, bobo. Com o tem-
po, com um bom papo, a gente que �� inteligente, con-
segue alguma coisa.
Olhei para as meninas e vi que elas n��o diziam na-
da, pois estavam bastante tocadas. Olhei para Carlos e
n��o pude deixar de sorrir quando vi que seus olhos su-
biam e deciam pelo meu biquini super-justo.
��� Voc��, apesar de feia, �� uma garota muito atra-
ente.
Prendeu-me nos bra��os e beijou-me na testa. Morri
de prazer e ele beijou-me o pesco��o.
��� Voc�� nunca poder�� saber a falta que faz uns
carinhos para um rapaz assim ardente como e u . . . Que-
ria prestar aten����o no que ele dizia, mas ondas de ca-
lor que subiam, a tempos regulares, pelo meu corpo, fa-
ziam revirar o meu est��mago.
Olhei Ivete. Ela e Ari pareciam um s��, deitados no
tapete. Arlete e Ney, agarrados, beijavam-se longamen-
te, parecendo n��o haver mais ningu��m na sala, s�� eles
dois.
Mas aquela estranha sensa����o de enj��o n��o me lar-
gava. Queria correr para fora, mas n��o tinha coragem.
Seria "antisocial". Aguentei mais umas ondas, at�� que
corri feito uma doida para o jardim. Pensei que fosse vo-
mitar, mas, gra��as a Deus, o ar livre levou meu enj��o
como que por encanto. Quando voltei para perto de Car-
los, disse:
��� Estou passadissima... Desculpe-me...
Carlos riu.
��� Olhe, beba agua gelada que lhe far�� bem.
A�� ficamos na janela ouvindo os sussurros dos ou-
tros quatro. Eu sabia que tinha me portado infantilmen-
te e tamb��m sabia que Carlos passaria a ignorar-me.
O jantar foi uma por����o de batatas fritas e mais
bebidas.
* * *
Voltamos para casa as duas horas. Entramos sem
fazer ruido. Ivete e Arlete seguiram para o quarto e eu
fui, p�� ante p��, �� cozinha ver se conseguia um sonrisal,
pois estava com o est��mago dando voltas. Os pais de Ive-
te discutiam na sala. O pai de Ivete dizia:
��� Eu lhe disse que aquela menina precisava de uma
surra. Se eu a pegar, jogo-a pela janela. Duas horas e
ainda est�� com essa turma de malucos.
��� Querido, n��o comece a berrar, sen��o os criados
podem ouvir.
��� Ora, cala a boca. Voc�� n��o sabe ser m��e. Voc��
fica orgulhosa de ter uma putinha dentro de casa.
��� Eu n��o me orgulho de coisa nenhuma, pois eu
sempre disse a voc�� que n��o queria ser m��e de ningu��m.
Foi voc�� quem quis. Agora aguente.
��� Vou esper��-la entrar. Ela hoje vai conhecer um
Cerqueira Cesar.
��� Voc�� n��o vai dizer nada, pois tem consci��ncia do
muro que Ivete ergueu ao seu redor. Talvez seja brinca-
deira, pois essas meninas de hoje fazem todas as tenta-
tivas para se transformarem em adultas.
��� 42 ���
��� Mas voc�� pode reparar que ela faz tudo por s��
mesma, recusando o nosso aux��lio.
O pai de Ivete largou o copo de bebida em cima
da mesinha e, cruzando o sal��o, disse:
��� Ela j�� chegou. O carro est�� estacionado no p��-
tio. V�� cham��-la, sen��o entrarei no quarto sem respeitar
sequer as amigas que a acompanham.
Voltei correndo para o quarto e avisei Ivete. Ela le-
vantou-se na maior calma, vestiu um penhoir de rendas
azul, e sem esperar a m��e cham��-la, foi at�� a sala e en-
frentou o pai com sarcasmo e petul��ncia. O andar segu-
ro com passos largos do pai em sua dire����o n��o a assus-
tou. O velho disse, com voz firme:
��� J�� a proibi de chegar em casa depois da meia-
-noite.
Ivete, p��lida, fixava o pai, exibindo um sorriso sar-
c��stico .
��� Sim. ��� Sua voz estava cheia de ��dio. ��� Voc��
proibiu, mas esqueci. Tive vontade de me divertir. E da��?
��� E da��? E da�� voc�� tem dezesseis anos. E o peso da
lei cair�� sobre seus pais, se o juiz a apanhar nessas far-
ras com esses cabeludos.
��� Se formos pensar em leis, voc�� deveria estar no
fundo de um c��rcere.
Os olhos dos dois se fixaram, desafiadores. Nesse
instante percebi que devia haver um grande segredo en-
tre pai e filha. Tinha certeza de que era um t��trico se-
gredo. Os olhos de Ivete se desviaram dos do pai e pou-
saram nos meus. A�� senti que ela percebera que eu des-
cobrira algo. Ent��o fez tudo para encobrir e respondeu
natural.
��� Pode me dizer, heim, papai, se �� pecado passear,
dan��ar, viver. Voc�� j�� foi mo��o, n��o foi?
Percebi que o velho tamb��m tentava disfar��ar algu-
ma coisa.
��� Mas no meu tempo havia respeito. Meninas n��o
ficavam nas ruas at�� horas.
��� Respeito ? ? ? ��� Parecia que Ivete ia revelar algo,
mas se controlou novamente. ��� Mas hoje �� diferente,
papai.
��� Mas existe a lei.
��� N��o se segure na lei, papai. Ela pode cair na
sua cabe��a.
O pai de Ivete ficou branco. Ia dizer uma coisa mas
disse outra.
��� Ora, voc�� quer destruir-nos. . . N��o v�� que a sua
m��e foi at�� a um psiquiatra por sua c a u s a . . . ?
��� Por minha causa ? ? ? Faz me rir. Talvez algum
dos seus romances tenha dado pra tr��s.
Pensei que um bofet��o iria estalar no rosto de Ive-
te. Mas a m��o daquele homem alto e forte parou no ar,
por longos minutos. O desprezo nos olhos de Ivete cres-
ceu. Ela virou-se e deixou a sala. Quando entrou no
quarto disse:
��� Eles est��o fingindo que se preocupam comigo, s��
por que voc��s est��o aqui. Mam��e sempre foi uma b��bada
cercada de homens. Para esses homens dava tudo, esque-
cendo que eu era uma crian��a que precisava de cari-
nho. ��� Interrompeu-se por instantes e foi a copa, de on-
de voltou com um copo cheio de uisque, que bebia aos
golinhos. ��� Olha, quando mam��e queria estar sozinha,
sempre me empurrava para o bar. Aquele l�� da p^cina.
Ou ent��o viajava e me deixava com papai. ��� Ivete engo-
liu o resto do uisque e repetiu. ��� Com papai, com pa-
pai! Esse monstro! ��� Mas logo voltou a calma e disse:
Com voc��s eu me sinto muito bem.
��� Ora, n��o se aborre��a com isso, Ivete. ��� falei. ���
Mam��e e papai tamb��m, para se livrarem de mim, man-
daram-me para o internato. Diziam que l�� eu estaria em
seguran��a contra os pecados_ do mundo. Sempre que eu
pedia para ficar numa escola semi-interna, mam��e gri-
tava: "Ent��o voc�� quer me ensinar como devo cri��-la?
Voc�� quer modificar ou mesmo exigir que eu modifique
meu sistema de educa����o? Voc�� bem sabe como �� dif��cil
��� 44 ���
para uma jovem como eu andar falando por a�� que tem
uma filha de quinze anos. Isso �� detest��vel". Pelo que
voc�� v��, eu tamb��m sempre fui um problema para ma-
m��e.
��� Eu tamb��m sempre fui um problema para ma-
m��e ��� arrematou Arlete. Ela sempre tem ci��mes
quando algum homem diz: "Sua filha �� ador��vel". Ela
responde com desd��m: "Ah, ��. �� muito bonitinha sim".
Agora anda badalando pelo mundo. Sei de fonte limpa
que anda com amante a tira-colo na frente de papai.
��� Nossos pais ��� exclamou Ivete ��� sentiriam
um al��vio se n��o exist��ssemos.
��� Papai n��o �� l�� dos piores ��� disse eu. ��� Sempre
diz a mam��e para tirar-me do internato. Vamos ver este
ano. Talvez eu fique com mam��e na Guanabara.
��� E em que col��gio voc�� pretende estudar?
��� Talvez em nenhum.
��� N��o �� m�� id��ia ��� disse Ivete, brincando com o
copo.
��� Talvez n��o fosse uma m�� id��ia se a gente fosse
dormir. Estou morrendo de sono.
��� Bem, isso �� l�� com voc��s. Eu vou beber mais uns
goles. E com isso, amigas, deixo-as com a luz apagada.
Dormirei no outro quarto. N��o se assustem se ouvirem
meus pais brigarem, pois eles est��o apavorados com a
id��ia de terem uma filha mulher. Essa id��ia quase mata
mam��e, pois eu tenho dezesseis anos e ela nunca sai dos
vinte e nove.
��� Ah, as m��es de h o j e . . .
III
40 Anos. Seios Duros
No dia seguinte, mandamos Recife para o infer-
no, embora sentissemos um pouco a tristeza, pois iamos
passar uns dias em Olinda, mas Ivete estava doida para
deixar Recife e eu n��o queria mago��-la, pois con-
siderava justo que as pessoas que n��o gostam de certos
lugares se retirem. Al��m disso, os pais viviam bri-
gando por causa dela e eu j�� estava me aborrecendo. J��
no aeroporto quando os motores eram acelerados antes
da decolagem, foi que me lembrei que tinha prometido
a mam��e uns colares e outras bugigangas que agora
nem me lembro.
Quando descemos no gale��o, fiquei contente por ma-
m��e n��o estar nos esperando. Mas quando chegamos ao
nosso apartamento na Av. Atl��ntica, tinha um monte
de amigos de mam��e esperando-nos e todos brindaram
a nossa vinda com champanha. Havia, tamb��m, alguns
que j�� estavam b��bados, apesar de ser bem cedo, Ivete
logo ficou gamada por um dos rapazes. Mario de Castro.
Era esbelto nos seus vinte e seis anos, com uma arro-
g��ncia como se quisesse que a gente n��o notasse uma
papada debaixo do seu queixo. Convidei-o logo a beber
incont��veis martines.
��� 47
Mam��e n��o gostou muito da vinda de minhas duas
amigas.
Quando fomos para a praia no dia seguinte, mam��e
reclamou que n��o t��nhamos empregadas e que aquelas
duas vagabundinhas n��o se deram ao luxo de tirar das
mesinhas nem um dos copos vazios e nem um dos cin-
zeiros cheinhos de tocos de cigarros.
��� S��o umas relachadas ��� falava tirando a saida
de banho e mostrando seu corpo de quarenta anos bem
queimado e belas e rijas formas. ��� Passei pelo quarto e
dei uma espiadinha. Elas dormiam nuas. N��o sei como
posso convidar algu��m, algum homem para dormir no
apartamento Voc�� sabe, n��o ��, Regina, que Mario sem-
pre dorme no sof�� da sala. Voc�� j�� pensou o que ele
poder�� dizer, vendo aquelas duas l��, peladas?
��� Ora mam��e, daqui a pouco elas acordam, tomam
alguns goles de qualquer bebida e v��o para a praia.
��� Bebida??? Logo de manh��!
��� �� costume delas.
��� E voc��, querida, toma leite, n��o ��?
��� Claro. Caf�� com leite.
��� Muito bem. Voc�� ainda �� uma crian��a. Um Cuba,
uma vez ou outra n��o faz mal, mas, agora, outras bebi-
das fortes...
��� Ora m a m �� e . . . eu ia falar de quantos gim-t��ni-
cas havia bebido l�� em Pernambuco, mas s��bita e impe-
rativamente, tapando-nos a luz do sol, apareceu um
dos amigos de mam��e.
��� Paulo, gritou mam��e. Voc�� aqui na Guanabara?
Que surpresa! Quando chegou?
��� Vim da Europa ontem.
Paulo levou a m��o aos olhos e, apertando-os, falou:
��� Puxa, estou um verdadeiro pau-d'agua. J�� bebi
um rio de caipirinhas hoje.
��� 48 ���
Paulo olhou-me e, dirigindo-se a mam��e, falou:
��� N��o vai me dizer que tudo isso a�� �� aquela me-
ninazinha de tran��as que eu conheci?
��� Pois �� ela mesma, e eu vou come��ar a gritar aqui
se algu��m mais falar que a Regina est�� uma mo��a feita.
Isso faz com que eu me torne cada vez mais velha.
��� Ora, voc�� devia orgulhar-se da filha que tem.
��� Oh, Paulo, por favor, mude de assunto. Ou me-
lhor ��� vamos beber mais umas caipirinhas.
��� Posso tomar uma tamb��m, mam��e?
��� N��o, Regina. Caipirinha antes do almo��o n��o lhe
far�� bem.
��� Ora, Carmen, deixe a menina tomar uns goles.
��� S i m . . . Mas s�� uma ��� permitiu mam��e.
Paulo brindou com o copo cheio as minhas f��rias.
Levantou o copo bem alto e gritou:
��� �� Regina, que sempre receba permiss��o da ma-
m��e para muitos e muitos outros goles.
Fiquei olhando-o, meio hipnotizada por a q u i l o . . .
* * *
Mais tarde, Arlete e Ivete chegaram, em companhia
de Mario, um outro amigo de mam��e.
��� Ol��, pessoal, essa praia est�� infernal mesmo.
Foi servida mais uma rodada de bebida. Ivete prefe-
riu a dela pura. Passamos a manh�� bebendo. Quero dizer,
passaram os outros, pois eu parei na primeira.
As meninas estavam em super-biquinis. Paulo achou
que devia convidar mais uns homens, mais tr��s, para ve-
��� 49 ���
rem ��� disse ��� os belos corpos, pernas de carnes firmes
dessas lindas meninas esbeltas e alt��ticas. Apostou que
viriam uns cem, que seria s�� ele levantar um dedo e di-
zer dos seios rijos, morenos, que enchiam os biquinis at��
fazer transbordar as carnes para todos os lados, de ga-
rotas como n��s, com apenas quinze anos. Continuou di-
retamente a mam��e.
��� Olhe s��, Carmen, como essas meninas de hoje
t��m corpo de mulher, de carnes duras e sensuais. Isso
passa desapercebido ��s mulheres de quarenta anos,
n��o ��?
A felicidade e a seguran��a com que usava seu belo
corpo, cheio de vitalidade, at�� aquele momento, fizeram
mam��e encolher-se toda, parecendo uma velha.
��� Ora, Paulo ��� retruquei ���, mam��e tamb��m tem
um belo corpo, com m��sculos firmes, pois sempre prati-
cou muitos esportes.
��� Eu sei, Regina, mas corpo de quinze fala clara-
mente que est�� pronto para o amor. Os homens perce-
bem isso. Talvez essas meninas n��o sintam isso pois
acho que jamais foram beijadas ou nunca se entrega-
ram as v��rias car��cias do amor. Elas talvez nem perce-
bam que t��m l�� dentro muitas paix��es fortes, que s��o a
necessidade de amar inteiramente.
N��s rimos e corremos para o mar. Paulo, Mario e
mam��e ficaram de longe ouvindo nossas gargalhadas,
que soavam estranhamente quando come��amos a nos
empurrar umas ��s outras e quando as enormes e esver-
deadas ondas vinham se aproximando. Logo depois nos
deitamos na areia para tomar banho de sol e fomos cer-
cadas por rapazes intrusos, dos quais n��o gostamos.
Eram do tipo procedente do resplandescente e ofuscante
mundo ginasiano, aqueles que nos enchiam de t��dio.
Sorte que logo chegou um amigo da mam��e, e fez com
que os garotos deixassem as macias areias e fossem para
bem longe.
��� 50 ���
Era Andr��, bronzeado de sol e carregando sua mmi-
-espregui��adeira.
��� Al��, Regina, quem s��o as bonequinhas ?
��� Quais?
��� As duas, ora.
��� Amigas do col��gio. Ivete e Arlete, levantaram a
cabe��a.
��� Oi ��� disseram as duas.
��� Onde est�� sua m��e?
��� Ali, olhe, com Paulo e M��rio.
��� Chi, sua m��e sempre com aquele bastardo do
M �� r i o . . . Aposto que dormiu l�� no apartamento.
��� Sim, dormiu no sof�� da sala.
��� Que voc�� acha disso?
��� Eu gosto Tem qualquer coisa sublime um ho-
mem dentro de casa. A gente fica at�� pensando que tem
um lar completo, com pai e m��e. Isso atrai.
��� Cristo, garota! Nunca pensei que voc�� sentisse
falta de seu pai. Mas olhe aqui: cuidado com esse pai,
pois ele �� um invertido. Ele n��o vale nada.
��� Porque o cuidado com ��le?
��� Porque ele �� o tipo de camarada, metido a artis-
ta, a intelectual, e tem um certo encanto para as moci-
nhas . Por outro lado, essas mocinhas inocentes n��o sa-
bem o que �� um invertido, e a�� entra oi nteresse delas
por este canalinha.
A risada de Ivete se perdeu pela praia.
��� Imagine, n��s interessadas por um meio ho-
mem. .. Como �� mesmo o seu nome?
��� Andr��.
��� Viu, Andr��, nossa especialidade n��o �� esse tipo
de homem! ��� replicou, ir��nica.
��� 51 ���
Voc�� gabe, gomos apenas pobres crian��as.
Andr�� n��o entendeu a ironia e exclamou:
��� Por isso �� que falo, por voc��s serem crian��as com
corpo de mulher, e de mulher atraente. Eu estou avisan-
do ue a maioria dos amigos de Carmem s�� gostam de
tirar proveito disto. Olhem, vou lhes apresentar uns jo-
vens da mesma idade de voc��s. S��o bons rapazes, e es-
t��o passando o ver��o aqui. Querem conhec��-los ?
Esprememos os rostos na areia, quase nos sufocando
de tanto rir.
��� De que est��o rindo?
��� Voc�� seria a ultima pessoa do mundo a saber.
Olhe, Andr��, mam��e vem para c��. E por falar em ma-
m��e, ser�� que ela arranjou o papel que tanto desejava
na novela da televis��o?
��� Creio que o contrato dela foi anulado.
��� Mas ela ia trabalhar sem c o n t a t o . Era s�� um
bico.
��� Ora, os artistas sem contrato s��o chutados por
a�� aos ponta-p��s. Ela se humilha muito. Por isso nin-
gu��m quer contrat��-la.
Suspirei e pedi a Andr�� para falar mais baixo, pois
as meninas deveriam passar um m��s em minha casa, na
Guanabara.
��� Acho que voc�� n��o devia incentivar essas garo-
tas para ficarem no apartamento de sua m��e, pois ela
est�� quebrada.
��� Mas as coisas est��o assim t��o graves?
��� Regina, eu conhe��o sua m��e h�� anos. Ela n��o
est�� mais naquela forma do passado. Novelas de televi-
s��o s��o umas bombas. Ela �� doida se pensa que h�� al-
gu��m invis��vel que lhe fornecer�� um grande papel em
mil novelas, dando condi����es para ela ter h��spedes aos
montes. O que voc�� tem a fazer �� convenc��-la a acabar
��� 52 ���
com essa loucura de gastar o que n��o pode. Eu penso
que voc�� compreender�� essas coisas. Essas meninas a��,
devem gastar um dinheir��o s�� de comida, pois est�� se
vendo que est��o bem nutridas... Voc�� deve me descul-
par por eu estar lhe contando essas coisas. Voc�� ainda
est�� com o p�� na inf��ncia, e n��o deve arcar com a res-
ponsabilidade que uma mocinha nunca devia ter. Po-
nho-a a par desses fatos porque j�� �� tempo de voc�� descer
das alturas da fantasia, para o ch��o duro e negro da
terra que pisamos.
��� N��o, Andr��. Juro que n��o me incomodo de sair
da luz do sol infantil e cair no mundo real. Mas acho o
diabo, fico chatead��rrima de ter que falar ��s amigas que
viemos �� Guanabara enfrentar uma fal��ncia. Afinal, es-
sas meninas a�� vivem naquele mundo encantado da fan-
tasia e ilus��o. N��o casa de Ivete, ali��s, na mans��o de
Ivete, l�� em Pernambuco, a gente �� servida como rainha.
Ivete e os pais gostam muito de beber. H�� uma adega
cheinha, com estoques de u��sque, gim, bourbon, enfim,
as mais finas variedades de bebidas. Agora n��o sei o
que fa��o.
��� Bem, por enquanto convide as suas amigas, ali��s
pergunte, se gostariam de ir at�� o meu apartamento,
para beber alguma coisa.
��� Mas elas beberam at�� agora. Creio que estejam
mortas de fome.
��� Ora, Regina, l�� temos fartura. N��o estou na ban-
carrota .
As garotas ficaram encantadas com o convite. Eu
at�� esqueci mam��e, parada l�� na praia, cercada de ho-
mens. Mam��e, a grande atriz de televis��o, como se jul-
gava.
* * *
��� 53 ���
Entramos no apartamento de Andr��. Subitamente
lembrei que mam��e sempre me aconselhava a n��o en-
trar em apartamentos de homens. Mas, afinal, decidi sor-
rindo quando me ocorreu que n��o estava s��, e depois n��o
tinha muita import��ncia, pois n��o se tratava de um An-
dr�� qualquer, de forma que esqueci que era uma me-
nina com mais duas meninas. Ele me chamou para a
cozinha e abriu a geladeira. "Rosbife", azeitonas, to-
mates e ovos duros. Chamei Ivete e Arlete e preparamos
de melhor maneira poss��vel o almo��o, enquanto Andr��
telefonava.
Quando voltamos para a sala com o que t��nhamos
preparado nas bandejas, encontramos dois rapazes. Sen-
tamo-nos aos pares no sof��, e Andr�� cerrou as cortinas
para que tudo ficasse em penumbra.
A bebida foi servida e em minutos as bandejas fica-
ram vazias.
Quis beber uisque para aniquilar a perturba����o de
encarar a realidade que mam��e estava quebrada. Mas
logo fiquei tonta e me estirei no sof��.
��� Cristo, Regina, pensei que voc�� fosse mais forte!
��� �� a primeira vez que bebo bebida t��o forte. Olhe,
Andr��, nessa hora, com o teto rodando, �� que vejo que
essa vida artificial e sofisticada n��o vale nada. Juro que
tenho vontade de largar tudo.
��� Mas voc�� pode tentar, Regina. Ainda n��o est��
apodrecida pela malandragem de toda essa ilus��o que
nos cerca.
��� N��o, n��o ir�� adiantar nada. Fui criada no meio
do luxo, comendo do bom e do melhor, frequentando os
melhores col��gios. Fui criada assim e nunca ser�� dife-
rente. Talvez, se me tivessem criado num grupo escolar
qualquer e me feito trabalhar com dez anos, tudo seria
diferente. Agora j�� estou acostumada com roupas finas,
com muito dinheiro. Estou me acostumando com bebidas
��� 54 ���
caras, me levantando ao meio dia e almo��ando as
quinze.
��� Voc�� fala como se tivesse trinta anos.
��� Se algum dia tive uma inf��ncia, hoje ela est��
ha quil��metros de dist��ncia. Ali��s, agora sinto-me uma
verdadeira mulher. Mas uma mulher que n��o sabe lutar
para sobreviver. Sei que a luta pela exist��ncia, para
mim, seria perturba����o e confus��o.
��� Quero gelo e ��� gritou Ivete, j�� meio tocada. ���
Gelo �� o mesmo que me encostar em um homem, sentir
um calor agrad��vel e uma gostosa sensa����o. Voc��s n��o
entendem o que os meus dezesseis anos sentem nos bra-
��os de um homem? �� uma sensa����o viva e contagiante,
de fogo e de tes��o que cresce conforme a coisa deie
tamb��m cresce.
O jovem que estava com Ivete foi at�� a cozinha e
trouxe o gelo. Logo em seguida, seus corpos aproxima-
ram-se. O rapaz inclinou-se sobre ela e foi beijando-a no
rosto, no pesco��o, e foi descendo. Ivete abriu as pernas.
��� Voc�� �� uma jovem vibrante. Vou ensin��-la, mui-
tas coisas. Comprima-se contra o meu r o s t o . . . Assim,
v a m o s . . .
Levantei-me r��pida e gritei:
��� Calma, Ivete. Voc�� disse que era uma menina
descente. N��o vai se permitir dar-nos um espet��culo de-
primente, vai?
��� Ora, Regina, j�� perdi minha identidade na emo-
����o do sexo. Nunca tive uma emo����o assim. Minha men-
te est�� envenenada e meu todo latejante. Afinal, n��o
sou de pedra. Quero ser possuida, mas possuida pelo lado
certo.
Eu tamb��m j�� estava meio b��bada. Sen��o n��o teria
gritado.
��� 55 ���
��� Voc�� �� uma suja! Devia sentir nojo de si mes-
ma.
��� Nojo? E por que? Nada mais poder�� acontecer
al��m de eu me tornar mulher. E eu adoro ser mulher...
��� Mas pense nas consequ��ncias.
��� Que consequ��ncias?
��� Ora, voc�� poder�� ficar gr��vida.
Ivete riu. Apalpou o bolsinho que tinha no biquini e
sacudiu uma caixinha de pl��stico ao dizer:
��� E pra que servem as p��lulas?
��� Bem, Ivete, se voc�� continuar assim, acabou-se a
festa.
Ela deu uma risada.
��� Voc�� �� mesmo de amargar, Regina ��� sentou-se
no sof��. ��� Voc�� conseguiu cortar as asas da minha von-
tade. Agora vou ficar entendiada, s�� com comidas, be-
bidas e prosinha.
J�� v�� que aqui na Guanabara estou dando azar.
��� Voc�� est�� nos deixando chocadas, isso sim.
O companheiro de Ivete saiu do sof�� e sentou-se em
uma poltrona, empunhando um novo copo de u��sque.
��� Sinto muito, pessoal ��� Disse ele ��� pensei que
a garota fosse mulher. E, como mulher, acho que ela
deve sempre esperar tentativas desse tipo por parte do
sexo oposto.
��� Eu n��o o estou culpando pelas tentativas. Al��m
disso, n��o tenho nada com a vida de Ivete. Mas �� que as-
sim, em p��blico, o neg��cio fica rid��culo. Se voc�� quiser
avan��ar o sinal, isso �� l�� com voc��, mas n��o na minha
frente.
��� 56 ���
O rapaz deu de ombros e continuou bebendo e fu-
mando Alias, todos fumando.
Eu nunca tinha fumado e, por isso, Andr�� disse:
��� Sua m��e j�� sabe ? Para mim �� uma surpresa v��-la
fumar.
��� Sempre h�� a primeira vez, n��o ��, Andr��? E de-
pois, tudo que eu fa��o �� para me vingar de duas pessoas.
Algum dia voc�� saber�� quem s��o.
��� 57 ���
IV
Dinheiro? Os Homens me dar��o
O nosso apartamento, alugado, com mob��lia, ficava
bem na Avenida Atl��ntida. Era grande, com tr��s quar-
tos, e n��o estava decorado a meu gosto, pois tinha m��-
veis pesados e antigos e com grosso tapete de uma cor
indefinida. As janelas da frente davam para o mar e o
edif��cio ficava a poucos metros do Copacabana Palace
Hotel. Quando cheguei a Copacabana senti que teria uma
vida ador��vel naquele apartamento. Mas depois que An-
dr�� falou a respeito de mam��e estar quebrada, fiquei
apavorada, pensando a todo instante que tocavam a
campainha e que seria um oficial de justi��a trazendo a
ordem de despejo. Quando a noite caia sobre o meu
quarto �� que me tranquilizava um pouquinho. Por que
�� noite a lei n��o trabalhava. Assim me diziam. N��o dis-
se nada a mam��e do que Andr�� havia me contado. Tam-
b��m n��o podia mandar as minhas amigas embora pois
eu vivia muito solit��ria e sem elas morreria de isola-
mento. Por isso, resolvi, procurar papai, para pedir um
dinheiro a fim de passarmos aquele m��s. Mas onde achar
papai? Meus pais estavam desquitados h�� muitos anos,
a bem dizer uns dez. Eu passava quase todo o meu tem-
po pensando, em como seria formid��vel se meus pais es-
tivessem juntos e que olhassem por mim. Com que an-
��� 59 ���
siedade eu esperava ver papai. A coisa que eu mais que-
ria era ser dirigida pelos dois e n��o ter que decidir coisa
alguma. Ter um lar. Oh, Deus, que felicidade se os velhos
se reconciliassem!
Estava em certa manh�� perto da janela, pensando
em tudo isso, quando mam��e entrou na sala.
��� Ol��, querida. Dormiu bem? ��� Sem esperar res-
posta, continuou. ��� Quer um drinque?
��� N��o, mam��e.
��� Por que est�� t��o cismada?
��� Nada, m a m �� e . . .
��� Ora, minha filha, sei que voc�� �� silenciosa e pen-
sativa, mas hoje est�� al��m de tudo perturbada.
��� N��o �� nada. Estou s�� pensando.
��� Regina, gostaria que me dissesse o que est�� pen-
sando. Talvez eu possa ajud��-la. Parece, quero dizer. . .
isso significa, possivelmente, que voc�� est�� ficando mo��a
e se afastando de mim.
��� Talvez.
Mam��e ficou desanimada. Foi at�� o bar e se serviu
de uma bebida.
��� Quer que acorde as suas amigas? Isso talvez a
anime.
��� N��o. Estou bem.
��� Claro que n��o est��. Sentada a��, t��o deprimida...
Por que n��o convida alguns rapazes para sair? Por exem-
plo, poderiam ir at�� S��o Conrado, ou mesmo dar um pas-
seio na Ilha do Paquet��. Olhe, nossos vizinhos s��o uns
bons rapazes. Quer que eu telefone para l��?
��� N��o. Eu acho que as minhas amigas os odiariam,
pois s��o crian��as demais.
��� Crian��as???
��� Sim. N��s gostamos de nos divertir com homens.
��� Bem, voc�� n��o pode prosseguir nessa atitude.
Suas amigas v��o achar que voc�� �� cacete.
��� 60 ���
��� Sinto muito. Elas me conhecem h�� muitos anos
e nunca disseram que as caceteei!
��� Bem, ent��o deixe que elas acordem. Eu vou pe-
dir ao Paulo que as levem para beber e nadar no Copa-
cabana Palace. Eu mesma pago.
��� Isso ficar�� muito caro.
��� Nem tanto. ��� Mam��e olhou-me como se me vis-
se pela primeira vez.
��� J�� sei o que a est�� preocupando. �� dinheiro,
n��o ��?
��� ��.
��� Quem foi que lhe falou?
��� O qu��?
��� Que estamos quebradas?
��� Eu percebi.
��� N��o, Regina. Algu��m mencionou o ato. Voc�� es-
t�� mentindo.
��� Pelo amor de Deus, mam��e. Eu a vejo pedindo
dinheiro para todos os homens que aparecem.
��� Nada. Nada.
��� Olhe aqui, Regina. Logo n��o teremos mais esse
problema. Eu vou fazer uma novela.
��� Isso s��o babozeiras.
��� Como?
��� Eu disse que s��o babozeiras.
��� Voc�� n��o acredita em mim?
��� Perdoe-me.
��� Um diretor me prometeu o papel principal de
uma novela.
��� 61 ���
Dei de ombros. Que poderia eu dizer? Havia tanta
coisa, mas eu preferi umas poucas palavrinhas.
��� Eu quero o papai.
��� Seu pai? E por que?
��� Mam��e, por favor, me diz onde ele est��. Isso ��
muito importante para mim.
��� Ora, minha filha, ele est�� em S��o Paulo. Mas que
bicho a mordeu para voc�� querer o seu pai?
��� O bicho da saudade.
��� S�� isso? N��o acredito.
��� O bicho da necessidade tamb��m Eu preciso de
dinheiro.
��� 62 ���
V
Dr., voc�� ter�� uma filha prostituta!
Logo que chegou ao Aeroporto, papai me telefonou.
Eu o contemplei e o achei lindo de morrer, quando nos
vimos. Alto, moreno, com um sorriso franco e encanta-
dor. Agora, dentro do t��xi, n��o tirava os olhos dele e
estava felic��ssima por que atendera ao meu chamado.
Papai era m��dico cirurgi��o em S��o Paulo.
��� Voc�� est�� linda, minha filha. Onde podemos ir,
para conversar �� vontade?
��� Em qualquer restaurante.
Pela janela do t��xi, ele olhava para todos os restau-
rantes, at�� que se decidiu por um, �� beira-mar.
��� Espero que goste. Se n��o gostar, pode escolher o
que mais lhe agradar, pois o dia e os restaurantes s��o
todos seus.
O restaurante era chiqu��rrimo. Mas, ao sentarmos ��
mesa, caiu entre n��s um sil��ncio constrangedor. Eu ti-
nha tanta coisa a lhe falar, mas a mente n��o destilava
coisa alguma. Tudo parecia vetado. Papai parecia tam-
b��m n��o querer interferir na minha mente. Talvez fos-
se melhor n��o falar em dinheiro. Pareciamos dois desco-
nhecidos. Tamb��m, naqueles anos todos, haviamos pas-
��� 63 ���
sado apenas algumas horas juntos. Como era doloroso o
desquite, meu Deus! Eu tinha sido feita, eu era daque-
la carne que estava ali na minha frente e n��o tinhamos
nada em comum. Oh! meu Deus, por que n��o o
fazia ficar ali e chamava mam��e e n��s tr��s iriamos para
um lugar s�� nosso, cheio de paz? Por que aquele homem
que era meu pai, tinha que ficar ali, s��rio, esfor��ando a
imagina����o, a fim de encontrar assuntos para conversar
com a sua pr��pria filha?
��� O que voc�� gostaria de comer, Regina?
��� Quero beber.
��� Beber?
��� Onde, diabos, voc��, com quinze anos, aprendeu a
beber ?
��� Com todos.
��� Como todos??? Mas voc�� ainda �� uma menina!
��� Uma menina sem pais. Jogada. E vou aprender
muita coisa ainda.
��� Voc�� deve falar essas coisas para sua m��e.
Fiquei sem saber o que falar.
��� Eu preferia que voc�� n��o bebesse.
��� Mas eu quero uisque.
Papai pediu duas doses.
��� Gosto muito de estar perto de voc��, minha filha.
��� Sim, papai. Faz um ano que n��o o vejo. Acho
que o senhor gosta mesmo.
��� Voc�� cresceu muito, nesse ano.
��� Tinha que crescer, n��o ��, papai?
O gar��on trouxe as bebidas, azeitonas e legumes
cruz. Comecei a beber e me senti mais confortada.
��� Regina, a juventude n��o deve procurar conforto
na bebida.
��� Com pais separados, vai procurar conforto on-
de? E, depois, n��o existe mais juventude moralizada.
��� Ainda insiste? Voc�� n��o deve beber!
��� 64 ���
��� S�� faltam tr��s anos para eu beber legalmente. Se
vou beber daqu1 a tr��s anos, come��o agora. O senhor n��o
acha infernal?
Prefiro n��o dar resposta. ��� Disse friamente.
��� N��o h�� mesmo uma resposta para uma menina
que bebe ilegalmente, perto do pai, e ��le n��o tem autori-
dade para faz��-la parar.
��� Bem, n��o estou aqui para tratar dessas coisas.
S�� a acho muito crian��a para estar bebendo.
Virei o conte��do do copo e olhei desafiante para
papai. Queria mago��-lo, queria que ��le sentisse que uma
menina sem lar n��o tinha chance de coisa alguma.
��� Acenda o meu cigarro, papai.
��� Tamb��m fuma?
��� �� a ��poca, papai. Hoje em dia n��o se bebe furti-
vamente e nem se fuma na privada, como se fazia an-
tigamente .
��� Acho bom n��o falarmos desse assunto. Voc�� me
deixa ressentido, pois discute comigo como sua m��e sem-
pre fazia. Voc�� est�� se parecendo tanto com sua m��e, que
nessas discuss��es me deixa irritado.
��� Ora, papai, h�� tantos casais que n��o se desqui-
tam por causa dos filhos. Voc�� e a mam��e me privaram
dcs anos que as outras crian��as podem desfrutar alegre-
mente, tendo o pai como companheiro nas festinhas de
anivers��rio. Privaram-me, tamb��m, dos olhares proteto-
res e ciumentos que outras crian��as encontram nas fa-
ces de seus p a i s . . .
Papai mudou de assunto.
��� Bem Regina, penso que voc�� est�� se sentindo no
auge da alegria por ter sa��do do col��gio.
��� Quem n��o se sentiria contente por sair de um
internato? O senhor sabe o que �� passar todos os dias
vendo todo mundo com a mesma cor de roupa ? Aqui em
Copacabana, a gente fica at�� espantada com a variedade
de cores que cobre todo mundo andando de l�� pr�� c��.
��� 65 ���
Ficamos algum tempo em sil��ncio. Eu com o meu co-
ra����o saltando e a garganta seca, pois ia pedir uma coisa
muito importante a ele.
��� Papai ��� disse eu, subitamente ��� porque o se-
nhor n��o faz uma visitinha a mam��e? ��� Por favor, v��
sim. Isso me faria muito feliz.
��� N��o, Regina. Sua m��e me atribuiria muita res-
ponsabilidade. Ela �� um problema. Algo muito s��rio.
Sinto muito ter que falar a verdade a respeito de sua
m��e. Mas ela �� muito dif��cil, e eu n��o conseguia compre-
ender os seus caprichos. Pedia para ela largar suas an-
dan��as pela televis��o, para cuidar mais de voc��, que era
uma criancinha.
��� Mas voc�� tamb��m n��o interferia no modo errado
que mam��e me criava. Lembro que, uma vez, eu implo-
rei a voc�� para me levar ao zool��gico, mas, porque ma-
m��e estava dormindo e n��o devia acord��-la, voc�� disse
n��o. Aquilo me doeu tanto como se eu tivesse recebido
uma punhalada em pleno cora����o, pois pensava que era
s�� estender a minha m��ozinha e amparar-me em voc��
que tudo se fortificaria, pois voc�� era o homem, era o
pai, era o equilibrado, era o que raciocinava.
��� Ora, minha filha, eu n��o podia me intrometer
ou interferir na maneira de educar de sua m��e. N��o po-
dia assumir um outro modo de educ��-la. Sua m��e, era
a respons��vel pela sua disciplina.
��� L��gico que podia ��� pedi mais uisque p papai
mandou o gar����o servir. ��� Mas, todas as vezes que dis-
cutimos essa quest��o, o senhor tenta sempre jusificar-se.
��� N��o �� isso, Regina. �� que tudo aconteceu h�� tan-
tos anos. Voc�� ainda continua a fazer a mesma coisa,
continua a pensar no passado. Ora, n��o adianta voc��
querer que eu me defronte com sua m��e.
��� Ent��o voc�� quer que eu os jogue um contra o
outro? Ent��o farei isso, de agora em diante. ��� Papai fi-
cou vermelho e mudou o assunto.
��� 66 ���
��� Gostaria de saber se, pelo menos, podemos jan-
t a r . . .
��� N��o sei ��� respondi agressiva. ��� Preferia outro
uisque.
��� N��o ficarei mais um minuto nessa mesa se voc��
tomar outra bebida. Dois u��sques j�� s��o suficientes.
��� Que �� que voc�� pretende agora, papai? Se en-
volver nos meus gostos ? Quer por acaso come��ar a diri-
gir a minha vida ? Voc�� j�� se esqueceu que desistiu de
me educar h�� muitos anos? Quando eu mais precisava
de voc��, nem para me levar as festinhas voc�� serviu.
Agora que sou menina mo��a, e preciso de meus pais jun-
tos, para que eu tenha um pouco de felicidade, j�� que
fiquei quase toda a minha vida num internato, vem voc��
com lorotas, que mam��e �� isso e aquilo. Mas n��o faz
mal, papai. Eu juro que me vingarei. Me vingarei por vo-
c��s continuarem desquitados. Vou fazer as piores coisas
que uma menina de quinze anos poderia fazer. Vou me
atolar na lama e arrast��-los comigo. Todos saber��o que o
grande m��dico, o famoso cirurgi��o, n��o passa de um in-
diferente. Todos saber��o que, o homem escolhido para
as maiores confer��ncias em todo o mundo, abandonou
sua filha ainda beb�� e a deixa, j�� mocinha, a passar as
maiores necessidades. ��� Olhei bem nos olhos de papai
e conclui, petulante:
��� Voc��, doutor Alberto Albuquerque, vai ter uma
filha prostituta. E das piores, voc�� vai ver.
��� Est�� bem. Regina. Seja o que voc�� quiser. Se
afunde na lama, n��o me incomodo. N��o posso ser o res-
pons��vel, desde que voc�� se recusa a fazer qualquer coisa
que eu lhe pe��a.
��� Ent��o sou eu que recuso, n��o ��, papai? Realmen-
te, voc�� tem mais uma qualidade que eu desconhecia:
Covardia. N��o sei como foi que voc�� conseguiu chegar a
invej��vel situa����o que ocupa. Talvez passando sobre os
��� 67 ���
mais f r a c o s . . . Eu pe��o para voc�� me dar um lar e voc��
vem dizer que eu me recuso a fazer o que voc�� manda.
Francamente... A ��ltima vez que o vi faz exatamente
um ano, e eu me recusei a obedec��-lo. N��o �� da gente
morrer de rir ? Agora compreendo at�� as discuss��es pre-
c a t a i s de voc��s. Era isso - - - mam��e estava sempre
embriagada, quando eu estava ainda em sua barriga. L��
dentro, eu sentia o cheiro do ��lcool, e sabia que voc�� n��o
estava raivoso por ver um feto b��bado, mas sim que mor-
ria de raiva pelo fato de mam��e gastar todo seu dinheiro
em bebidas e a�� as suas discuss��es chegavam a um au-
ge que o fazia querer estrangul��-la.
��� Pelo amor de Deus, Regina, pare de falar de sua
m��e.
��� Sen��o voc�� sair�� da mesa, n��o ��, papai? �� s�� isso
que sabe falar. Pode me largar aqui. Eu n��o me inco-
modo. Mas voc�� e mam��e v��o se arrepender. Agora vou
dar por terminada a nossa conversa. Quem vai sair da
mesa serei eu, depois que voc�� me der o dinheiro de que
necessito.
��� Quanto?
��� Cinco milh��es.
Papai ficou branco e gritou:
��� Cinco milh��es??? Mas sua m��e falou que quem
pagou o col��gio este ano fui eu? E olhe que n��o foi ba-
rato. Gastei milh��es.
��� E da��? N��o fui eu que pedi para vir ao mundo.
E depois, voc�� sempre tem a mania de falar sobre dinhei-
ro gasto comigo. Para voc��, dinheiro n��o deveria signi-
ficar coisa algum?, pois voc�� tem muito.
��� Para mim, dinheiro significa muita coisa pois eu
fa��o um esfor��o enorme para ganh��-lo. Voc�� �� igualzi-
nha a sua m��e. S�� se preocupa com o que eu posso dar a
voc��s.
��� 68 ���
��� Vou tomar mais um gole, papai, pois sinto von-
tade enorme de chorar. Voc�� n��o me ama. Juro que at��
gostaria se eu morresse.
��� N��o seja petulante, Regina.
��� Voc�� ao menos devia ter esp��rito esportivo ou
mesmo senso de humor. Exclamei.
��� N��o vejo nada engra��ado nisso.
��� N��o v�� por que n��o quer.
��� Ora, escuta...
��� Est�� bem. Est�� bem. N��o quer me dar o dinhei-
ro? Me venderei a qualquer homem na rua.
��� Por favor, filha. Cinco milh��es �� muito.
Vendo-me irredut��vel, papai suspirou e disse:
��� Pensei que voc�� tivesse me chamado por que a
saudade lhe apertava o cora����o.
Sorri.
��� N��o, papai. Eu o chamei por que mam��e est��
quebrada e eu preciso de dinheiro. Mas o mais importan-
te : eu chamei para ver se conseguia colar os peda��os do
nosso mundo. Mas estou me afogando e ningu��m se re-
solve a me salvar.
��� Como voc�� pode dizer uma coisa dessa, menina?
Se a situa����o da sua m��e n��o �� est��vel voc�� fica comigo
em S��o Paulo at�� que ela melhore. Voc�� pode voltar pa-
ra o internato ou escolher um outro col��gio. Temos um
colosso de boas escolas como a que voc�� estava.
��� S�� se voc�� levar mam��e, tamb��m.
��� Olhe, Regina, estou lhe dizendo que voc�� viveria
melhor na minha companhia. Sei que a sua m��e a magoa
muito. Voc��, eu quero, mas a sua m��e n��o.
��� 69 ���
��� Bem, sendo assim, prefiro viver com mam��e.
Olhei para papai e v�� que ele embranquecia. Por is-
so, disse:
��� Mam��e, apesar de viver rodeada de falsas amigas
e de falsos amigos, anda muito solit��ria.
Papai demorou para responder.
��� Eu j�� sabia o que voc�� ia dizer enquanto a obser-
vava, minha filha. Voc�� j�� decidira e estava apenas fin-
gindo. Eu mesmo permiti que voc�� crescesse como uma
menina sem pai. Eu a deixei e agora reconhe��o que er-
rei deixando a cust��dia com sua m��e. Agora �� tarde pa-
ra modificar a minha posi����o.
��� N��o �� tarde n��o, papai. �� s�� voc��s se reconcilia-
rem. Eu terei um lugar sad'o para crescer com uma for-
ma����o moral elevada.
��� Sei tudo isso, minha filha. Sei que o seu bem-es-
tar est�� acima de toda essa confus��o que aconteceu em
nossas vidas. Mas eu j�� esclareci dizendo tudo a respeito
de sua m��e e eu juro que n��o poderei viver com ela. Es-
t�� acima das minhas for��as.
��� Mas eu o amo tanto, papai. Amo-o como amo a
mam��e. Por que vivemos separados?
��� S��o coisas da vida, minha filha. Agora me diga
para que quer o dinheiro. E pe��a o jantar.
Enquanto comia, expliquei:
��� Ser�� ��timo ter o dinheiro, porque Ivete e Arlete,
duas de minhas amigas do col��gio, est��o aqui na Guana-
bara. O senhor sabe, as fam��lias delas sempre me con-
vidam para f��rias e fins-de-semana.
��� Ivete n��o �� aquela garota que a superintendente
disse que �� m�� companhia para voc��?
��� Que superintendente?
��� 70 ���
��� L�� do col��gio.
��� Oh, aquela �� uma idiota. Nunca gostou de Ivete
por que Ivete �� uma garota pra frente, que detesta ser
mandada. Oh, papai, fico pensando e at�� estreme��o em
pensar que voc�� n��o poder�� me dar o dinheiro. Essas me-
ninas adoram a praia de Copacabana. Toda essa bagun-
��a de praia as deixa malucas. Dizem sempre que, quan-
do acordam pela manha, correm �� janela para ver se o
mar est�� ali ainda ou se foi para o mundo de sonhos de
onde parece ter surgido.
��� Mas eu acho que voc��s deveriam passar as f��rias
em um lugar mais tranquilo onde exista atmosfera de
paz. Isso aqui �� muito agitado.
��� N��o para garotas de quinze anos.
Papai sorriu.
Depois do jantar me deu um cheque de dois mil
cruzeiros.
��� Mas, papai... eu p e d i . . .
��� N��o v�� me recriminar por n��o ter o dinheiro que
voc�� pretende, Regina. Tenho dificuldades em arranjar
dinheiro. Contudo, penso que se voc��s passarem o m��s
economizando, dar�� perfeitamente.
Peguei o cheque logo, antes que papai se arrependes-
se. Despedi-me dele depois.
No dia seguinte, acordei cedo, corri para o banco e,
com o dinheiro na bolsa, meus primeiros pensamentos
foram comprar bebidas. Comprei-as e, da janela do apar-
tamento, eu, Ivete e Arlete brindamos a beleza de Copa-
cabana .
��� �� uma cidade ador��vel ��� disse Arlete, fitando
da janela os lindos desenhos que beiravam a praia. ���
Gosta daqui, n��o, Regina?
��� 71 ���
��� E quem n��o gostaria?
��� Se n��o tivesse tantos homens queimadinhos eu
n��o gostaria ��� disse Ivete, tomando, de uma vez, o con-
te��do do copo.
��� Cristo, Ivete. Voc�� s�� pensa em homens!
��� Ivete ficou pensativa e depois respondeu:
��� Penso tanto em homens para esquecer... Bem,
para esquecer um certo h o m e m . . .
��� O grande amor de sua vida? ��� perguntei.
Ivete ficou p��lida e apertou o rosto com as m��os. Por
um momento, pensei ver l��grimas em seus olhos, antes
que ela escondesse o rosto.
* * *
Nessa mesma tarde, Paulo chegou com um Impala
e nos levou a dar uma volta pela Guanabara. A vis��o
dos edif��cios de apar��ncias iguais por todas as ruas que
passamos, fez-me sentir a saudade da grandiosa e mal
feita S��o Paulo, com seus altos pr��dios, m��dios pr��dios,
pequenos pr��dios, tudo na maior bagun��a, atravessados
por pontes elevadas que mostravam mais de perto suas
fachadas de estuque pintadas de cores encardidas. Na-
quele momento, olhando a famosa Copacabana, senti
uma sensa����o de paz, esquecendo, por momentos, a dis-
cuss��o que tive com papai. Agora, sentia dificuldades em
lembrar do que hav��amos falado, embora n��o me esque-
cesse da promessa de me vingar se ele n��o voltasse pa-
ra mam��e.
Paulo passou pelo apartamento de M��rio e subimos
todos para cham��-lo.
A porta foi aberta pela empregada de uniforme azul
dando-nos a impress��o de estar com um dos nossos uni-
formes do col��gio. Entramos na sala muito bem decora-
da, com poltronas de ar e grandes almofadas de espuma,
de diversos formatos, jogadas por todos os lados.
Nos atiramos nas poltronas, soltando gritinhos his-
t��ricos de medo que elas estourassem. Depois, manda-
mos a empregada servir bebidas enquanto apanh��vamos
cigarros nas mesinhas. Foi o instante em que surgiu Ma-
rio, vindo de um dos quartos, vestindo um roup��o bran-
co que n��o lhe escondia muitas partes do corpo. Estava
totalmente queimado pelo sol. Tinha uma cor de choco-
late.
��� Ol��, pessoal. Que surpresa formid��vel v��-los no-
vamente .
Juntou-se a n��s e ficamos todos bebendo, fumando
e conversando. Uma certa hora, pedi a M��rio para ir
trocar de roupa, pois queria dar um mergulho na pisci-
na que existia no seu pr��dio.
��� Claro, meu bem. Venha para o meu quarto.
0 quarto estava em formid��vel desordem. Ele co-
me��ou a apanhar roupas daqui e dali, xingando a empre-
gada, como se a coitada tivesse culpa dele trocar de rou-
pa de cinco em cinco minutos e jog��-las por todos os
lados.
��� Essa empregada �� um suino. Fica sempre beben-
do e quando est�� meio tocada n��o arruma nada. N��o
repare, Regina. Fique a vontade e se acha que deve cha-
mar as suas amigas, grite que elas vir��o.
��� N��o, M��rio. Nessa hora, acho que est��o inteira-
mente embriagadas e n��o poder��o entrar na piscina.
��� Ent��o eu subo com voc��. A piscina fica no ��lti-
mo andar.
��� Eu sei. Vim com mam��e uma vez. Voc�� n��o se
lembra ?
Ele bateu na testa.
��� Oh! Mas voc�� era t��o pequena. Mas, Cristo, agora
voc�� est�� um bocado legal. ��� M��rio ia falando enquanto
me guiava para o elevador. Ao chegarmos �� piscina, s��
encontramos dois rapazinhos que, com suas risadas in-
fantis, enchiam o ar.
Nadamos e nos sentamos nas espregui��adeiras.
M��rio perguntou-me:
��� Voc�� est�� gostando daqui?
��� De onde?
��� Da Guanabara.
��� Muito! Tudo �� formid��vel. S�� que n��o conhe��o
muitos rapazes.
��� Ora! Isso n��o �� problema. Eu estou aqui. Vou
arrumar um colosso de festas. Voc�� bebe, n��o ��?
��� Bebo.
��� Fuma?
��� Sim.
��� S�� cigarros ?
��� S��.
��� Nunca experimentou outras coisas?
��� N��o.
��� E suas amigas?
��� N��o sei. Eu n��o ia falar que elas fumavam ma-
conha no col��gio.
��� Voc�� quer experimentar?
Lembrei-me da vingan��a. Agora ia come��ar. A filha
do grande cirurgi��o fumando maconha.
��� Quero.
M��rio tirou um cigarro da cigarreira e me deixou
dar umas tragadinhas.
��� 74 ���
Logo me senti enjoada e ia desistir, quando a ima-
gem de papai se fez bem n��tida.
��� Fumei o cigarro inteirinho e me senti meio tonta
mas. . . feliz!
��� Gostou?
��� N��o �� l�� grande coisa.
M��rio n��o se deu por achado.
��� Voc�� quer ir a uma festa de fechar o com��rcio?
As mo��as tem que ir com o vestido bem decotado, ofe-
recendo os seios para facilitar o neg��cio.
Encarei-o com dureza. Ele fez de conta que n��o
percebeu.
��� Realmente, para ser uma garota pra frente, vo-
c�� tem que frequentar festas desse tipo, ou piores. Se-
n��o fica parecendo uma caipira.
Eu tinha que continuar a vingan��a. Aceitei.
��� E quando �� essa festa?
��� Hoje mesmo. �� s�� convocar a. turma.
��� Oh! Seria maravilhoso! Adoro festas, mas acon-
tece que n��o tenho nem um vestido decotado.
��� Isso se arranja.
��� Ent��o eu topo.
Assim, naquele momento, comecei a vingan��a que
prometera a papai se ele n��o voltasse para junto de
mam��e. Nesse momento comecei a adotar o padr��o de
vida da juventude transviada. Telefonei a mam��e di-
zendo que iamos passar a noite na casa de uma amiga
de Arlete que, inadvertidamente, encontramos quando
tomavamos um coquetel. Mam��e ficou muito contente,
��� 75 ���
talvez por que fosse economizar o jantar. Voltamos pa-
ra o sal��o e M��rio comunicou �� turma a tal festa.
��� Mas precisamos arrumar um companheiro para
Arlete.
��� Ora, �� s�� telefonar para Andr��.
No apartamento de M��rio tinha um mont��o de
vestidos super-decotados, que fomos usar sem sutian.
Mas, para mim, que tinha saido h�� t��o pouco tempo
de um internato, n��o usar sutian era meio indecente.
Mas, depois de uns goles, a coisa ficou natural. Toma-
mos mais uns goles e fomos para a festa, que estava
sendo realizada no apartamento de um jovem da mi-
nha idade, que os pais estavam viajando.
Quando chegamos, o apartamento estava apinhado
de gente. Fiquei meio encabulada. Quase todos os ra-
pazes estavam com tudo a mostra. As meninas era
aquele Deus nos acuda. Uma mais decotada que a ou-
tra. Os seios a mostra e os vestidos abertos na frente,
mostrando as coxas e o resto. Eu n��o estava acostu-
mada com tanta gente, e com tanta fuma��a de cigar-
ros . Um conjunto de rapazes com os cabelos enormes
come��ara a tocar. Os pares dan��avam e alguns pre-
feriam ir para os quartos para ficarem mais a von-
tade. Mario segurou-me pela cintura e, apertando-me
contra ele, come��ou a dan��ar, me levando.
��� Sabe que voc�� �� uma jovem muito atraente e
que tem seios lind��ssimos? J�� foram tocados por al-
gu��m?
Decidi ignorar a pergunta. Mas M��rio n��o tirava
os olhos do meu corpo. Seus olhos subiam e desciam.
Eu sabia que meus seios eram morenos, erectos e du-
rinhos, e fiquei toda arrepiada quando Mario abaixou
a cabe��a at�� eles e sugou-lhes os bicos, fazendo-me
quase desmaiar.
��� 76 ���
��� Tenho certeza de que voc�� gostou muito. Gos-
taria de lev��-la para um lugar mais tranquilo. Aqui
est�� muito quente e cheio.
��� Onde poder��amos ir?
��� Para o meu apartamento.
��� Seria formid��vel. Mas, e as minhas amigas?
��� Nesse momento, elas a ignoram.
��� N��o. Fica para outro dia. Hoje eu j�� estou
meio tonta.
A festa terminou as seis horas da manh�� e fomos
todos para o apartamento de M��rio Deitamos ali mes-
mo, nas almofadas da sala, pois n��o aguent��vamos
mais de cansadas. Tinhamos bebido muito, muito
mesmo.
Daquele dia em diante fomos a muitas festas e
conheci uma infinidade de rapazes. Eram meninos ain-
da, que andavam �� solta, pois os pais viajavam para as
Bermudas, para Nova York, It��lia, ��frica, enfim, para
mil lugares diferentes, e os filhos se esborrachavam de
beber, fumar e frequentar as mais ousadas festas. E vi-
viam se lastimando por terem sido atirados ao mundo
livre antes do tempo. Eu observei que quase todos aque-
les meninos que n��o saiam das festas n��o tinham con-
seguido concluir seus cursos de gin��sio pois estavam
constantemente suspensos e, quase sempre, por bebe-
deira ou por fumar maconha.
Eu apreciava essas festas e a intimidade do nosso
grupo, que se sentia ligado por uma esp��cie de revolta
contra os pais. Todos tinham uma queixinha contra o
pai ou contra a m��e. Tamb��m comecei a gostar da
abund��ncia de bebidas e da falta de pudor dessas fes-
tas. Nela encontrei o carinho que jamais tive em casa.
N��o sei bem isso. Talvez fosse o carinho dos amigos
que me deixava t��o f e l i z . . . As afei����es casuais, as
frequentes propostas que recebia, preenchiam a falta
de carinho dos meus pais e, com o correr do tempo,
reduziam a solid��o, que ficava coberta de cinzas den-
tro do meu cora����o. Mas, era s�� vir um ventinho, que
as cinzas iam para longe. Quando, a noite deitava,
sentia uma falta terr��vel do amor que nunca encon-
trara em meus pais. Ent��o pensava na garrafa que
estava em cima do criado mudo e, de gole em gole,
ia me atolando na lama.
��� 78 ���
VI
Gr��vida? P��lulas
Naquela noite que dormimos no apartamento de
M��rio eu fui a primeira a acordar. Olhei no rel��gio
pendurado na parede. Era exatamente, treze horas.
Levantei-me do almofad��o com a cabe��a rodando.
A empregada de M��rio entrou nesse instante e per-
guntou :
��� Quer tomar o caf�� aqui ou na cozinha?
��� Na cozinha.
Enquanto tomava o caf�� com leite, entrou Ivete.
Olhando para dentro da x��cara, gritou:
��� N��o, n��o �� poss��vel! Caf�� com leite! Voc�� deve
estar biruta, garota!
��� Ora, n��o vejo porque.
��� Ent��o vai ver! ��� Olhou para a empregada e
gritou:
��� Hei.me d�� uma dose dupla de u��sque!
��� Assim voc�� acabar�� uma alcoolatrazinha.
��� �� s�� isso que meus pais merecem! ��� Replicou
��� 79 ���
Ivete ��� ter por filha uma alco��latra pois os dois j��
o s��o!
A�� foi que a lembran��a da vingan��a que tinha pro-
metido veio �� tona.
Empurrei a x��cara de caf�� e pedi o mesmo que
Ivete.
��� Bem. Tamb��m beber sem comer �� chato. Hei,
empregada. Bota a�� salame, queijo, azeitonas e biscoi-
tinhos.
��� Olhe Regina, conte-me o que andou fazendo na
festa. N��o a vi uma ��nica vez.
��� N��o viu porque n��o quis. Estive o tempo todo
dan��ando com M��rio. E, por sinal, ele me convidou
para vir aqui no apartamento para ficarmos mais a
vontade.
��� Fant��stico! E voc�� aceitou?
��� N��o.
��� Boba!
��� Boba?
��� Claro!
Olhei bem para Ivete.
��� V o c �� . . .
��� Uma surpresa n��, Regina? M as, finalmente, a
coisa aconteceu.
��� N��o acredito.
��� Juro.
��� Quanto tempo?
��� Essa noite.
��� N��o? N��o �� poss��vel.
��� Claro. Eu estava numa tremenda bebedeira e
ele, o espertinho, aproveitou.
��� Paulo! Virgens! Se mam��e souber...
��� O que tem ? N��o se preocupe. Eu sei tomar as
p��lulas.
��� E que tal?
��� Olhe: o neg��cio arde pr�� burro. Mas �� legal.
��� E agora? Se os seus pais souberem?
Ivate ficou me olhando fixamente, como se n��o me
visse. Mas eu vi aquela coisa no seu olhar. Era como
os seus belos olhos se transformassem em olhos de
v��bora. Dissimulou e respondeu indiferentemente:
��� Isso eu vou deixar pr�� pensar depois. Agora que-
ro fazer amor muitas vezes, para passar a fome dos
meus dezesseis anos. Puxa, se visse que p��nis grande
e lindo que ele t e m ! . . . �� da gente morrer debaixo
dele!
��� Mas voc�� gosta do sujeito?
��� Que sujeito?
��� Ora, Ivete, do Paulo.
��� Ah, voc�� sabe que nem me ocorreu perguntar
ao meu cora����o?
��� E a coisa vai continuar? Quero dizer as re-
la����es?
��� Nem h�� d��vida. Pois foi o que acabei de dizer:
morrer debaixo dele!
��� Eu tamb��m gostaria de ter Mario agora s�� para
mim. Mas h�� tanta gente aqui no apartamento.
��� Por isso n��o. Vou acordar Arlete, Andr�� e Peulo.
Iremos para o apartamento de sua m��e. Voc�� nos en-
contrar�� l�� daqui a algumas horas. Mas tem um pro-
bleminha; e se sua m��e perguntar por voc��?
��� Ora, mam��e est�� doidinha para que eu perca
a virgindade. Ela vai dar hurras de alegria.
��� Nem tanto, Regina. Acho sua m��e meio qua-
drada.
��� 81 ���
��� �� que ela �� uma grande atriz.
E assim foi feito. Ficamos, naquele enorme apar-
tamento, eu e M��rio. Os empregados n��o contavam.
* * *
Acabei de tomar o u��sque e fiquei na sala espe-
rando M��rio acordar. Fiquei imaginando como seria
bom estar deitada ao lado dele, beijando-o longamente.
De s��bito, algu��m me agarrou por tr��s e me tapou os
olhos. M��os macias, quentes e perfumadas. Meu cora-
����o parecia querer saltar do peito. As m��os eram de
M �� r i o . . . Levantei as minhas m��os e fiquei tentando
tirar as deles de meus olhos. Venci e M��rio, rindo, foi
preparar duas doses de bebidas.
��� Espero n��o t��-la assustado.
��� De forma alguma.
Ele foi para o quarto.
��� Regina! ��� gritou l�� de dentro ��� gostaria de
tomar a sua bebida aqui? Estou meio cansado. Ainda
n��o estou bem desperto.
Fui e sentei-me na cama, ao seu lado. O quarto
estava imerso na penumbra.
��� Gostou da festa?
��� N��o, M��rio. Na verdade, quando se sai de um
internato, espera-se ver coisas perfeitas. A festa de on-
tem liquidou as minhas ilus��es. S�� por isso n��o gostei.
��� Mas gostou de dan��ar comigo?
��� Gostei. Mas estou com o corpo todo dolorido.
��� Quer que eu lhe fa��a uma massagem?
��� N��o sei, M��rio. N��o sei se ficaria bem.
��� Olhe, �� s�� voc�� pensar que eu sou realmente
um massagista.
��� 82 ���
��� Mas eu nunca fui a um massagista. A gente
tem que ficar n��a?
��� Claro.
Ocorreu-me, subitamente, que talvez n��o devesse
mostrar as minhas partes ��ntimas a um homem por
que meu corpo e meus seios ele j�� estava cansado de
ver em vestido de festa e quando tom��vamos banhos
de sol sem a parte de cima do m a i �� . Mas, a outra
parte, essa n��o. Juro que morria de vergonha. A�� a
coisa estourou dentro do meu c��rebro.
��� Voc�� eu quero, Regina, mas a sua m��e n��o. ���
A voz de papai martelou nos meus ouvidos.
Deixei M��rio tirar minha roupa e me deitei de bru-
��os na cama, a seu pedido.
��� Voc�� tem um corpo de carnes firmes, bem quei-
madinho de sol. S�� em pensar que tenho esse belo corpo
em minhas m��os, esque��o que seu massagista...
Eu adorava a sensa����o de fogo que queimava as
minhas veias quando aquelas m��os corriam pelo meu
corpo. Sentia que todo ele estava vestido de uma sen-
sa����o viva que crescia cada vez mais. Virei-me e en-
costei o meu corpo no corpo de M��rio e me comprimi a
ele. Deliciosamente, ele beijou-me a boca e foi descendo.
Depois, separou as minhas pernas e ficou olhando fixa-
mente no meio delas, dizendo:
��� Estou conhecendo hoje, pela primeira vez, a
virgindade.
Eu quis fechar as pernas, mas ele segurou-me fir-
memente os joelhos, escancarando-as.
��� Calma, Regina. Voc�� vai gostar. Eu juro que
ainda n��o conhecia a membrana t��o falada. �� uma pe-
linha esbranqui��ada, muito insignificante, mas que con-
forme o caso leva at�� ao crime. �� bela a virgindade ..
A cabe��a de M��rio foi se aproximando e senti sua
l��ngua ardente querendo arrebentar a insigniicante pe-
linha. Tomei-me de intensa vibra����o. Nunca meu san-
gue correra trazendo uma vibra����o como aquela. Mas
��� 83 ���
a sua l��ngua era fr��gil, e ele sabia disso. Deitou-se por
cima de mim e meu corpo come��ou a viver uma in-
tensidade que me fazia perder a consci��ncia. Foi quando
um grito animalesco escapou da minha garganta, sem
que eu pudesse ret��-lo. Suas carnes j�� estavam dentro
de mim. Eu era mulher. Papai havia de ficar bran-
quinho quando soubesse, pois era dos tais moralistas
hip��critas.
��� N��o, M��rio. A culpa foi minha. Fui eu que o
provoquei. Eu quero me vingar de algu��m e a melhor
maneira �� fazer coisas erradas. As piores. Agora eu
gostaria que voc�� me levasse para casa.
��� Ok. Vou trocar-me e buscar o carro.
��� Enquanto isso vou tomar mais um gole. ��� Dis-
se-lhe virando o conte��do do copo de uma vez.
��� 84 ���
VII
Meus 15 anos Fervem
Entrei no quarto das meninas e fiquei admirando
a desordem. Fechei a porta depressa, para mam��e n��o
ver. N��o encontrei nem um lugar para sentar. As ca-
mas estavam lotadas de roupas. O ch��o, coberto de dis-
cos. Enfim parecia ter havida l�� um terremoto. Ivete,
sentada no ch��o em cima das pernas, esmaltava as
unhas, e Arlete, deitada em cima de um monte de
an��guas e vestidos, acompanhava o ritmo da m��sica,
balan��ando as pernas. Corri e desliguei a eletrola. Ivete
levantou a cabe��a e Arlete, repousando a cabe��a num
travesseiro, fitaram-me.
��� Como foi, hem, Regina?
��� Foi legal o neg��cio?
��� Bem, e u . . . M �� r i o . . . Quer dizer... n��s manti-
vemos rela����es, se �� isso que voc��s querem saber.
��� Mas essa �� grande, querida. Grande de morrer.
��� disse Ivete. ��� Ent��o agora voc�� n��o �� mais uma
menina ? Agora �� uma mulher. Legal. Legal pr�� burro.
E como foi? Doeu muito?
��� Como se eu tivesse levado uma punhalada. Mas
isso n��o faz diferen��a agora. Para todos os efeitos eu
��� 85 ���
ainda sou uma menina de quinze anos, virgem. Mas
por dentro j�� sou uma mulher experimentada.
Arlete sorriu, sacudindo a cabe��a.
��� Mas que hist��rias s��o essas, gente?
��� Simplesmente que Regina n��o �� mais virgem.
Arlete cruzou as m��os debaixo da cabe��a.
��� Juro, nunca poderia imaginar que isso pudesse
acontecer a voc��, Regina.
��� Voc�� quer dizer: n��s d u a s . . . n��o �� Arlete ? ���
Exclamou Ivete.
��� Voc�� tamb��m! Poxa, �� mesmo engra��ado que
voc��s, umas inocentes escolares, j�� tenham essa expe-
ri��ncia t��o grande. Gozado, as voltas que a vida d��.
Agora vou precisar arranjar um homem tamb��m para
mim. Sinto necessidade de restabelecer uma superio-
ridade moral para n��o ficar feito boba ��� disse Ar-
lete.
Melhor �� arranjar logo dois para ficar diferente de
voc��s duas.
��� Mas eu sempre tive mais que dois ��� argu-
mentou Ivete, com orgulho.
��� Olhe gente: n��o devemos acanalhar a coisa. Por
outro lado, fiz para me vingar de meus pais. Mas estou
contente por ter revelado o meu segredo a voc��s.
��� Essa �� a sua justificativa, hem Regina? ���
disse Arlete. ��� Porque voc�� quer se vingar de seus
pais?
��� Pelo desquite.
��� Ent��o, eu tamb��m vou me vingar, pelo aban-
dono. Maus pais est��o na Europa e o que eu sei deles
�� s�� pelo cheiro do cheque que me enviam todos os
meses.
��� 86 ���
��� Pois ent��o seja nossa c��mplice.
��� Bem, o neg��cio �� que eu preciso escolher um
homem legal, e n��o esses est��pidos colegiais.
��� N��s n��o fizemos com colegiais est��pidos mas
com rapazes j�� vividos ��� disse Ivete. ��� Olhe, Arlete:
Andr�� �� um belo tipo!
��� �� . . . Vou escolher. Talvez apare��a coisa melhor.
Caimos na risada.
��� Voc��s viram mam��e?
��� Disse que ia �� televis��o.
��� A h ! Bem, voc��s tomam alguma coisa?
��� Claro, estamos com a garganta seca.
��� Escolha nessa desordem toda um bom disco pa-
ra nos acompanhar na bebida.
��� Que tal Roberto Carlos?
��� Grande.
Voltei com a garrafa de conhaque, acendemos ci-
garros e, bebendo, ficamos ouvindo m��sica. Era t��o gos-
toso ficar ali deitada na cama em sil��ncio. Era bom es-
tar de f��rias. Era bom ter perdido a virgindade com um
rapaz, como M��rio. Tamb��m era bom estar com duas
amigas que conhecia t��o bem e com as quais n��o tinha
necessidade de esconder nada. Constitu��amos um mun-
do feliz estando assim juntas, um mundo sem segredos
e sem censuras. Naquele momento, ouvindo Roberto
Carlos, fiquei pensando que seria formid��vel se nossas
vidas n��o seguissem rotas diferentes. Como gostaria que
estiv��ssemos sempre juntas, sem qualquer tens��o ou
incompreeins��o. Nossa amizade refor��ava-se pelos segre-
dos que deix��vamos transparecer em nossas almas. E
foi Ivete quem quebrou o sil��ncio.
��� 87 -
��� Olhe a��, Regina, a�� perto de voc��. A carta que
enviei aos meus pais devolvida pelo correio. Vai ver que
o velho vem aqui bisbilhotar a minha vida. Aposto que
ele mandou mam��e para uma esta����o de ��guas.
��� Mas a sua m��e fica na esta����o de ��guas sem o
seu pai?
��� Voc�� bem sabe que os dois bebem pra burro. Mas
mam��e n��o liga para as minhas aus��ncias. Diz, uma
vez ou outra, que essas minhas estadas com amigos s��o
muito prolongadas. E �� s��.
��� E se o seu pai vier aqui, o que far��?
��� �� muito dif��cil dizer. Pode ser que me esconda
e mande dizer que j�� voltei para casa. Voc�� sabe, eu
n��o suporto ficar na companhia de meus pais. Est��o
sempre b��bados. Mam��e, quando bebe, �� legal, mas pa-
pai �� duro de aguentar. Por isso passo em casa o menos
tempo poss��vel. Acho mesmo que quando ainda dormia
no ber��o j�� sentia vontade de estar longe de meus pais.
Principalmente de papai.
Ivete calou-se de repente. E bebeu de uma vez tudo
tudo o que restava do copo.
��� Mas por que eles bebem tanto?
��� Acho que come��aram como n��s, aos quinze anos.
Um sil��ncio f��nebre caiu sobre o quarto.
��� Fale de seu pai, Ivete ��� pedi.
Ivete arregalou os olhos. Seus l��bios se abriram mas
n��o saiu nem um som. Depois, sorriu meio sem-gra��a
e come��ou.
��� Papai �� violento. Quebra tudo quando �� contra-
riado em alguma coisa. Eu n��o o respeito por que ele
faz tudo para me atormentar. Se eu vou a festas e fico
at�� muito tarde, durmo na casa de amigas. E papai
��� 88 ���
sempre diz: "Aposto que est�� dormindo com algum va-
gabundo". Fica louco de raiva. Voc�� sabe, somos da alta
sociedade. H�� nessa vida muito luxo, bailes de todas as
esp��cies, jantares e banquetes. A gente n��o pode ficar
a toda hora agarrada a saia da m��e, voc�� n��o acha?
��� Mas ele j�� lhe bateu alguma vez?
Pensei que Ivete n��o fosse responder. E sua voz saiu
cheia de ��dio.
��� Uma vez ele me deu uns tabefes, mas eu lhe
dei um pontap�� naquele lugar que foi s�� pena que voou.
Eu n��o tenho medo dele. Se algum dia ele tentar me
agredir, juro que lhe dou um tiro, ou dois, conforme
for preciso, para mat��-lo.
��� ��, Ivete. Eu sei a vida desagrad��vel que voc��
vive com seus pais, mas tanto ��dio a s s i m . . . ?
Arlete sentou-se na cama e disse:
��� Eu tamb��m sei a vida horr��vel que Ivete vive
com os pais, mas n��o quero saber mais nada a respeito.
Tenho horror de homens do tipo do pai de Ivete. ��
melhor a gente mudar de assunto. Olhem, eu acho que
a gente devia mudar de rapazes, conhecer nova turma.
��� Oh! gente, seria maravilhoso. Adoro fazer novas
amizades.
��� Eu acho formid��vel estar na Guanabara, mas o
problema �� que n��o conhe��o outros rapazes, sem ser es-
ses que vivem nos rodeando na praia.
��� Bem, Regina, agora que a gente j�� n��o �� mais
virgem, posso arrumar um colosso de festas. Antes n��o
seria poss��vel porque voc�� se sentiria deslocada.
��� Mas, Ivete, se eu, que sou do sul, n��o conhe��o
muitos rapazes morando aqui, imagina v o c �� . . .
��� 89 ���
��� Ora, querida, n��o se esque��a que um monte de
cariocas frequentam minha mans��o l�� em Pernam-
buco . . .
E por falar nisso, temos uma tremenda festa para
amanh��. Provavelmente voc�� far�� novas e ricas amiza-
des. Depois que a turma souber que voc�� tem quinze
anos e j�� est�� furada, n��o haver�� problema de esp��cie
alguma.
��� Ei ��� exclamou Arlete ��� Voc��s est��o esquecen-
do de mim.
��� Nessa voc�� n��o poder�� entrar, criancinha. S��
depois.
��� Mas se a minha oportunidade de arranjar um
belo e bom amante for hoje, hem? O que voc��s me di-
zem?
��� V�� l��. Talvez voc�� esteja certa. Com algum de
meus amigos voc�� se encontrar�� a si mesma.
��� E encontrar�� a oportunidade de se revelar mu-
lher.
��� Oh! ��� exclamou Arlete ��� isso ser�� maravilho-
so. Adoro o contacto com homens e voc��s imaginam
ent��o sentir um homem inteirinho? Vai ser de enlo-
quecer!
Arlete levantou-se e, rodando de bra��os abertos pe-
lo quarto, repetiu: ��� Vai ser de enloquecer!
��� Olhe, pessoal: o melhor �� a gente ir se arru-
mando para a festa. Vamos at�� a av. Nossa Senhora
de Copacabana comprar vestidos e coisas novas. ��� Foi
dizendo Arlete.
N��s tr��s saimos em micro-vestidos que mam��e cer-
tamente odiaria, e com sand��lias tran��adas at�� as
coxas.
Na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, quan-
do olh��vamos vitrines escolhendo coisas, Ivete gritou:
��� 90 ���
��� J�� consegui arrumar o destruidor da sua vir-
gindade, Arlete. Olhe aquele ali. �� rico pra xux��. Es-
tuda na Inglaterra. Dizem que no mesmo col��gio que
o Pr��ncipe Charles.
Arlete olhou para todos os lados e, com os c��lios
posti��os piscando tremendamente, falou:
��� Cad��? N��o vejo nenhum tipo londrino aqui.
��� Voc�� n��o vai querer que um p��o daqueles este-
ja a p��, n��o ��, querida? Olhe ali, naquele mustang
met��lico. Espere. Ele j�� nos viu. Chi, est�� descendo do
carro, fazendo parar o tr��nsito. Olhem, todo mundo
est�� xingando. Veja s�� os nomes.
��� Hei, Ivete, traga as amigas. Vamos at�� S��o Con-
rado.
Jos�� era, de fato, um homem simp��tico. Alto, mo-
reno, bem queimado. Em S��o Conrado sentamo-nos em
bancos toscos e ficamos tomando agua de coco.
Jos�� logo gostou de Arlete, pois ela estava atraen-
te com seus oculos escuros e seu ar de menina sofisti-
cada.
��� Quanto tempo voc�� leva para conquistar Arlete,
heim Jos��? Est�� querendo ir naquela festa hoje a
noite.
��� Bem, depende de ela estar com vontade...
��� Morrendo ��� disse Arlete. ��� Meus quinze anos
fervem de ansiedade.
��� Mas voc�� �� menor?
��� Quinze anos.
��� Mas depois n��o vai haver bronca.
��� Que nada. Meus pais est��o na Europa. Eu sou
filha ��nica e fa��o o que bem entendo.
��� 91 ���
��� Sabe, Jos��, ��� Ivete falou rindo, ��� Arlete, quan-
do �� beijada sente o cora����o arrepiar.
��� O cora����o?
Caimos na risada.
��� Bem Arlete, eu tenho apartamento em Bota-
fogo. Espero-a l�� ��s quatro da tarde, amanh��. N��o po-
der�� ser hoje, o que sinto muit��ssimo, porque acabo de
comprar um carro esporte e ia busc��-lo quando as en-
contrei. A festa ser�� transferida para amanh��. Deixa
pra mim.
��� 92 ���
VIII
Largue-me... dois
��s quatro horas do dia seguinte, vimos o lindo car-
ro esporte, de linhas baixas e convers��vel, estaciona-
do no meio fio.
��� Puxa que carro! O homem tem gosto.
��� Precisa saber se �� dele, Regina.
��� Claro. Ivete. Olhe ali no espelhinho. Leia o que
est�� escrito. Jos�� Siqueira.
��� Voc�� est�� nervosa, Arlete?
��� Nem um pouquinho.
��� Quer que subamos com voc��?
��� N��o. Se fosse um col��quio com a professora
do col��gio, a�� sim, eu precisaria de ajuda.
��� Olhe, eu acho que essa cal��a Lee, just��ssima, e
t��o apertada, vai atrapalhar um pouco.
��� E voc�� acha que vou ficar de cal��a?
O povo que passava, virava-se para ver quem ria
t��o escandalosamente. Arlete entrou no pr��dio abanan-
do a m��o e andando:
��� 93 ���
��� At�� a pr��xima, queridas. Depois lhes conto tim-
tim por tim-tim.
* * *
Depois, Arlete contou:
��� Entrei no pr��dio e apertei a vista na penumbra,
para ver onde era o elevador.
��� O que deseja, srta.?
O zelador de cabelos brancos fitava-me, com um
rosto carrancudo.
��� Eu e s t o u . . . Bem eu desejo falar com o senhor
Jos�� Siqueira.
��� Ele a convidou?
��� Sim.
��� Um momento. Ligou para o apartamento dele...
��� Pode subir mocinha, apartamento 208.
��� Ok. Obrigada. Fiquei meio embara��ada, pois
nem sabia onde era o elevador.
O zelador me acompanhou, e com um riso c��nico
abriu a porta dizendo: A porta do apartamento tam-
b��m est�� aberta. �� s�� entrar.
Jos�� estava recostado em um sof��, lotado de al-
mofadas. Achei-o petulante pois n��o se dera nem ao
luxo de ir me buscar no sagu��o.
Levantou-se quando entrei por uma porta j�� aberta.
��� Meu Deus!! Voc��s tinham que ver como ele esta-
va vestido. Usava um camisol��o branco de seda que lhe
cobria os p��s. Tinha nas m��os, ali��s em cada dedo, um
enorme anel. Quando entrei, fez uma rever��ncia.
_ 94 ���
��� Entre, querida ��� disse sorrindo ��� Como voc��
�� maravilhosa vindo para mim. Espere, eu a ajudo a
tirar o casaco. Sou um cavalheiro, sabe? N��o fui es-
per��-la l�� embaixo porque trocar de roupa se torna
enfadonho. Vou servi-la de alguma bebida, ou voc�� s��
bebe coca?
��� U��sque com gelo.
Entrou logo depois com uma bandeija de prata,
com dois copos da bebida e sentou-se ao meu lado, di-
zendo: ��� Estou com uma ressaca infernal, mas tam-
b��m estou com a l��ngua para fora de vontade de beber
Bebia aos goles, enquanto falava:
��� Arlete, voc�� est�� celestial. Dev��amos ficar aqui
a tarde toda. N��o sei porque voc�� quer ir naquela fes-
ta. ��� Deslizou sua m��o pelas minhas pernas.
��� Dizem que �� uma festa fant��stica. Montes e
montes de gente nua. dan��ando e quando est��o cansa-
das deitam-se no ch��o e . . .
��� Realmente, �� a juventude, ��� falou com um
sorriso leve ��� juventude que acha que o sexo deve ser
livre e feito ��s claras. E voc��, o que acha a�� nos seus
quinze anos?
��� Acho que o amor deve ser livre, por isso aqui
estou. N��o ser virgem n��o �� mais problema hoje.
��� Mas para casar ��.
��� S�� as quadradas pensam a s s i m . . .
��� Voc�� parece uma menina muito bem cuidada.
��� ��, tenho muito dinheiro, e me cuido. Ali��s, cui-
do do corpo.
��� E do esp��rito?
��� Apesar de meus vinte anos, ainda penso como
os amigos. A alma tem que ser cuidada. Mas foi ma-
��� 95 ���
ravilhoso voc�� ter vindo. Tenho certeza de que vai cor-
rer tudo bem.
Ele olhava-me fixamente. Tirou o copo de minha
m��o e as apertou ternamente.
Sorri e lhe perguntei:
��� Voc�� est�� escandalizado com o meu jeito?
��� N��o, n��o. Absolutamente. S�� que fico a imagi-
nar como ser�� realmente a juventude daqui a alguns
anos.
��� Eu acho muito infantil ficar me preocupando
com o que possa acontecer daqui a alguns anos. Prefiro
viver o presente, se voc�� achar melhor. Se n��o, vamos
ficar aqui filosofando, como sacerdotes budistas. Voc��,
vestido assim, est�� parecendo um deles.
��� Aqui no Rio �� a moda, voc�� tem visto homens
vestidos assim? N��o?
Muito me admiro. Isso �� o "weston", t��o famoso.
��� Tive pouca conviv��ncia com o sexo oposto. Che-
gamos a alguns dias de Recife.
��� A h !
��� Como ele n��o resolvia falar em cama, eu logo
pensei que fosse homossexual. A�� fiquei estudando-o,
enquanto ele se recostava, langorosamente, contra as
almofadas do sof��. Tinha uma face atrante, e parecia
extraordinariamente aquele s��mbolo do homem em de-
cad��ncia sexual. Ser��, pensei, que todo mundo acha que
ele �� vigoroso e ningu��m sabe de seu segredo? Ele olha-
va-me sorrindo. Ent��o lhe falei:
��� Olha aqui, Jos��, voc�� pensa que ter intimidade
comigo �� pervers��o?
��� 96 ���
��� Oh! ��� Disse ele sorrindo. ��� Voc�� est�� com mui-
ta pressa. Calma, menina. Isso n��o se faz assim, sem
mais nem menos.
��� �� que minhas amigas est��o me esperando l��
perto de seu carro.
��� Minha querida crian��a, voc�� devia estar ame-
drontada, e n��o permitir que homem algum a possuisse.
Podia, agora, recuar e sair correndo daqui levando o que
os homens brasileiros pensam valer mais que tudo, mes-
mo m a i s que o car��ter, que a honra, que a bondade, que
a dignidade, que a nobreza de esp��rito: a virgindade.
Mas sei que a sua juventude est�� enraizada na atual
idade. Para voc�� e as jovens de hoje, a juventude ��
um jogo de satisfa����es do qual se tem que participar. Vo-
c�� sabe que tem muito a perder nesse decadente mun-
do belo e perigoso. Contudo, minha linda crian��a, est��
determinada a manter a sua posi����o. Sente que ser��
desprezada, se continuar virgem, no seu mundo de jo-
vens que t��m um mundo �� parte, e esse mundo tam-
b��m �� seu. Voc�� quer agarr��-lo com unhas e dentes e,
para isso, tem que seguir jogando, sem se surpreender
com coisa alguma.
Voltou a pegar minhas m��os.
��� Sinto uma imensa atra����o por voc��. Voc�� �� de-
safiante. Venha c��.
Levou-me para o quarto.
��� Puxa, at�� que enfim, ��� disse Ivete ��� mas con-
tinue. Fez ou n��o fez?
��� Calma, chego l��. Eu disse que ia contar tim-
tim por tim-tim. O leito era grande e redondo, forrado
��� 9 7 ���
de seda negra, com um monte de almofadas coloridas
�� volta. Em dado momento, ele disse:
��� Bem, acho melhor voc�� tirar a roupa.
Depois, ele veio at�� mim e beijou-me na boca, de-
liciosamente, dizendo:
��� A decis��o �� sua. Fico ou n��o fico presente?
Dei de ombros. N��o deixei por menos: Ora, quem
vai funcionar �� voc��, Jos��. N��o sei como devo fazer. ��
a primeira vez.
��� Oh, ent��o tudo deve ser maravilhoso e rom��n-
tico. Vou colocar um disco na vitrola enquanto voc��
se deita. Quer Wagner, Bach, Chopin, F r a n z . . . ?
��� Chopin.
��� Tirei a roupa e fiquei olhando onde deitar. Afas-
tei algumas almofadas e recostando-me na cama, fiquei
ouvindo Chopin, enquanto ele foi at�� o banheiro. Ouvi
o chuveiro. O disco, o chuveiro, e eu l��, n��a, feito uma
tonta. Tive uma vontade enorme de correr �� janela e
chamar o primeiro homem que passasse. Mas nisso ele
surgiu, n��, friccionando as costas com uma toalha.
��� Voc�� tem um lindo corpo, seios retos, grandes
coxas e cintura fina. Assim deitada, parece uma deusa
grega.
��� Chi ��� fiquei pensando. ��� banho, disco, deu-
sa. Quanta chatea����o para entrar no rol das mulheres
desvirginadas. Puxa, como o homem era dif��cil. Era um
homem desencorajador. N��o aguentei mais. Quando ele
foi �� frente do espelho pentear os cabelos, sentei-me na
cama e gritei:
��� 98 ���
��� Olhe aqui, Jos��. Ou voc�� �� um incapaz ou est��
brincando comigo?
��� Ele sentou-se ao meu lado na cama e me empur-
rou delicadamente contra as almofadas.
��� Sabe que seu corpo assim moreno fica maravi-
lhoso entre essas almofadas brancas?
��� Sei ��� disse eu, zangada. ��� mas acho que para
voc�� nada disso interessa. Voc�� n��o pode amar, n��o ��?
��� Um fluxo de sangue abrazou-lhe o rosto. Ouvia-
-se-lhe o cora����o bater, t��o forte que fiquei im��vel.
��� Vou lhe mostrar ��� disse. ��� Voc�� jamais es-
quecer�� esta tarde. ��� Subiu na cama como um le��o.
Depois, ficamos abra��ados numa doce lassid��o, acon-
chegados um ao outro.
��� S�� isso? ��� perguntou Ivete.
��� Ora, eu tamb��m n��o vou dizer como foi que
abri as pernas e o neg��cio entrou, que ele gemeu e que
eu gemi. Isso todo mundo faz igual. Voc�� gemeu e gri-
tou, Regina. Pois eu tamb��m gemi e gritei.
��� E depois, o que ele disse?
��� N��o sei por que, mas Jos�� �� t��o esquisito. Quan-
do levantou-se da cama, olhou-me longamente e disse:
��� Pronto, agora v�� para o seu lar em peda��os,
para os rapazes ricos da turminha da Ivete, que riem
pelas costas da facilidade com que possuem a garota
que escolherem. V�� para o seu mundo onde s�� existe
sexo e n��o existe o amor. Se voc�� tivesse um pouco de
vergonha sabe o que faria agora? Deitaria de bru��os e
choraria.
��� Ora, mas que homem besta. Por que voc�� n��o
mandou para a merda ou para a puta-que-o-pariu?
��� 99 ���
��� Nem liguei para o que ele disse. Que tal, vamos
�� festa?
Voltamos para o apartamento e mam��e n��o havia
chegado. Ficamos tomando u��sque, numa garrafa mes-
mo, e fumando.
��� Puxa, se a gente tivesse aqui um daqueles ci-
garros de maconha, seria vibrante, heim, gente?
��� Eu n��o gostei muito ��� exclamei, depositando
a garrafa em cima de mesinha. Arlete e Ivete me olha-
ram admiradas.
��� N��o v�� nos dizer que voc�� j�� fumou o fuma��a?
��� Que fuma��a?
��� �� como chamamos os cigarros de maconha l��
no col��gio?
��� Claor que fumei. ��� falei com orgulho. ��� M��-
rio deixou-me fumar um inteirinho.
��� E o que voc�� sentiu?
��� Uma tonteirinha, e me pareceu que me reani-
mou um pouco o esp��rito. Fiquei meio vidrada.
Ivete riu.
��� V��, querida. Acho que ele lhe deu foi um ci-
garro de fumo de corda, porque maconha fumada a
primeira vez faz a gente se sentir mal pra burro.
��� E o que se sente?
��� Bem, todo mundo sente uma estranha sensa-
����o de sono. Depois das primeiras tragadas sobem l��
do est��mago ondas de mal-estar de minuto a minuto.
Um suor frio banha o rosto da gente e o enjoo do es-
t��mago faz a cabe��a ficar girando. Eu quase vomitei
as tripas. Nunca me senti t��o mal durante todos os
meus dezesseis anos.
��� 100 ���
��� E por que voc�� continua fumando?
��� A gente se acostuma. Agora a sensa����o �� dife-
rente quando fumo um fuma��a. Parece que estou vi-
vendo em c��mara lenta. �� gostoso e gozado.
��� Ent��o voc��s querem dizer que n��o fumei ma-
conha ?
��� Claro, querida. Mas na festa de hoje haver��
maconha, e muita. Voc�� vai ver como �� diferente. Vai
ser divertido como o diabo. Quero ver Regina fumar
um fuma��a.
Suspirei e bebi mais um gole da garrafa e a passei
para Arlete.
��� Eu devia ter sabido disso. ��� falei. ��� Algu��m
j�� me havia falado dos sintomas. Quer dizer que aquele
cretino do M��rio me enganou e, enganando-me, cortou
a minha vingan��a. Mas n��o faz mal. Hoje afundarei
mais um p�� na lama fumando maconha de verdade.
��� Sua m��e est�� demorando, Regina. Acho melhor
a gente ir se vestindo. J�� s��o nove horas e os rapazes
aparecer��o para nos buscar l�� pelas dez.
��� Telefone para ela.
Liguei o telefone para o canal de televis��o e foi
um custo para mam��e atender.
��� Mam��e, olha, n��s vamos numa festa. N��o sa-
bemos a hora que voltaremos. N��o se preocupe, t��?
��� Otimo, querida. Fiquei encantada com seu te-
lefonema. Estou ensaiando a novela. Obtive um papel
formid��vel. Depois do ensaio irei com a turma aqui da
tv para uma boate, por isso fique na festa sossegada.
��� Mas, mam��e, a senhora disse a papai que se ele
custeasse as despesas do apartamento que ia largar m��o
de novelas e de cinema.
��� 101 ���
��� Ora, querida, falei por falar. N��o se incomode
que seu pai paga tudo. Divirta-se, meu bem.
Quando desliguei, sentei-me desanimada no sof��.
��� O que houve? Sua m��e foi contratada?
��� Sim. ��� disse eu, tristemente. ��� Os malditos
pap��is na tv levam para longe, mais longe, o lar que
eu sempre almejo, com os meus pais reunidos. Ela acei-
ta uns papeizinhos que, para ela, psicologicamente, ��
de uma grande atriz. Mas no fundo o que ganha n��o
d�� nem pra comprar um sabonete.
Sentei-me e acendi um cigarro.
��� O engra��ado �� que ela �� um fracasso como atriz,
mas �� a ��nica coisa que a faz gostar da pr��pria exis-
t��ncia. Pequenos pap��is fazem com que ela se considere
um ��xito. Um insignificante papel numa novela vale
mais do que um marido, uma filha e um lar.
��� 102 ���
IX
Festa do Vale Tudo
Na festa, ficamos conhecendo in��meros e diferen-
tes rapazes. Chamavam-na a "Festa do Vale-Tudo". No
enorme sal��o, a orquestra ensurdecia a gente. A tur-
ma pulava, agarrados como se fosse, cada par, um s��,
Todos os que queriam defenda a sua m�� reputa����o e a
baixa moralidade estavam presentes. Digo, reputa����o e
moralidade baixa de jovens da alta sociedade, desses
tipos que um quer aparecer mais que o outro. Eu achei
que eles, com os peitos n��s, com os pesco��os enfeita-
dos com in��meros colares, correntes, medalhas, esta-
vam fantasticamente unidos por uma rebeli��o comum
contra a falta de um lar sadio. Tamb��m, eu, vendo
aquele bando de jovens ricos e livres nos seus verdes
anos, podia fazer o que bem me aprouvesse. Senti que
mais crescera dentro de mim o abandono em que me
via e comecei a gostar da abund��ncia de bebidas e da
falta de cerim��nia e dos gestos escandalosos do pessoal
dessa festa. Na turma, encontrei uma receptividade
que me emocionou. A afei����o dos homens, quase me-
ninos, que me faziam as mais diversas propostas, a
camaradagem na bebida, os di��logos, os carinhos pre-
encheram nessa noite o vazio que sentia dentro do meu
cora����o. Nessa festa, a bebedeira que tomei me levou
a um quase esquecimento do desquite dos meus pais.
Aceitamos o convite de alguns rapazes e fomos para o
apartamento de um deles. Quando chegamos, senti que
havia batido o meu recorde de capacidade de resist��n-
cia. Estava completamente b��bada, mas assim mesmo
aceitei o desafio de meus companheiros e bebi at�� cair.
Acordei na manh�� seguinte, com as sacudidelas de
Arlete.
��� Acorde, Regina. S��o seis horas.
Abri os olhos, olhei para os lados e vi que estava
em uma sala deitada no ch��o. Perto de mim havia um
rapaz dormindo. Levantei-me e tentei acordar o jovem.
��� N��o adianta ��� observou Ivete, lugubremente
��� ele est�� desacordado de tanto beber.
��� Me d�� um cigarro.
��� N��o temos mais. Mas ainda h�� bebida.
��� N��o. Ainda estou tonta.
��� Tonta ou b��bada?
��� Estou s��bria, mas morrendo de fome.
��� N��o existe cozinha neste apartamento?
��� Vamos procurar.
��� Tem cozinha, tem geladeira e nada para co-
mer.
��� Vamos descer e procurar um bar, eu sei l�� o
que. A fome que estou sentindo �� tremenda.
O bar estava quase vazio. Sentamo-nos em banqui-
nhos girat��rios e pedimos uma m��dia com p��o e man-
teiga .
O caf�� com leite tinha um bom gosto naquela hora
que o est��mago roncava de fome. Ivete comprou cigar-
��� 104 ���
ros e ficamos no bar fumando. Perto de n��s estavam
sentados dois homens, que nos olhavam sorrindo. Um
deles fixou-se em Ivete e disse:
��� A farra dessa noite esteve legal, heim, garota.
N��o querem lazer amor com a gente agora? N��S so-
mos dois, mas garanto que nem dez homens nos tiram
a prosa. Somos resistentes pra burro.
��� Ambos devem olharem-se para depois dirigirem
a palavra a jovens como n��s.
O homem deu uma risadinha e baixinho conspirou
com o outro. Depois, exclamou:
��� Voc��s s��o umas putas. E como querem ser olha-
das, ent��o?
��� Acho bom a gente sair daqui, ��� sussurrei a
Ivete e Arlete ��� se a gente for ligar para esses tipos,
haver�� esc��ndalo.
��� Mas, voc�� n��o disse que queria se vingar de
seus pais. Olhe, acho que n��o haver�� melhor oportu-
nidade .
��� Ah, fant��stico. Ent��o vamos entrar para o es-
c��ndalo. Mas, como come��ar?
��� Assim ��� falou Ivete, lan��ando o caf�� no rosto
de um dos homens, que veio como um le��o por cima
da gente. Jogamos sobre ele copos e garrafas, tudo que
estava ao nosso alcance. Um policial entrou. E, en-
quanto os primeiros raios de sol banhavam a praia' n��s
entramos no carro preto da pol��cia.
Papai, a chamado de mam��e, veio de S��o Paulo
para nos tirar da delegacia. Levou uma esfrega do
delegado por me deixar assim solta. Sorri, quando ele
me perguntou onde havia passado a noite.
��� Uma farra, papai, e com homens.
��� N��o acredito! Voc�� gosta de escandalizar as
pessoas ?
��� 105 ���
��� Escandalizar n��o, papai. Hoje voc�� atolou esses
brilhantes pezinhos, envoltos em sapatos car��ssimos, na
lama. como prometi. Toda a pol��cia, agora, sabe que eu
sou uma putinha.
Papai n��o respondeu. Nos entregou ao homem do
elevador, pedindo para nos deixar no apartamento, pois
mam��e nos esperava. Ivete me deu uma cotovelada,
quando chegamos �� porta do apartamento.
��� E se sua m��e nos mandar embora?
��� Ela que experimente. Pois se foi ela mesma
quem me mandou ficar na festa at�� quando eu bem
entendesse.
Batemos na porta e mam��e abriu.
��� Regina, a essa hora? ��� exclamou mam��e,
fechando a porta depois de entrarmos.
��� Mas, mam��e, voc�� deixou.. .
��� Voc�� vive a mentir ��� disse mam��e, zangada
��� Deixei voc�� ir a uma festa e n��o a uma bacanal. Seu
pai, assim, pode cortar a nossa mesada.
��� Que corte! Assim talvez voc�� resolva voltar pa-
ra junto dele e se comportar como m��e e esposa.
��� Olhe aqui! N��o �� poss��vel voc�� querer organi-
zar a minha vida. Se n��o me caso outra vez �� porque
seu pai tem muito dinheiro para nos levar a uma vi-
dinha de ricas.
��� T�� bem, mam��e. N��s queremos dormir.
��� A empregada est�� limpando os quartos. Esta-
vam parecendo chiqueiros. As suas a m i g a s . . .
��� Por favor, mam��e. O apartamento tamb��m ��
meu. Papai disse que eu mando aqui tanto quanto voc��.
��� Seu pai? Diga a ele que cuide da pr��pria vida
e deixe de explorar os sentimentos de uma menina
��� 106 ���
��� Olhe, mam��e, ��� expliquei pacientemente ���
papai n��o manda nos meus sentimentos. Ele �� um ho-
mem forte de verdade, e eu gosto muito dele. Nunca
tenta me influenciar em coisa alguma. Agora deixe a
gente em paz.
Olhei para as minhas amigas e disse: ��� Voc��s que-
rem bebida antes da gente ir dormir, n��o querem?
Mam��e ficou de bra��os cruzados, batendo a ponta
do p��, envolto em chinelo de pel��cia cor de rosa, no
tapete de cor indefinida enquanto fomos para a co-
zinha .
��� Para mim, gim com soda, Regina.
��� Com gelo?
��� Claro.
��� E voc��, Arlete?
��� U��sque.
��� Tamb��m com gelo?
��� Pode ser.
Nisso, a voz da empregada fez-se ouvir:
��� Dona Regina, telefone.
��� Atendo aqui. Pode colocar no gancho.
Era Jos��.
��� Oh Jos��! ��� exclamei ��� �� formid��vel ouvi-lo.
Sim, gostaria muito. As amigas est��o perto. Arlete?
Est�� sim. Olhe, arranje uma companhia para Ivete.
Silvio, um rapaz que esteve na festa de ontem? Ok,
Desliguei e disse ��s meninas: ��� Olhe, tem uma turma
velejando por a��. Cada barco leva seis pessoas. Jos��
nos convidou a ir com ele.
��� Mas n��s n��o iamos dormir? ��� disse Ivete, se
espregui��ando. ��� Estou morrendo de sono.
��� Que sono que nada. Voc�� tem apenas quinze
anos. Vamos apanhar os biquinis.
��� 107 ���
Ao atravessarmos a sala olhei para mam��e. Ela
bebia um c��lice de conhaque e parou para perguntar:
��� Por que toda essa correria?
��� Vamos sair com alguns amigos. Olhe, mam��e,
n��o sabemos a hora da volta.
��� Olhe aqui, Regina, n��o suporto mais essas suas
maluquices. N��o quero ver minha filha vivendo dessa
forma.
��� �� s�� voc�� dizer uma palavra que meu sistema
de vida mudar��.
��� Que palavra?
��� Que volta para papai.
��� Nem vou discutir a quest��o. N��o h�� alterna-
tiva. Eu n��o posso adaptar-me �� vida de seu pai e
est�� acabado.
��� Ent��o voc�� tem que arcar com as consequ��n-
cias das minhas maluquices. Tchau, mam��e. Vou cair
em outra farra.
X
Oito homens, duas meninas.
O mar estava, realmente, muito calmo e cheio de
barcos �� vela, nessa manh��. Jos��, Silvio e um outro
rapaz que ficou sendo par de Ivete, manobravam o
barco assobiando. N��s tr��s, deitadas no fundo do bar-
co, sentindo no corpo nu aquele calor abrasador que
vinha do sol que era uma bola fulgurante, com seus
raios cortando o claro c��u azul, davam uma impres-
s��o t��o irreal a tudo que nos rodeava, depois de ter-
mos passado uma noite dan��ando e fazendo outras coi-
sas na penumbra.
Fiquei silenciosa e pensativa debaixo daquele sol,
pensando como era gozada a vida. Quando era nene-
zinho, a pagem me levava �� praia e me deixava deita-
dinha no meio da ��gua azulada, tendo o cuidado de
n��o deixar o sol me queimar muito. Quando estava
mais crescida, era o sol o meu querido, onde passava
horas a fio me tratando. H�� um ano atr��s, saida do in-
ternato, corava quando, deitada ao sol, e biquini, al-
gum rapaz soltava qualquer piadinha a respeito do meu
corpo. Agora, deitada, nua, com esse mesmo sol a me
queimar, tinha em minha frente tr��s homens que me
devoravam com olhares s��dicos e ao alcance da m��o
uma garrafa de uisque. Era engra��ado pensar que eu
��� 109 ���
n��o queria nada daquilo, que o que eu queria era, sim-
plesmente, estar sentada em uma salinha, com a jane-
la aberta, onde o sol pudesse entrar e beijar os bot��es
de rosa que estariam num vaso azul, em cima de uma
mesa com uma toalha bem branquinha. Sentado em
uma poltrona estaria o papai lendo o jornal e mam��e
a lhe perguntar se queria um cafezinho que teria aca-
bado de coar. Papai deixaria o jornal, sorriria e acei-
taria. Eu olharia os dois e me sentiria feliz. Saberia
que eles se amavam e eu partilharia desse amor. Mas
a salinha foi desmanchada pelo grito de Ivete.
��� Cuidado! O barco vai virar!
De fato, um vento forte que veio cortando ondas
enormes que se formavam requebrando num estrondo
ensurdecedor para se perderem na praia, quase virava
o barco, se n��s todos n��o tiv��ssemos, imediatamente,
for��ado o lado mais alto at�� que o mesmo se equili-
brasse. E a��, Jos�� achou melhor irmos para uma ilha
particular onde a turma prometera se reunir.
Fomos recebidos �� porta por um rapaz de "short",
que nos proibiu de entrar assim de Ad��o e Eva.
��� Que nova �� essa? ��� exclamou Jos��. ��� Voc��
n��o est�� querendo dizer que teremos de nos vestir.
��� Infelizmente, sim. Bote a�� qualquer tro��o. At��
uma folha de parreira serve. Mas o sexo tem que estar
tapado.
Caimos na risada.
��� Esperem aqui. Ou melhor, venham comigo. Te-
nho um amigo que tem casa nessa ilha. Acho que ��
aquela, aquela mesmo. L�� encontraremos roupas de ba-
nho, ou pelo menos algo semelhante.
A casa estava vazia e trancada. Jos�� for��ou uma
janela e entramos. Num guarda-roupa encontramos bi-
quinis e os rapazes encontraram "shorts". Voltamos e
��� 110 ���
entramos num grande sal��o repleto de jovens que con-
versavam aos picadinhos e j�� estavam alegr��ssimos. Ive-
te, Arlete e os tr��s rapazes ficaram entretidos com a
mo��ada. Eu abri caminho e fui procurar qualquer coi-
sa para beber. Entrei na cozinha e fui preparar um
martini, quando entrou uma jovem segurando um co-
po com u��sque.
��� Ol��! ��� disse ela. ��� N��o nos conhecemos?
��� Creio que n��o.
��� Ent��o vamos nos apresentar.
��� Regina.
��� Clara.
��� Com quem voc�� veio?
��� Com Jos�� Siqueira e uma turminha.
��� Ah, o J o s �� . . .
��� Voc�� o conhece?
��� Quem n��o o conhece? ��� sorriu ela. ��� �� um
dos homens mais desfrut��veis da sociedade. Antiga-
mente, era um sem-vergonha. Hoje deflora meninas.
Mas �� um moralista.
��� Como pode ser moralista s e . . .
��� As meninas se oferecem. Uma vez, aqui mesmo,
neste sal��o, uma pequena se ofereceu a ele e eles fi-
zeram amor na frente de todo mundo. Tem pequenas
que o acham abomin��vel, mas o suportam por que ele
nada em ouro. Eu, principalmente, o acho muito es-
quisito. E voc��?
��� Ah, eu o conhe��o muito pouco. Ele �� namorado
de uma amiga.
��� Namorado??? ��� debochou Clara.
��� 1 1 1 ���
��� Amante.
��� Ela se ofereceu?
��� Sim.
��� Ah, como corre a juventude. Olhe, Regina, vem
para c�� um rapaz amigo meu. Quero dizer, era amigo.
Como n��o fa��o quest��o de v��-lo, deixo-a s��. Tchau.
O jovem entrou na cozinha. Era o ��nico que pare-
cia s��brio naquele meio. Analisei-o rapidamente. Ti-
nha um ar abstra��do. Era queimado e com apar��ncia
petulante. Devia ter uns vinte e seis anos. Bem velho,
em rela����o aos frequentadores habituais das festas a
que eu costumava ir. Os seus cabelos castanhos dou-
rados faziam um lindo contraste com os seus olhos de
um negro brilhante, fazendo sobressair, na pele bem
morena, os dentes brancos e luminosos. Quando me
olhou, v�� que seu olhar era cr��tico e reservado. Fixou-
me diretamente, eu fiquei descontrolada. Preparou uma
bebida e me ofereceu.
��� Martini?
��� J�� tenho.
��� Estudante?
��� Sim.
��� Senai?
��� ��.
��� Puxa, parece que n��o existe outro col��gio em
S��o Paulo. Senai. S�� Senai. Pelo que vejo �� um mem-
bro dessa turma a�� fora.
��� Come��o a fazer parte. E voc��?
Sorriu e falou r��pido, sem parar.
��� A turma. . . quero dizer, essa turma bebe e fu-
ma at�� perder os sentidos. Isso �� repugnante. Mas eu
n��o entendo muito desse neg��cio, essa vontade de se
��� 112 ���
auto-destruir. Eu n��o quero ser moralista, mas me pa-
rece que, se voc�� come��ar a fazer parte da turma, vai
acabar se dando mal. �� melhor n��o come��ar. Olhe, d��
uma olhada l�� no sal��o. Todos b��bados, ou cheios de
entorpecentes. Caidos pelo ch��o, agarrados, dan��ando
como se estivessem em c��mera lenta. Beber algo, acho
certo. Mas beber para se destruir...!
��� Mas se voc�� n��o os aprecia por que est�� aqui?
��� Voltei para dar uma espiada.
��� Voltou?
��� Sim. Quando frequentava a turma n��o conse-
guia boas notas, via meus melhores amigos morrerem
de tanto t��xico, olhei para dentro de mim e fiz um ba-
lan��o da vida que estava levando. Ent��o perguntei a
mim mesmo: ,Para que viver, se eu mesmo estou me
matando?" Ent��o deixei a turma e dediquei-me ao tra-
balho de me reformar. De um b��bado e toxic��mano, nas-
ceu um escritor.
��� Voc�� escreve?
��� Sim. Lan��arei no pr��ximo m��s o meu terceiro
livro.
��� Qual �� o meu nome?
��� Raul de Castro.
��� Ah.
��� Ah o que?
��� Voc�� �� escritor de sexo, n��o ��?
��� Voc�� n��o pode ter lido nenhuma das minhas
obras pois me parece t��o crian��a.
��� N��o, sinceramente n��o o conhecia. Mas n��o ��
por isso, por voc�� escrever sobre sexo, que falo, pois
eu e as minhas amigas lemos tudo no g��nero. Adelaide
Carraro, por exemplo, n��s a a c h a m o s legal pra burro.
��� 1 1 3 ���
��� Eu tamb��m a conhe��o. Ali��s, a conhe��o pessoal-
mente. Ela escreve os livros proibidos, mas no fundo,
bem no fundo, �� uma moralista.
��� J�� desconfiava.
��� Por que?
��� Por que eu tamb��m detesto ter que frequentar
tudo isso, detesto fazer o que fa��o, mas �� preciso.
��� N��o a entendo. Mas h�� alguma coisa na con-
vic����o de que voc�� n��o quer ficar assim perdida.
��� Claro que eu n��o quero, mas os meus pais sim.
��� Seus pais?
��� �� uma outra hist��ria, que n��o vai lhe interessar.
��� Algo assim como auto-piedade ? Manifestando
��dio ao mundo, assim como aquela turma?
��� Quase que voc�� acerta. Talvez seja isso que sin-
to. �� pena de mim mesmo por n��o ter um lar. E, de
certa forma, me sinto igual a eles. Na ��nsia de me des-
truir porque estou oca por dentro.
��� N��o vou lhe falar como um intelectual, mas co-
mo um homem batido pela vida. Voc��s, os jovens, es-
t��o perdendo tempo manifestando tanta revolta. A
gente fica indignado de ver aquilo ali: meninas e me-
ninos, homens e mulheres de amanh��, que poderiam
formar um Brasil melhor, mais sadio, mais cheio de
amor, a�� jogados como trapos humanos.
��� A gente formaria um Brasil melhor se tivesse
uma fam��lia melhor.
��� Mas a juventude n��o tem que esperar vir da
fam��lia os bons exemplos. Os jovens devem pensar que
eles �� que t��m de formar uma fam��lia. �� engra��ado o
que pensa uma menina como voc��. Como �� o seu nome?
��� Regina.
��� 114 ���
��� Pois ��, Regina, o que voc�� quer fazer ��� ou
melhor, acho que j�� fez ��� tomar entorpecentes, be-
ber, fazer amor com todo mundo, para se vingar dos
seus pais, �� covardia.
��� Covardia??? Por que n��o est�� acontecendo com
voc��? Ningu��m, hoje em dia, respeita uma mocinha que
tem pais desquitados. Eu critico os meus pais e culpo-
os por me fazerem andar por a��.
��� Voc�� os critica, os culpa, mas aposto que vive
��s custas deles.
��� Ora, e ��s custas de quem poderia viver uma
menina de quinze anos?
��� A sua pr��pria. Em vez de andar por a��, poderia
trabalhar e deixar de viver se lamentando, na bebida,
por seus pais estarem separados. Devia procurar algum
lugar para dar aulas, ou coisa parecida.
��� Bem, mas a coisa n��o �� t��o simples assim.
��� Olhe, Regina ��� Raul me olhou com renovado
interesse ��� voc�� n��o �� o que eu havia julgado a prin-
cipio, uma pern��stica e f��cil garota. Sei que n��o deixa
se levar pelos demais. Voc�� disse que se despreza por
estar aqui, que detesta tudo isso. Por que ent��o n��o
sai disso tudo, agora, e de cabe��a erguida?
��� Por que ainda n��o chegou a hora.
��� Ent��o quer continuar a vingan��a?
��� Quero.
��� Bem, n��o sei por que pensei tudo aquilo logo
que a v��. A�� �� que est�� o mal em certos homens: eles
d��o valor a uma garota e, quando v��o ver, sentem que
a dosagem alco��lica de seu sangue �� de cem por cento.
Depositei o c��lice de martini em cima da pia e
falei.
��� 115 ���
��� Nunca vi ningu��m medir as qualidades de al-
gu��m em rela����o ao ��lcool. Por isso, n��o sei se ter no
sangue cem por cento de ��lcool �� bom ou ruim.
��� Isso quer dizer que a garota est�� desclassifi-
cada moralmente. Moral zero: j�� nem serve pra dormir
com um homem.
Olhei-o com desprezo.
��� N��o lhe daria esse prazer nem se voc�� fosse o
��ltimo homem sobre a terra.
Dei de ombros e deixei a cozinha. Mas n��o antes
de apanhar um outro copo de bebida. Na sala, em meio
�� turma j�� podre de tanto beber, de repente algu��m
falou:
��� Meu Deus, Regina, voc�� aqui nesse meio? Est��
mesmo se atirando na lama?
��� Ol��, M��rio, como vai?
��� Continuo dizendo que �� um verdadeiro sacril��-
gio sua m��e deixar um broto lindo assim se desperdi-
��ar desse jeito. Puxa, n��o a vejo desde aquele dia. Onde
tem andado?
Brinquei com ele.
��� Nos bra��os de um principe.
Ele tamb��m brincou.
��� De verdade? Parab��ns, garota. Assim voc�� po-
der�� dar mais conforto a sua m��e.
��� E por mais um sof�� para voc�� dormir na sala?
Ele deu uma risada.
��� Falando s��rio, tenho sentido a sua falta.
��� Por que voc�� n��o vai l�� em casa fazer compa-
nhia a mam��e?
��� 116 ���
��� Depois do que aconteceu, sinceramente, n��o te-
nho coragem.
��� U��, fazer amor n��o �� crime.
��� Deflorar menor ��.
��� Eu o provoquei.
��� Mas a sua m��e n��o querer�� saber disso.
��� Mam��e n��o se importa comigo.
��� Seu pai?
��� Ora, M��rio, voc�� bem sabe que n��o tenho quem
se importe comigo ��� as coisas que eu pensava, quan-
do achava que n��o tinha pais, voltaram a me atormen-
tar. E o desejo de vingan��a veio mais forte.
��� Olhe, M��rio, vamos na cozinha beber. Quero fi-
car embriagada.
A�� comecei a beber copo depois de copo e logo co-
me��ou a se formar junto de n��s uma turminha. Um
dos rapazes disse:
��� Ora, menina, n��o fique a�� nesse embalo, beben-
do sem um homem para lhe dizer que a ama. Pois eu
a amo, sabe, querida?
Apesar de estar quase b��bada, v�� que o rapaz esta-
va bambo das pernas e quase perdendo os sentidos.
Mas assim mesmo teve for��as para me abra��ar. Agar-
rando-me fortemente, quis me atirar no ch��o. N��o sei
quem me libertou, para dizer:
��� Eu tamb��m a amo, meu bem, seja mais boazi-
nha comigo. Deixe ver esse corpo. Fa��a uma demons-
tra����o tirando a roupa ao som dessa m��sica.
V�� que o homem dan��ava e batia palmas e volta-
va a me abra��ar. Tamb��m n��o sei quem, enla��ando-me
nos bra��os, resgatou-me do amplexo do homem e disse:
��� 117 ���
��� N��o fa��a amor com eles, boneca. Fa��a comigo.
Beijou-me na boca e escorregou a m��o pelo meu corpo.
��� Ei, largue a garota! Agora �� minha vez!
E eu, numa r��pida sucess��o, passava de bra��os a
bra��os, sendo beijada por todo mundo. Das duas uma:
ou eu n��o era t��o vulgar assim ou n��o estava gostando
da coisa, porque tentei me libertar da rodinha de
homens mas n��o consegui, pois mal me aguentava nas
pernas e sentia a cabe��a girar. Sabia que tinha de aca-
bar na cama com algum daqueles homens. Senti-me
erguida em bra��os fortes, e passos r��pidos me leva-
vam para algum lugar. Senti o colch��o macio e m��os
��geis que tiravam o meu biquini. Sentia que estava
n��a, mas n��o tinha coragem de abrir os olhos, para
ver a cara do homem que ��a me possuir.
Passei muito tempo com os olhos fechados e como
ele n��o se aproximava resolvi ver o que estava aconte-
cendo. Fui abrindo os olhos bem de vagarzinho. Cabelos
castanhos dourados, olhos brilhantes, negros, e dentes
luminosos, Raul de Castro, o escritor. Ele sorriu, e disse:
��� Voc�� est�� querendo, n��o est��?
Virei o rosto para o lado, me lembrando que al-
gum tempo atr��s tinha-lhe dito que n��o dormiria com
ele nem se fosse o ��ltimo homem sobre a terra. E ele
continuou:
��� Olhe, Regina, fiz uma inspe����o na turma e n��o
encontrei uma garota t��o inteligente ou linda como vo-
c��, e assim decidi procur��-la e a encontro no meio de
um monte de homens. Que diabo, voc�� faz quest��o que
todos saibam que �� uma garota f��cil? T��o f��cil que
est�� a��, nua, na minha frente. Eu s�� tive um trabalho,
o de lhe tirar a roupa. E olhe que voc�� gosta muito
desse neg��cio, pois seus pais n��o est��o aqui para se-
rem magoados. Mas eu n��o a quero. Garotas assim me
repugnam. Agora vista-se, que a levarei para casa.
��� 118 ���
Fiz um tremendo esfor��o e consegui sentar na ca-
ma. Olhando-o friamente, falei, com a lingua meio en-
rolada:
��� Ora, puritano metido a intelectual. Eu ia me
levantar mesmo, assim que vi que era voc��. Pois j�� dis-
se que n��o terei nada com voc��, nem que seja o ��lti-
mo homem sobre a terra.
��� Se voc�� n��o estivesse embriagada eu ia lhe mos-
trar a facilidade com que qualquer homem poderia
possu��-la. Agora vista-se. Vamos embora.
��� Ir embora? Voc�� est�� maluco. Ainda h�� tanta
bebida.
��� Bem, eu estou pronto para ir.
��� Ent��o v��. Eu vou descer daqui e vou beber ���
respondi, descendo da cama. Mas as pernas n��o me
aguentaram e ca�� no ch��o.
Raul, sol��cito, veio em meu socorro. Ajudou-me a
me vestir e, apoiada nele, desci para o sal��o. A turma
estava quase baqueada. Alguns casais ainda se encon-
travam de p�� e faziam um esfor��o sobre-humano para
n��o cair. Desprendi-me dos bra��os de Raul e, tran��an-
do as pernas, disse:
��� Vou beber. Quero beber.
Raul apanhou-me e, pondo-me dentro de seu car-
ro, levou-me para um restaurante. Chamou o gar��om
e mandou servir o jantar, n��o antes de me cobrir com
seu palet��.
��� Temos pouca coisa, meu senhor, pois j�� est��
quase na hora de fechar.
��� Cristo! Cinco horas! Como as horas passam!
Bem, sirva-nos o que tiver.
��� Frango alho e ��leo e arroz.
��� 119 ���
��� Est�� bem.
Quando o gar��om afastou-se, Raul olhou para as
mesas vazias, cobertas com toalhas de xadrez e per-
guntou-me :
��� Voc�� j�� veio aqui?
��� N��o. Costumo frequentar restaurantes mais ca-
ros. Mas gostei de conhecer esse, pois �� um local que
tem um ar muito calmo e puritano.
��� ��, de fato! ��� exclamou Raul ��� Aqui n��o ��
um lugar adequado para a juventude barulhenta que
toma aquelas tremendas bebedeiras e se agarram fa-
zendo "tudo" em qualquer lugar.
��� Esse "tudo" �� amor?
��� Claro. Voc�� n��o viu como aquela turma faz
amor? Voc�� n��o viu que estavam deitados em todos os
lugares da festa, at�� mesmo no jardim? Francamen-
te, n��o sei como elas se arranjam com a gravidez.
��� Tomam p��lulas anticoncepcionais.
��� Voc�� toma?
��� Tomo.
��� Sem receita m��dica?
��� A gente sempre d�� um jeito com o farmac��u-
tico.
��� Mas voc�� n��o pode tomar as p��lulas.
��� Por que?
��� Por que s�� tem quinze anos
��� Mas existe idade estipulada?
��� Aqui no Brasil n��o sei, mas em outros pa��ses,
principalmente na ��ustria, a idade m��nima �� de dezes-
seis anos.
��� 120 ���
��� Por que essa discrimina����o?
��� Segundo um grande genicologista austr��aco, o
ov��rio e o ��tero precisam de muitos anos para atingir
o seu total desenvolvimento. A p��lula corta esse pro-
cesso natural e provoca a atrofia desses ��rg��os. Al��m
disso, �� prejudicial ao crescimento do esqueleto.
��� Fant��stico! Ent��o estou na hora de tomar mui-
tas p��lulas, pois todos dizem que sou muito alta para
quinze anos. E como �� que a p��lula age sobre o esque-
leto para impedi-lo de crescer?
��� Sob a influ��ncia dos horm��nios adicionalmen-
te ministrados. Acelera-se a calcifica����o das juntas ��s-
seas e interrompe-se, prematuramente, o crescimento da
mocinha.
��� Puxa. Quem lhe disse tudo isso?
��� L�� num livro sobre ginecologia moderna.
��� �� . . . L e g a l . . . Mas creio que a turma prefere
atrofia do que soltar filhos por a��, ou praticar aborto.
��� O melhor mesmo seria voc�� aconselhar as me-
ninas da turma a voltar para casa. Aqueles rapazes da
turma n��o s��o companhia que preste para qualquer mo-
cinha. Voc�� viu o que fizeram com voc�� hoje? N��o im-
porta para eles quem seja a menina, filha de milion��-
rios onde pobres...
��� Ms, na turma, n��o existe filho de pobre. L�� h��
mais pobres do que eu. E depois os rapazes da turma
n��o t��m culpa pois a mo��a que vai l��, vai por que quer
ir.
��� Ora, acabe com essa hist��ria de defend��-los ���
disse Raul, chateado. ��� Tamb��m acho que quem vai
l��, vai por que quer, mas voc�� sabe perfeitamente ao
que estou me referindo.
��� 121 ���
��� Que todos queriam fazer amor comigo? Mas voc��
estava fazendo p a r t e . . .
��� �� uma pena que voc�� esteja meio tonta ainda.
Faz tudo para n��o me compreender.
��� Para falar mesmo a verdade, quem est�� desorien-
tado �� voc��, pois demonstrou que tem a mesma repu-
ta����o da turma.
��� Preferia que voc�� deixasse de me incluir nessa
turma. Fazia mais de anos que eu n��o via o pessoal. J��
disse que voltei para dar uma espiada.
O gar��om aproximou-se e serviu o jantar. Raul pe-
diu dois martinis.
��� �� pra voc�� n��o misturar as bebidas.
��� Muito gentil.
A�� fiquei reparando que Raul era bem diferente dos
homens que at�� agora conhecera. Impunha respeito e
autoridade. Por isso sabia que devia ficar profundamen-
te entediado com a conversinha do pessoal que estava
naquela festa.
��� Sabe, Regina, eu desejo pedir desculpas por t��-la
aborrecido nessa festa. Sinceramente, estava deslocado,
provavelmente por que sinto pena de ver tantos jovens
se perderem assim. E n��o me acostumo mais com esse
tipo de gente.
Isso me deixou calma e feliz. Ent��o ele se lembrava
de que tinha me magoado. Era legal ter algu��m que
se preocupava com o bem-estar da gente.
��� Ora, n��o ligue para isso. Creio que agi como uma
crian��a. Mas o que voc�� fez, j�� n��o tem import��ncia
pois voc�� se desculpou. Agora, a ��nica coisa que est��
me preocupando s��o as minhas amigas. Fico pensando
onde elas est��o.
��� 122 ���
Ele suspirou.
��� Devem ter voltado para o seu apartamento, ou
dormiram no apartamento de algum rapaz.
��� ��, acho que ficaram com Jos��. Puxa, n��o devia
ter saido sem falar com elas.
��� E encontr��-las onde, naquela bagun��a?
��� De fato, voc�� tem raz��o. Bem, eu quero ir para
casa.
��� Sabe, gostaria de encontrar-me com voc�� ou-
tras vezes. Qual �� o n��mero do seu telefone?
Olhei para ele com os olhos arregalados.
��� Apenas jantar e conversar, se voc�� quiser.
Sorri e dei-lhe o n��mero.
* * *
Quando cheguei em casa, dei uma olhada no quarto
das meninas. Vi dois biquinis jogados no ch��o e as ca-
mas vazias. Voltei para a sala-de-estar onde encontrei
os olhos de mam��e pousados em mim.
��� De biquini a essa hora da manh��? N��o �� poss��-
vel, Regina! Voc�� est�� determinada a perturbar com-
pletamente a minha vida. Voc�� passou um dia e uma
noite fora de casa. Quero saber onde esteve.
��� Estive em uma festa, mam��e, com Ivete e Ar-
lete.
��� Oh, Regina, desde quando voc�� aprendeu a men-
��� 123 ���
tir? Ivete e Arlete estiveram aqui ha minutos, vestiram-
se e foram encontrar os namorados. Disseram que n��o
a viram desde que entraram no sal��o.
��� Pois ��, mam��e. A�� est��. Eu fiquei longe delas.
Foi s��.
��� N��o quero que voc�� viva assim. Como uma per-
dida.
��� J�� disse que serei uma santa se v o c �� . . .
��� N��o continue. Voc�� tem que parar de ir a essas
festas intermin��veis. Voc�� deve se portar como uma me-
nina de fam��lia.
Sorri e disse, ir��nica:
��� Para se portar como menina de fam��lia �� pre-
ciso ter a fam��lia.
��� Mas eu sou a sua fam��lia. E j�� estou ficando
doente com tudo o que voc�� tem feito desde que saiu
do col��gio.
��� A senhora n��o sabe nem a metade do que ando
fazendo. Prometi a papai atol��-lo na lama. Seu nome
ser�� escrito a lodo se ele n��o me dar o lar que tanto
desejo.
��� Voc�� j�� tem um lar. Esse aqui. N��o venha com
justificativas para as suas sem-vergonhices.
��� Que lar, mam��e ? Voc�� vive de l�� para c�� nas te-
levis��es e papai naquela cl��nica em S��o Paulo. Que dia-
bo de lar �� esse? Lar que eu conhe��o �� pai e m��e juntos
para amar os filhos. Para voc�� e papai eu n��o signi-
fico mais nada. Sou s�� carne e osso que precisa comer e
��� 124 ���
vestir. E o carinho, o amor, a ternura, a compreens��o,
o respeito, a alegria, o sorriso, a felicidade, que emanam
de um lar, onde est��o? Lares como esse andam a�� aos
ponta-p��s.
Mam��e sorriu amarga e disse:
��� Infelizmente, �� isso aqui que voc�� tem que reco-
nhecer como lar e �� aqui que voc�� tem que se formar
dignamente para poder formar o seu lar, que espero ser
sadio e feliz.
��� Sem voc�� e papai reunidos, nunca poderei pensar
em formar o meu lar.
Mam��e esmagou o cigarro ainda inteirinho e, vol-
tando-se, foi para o seu quarto dizendo:
��� Jamais voltarei para junto de seu pai.
Olhei desanimada para as costas da mam��e e pen-
sei:
��� O lar que eu esperava deu mais um passo para
tr��s.
Fui para o quarto das meninas e logo peguei no
sono, acordando, horas mais tarde, com Arlete gritando;
��� Regina! Ei, Regina! acorde! Temos uma ��tima
bebida!
��� Que horas s��o?
��� Dezesseis.
��� Puxa, estou dormindo desde as oito horas.
��� N��s n��o dormimos at�� agora. Divertimo-nos a
valer no apartamento de um jovem que conhecemos on-
tem. Olhe, voc�� nem faz id��ia de como �� o apartamento.
Tem piscina dando de frente para o mar.
��� Ora, Arlete, existem milhares de apartamentos
assim, aqui na Guanabara, com piscina e tudo.
��� 125 ���
��� Mas isso n��o importa. Eu quero lhe contar dos
homens que fizeram aquilo com a gente.
��� Homens???
��� Homens. Claro! No plural.
Sentei-me r��pida na cama.
��� Fale baixo. Mam��e pode escutar.
��� Escutar o que? ��� perguntou Ivete, entrando no
quarto e j�� tirando o vestido de baile e jogando-o sobre
a cama.
��� Que tivemos v��rios homens hoje?
��� Regina n��o acredita ? ��� Ivete afastou com a m��o
as cortinas da janela, na tentativa de fazer passar um
pouco de ar, pois o calor da tarde estava insuport��vel.
��� N��o acredito mesmo.
��� Pois �� verdade. Arlete com quatro e eu com qua-
tro.
��� E todos fizeram?
��� Mas a troco do que voc��s fizeram isso?
��� �� bacana. A gente se divertiu �� bessa ��� disse
Ivete, sentando-se na cama. ��� Homem foi feito para
satisfazer o sexo oposto, e a�� est�� a moral da quest��o.
��� Voc��s s��o infernais, uma juventude que sabe pe-
car, heim, meninas?
��� Ora, Regina, os jovens tamb��m pecam, ou voc��
acha que s��o s�� os maiores de dezoito anos que frequen-
tam bacanais?
Espreguicei-me e, deitando-me com as m��os cruza-
das sobre a cabe��a, fiquei ouvindo-as contarem o que
��� 126 ���
haviam feito com os oito homens. �� simplesmente ine-
narr��vel. Arlete foi buscar copos e, servindo-se de co-
nhaque, falou:
��� Olhe, vamos dormir um pouco, pois temos en-
contros com tr��s deles para jantarmos no Canec��o.
��� T�� bem, ent��o vamos dormir, sen��o vou perder
o meu auto-controle ou me desintegrar ��� disse Ive-
te, deitando-se nua como sempre fazia.
Em seguida, as duas dormiram como anjinhos.
��� 127 ���
XI
O sem-vergonha.
As vinte horas, olhamos da janela os homens chega-
rem. As meninas tinham acordado naquela hora e ainda
n��o estavam prontas, por isso eu, que j�� estava num ves-
tido de baile, fui escolhida para descer e avis��-los, mas
n��o antes de pedir para as meninas que n��o fizessem
muito barulho, pois mam��e estava mesmo danada. Na
hora que ia saindo, a empregada avisou-me que mam��e
sair�� para jantar fora. Parei de andar e olhei para a
empregada, com raiva.
��� Ent��o mam��e saiu. Hoje pela manh�� ela me deu
a impress��o de se importar com a vida que eu vinha le-
vando. E agora sai assim, sem dizer nada, sem aos menos
me avisar.
��� Bem, dona Regina. N��o adianta a senhora ficar
com essa raiva. Eu n��o tenho culpa.
��� Olhe aqui, Maria. Des��a e avise aqueles homens
l�� do Impala vermelho que podem subir. Mam��e vai me
pagar.
Quando fiquei s��, senti uma vontade louca de chorar,
pois o incidente da manh�� fora para mam��e uma quest��o
sem import��ncia. Acho mesmo, que era tudo fingimento.
��� 1 2 9 ���
��� Al��, menina! ��� os homens me cumprimenta-
ram com anima����o. ��� Como v��o as coisas? A empre-
gada disse que v��o mal.
��� O que quer dizer com isso, heim, Maria?
A empregada baixou a cabe��a e n��o respondeu.
Os homens tomaram posse da sala, estabeleceram-se
nas poltronas e, colocando os p��s sobre a mesinha, pedi-
ram algo para beber. Estendi-me sobre o sof�� e mandei
a empregada servir uisque. Embora n��o estivesse com
vontade de beber, acompanhei os homens na primeira
rodada, pensando que, de qualquer forma, mam��e have-
ria de saber que os homens estiveram no nosso aparta-
mento.
Eles eram, realmente, uns tipos que n��o agradariam
aos meus pais ou aos pais de minhas amigas. Eram do
tipo cafageste, mal encarados e mal vestidos, com sapa-
tos empoeirados e sem meias. Um deles perguntou:
��� E as outras duas, onde est��o?
��� No quarto, se vestindo.
��� Posso ir at�� l��?
��� Bem ��� respondi atrapalhada ��� acho que
elas n��o iriam gostar.
��� Como n��o iriam gostar? Estivemos com elas a
manh�� toda. Eu e mais uns amigos.
��� Elas me contaram.
��� Ent��o posso ir?
Ele se levantou e dirigiu-se para a porta do quarto.
Quando a porta se abriu, Ivete e Arlete apareceram nos
vestidos longos.
��� Puxa, voc��s demoraram, meninas! Eu j�� ia en-
trar para ajud��-las, pois estava realmente imposs��vel a
espera.
��� 130 ���
��� Que diabo est�� dizendo esse homem? A gente n��o
demorou nem cinco minutos.
Chamei Ivete e Arlete para a cozinha.
��� Olhe, gente, Deus sabe que n��o sou ningu��m
para andar pregando moral, mas n��s agir��amos como
idiotas se f��ssemos sair com esses sujeitos abertamente.
Voc��s terem dormido com eles, j�� foi um grande erro. O
que voc��s fizeram �� uma coisa bem diferente do que
manter rela����es com um algu��m. Voc��s sabem que pro-
meti fazer tudo para magoar meus pais.
Prosseguirei, jogando-os cada vez mais na lama, mas
n��o com tipos como esses.
��� E onde est�� a diferen��a desses homens e os ho-
mens com quem dormimos sempre? ��� quis saber Ivete.
��� Olhe, eu acho que voc�� estava b��bada quando
fez o que fez com quatro desses sujeitos. E agora est��
mais b��bada ainda, para fazer essa pergunta.
��� Ent��o por que voc�� os convidou a subir?
��� Por que n��o tinha visto a cara deles.
��� Olhe, Regina, eles s��o homens iguais aos outros.
N��o adianta voc�� vir com serm��o.
��� N��o, Arlete. Nunca em minha vida pensei em
passar serm��o em algu��m. Mas tenho direito de defen-
der a mim e �� minha casa.
��� Penso que voc�� est�� assustada a toa, querida
eles s��o boas pessoas.
��� Isso significa que voc��s v��o sair com eles?
��� Claro.
��� Eu n��o irei. N��o sou obrigada a moldar minha
vida na vida de voc��s.
��� 131 ���
��� Nessa altura as horas passam e a gente n��o vai
se divertir nem um pouquinho ��� choramingou Arlete.
��� At�� arranjar novas companhias,..
��� �� s�� telefonar ��� respondi.
��� Bem, ent��o telefone para algu��m diferente. N��o
para os que j�� conhecemos.
��� Vou telefonar para Jos��. Ele poderia nos levar
para jantar.
��� Jos��! Jos��! ��� disse Arlete. ��� J�� estou enjoada
de ver sempre as mesmas caras. Voc�� n��o vai querer
ficar saindo com essa turma durante anos. Sinceramen-
te, s�� por que esses homens s��o um pouquinho menos
alinhados que os nossos outros amantes voc�� faz um tre-
mendo carnaval.
Nisso um dos homens entrou na cozinha e disse,
meio embriagado, com uma express��o no rosto que n��o se
sabia ser de raiva ou n��o.
��� Voc��s est��o nos fazendo de palha��os? V��m ou
n��o v��m nos fazer companhia?
��� J�� vamos ��� respondi friamente.
��� Vai ser divertido como o diabo a gente passar a
noite aqui neste apartamento. Voc��s sabem, fiz planos a
tarde toda sobre a garota que seria a minha parceira
hoje. Mas nunca pensei que seria uma coisa assim.
Ele ia falando e andando para o meu lado, com as
m��os estendidas, querendo agarrar-me.
��� Olhe, o melhor �� o senhor ficar onde est��.
��� N��o, minha boneca, eu a desejo tremendamente
e quero que voc�� se porte como as suas amiguinhas se
portaram hoje de manh��. Elas deram sem a gente in-
sistir.
��� Sua m��e n��o deve demorar muito, n��o ��, Regi-
na ? ��� disse a empregada, vendo a express��o infernal no
rosto do sujeito.
��� 1 3 2 ���
O homem virou-se para Maria e disse, abrindo-se
num sorriso c��nico:
��� Meu anjo, a m��e dela deve ser uma igual a essas
duas a��. Sen��o, n��o deixaria uma beleza dessas em casa,
sozinha. Ela, pela amostra, n��o deve ser l�� muito de-
cente. Por isso, se ela aparecer, a gente d�� um jeito nela
tamb��m.
Felizmente, outro homem entrou sorridente e, pe-
dindo um u��sque duplo, sem gelo, disse:
��� �� melhor a gente ir para o Canec��o, sen��o fica
muito tarde e n��o acharemos mais lugares.
��� Eu n��o vou sair daqui ��� disse o primeiro ho-
mem. ��� Vou d o r m i r com a minha companheira. ��� e
olhando para mim, com olhos meios mortos, continuou:
��� Olhe aqui meu bem, que tal fazermos amor a noite
toda?
O segundo homem riu.
��� Pare de fazer proposta �� garota. N��o v�� que
elas est��o assustadas?
��� V�� para o diabo que o carregue! Se meta com a
sua garota, aquela putinha ali! Essa aqui �� minha! Foi
o que combinamos, n��o foi?
Enquanto os homens discutiam, pedi �� empregada
para ligar a mam��e pedindo que ela viesse para casa ur-
gente. A empregada desapareceu no quarto de mam��e.
Quando a discuss��o estava no auge, entrou o terceiro
homem e, conciliador, perguntou aos companheiros se
queriam mais um gole.
A�� tomaram conta da cozinha tamb��m. Abriram a
geladeira e retiraram tudo o que havia para comer. O
que n��o apreciavam, atiravam para cima a pia, ou da
mesa. Bebiam todas as bebidas que encontravam, mis-
turando tudo.
��� 1 3 3 ���
A empregada voltou dizendo que mam��e n��o po-
dia atender o telefone, porque, assim que terminou o
jantar, entrara para os est��dios de grava����o.
��� Ent��o ligue para S��o Paulo, para o Hospital das
Cl��nicas. Chame o meu pai e diga para ele tomar um
avi��o e vir urgente.
��� Mas, dona Regina, daqui a pouco eles v��o em-
bora ou levam as senhoritas pra boate.
Permaneci em sil��ncio, olhando os copos em que o
homem bebia. Depois, ele veio at�� onde eu estava e ofere-
ceu-me um copo cheio de uisque. Apanhei o copo en-
quanto ele se voltava para encher o seu e a�� fiquei pen-
sando que n��o devia ter permitido ��queles homens en-
trarem no apartamento, sem os conhecer. Estava mui-
to amedrontada, mas n��o podia permitir que os homens
ou as meninas o percebessem. Agora, com aqueles tr��s
b��bados trancados com a gente, comecei a sentir que a
minha vingan��a era muito perigosa. Sentia que devia
manter uma determinada posi����o. Devia desprezar-me
por sentir medo. Se papai soubesse como me sentia crian-
��a naquela hora, ele n��o poderia resistir e me daria o
lar que eu vinha sonhando h�� muito tempo.
Um dos homens varou os quartos a procura do ba-
nheiro onde trancou-se e come��ou a vomitar em estron-
dos. Eu mesma resolvi telefonar para papai. Para isso,
corri ao quarto, mas assim que entrei, o primeiro homem
entrou comigo e trancou a porta. Olhei para ele e pa-
ra a porta, fazendo um esfor��o enorme para me manter
tranquila, pensando que tudo aquilo que estava aconte-
cendo fazia parte do mundo que eu escolhera. O meu
mundo era aquele. O mundo que eu desejava a fim de
encontrar tudo que eu sonhava: um lar. O homem vi-
nha devagar, se aproximando, enquanto eu me afastava
com os olhos fixos nele, naqueles olhos morteiros, em-
bassados pela bebida. Ouvi-o dizer:
��� 134 ���
��� Amo voc��, boneca. Voc��, com esse corpo, me dei-
xa louco. Voc�� �� um desafio a qualquer homem, seja ele
de que classe ou ra��a for. Eu a quero, eu a desejo.
Pousou sua m��o sobre meu ombro e senti seu h��lito
fedorento e quente bem perto do meu rosto. Puxou-me
com brutalidade e, abra��ando-me, tentava me beijar. Fiz
um esfor��o enorme, me retorci toda para sair daqueles
bra��os gigantescos, fazendo com que os enfeites do ves-
tido de baile ca��ssem pelo ch��o. Os cabelos se soltaram
da fivela e me cairam no rosto, dificultando a minha de-
fesa.
��� Jesus... ��� pensei. ��� O medo est�� crescendo l��
dentro. Estou deveras amedrontada. Que emo����o estra-
nha �� o medo... Nunca antes o havia sentido...
Desesperadamente, tentei reassumir o auto-contro-
le, empurrando o enorme t��rax do homem.
��� Vamos, meu bem ��� continuou ele, com aquele
bafo quente na minha cara. ��� Eu a esperei o dia todo..
N��o adianta fazer for��a, pois voc�� est�� �� minha merc��,
Ceda ou se arrepender��.
��� Quem vai se arrepender �� o senhor se n��o me sol-
tar j�� e j��!
��� S�� depois de t��-la inteirinha. Vamos, n��o me
aborre��a com esse fricote. Eu sei que voc�� n��o presta,
que �� uma vagabunda igual as suas amigas.
Ele come��ou a passar a m��o pelo meu corpo, com ar
de propriet��rio.
��� Eu a estou excitando o suficiente para que voc��
caia correndo na cama e me chame depressinha.
Cuspiu no ch��o do quarto e afroxou um pouco os
bra��os. Foi a�� que eu aproveitei para desvencilhar-me e,
abrindo a porta, rapidamente, corri atravessando a sala
de estar, abr�� a porta que dava para o hall e desci cor-
��� 135 ���
rendo as escadarias, de dois em dois degraus. Falei com
o zelador.
��� Olha, dona Regina, eu n��o posso largar a por-
taria sozinha. �� melhor a senhora chamar a pol��cia.
Primeiro telefonei para papai e expliquei a situa����o.
Ele suspirou fundo.
��� Est�� bem, Regina. N��o chame a pol��cia. Daqui
h�� uma hora estarei a��.
��� Uma hora??? At�� l�� eles j�� nos assassinaram. ��
melhor eu chamar a pol��cia.
��� N��o chame. N��o quero passar pelo que passei a
outra vez. Chame algum dos amigos de sua m��e.
E desligou. Mas eu estava determinada a continuar
com a minha vingan��a. Por isso chamei a pol��cia, que
levou os tr��s homens e, em um outro carro, n��s que fo-
mos encaminhadas ao juizado de menores onde minu-
tos depois papai apareceu.
O juiz lhe passou um daqueles serm��es, sem ao me-
nos respeitar o famoso cirurgi��o que parecia fulo de rai-
va quando se aproximou de mim, falando bem alto.
��� Ca�� em outra, heim Regina? Da pr��xima vez
juro por tudo que h�� de mais sagrado que n��o gastarei
um n��quel para v��-la solta. De outra vez pe��o ao juiz
de menores para a deixar internada. Ele tomar�� conta
de voc�� muito melhor do que a sua m��e.
��� Voc�� falou com os homens para ver a cara de-
les, papai- Talvez assim sinta o que foi que passei, aper-
tada nos bra��os de um deles.
��� Estou entusiasmad��ssimo por ouv��-la falar em
homens.
Nisso entrou um monte de rep��rteres e os fot��gra-
fos estouraram as suas l��mpadas na nossa dire����o.
Um dos rep��rteres quis entrevistar papai, mas ele, dan-
��� 136 ���
do-lhes as costas, foi para o seu carro, me chamando aos
gritos. De qualquer forma, papai nos deixou na porta
de casa, dizendo que ia dormir na Guanabara e que no
dia seguinte me ligaria.
Logo pela manh��, fui acordada por mam��e, pois pa-
pai me chamava ao telefone. Ele estava col��rico, pois
Ivete, Arlete e eu enfeit��vamos as p��ginas dos jornais
matutinos com manchetes deselegantes, dizendo de
quem era a filha.
��� N��o me fa��a mais uma dessas, pois sen��o cor-
to-lhe a mesada. Juro!
O ruido do telefone desligando e a voz de mam��e:
��� Quem era?
��� Papai.
��� O que queria, ligando t��o cedo?
��� Ele est�� na Guanabara.
��� ��timo. Preciso urgente de um vestido, de um par
de sapatos e bolsa. Terei que me apresentar bem chic.
N��o �� maravilhoso, Regina, ter seu pai t��o perto quando
se precisa de dinheiro?
��� Ele vai cortar a minha mesada.
Mam��e levantou-se e, com os olhos desmesurada-
mente abertos, falou gaguejando:
��� Mas, por que?
Fui at�� a porta do apartamento apanhar o jornal e,
logo na primeira p��gina, vi nossas caras. Entreguei-o a
mam��e que o leu e ficou balan��ando a cabe��a estupifi-
cada.
��� Aqui, dentro da sua casa??? N��o �� poss��vel, Re-
gina!
��� 137 ���
��� Mas, mam��e, eu n��o s a b i a . . .
��� N��o venha com desculpas. Voc�� n��o tem o di-
reito de me fazer perder o pouco que seu pai nos d��.
Voc�� �� infernal... Oh, meu Deus, imagine se ele nos
cortar a mesada. ��� Apertou a cabe��a entre as m��os. ���
Oh, como sofrem os pais. Voc�� quer destruir-nos. Todos
voc��s; essa juventude moderna, quer acabar com a
gente. Sei que nunca admitir��o que est��o erradas. Ago-
ra, deixe-me s��. V�� para o seu quarto.
Sa��, fechando a porta, e fui para o quarto das me-
ninas. Acordei-as. Abriram os olhos se espregui��ando.
��� Que horas s��o?
��� Dez.
��� Puxa, e voc�� vem acordar a gente a essa hora!
Fomos dormir de madrugada.
��� Voc��s devem dar gra��as ao papai por estarem
aqui, deitadinhas como dois anjinhos. Se fosse pelo se-
nhor juiz de menores voc��s estariam ainda em cana at��
agora. Agora escutem o que eu vou ler para voc��s. Pri-
meiro olhem essa fotografia, bem na primeira p��gina.
Arlete arrancou-me o jornal das m��os e gritou:
��� Olhe, Ivete, como saimos legais. At�� parecemos
artistas de Hollywood, mas daquelas artistas mais ba-
canas que moram em Beverly Hills.
Ivete debru��ou-se bocejando e batendo a m��o na bo-
ca, olhou o jornal.
��� �� muito bacana mesmo, mas o diabo �� se papai
ver. Ele vai ficar fulo de raiva.
Apanhei o jornal das m��os de Arlete e l�� alto.
��� Regina Albuquerque, Arlete Sampaio de Souza e
Ivete Cerqueira, jovens da alta sociedade, residentes na
Avenida Atl��ntica, 241, apartamento 93, ontem �� noite
��� 138 ���
foram submetidas aos maiores vexames por tr��s h o -
mens desclassificados que a jovem Regina Albuquerque
introduziu no apartamento. Foi imposs��vel entrevistar
seu pai, o famoso cirurgi��o Alberto de Albuquerque, que
veio de S��o Paulo prestar depoimento ao juiz de menores,
que classificou o caso de "juventude perdida".
Ivete e Arlete riram at�� as l��grimas.
��� Olhe, gente, n��o riam assim t��o alto que mam��e,
depois que leu a not��cia, ficou uma fera. Agora est�� mui-
to perturbada e n��o quer que a incomodem! Por isso ��
bom a gente levantar e ir para a praia.
��� Primeiro vamos beber alguma coisa ��� sugeriu
Arlete.
��� Ora, �� muito cedo. O melhor �� a gente comer
ovos fritos e beber leite.
��� Bahhhhh... L�� vem voc�� com leite. Ali��s, teve
uma boa id��ia. Traga leite com conhaque ��� retrucou
Arlete, acendendo um cigarro.
��� Para mim, martini doce, querida. Traga a gar-
rafa, sim?
��� T�� bem, deixe eu preparar a bebida, pois fa��o
um martini excelente e voc��s sabem disso. Para mim
ser�� u��sque.
Bebemos, fumamos e depois fomos �� praia do Ar-
poador. Mas, logo depois do primeiro banho, Ivete disse:
��� �� verdade, Regina, a gente n��o tem escolhido
muito bem as companhias.
��� Claro. Voc�� viu em que atrapalhada nos mete-
mos ontem �� noite?
��� Foi bom para a sua vingan��a.
��� Ah, l�� isso oi. Papai ficou possesso e mam��e,
ent��o, nem se fala. Mas, no fundo, eu fiquei com pena
��� 139 ���
dos dois, pois aqueles homens n��o s��o companhias para
jovens como n��s.
Sentamos na areia e Ivete ficou matutando com
quem poder��amos sair �� tarde. De repente, ela deu um
pulo.
��� Ah, j�� me lembrei. Cada uma deve telefonar pa-
ra o rapaz que mais lhe agradar todos esses dias.
��� Ent��o vamos para casa almo��ar e a�� faremos o
programa para a tarde ou a noite.
Seguimos para o apartamento, debaixo de in��meros
convites e estridentes assobios.
Tocamos a campainha. Uma chave girou a fecha-
dura e Maria abriu a porta.
��� Cad�� a mam��e?
��� Ela saiu, dona Regina. Foi gravar.
��� T�� bom. Olhe, sirva o almo��o. O que se tem para
comer?
��� Ainda n��o comecei o almo��o.
��� Diabo, a gente tem que sair e voc�� vem com essa
molengada toda. Fa��a a�� uns bifes e batatas.
O telefone tocou e eu fui atender.
��� B voc��, Regina?
��� Sim.
��� Falando Raul.
��� Ah, n��o! Que surpresa! Estava pensando em vo-
c�� agorinha mesmo.
��� Mentirosa.
��� Juro!
��� 140 ���
��� Voc�� tem compromisso para a noite?
��� N��o.
��� Ent��o jantaremos l�� no Recreio dos Bandeiran-
tes.
��� Maravilhoso! Olhe, passe para me apanhar l��
pelas vinte horas.
��� Est�� bem. E, obrigado por ter aceito o meu con-
vite.
��� Puxa, que comodidade, heim, Regina? Nem pre-
cisou procurar o seu homem por telefone.
��� Voc�� j�� pensou com quem ir�� jantar?
��� J��. Espere, vou telefonar.
Depois que Carlos aceitou o convite de Ivete foi a
vez de Arlete, que ligou para o Ivan.
��� Pronto, todas temos compromisso para a noite.
E a tarde, vamos ficar chupando o dedo?
��� Foi o que pensei. Bom, o negocio �� a gente ir
at�� o apartamento do Jos��. L�� est�� sempre cheio de
gente alegre.
Como fic��ssemos indiferentes, disse, ir��nica:
��� Voc�� se lembra dele, n��o ��, Arlete?
��� Creio que n��o.
��� Esquisito. Foi ele o primeiro homem em sua
vida.
��� Sinceramente, depois de passar por tantos, j�� me
havia esquecido.
��� Bem crian��as ��� gritou a empregada. ��� o al-
mo��o est�� servido.
��� Traga bebidas.
��� 1 4 1 ���
��� Uisque! ��� gritou Arlete.
��� Dois! ��� disse Ivete.
��� Tr��s! ��� falei.
E, rindo, nos afundamos nas poltronas e ficamos
bebendo e fumando.
��� Mas, e o almo��o? ��� choramingou a empregada.
��� Deixe pra l��. Vamos almo��ar na casa de um
amigo.
Apanhei o carro de mam��e e, alegres, nos dirigimos
para o apartamento de Jos��. Assim que rodei alguns
metros, ouvi um apito.
��� �� a pol��cia, Regina! ��� exclamou nervosa Ar-
lete.
��� P�� na taboa! ��� gritou Ivete.
��� N��o, Regina. Pare! Voc�� �� menor. Vai dar um
galho dos diabos.
��� Deixe dar.
Ivete me incentivava a correr. Mas, num farol ver-
melho, tive que parar.
Na pol��cia, fomos obrigadas a esperar horas at�� que
mam��e conseguisse ser avisada e ela entrou na delega-
cia com as m��os na cabe��a, gritando:
��� Voc�� est�� determinada a me deixar louca? N��o
sabe que �� menor e n��o pode dirigir? Sabe ou n��o
sabe ?
��� Sei.
��� Ent��o por que pegou o carro?
��� Ora mam��e pra que haveria de pegar o carro?
��� 142 ���
��� Vou avisar seu pai. Voc�� qualquer hora atro-
pela algu��m.
��� Voc�� perde a mesada, mam��e.
��� Posso perder, mas juro que n��o vou me respon-
sabilizar por voc�� perante a lei.
��� Ent��o �� preciso chamar o papai. �� melhor voc��
resolver logo, pois estamos cansadas. J�� faz quatro ho-
ras que estamos esperando aqui, sentadas e temos com-
promisso para jantar fora.
��� N��o chamarei o seu pai. E voc�� n��o sair�� mais
de casa.
��� Oh, mam��e, n��o diga bobagem perto das mi-
nhas amigas. Afinal, o que h�� de mais em guiar um car-
ro? Por que essa pol��cia quadrada fez todo esse esc��n-
dalo?
��� Nem vou discutir a quest��o. O delegado que a
mande para o abrigo de menores. Juro que eu mesma
assinarei a peti����o para voc�� ficar no abrigo.
��� E voc�� perde o apartamento, o mobili��rio, o car-
ro, as roupas finas, as j��ias, etc.
Mam��e ficou andando de l�� para c��, falando alto.
��� N��o quero v��-la mais em delegacia. N��o faz nem
um m��s que voc�� saiu do col��gio e essa �� a terceira vez
que �� detida. Sei que posso pedir a minha filha um pou-
co de considera����o pois sei que ela �� capaz disso. Ainda
h�� alternativa. Voc�� promete que pedir�� ��s suas amigas
para irem embora e eu assinarei a responsabilidade.
��� N��o, nunca! S�� se voc�� prometer voltar para
p a p a i . . .
��� Nem vou discutir a quest��o.
��� Ent��o, em que ficamos? ��� perguntou o dele-
gado.
��� 143 ���
Mam��e manteve-se silenciosa. Eu, ent��o, sugeri ao
delegado que chamasse papai.
��� N��o! ��� disse mam��e, derrepente. ��� Eu assino.
Assinou o termo de responsabilidade e, aliviada, dei
o bra��o ��s amigas e saimos da delegacia.
Bem, ��� disse mam��e quando entramos no carro.
��� gra��as a Deus, dessa vez, tudo terminou bem. Mas na
pr��xima deixarei o juiz de menores resolver.
��� T�� bem, mam��e. Agora, por favor, deixe-nos na
porta daquele edif��cio ali. Iremos passar a tarde com
umas amigas.
Quando mam��e desapareceu ao longe, Arlete gri-
tou:
��� Puxa, em que fria ��amos nos metendo! Agora que
deixamos aquela chata pol��cia, vamos celebrar bebendo
qualquer coisa.
��� Beber? Onde?
��� Num b a r . . .
Sentamos nas cadeiras girat��rias de um barzinho
bem legal na Avenida Nossa Senhora de Copacabana.
��� Tr��s u��sques ��� pediu Arlete.
��� N��o vendemos bebidas alco��licas para menores.
��� Chi, outro quadrado! ��� falou Ivete.
��� Quadrado ou n��o, obedecemos a lei.
��� Ok, meninas, vamos tentar em outro bar.
Passamos uma meia hora visitando bares, mas to-
dos se negaram a nos servir.
��� O neg��cio �� a gente ir festejar no apartamento
de Jos��.
��� 1 4 4 ���
Subimos e encontramos o apartamento com alguns
rapazes.
Jos�� nos recebeu sorrindo.
��� Ei, menininhas, est��vamos mesmo precisando de
voc��s.
Os rapazes usavam cal��as "blue-jeans" acinturadas,
bem abaixo dos quadris, e camisas furadinhas.
��� Olhe, meninas, s��o os jovens do conjunto "Os Pra
Frente". Cantam no Canec��o.
Tomamos uns goles e depois almo��amos. Os meni-
nos do conjunto vieram com aquela xaropada toda de
escolher quem dormiria com uma de n��s. Mas, gra��as
ao Jos��, eles nos deixaram em paz e ficaram discutindo
a possibilidade de mam��e apresent��-los a algu��m in-
fluente da TV. Paulista.
��� Voc�� sabe, aqui na Guanabara n��o existe mais
caminho para n��s. Levamos um tombo e, quando al-
gu��m cai nesta cidade, a ��nica coisa a fazei �� sair e
fortificar-se em outra cidade. S��o Paulo �� a terra de er-
guer os caidos.
��� N��o sei se mam��e poder�� ajud��-lo.
��� Mas Jos�� me disse que nas tvs de S��o Paulo sua
m��e �� muito conhecida.
��� Eu falo com ela. Mas n��o sei se voc��s consegui-
r��o sair daqui.
��� Ora, por que n��o?
��� Bem, eu acho uma coisa gozada essa Guanaba-
ra. A gente passa algum tempo aqui e depois �� duro se
acostumar em outro lugar. Quanto mais a gente fica,
mais dif��cil de sair �� preciso um motivo muito forte
para partir.
��� E n��s temos. Estamos quebrados. Depois de
terminado o nosso contrato no Canec��o arrumamos so-
��� 145 ���
mente um programinha vagabundo para cantarmos no
r��dio. N��s preeisamos nos apresentar em S��o Paulo.
��� �� . . . ��� Respondi. ��� Tentarei ajud��-los. Falo
com mam��e ainda hoje, se poss��vel, pois ela est�� uma
fera.
Por que?
O guarda de tr��nsito nos pegou. E o earro era
de mam��e. Ela teve que assinar um termo de respon-
sabilidade e agora haver�� inqu��rito e mil e uma coisi-
nhas mais.
Um dos rapazes, olhou paia mim, Ivete e Arlete e
falou:
��� Sua m��e ou os pais dessas meninas t��m raz��o
de ficarem feras, pois essa liberdade excessiva que a ju-
ventude exige p��e em p��nico qualquer fam��lia.
��� Mas n��s temos que viver como a nossa ��poca re-
quer. N��o podemos viver o passado. Somos o futuro.
��� Futuro insatisfeito no corpo e na alma.
��� Insatisfeito por que? ��� reclamou Ivete, petu-
lante.
��� Por que voc��s, jovens, procuram nos entorpecen-
tes, na bebida, no sexo, o calor para viver.
��� Bem, l�� isso �� verdade ��� respondi. ��� N��o te-
mos o calor de um lar e �� por isso que procuramos, em
tudo o que voc�� disse, um modo de escapar da ang��stia
que nos oprime o cora����o, por sermos adolescentes sem
amor, adolescentes perdidas nessa grande cidade de ci-
mento armado, cheias de melancolia e afli����o, gritando,
em gritos mudos, afeto e carinho dos pais.
��� Mas voc��s podem se recuperar. Podem procurar
um outro meio de vida. O que voc��s andam fazendo n��o
�� o certo. Essa hist��ria de conflitos entre pais e filhos ��
��� 146 ���
universal e nem todos os filhos desse conflito se ati-
ram assim para o abismo. Existe a recupera����o.
��� A Guanabara n��o �� cidade para ningu��m tentar
urna recupera����o ��� disse Jos��.
��� N��o vejo por qu��. Ent��o S��o Paulo �� pior ainda
��� retrucou outro jovem.
��� Vamos mudar de assunto ��� a voz de Arlete
encheu a sala. ��� Ningu��m quer sair da bebida, do se-
xo e das bolinhas Olhe, Jos��, por favor, mande esse Mes-
sias a�� parar com esse serm��o. J�� falou o bastante esta
tarde. A gente fica at�� doente com tanta moraliza����o.
Parece at�� que somos deca��das.
��� Deca��das ou n��o, voc��s n��o devem estar se estra-
gando assim. Gosto muito da nossa juventude e detesto
ver como rolam envoltos em lama para o pecado.
��� Pecado??? O que �� isso? ��� Disse Ivete, caindo
na risada.
O rapaz ficou vermelhinho e disse ir��nico:
��� Voc�� j�� ouviu falar em Cristo?
��� Ah, aquele filho de Deus feito homem?
O rapaz continuou na mesma ironia.
��� Jesus Cristo teve que morrer crucificado, san-
grando por todos os lados para que seu Pai perdoasse os
pecados dos homens. Voc��s n��o devem viver em peca-
do e . . .
��� Mo��o, por favor, pare de falar. Deixe a gente
viver em pecado. O problema �� nosso. E por falar em
problemas temos que sair correndo pois precisamos nos
arrumar.
��� �� verdade. O nosso jantar.
��� Mas, antes vamos beber mais uns goles ��� disse
Arlete, com olhar de desafio cravado no rosto do mo��o
do serm��o. ��� L�� em casa, a m��e da Regina escondeu
todas as bebidas.
��� 147 ���
��� Arlete, querida, voc�� �� uma idiotazinha. Se ma-
m��e escondeu as bebidas, existem milhares de bares, ar-
maz��ns, super-mercados, para se comprar outras.
Caimos na risada, bebemos uisque, pegamos cigar-
ros que estavam em cima da mesinha, dentro de um sa-
patinho de prata, e fomos pela avenida, fumando, at��
chegarmos ao apartamento. Raul chegou junto com Car-
los e, logo em seguida, Ivan. Carlos sugeriu irmos todos
para um restaurante que ficava num daqueles pr��dios
perto da Lagoa Rodrigo de Freitas e eu fiquei contente
com a id��ia de Carlos pois estava determinada a impe-
dir que meu cora����o batesse mais r��pido, ficando a s��s
com Raul. N��o queria me apaixonar e n��o queria dar
nenhuma oportunidade a Raul de passar-me um daque-
les serm��es. Com mais companhia, Raul ficaria calado,
como de costume.
��� Oh, Carlos, fico satisfeito com a sugest��o ���
disse, enquanto entr��vamos todos no Impala de Ivan,
pois Carlos estava com um carro esporte e Raul com um
Karman-Ghia.
Sentamo-nos em mesas perto ao conjunto que toca-
va, estridentemente, m��sicas da juventude. Raul estava
morto de raiva.
��� Olhe aqui ��� disse-me enquanto dan����vamos.
��� Sinceramente, n��o estava com um pingo de vontade
de vir jantar em companhia dessas crian��as e nem de
ficar ouvindo essa m��sica de doidos. N��o suporto essas
coisas. O melhor �� a gente ir para um lugar mais so-
cegado.
��� Ora, Raul, �� o meu ambiente. Eu tamb��m sou
crian��a.
��� Para falar a verdade, voc�� �� mais do que crian-
��a. Ent��o n��o sentiu que eu a convidei por que tinha
algo muito importante para lhe falar?
��� 148 ���
��� E o que ��?
��� Aqui n��o poderei falar.
��� Por que? ��� sorri. ��� S��o as crian��as, ou coisa as-
sim, que o atrapalham?
��� Ningu��m me atrapalha. Gosto de crian��as dor-
mindo a essa hora. Gostei de estudantes no tempo que
era estudante. Gosto de adultos agora que sou adulto.
Uma progress��o just��ssima, voc�� n��o acha?
��� Eu adoro essa m��sica e essa dan��a maluca.
��� Sei muito bem que voc�� n��o gosta disso ��� dis-
se ele, sorrindo.
��� Bem, na verdade n��o gosto mesmo. Mas voc��,
com essa obsess��o de n��o gostar da minha turma, me
deixa chateada,
��� Ope express��o horr��vel, Regina. E u , . .
��� Voc��, pelo que me pareee. n��o tem fraqueza al-
guma. �� auto-suficiente em todos os pontos de vista.
Raul acendeu um cigarro e retrucou.
��� Sempre as pessoas amigas dizem o mesmo. Mas
eu, como qualquer mortal, tenho os meus defeitos. Mas
prefiro n��o demonstr��-los.
A m��sica cessou e voltamos para a mesa. Ivan pe-
diu bebidas e n��s, as meninas, esvaziamos as nossas ta-
��as em segundos. Raul levantou a cabe��a olhando-me fi-
xamente e, vendo que eu pegava o u��sque duplo de Ivan
e secava o copo logo em seguida, abaixou a cabe��a e fi-
cou batendo a cinza do cigarro. Quando um grupo ba-
rulhento de rapazes e mo��as invadiu o resturante, olhei
para Raul e vi que ele n��o conseguia acender um novo
cigarro. Um dos rapazes era meu conhecido e logo que
me viu se pos a gritar:
��� 149 ���
��� Ol��, Regina! Como vai, queridinha?
Chegou-se a nossa mesa quase caindo, pois as pernas
n��o conseguiam sustent��-lo, e, beijando-me no rosto,
disse:
��� Olhe aqui, querida, encontrei o M��rio e ele disse
que a est�� procurando por toda parte para lhe fazer ou-
tra massagem, daquelas de se ficar nua e d e p o i s . . . A��
ele cochichou o resto em meu ouvido e caiu na risada,
Raul ergueu as sobrancelhas e disse r��spido:
��� Pare de falar bobagens �� minha companheira.
��� V�� para o inferno! N��o estou falando com voc��
E depois Regina �� de todos. Todos podemos dormir com
ela. Ela n��o �� ego��sta, pois todos sabem que ela �� a
maior, na cama.
Raul, vermelho de raiva, levantou-se e atirando a
cadeira para tr��s, ia agarrar o jovem, quando Carlos e
Ivan vieram concili��-los.
��� N��o ligue para o que ele diz. Est�� b��bado n��o
est�� vendo?
��� B��bado ou n��o, ele que cale a boca, sen��o parto-
-lhe a cara.
��� Ora, que h��, puritano? ��� sorriu o meu conhe-
cido, friamente. ��� Est�� mesmo ficando ciumento. Bas-
tardo. N��o esque��a de que n��o �� o ��nico camarada a
fazer amor com ela. O meu col��gio inteirinho j�� a tre-
pou. E olhe que o col��gio tem dezenas de quartos e em
cada quarto dormem quatro alunos, todos jovens e fo-
gosos.
��� Pelo amor de Deus, Ivan! ��� implorou Raul. ���
Largue os meus bra��os, pois mato esse camarada, esse
b��bado.
��� 150 ���
��� Mata nada, Eu bebo mas n��o paro de funcionar
Pergunte a�� pra Regina.
��� Solte-me, Ivan. Tire essas m��os de mim, por fa-
vor, pois ningu��m vai dizer coisas assim �� Regina. Nin-
gu��m!
O gerente do restaurante se aproximou de n��s. Dis-
se ao meu conhecido:
��� Quer dar o fora daqui, antes que eu mande jog��-
4 o na rua.
0 meu conhecido respondeu.
��� Ora, meu velho, voc�� nem sabe do que est�� fa-
lando e j�� vem com essa f��ria toda.
��� Sei sim. Um vizinho de mesa, aqui desses casais,
disse que o senhor est�� faltando com o respeito a uma
das meninas,
��� Menina ? ? ? Ora, seu gar��om, pergunte a ela quan-
tos abortos j�� andou fazendo por a��. Eu a encontro sem-
pre em todas as espeluncas do raio do mundo que fre-
quento e sempre ela est�� ��� quero dizer, elas est��o ��� com
homens diferentes, bebendo e fumando com caras de
deca��das, �� isso mesmo, seu gar��om. Meninas deca��das,
perdidas, envoltas em lama.
��� Vamos! Vamos! Fora! Fora daqui! Fora! Fora.
��� Ora, que me interessa ser posto para fora desse
restaurante depois que Copacabana inteirinha, me jo-
gou para fora de seus bares. Eu tamb��m posso ser cha-
mado de menino. Sabe quantos anos eu tenho, senhor
gar��on? Dezessete anos. Dezessete anos cheios de ��l-
cool, de entorpecentes e de nada. Eu tamb��m sou um
menino deca��do, perdido, envolto em lama.
��� �� mais uma raz��o para voc�� sair daqui. Meno-
��� 151 ���
res s�� devem entrar aqui acompanhados de adultos. Va-
mos. Eu o acompanho.
O chefe dos gar��ons, muito satisfeito, segurava o
bra��o do meu conhecido e o conduzia para fora.
Ivan largou Raul, que levantou a cadeira e sentou-
se. Os outros fizeram o mesmo e por uns minutos o si-
l��ncio cobriu o grupo. Foi Ar��ete quem o interrompeu,
falando-me.
��� N��o fique perturbada, Regina. �� apenas mais
um incidente de b��bados e isso a n��s n��o abala.
N��o respondi, pois estava danada com aquele jo-
vem b��bado, pois nunca tivera nada com ele. Simples-
mente, certa vez, n��s nos encontramos numa festa. Era
a segunda vez que o via.
Senti Raul pegar o meu bra��o e passando-o por so-
bre o dele afagou carinhosamente a minha m��o, sorrindo
par�� os meus olhos, e disse:
��� Mas, afinal, para que tanto sil��ncio? Vamos pe-
dir mais bebidas. O que quer tomar?
��� Nada. Estou terrivelmente enojada de tudo.
��� Eu sei, querida. Por isso �� que acho que um gole
viria a calhar bem.
��� N��o! ��� decidi rapidamente. ��� Creio que n��o
estou com vontade de beber nada mesmo. Sabe o que
realmente quero? Ir para minha casa. Sei que voc��s
v��o achar esquisito, pois ainda s��o apenas nove horas.
M a s . . . ��� parei de falar, pois estava com vontade de
chorar.
Raul apertou meu bra��o e, fazendo-me levantar,
despediu-se do grupo. Passando os bra��os pelos meus
Ombros, falou;
��� 152 ���
��� N��o acreditei no que aquele jovem falou. Por
isso levo-a para casa, mas com uma condi����o.
��� Qual ��? Quer beber comigo l�� em casa?
��� Nada disso. Compreendo muito bem como se
sente. Proponho irmos almo��ar e, �� tarde, pegarmos um
cinema.
��� Est�� certo ��� respondi, sentindo as l��grimas
correrem pelo meu rosto.
��� Regina. . . juro que n��o acreditei.
��� Eu sei. Raul. Mas choro por que n��o queria pas-
sar por aquilo.
��� Eu sei.
��� Mas, se papai e mam��e quisessem, eu jamais vol-
taria a me encontrar com essa turma de jovens fardos.
��� Mas �� voc�� que tem de querer, Regina.
��� N��o, Raul. O que passei essa noite �� culpa dos
meus pais. Agora chego em casa e sabe quem encontro
l��, para me consolar.
��� Quem?
��� Sombras. Sombras de dois jovens que se casa-
ram por amor, que tiveram uma filha do amor, e hoje
vivem separados. Sim. Raul, abra��arei e chorarei nos
bra��os de sombras negras...
��� Quer que eu fique com voc�� at�� sua m��e voltar
da tv?
��� N��o, pois voc�� ficaria esperando um talvez. Pois
ela sempre diz antes de sair de casa que talvez volte, se-
n��o dormir no est��dio mesmo.
Paul abriu a porta do apartamento para eu entrar
o se afastou desaparecendo na noite. Eu fechei a porta
e me recostando na mesma, gritei:
��� Mam��e, papai, j�� cheguei!
As sombras negras se revolveram e o sil��ncio t��trico
levou a minha voz para bem longe, ficando somente o
eco vibrando no enorme apartamento.
��� 153 ���
XII
Aquele??? Dorme com o diretor.
O dia seguinte amanheceu com uma fria chuva, que
caia na praia, enchendo-a de sombras de solid��o. Eu le-
vantei-me cedo e fui ao quarto das meninas, mas elas
tinham passado a noite fora. Liguei a eletrola, preparei
uma dose de u��sque e acendi um cigarro. Fiquei tentan-
do adivinhar onde estariam dormindo Arlete e Ivete.
Em algum apartamento com Carlos e Ivan, de certo. A��
fiquei pensando em mam��e. Tamb��m ela havia dormido
fora. Talvez se eu mudasse o modo de tratar mam��e
teria uma chance dela voltar com papai. Por isso man-
dei a empregada fazer um variado almo��o e mandei, do
bar, vir a champanha mais cara. Alguns minutos depois
a porta do elevador bateu e os passos de mam��e ressoa-
ram pela sala. Mas, olhando mam��e, senti que alguma
coisa andava mal. Mam��e provavelmente havia chorado
pois tinha os olhos vermelhos.
��� Quer tomar alguma coisa, mam��e?
��� N��o se incomode. Eu mesma preparo.
��� Aconteceu alguma coisa?
��� Sim. N��o farei mais a novela. O papel foi da-
do para a Cristina.
��� Aquela que dorme com o diretor, n��o �� essa?
��� Por favor, minha filha. N��o diga coisas assim
Cristina �� uma grande atriz. Ela garante boa audi��ncia.
O diretor n��o poderia fazer nada, pois foi advertido ener-
gicamente. Bom Ibope ou rua. Olhe, Regina, a Guana-
bara �� dura mesmo para se vencer. Todos me disseram,
quando tentei tv, no in��cio da minha carreira aqui. To-
dos tinham raz��o. O que �� duro �� a luta pela sobrevi-
v��ncia e cada qual deve se defender. Aqui na Guanaba-
ra n��o existe pena, d�� ou piedade. Cristina s�� tem a
novela e eu ainda tenho o seu pai.
Meu cora����o quase parou. Mam��e, com o fracasso
da novela, talvez permitisse que papai voltasse para ca-
sa. Eu tinha certeza de que, apesar de todo o fel que
papai cobria, mam��e ainda o amava apaixonadamente.
��� Quer dizer que voc�� est�� sentindo falta de papai?
��� Ah n��o. Seu pai tornaria as coisas mais dif��ceis
do que est��o. N��o sinto a m��nima falta dele. A vida de
uma artista �� assim mesmo Cheia de altos e baixos. Eu
devo me levantar sozinha. Seu pai s�� atrapalharia,
A�� senti que devia deixar mam��e sozinha. Fui a co-
zinha e disse �� empregada para servir qualquer coisa pa-
ra o almo��o e que escondesse a champanha.
Sem as meninas, o apartamento estava triste. Pen-
sei aonde poderia ir para me distrair um pouco, pois es-
tava infernalmente deprimida com os problemas de ma-
m��e. Ent��o descobri aonde queria ir. Queria ver Raul.
Liguei para ele.
��� Al��?
Al��, Raul, �� Regina. Gostaria de falar com voc��.
��� Quando?
��� Agora.
��� 156 ���
��� Est�� bem. Espero-a l�� na praia em frente ao Co-
pacabana Palace.
��� N��o. Eu prefiro ir a�� ao seu apartamento.
��� Claro. Pode vir.
Quando cheguei, ele perguntou-me:
��� O que vai mal, menina?
��� Nada. Queria apenas bater um papo com voc��.
Espero n��o o estar aborrecendo ou coisa que o valha.
��� N��o me aborrece em nada. Olhe, teme um ca-
fezinho enquanto batemos o papo.
Acabei de tomar a x��cara de caf�� e disse:
��� Raul, mam��e anda dando murros para partici-
par de bons pap��is na tv e s�� conseguiu fazer papel de
idiota. Eu gostaria de que algu��m falasse com o diretor
da tv para n��o contrat��-la mais. Assim ela talvez volte
para papai. O que devo fazer?
��� Olhe, Regina, eu acho que voc�� est�� terrivelmen-
te cansada de compartilhar da infelicidade de seus pais.
Pense em encontrar o rapaz certo e a�� voc�� se casaria e
n��o ficaria mais solit��ria. Fa��a um lar sadio, onde de-
ver�� imperar o amor e a compreens��o.
��� N��o adianta tentar iludir-me, Raul. Voc�� deve
saber que homem algum se casar�� comigo quando sou-
ber o que aconteceu e que vivo ao l��u, pois sou filha de
pais desquitados.
��� Mas voc�� tem m��e Regina. Sua m��e olha por
voc��.
��� Minha m��e n��o quer ser m��e. Ela nunca me re-
preende em nada. Deixa que eu fa��a o que bem enten-
da. Tenho uma excessiva liberdade. Fa��o da minha vi-
da o que bem entendo. Saio com quem quero e fa��o o
��� 157 ���
que quero. Minha m��e poucas vezes me aconselhou a
fazer isso ou aquilo, mas eu n��o me abro com ela, n��o
conto meus segredos a ela, n��o sei porque n��o a sinto
m��e. O que quer dizer isso, heim, Raul?
��� �� por que voc�� a quer junto de seu pai. Os dois
juntos ser��o para voc�� a for��a que a guiar�� pelos ��spe-
ros caminhos da vida. Se eles estivessem juntos, voc��
contaria �� sua m��e as coisas que a perturbam, como es-
t�� contando para mim, mas j�� que isso �� imposs��vel, vo-
c�� deve fazer um esfor��o e deixar sua m��e ser m��e.
��� N��o sei, Raul. S�� confiarei nela o dia que me
der o lar que sempre almejei. Lar com pai e m��e.
��� Voc�� j�� falou umas duzentas vezes sobre esse lar
e eu n��o canso de repetir que o lar voc�� poder�� formar
com um bom rapaz que a ame e que a respeite.
��� N��o, eu quero o meu lar sonhado, com os meus
pais juntos.
��� Est�� bem, Regina. Agora vamos sair para voc��
se distrair um pouquinho. Est�� muito nervosa.
��� N��o, obrigada. Eu quero ir para casa.
��� Ok. Eu a levo. Deixe ir buscar o carro.
Enquanto Raul guiava, senti dentro de mim que a
observa����o que fazia do seu belo semblante me dava um
desejo louco de beij��-lo. Sim, gostaria que aquela boca
arrogante se enfiasse inteirinha dentro da minha. Raul
era um homem no duro. O corpo esbelto, as m��os for-
tes e grossas pelo trabalho. Agora que estava ali olhan-
do para ele, a seu lado, sentia que ele poderia ser o ra-
paz que o futuro me daria para formar o lar sadio de que
fal��vamos h�� pouco. N��o, Raul n��o seria o homem
para se casar com uma jovem pecadora. Mas a atra����o
que eu come��ara a sentir por ele parecia se fortificar
mais e mais.
��� 1 5 8 ���
Depois de me despedir de Raul, entrei no aparta-
mento e encontrei mam��e falando com um senhor c
Quando v�� o rosto do homem, meu cora����o gelou.
Era o pai de Ivete.
Fiquei parada na porta um longo tempo, vendo-o be-
ber um enorme copo de uisque e falando de um modo
como s�� os alco��latras sabem se expressar. Depois que
Ivete me contou tanta coisa a respeito dele foi que v��
que a express��o de seu rosto era, realmente, estranha e
me pareceu, de fato, perigosa. N��o voltou a cabe��a quan-
do o cumprimentei, mas sua voz rouca ressoou pela
sala.
��� Ivete est�� a�� com voc��, como sua m��e disse?
Relutei em responder, olhando para mam��e, que fa-
lou por mim.
��� Ivete saiu com Arlete, senhor Cerqueira. Daqui
a pouco estar��o de volta.
��� Mas, senhora, eu gostaria que minha filha n��o
ficasse por a��. Talvez a senhora possa dar uns conse-
ihos a ela para que volte comigo para Pernambuco. Ela
disse que s�� viria passar as f��rias de ver��o, e as f��rias
j�� terminaram. As aulas j�� come��aram e n��o sei de mi-
nha filha.
Pedi licen��a ao senhor Cerqueira e fui esperar Ive-
te na porta do pr��dio. N��o demorou muito e elas des-
ceram de um luxuoso carro. Corri para elas e gritei:
��� Ivete, sabe quem est�� l�� em cima?
��� Papai.
��� Como adivinhou?
��� E quem mais poderia deix��-la t��o nervosa as-
sim?
��� 159 ���
��� Ele veio busc��-la.
��� N��o irei.
��� J�� come��aram as aulas.
��� Que se danem.
��� Que pretende fazer?
��� N��o sei bem. Acho que vou procurar por a�� um
"fuma��a". Fumo e esque��o que tenho de me rebelar con-
tra o velho.
��� E onde voc�� vai encontrar maconha a essa ho-
ra?
��� Ora, h�� tantas bocas de fumo aqui na Guanaba-
ra. Digamos, l�� no Castelinho.
��� Mas se voc�� �� apanhada com um cigarro de ma-
conha pode ser castigada com pena de um a cinco anos
de cadeia.
��� Ora, Regina, voc�� est�� sabendo demais.
��� Eu n��o" �� a lei. Conhe��a o artigo 281 do nos-
so C��digo Penal. O C��digo pune a todos, indistintamen-
te: viciados, traficantes, consumidores eventuais, etc.
��� Chi, Regina, hoje voc�� est�� quadrada. O neg��cio
�� eu n��o tomar droga nenhuma e enfrentar o velho com
a cara bem limpa. Vamos l��.
Quando entramos na sala, o pai de Ivete a cumpri-
mentou muito agitado, como se estivesse ansioso por
desviar das pessoas presentes a aten����o do seu jeito de
alco��latra...
��� Ivete, querida, que alegria em v��-la. Vim busc��-
-la. Voc�� sabe, as aulas j�� iniciaram.
��� N��o volto praquele col��gio, papai. Nem Regina e
nem Arlete v��o voltar.
��� 160 ���
Mas voc�� parecia t��o satisfeita l�� no Senai.
��� Era fingimento. O senhor sabe perfeitamente
que a diretora de l�� disse que eu me sentirla mais feliz
em outro estabelecimento.
��� Mas, em Pernambuco h�� bons col��gios.
��� Eu nem ligo.
��� Escute, Ivete, eu gostaria que voc�� tivesse um
pouco de considera����o pelo menos por sua m��e.
��� Como considera����o, papai, se voc��s se impreg-
nam de ��lcool.
��� Ivete!
��� Que h��, papai? O senhor sabe que a emprega-
da encontrar�� sempre um frasco de uisque sobre o seu
criado-mudo todas as manh��s.
O pai de Ivete olhou para mam��e sem largar o co-
po de bebida e falou.
��� Gostaria, dona Carmen, que Ivete n��o se sentis-
se suficientemente �� vontade nessa casa para responder
assim. As vezes nem sabemos por que �� t��o revoltada
contra n��s, que procuramos dar-lhe tudo do melhor.
Nunca nos importamos que ela chegue em casa com
v��rios convidados, onde passam meses em festas sem
que Ivete nos pe��a permiss��o ou mesmo sem nos dar avi-
so algum. S�� a reprovamos quando soubemos que se
envolveu com uma turma que fumava maconha e eram
viciados em outras drogas.
Ivete encarou o pai, enfrentado-o com petul��ncia,
��� Fumava n��o: fumo! Fumo em busca de sensa-
����es que possam me fazer fugir de pais b��bados e indi-
ferentes .
��� Ingrata ��� disse o pai de Ivete bebendo outro
gole de uisque. ��� Gera����o de ingratos. In��teis. Que-
��� 161 ���
rem fugir de alguma coisa. De que coisa? Se voc��s, ju-
ventude perdida, trabalhassem como eu trabalhei...
Com quinze anos era mensageiro da firma, hoje sou do-
na Sou dono por que nunca quis fugir dos fantasmas
que a mocidade de hoje v�� em toda parte. Sou dono, por
que trabalhei duro e abri caminho para cima. Nunca
precisei erva e nem me interessei por estupefacientes,
para integrar-me na sociedade.
Ivete deu uma gargalhada.
��� Ora, papai, as drogas s��o um s��mbolo da nova
gera����o. Toda a juventude mundial �� orientada pelas
drogas. �� o mesmo: quem tem qualquer dor toma,
quase que automaticamente, um comprimido. Quem
tem indisposi����o estomacal toma Alka-Seltzer, quem
est�� nervoso toma qualquer calmante, e n��s, a juventu-
de, n��o estamos satisfeitos com os nossos pais, com o
nosso governo, fumamos maconha, ora essa.
Na sala caiu um grande sil��ncio, s�� se ouvindo a
respira����o forte do pai de Ivete, que encarou-a, nervoso,
e gritou:
��� Cale a boca! N��o vou permitir que minha filha
fale abertamente que �� uma viciada em drogas. J�� n��o
chega o que todos est��o murmurando l�� em Pernambu-
c o : que minha filha n��o passa de uma prostituta aqui
na Guanabara.
��� Papai, voc�� �� um quadrado mesmo. Hoje em dia
o amor �� livre. Durmo com rapazes para satisfazer as
necessidades do meu f��sico. Se eu fosse homem seria
muito mais simples, me masturbava e pronto.
O pai de Ivete, roxo de ��dio, saltou da cadeira e,
num movimento r��pido, apanhou Ivete pelos cabelos e
arremessou-a contra a parede, gritando:
��� Ent��o �� verdade! Tudo pelo que trabalhei duran-
te a minha vida foi para cobri-la de ouro, para voc�� andar
��� 162 ���
por a�� com essa turma de delinquentes juvenis, sua
miser��vel!
Ivete olhou-nos embara��ada, alisando a vasta ca-
beleira e depois, encarando o pai, disse calmamente:
��� Gra��as a Deus, voc�� est�� mostrando ��s minhas
amigas que esp��cie de pai ��. Agora elas saber��o que ��
um alco��latra mesmo, desses alco��latras que toda filha
tem vergonha de apresentar como pai. Um pai que pen-
sa que, por que d�� dinheiro ao filho, esse mesmo filho
�� feliz. Agora todos saber��o por que busco a paz nos
entorpecentes. Por que o meu pai b��bado pensa que
me deu o que, o que? Ouro, dinheiro? Diabos que car-
reguem o seu dinheiro. Dinheiro a gente pode obter de
mil maneiras, mas um pai de verdade e um lar, �� muito
dif��cil. Isso voc�� n��o poder�� me dar nunca, por que a
bebida fez as suas id��ias se afundarem nesse maldito
dinheiro que voc�� ganhou at�� arrebentar os dedos, co-
mo diz. A bebida age como a maconha, meu querido
pai, faz o est��mago urrar, a boca secar e o sistema ner-
voso central, respons��vel pela percep����o, pelo racioc��nio,
perder a capacidade de controle, e a pessoa fica assim
como voc��. Um louco furioso, agredindo a pr��pria filha
a quem ele nunca poder�� oferecer paz, carinho, compre-
ens��o e amor.
O pai de Ivete a encarou, subitamente silencioso e
pensativo. Depois, pegando o copo de bebida e esvazian-
do-o de uma s�� vez, disse:
��� N��s, sua m��e e eu, j�� quisemos lhe oferecer um
lar decente onde s�� reinaria o amor, mas voc�� formou
dentro do col��gio uma turma que fez de n��s alvo de zom-
barias. Sua m��e voc�� a fez passar como exemplo de m��e
indiferente e b��bada e e u . . .
��� E voc�� como b��bado que �� ��� interpelou Ivete,
branca de raiva. ��� com tudo o que acaba de dizer, res-
ponda: onde est�� esse lar? Se eu fiz o que voc�� est�� fa-
��� 163 ���
lande, o que �� pura mentira, pois se os colegas riram de
mam��e �� por que ela estava b��bada mesmo ��� ent��o por-
que abandonou a id��ia do lar sadio e puro? Ora, por que
n��o lutou por ele. Por que, j�� que queria que mam��e e
voc�� me dessem esse lar t��o falado, n��o deixaram de lado
a tolice dos estudantes. S�� por que eles riram, voc��s se
afundaram mais na bebida e o meu larzinho se desfez
como fuma��a? Ora, papai, v�� contar essa hist��ria de lar
para o diabo. Voc�� vem com cada justificativa besta.
Mam��e bebendo pra l��. Voc�� bebendo pra c��. E a lou-
cura juvenil da filha e que �� condenada pela sociedade.
Agora voc�� pede por a culpa nos meus dezessete anos,
mas n��o h�� muito tempo para justificativas, pois os
meus dezoito anos, a maior idade, est��o a��, papai.
O pai de Ivete permaneceu em sil��ncio, olhando pa-
ra o copo vazio em sua frente. Mam��e suspirou nervo-
sa, apanhou o copo do senhor Cerqueira e preparou uma
dose com gelo, que a empregada tinha acabado de tra-
zer.
��� Ponha duas doses, senhora. Ou melhor, encha o
copo. Sei que beber n��o me faz bem nenhum, mas co-
mo parar de beber quando se vive nessa ��poca em que
os filhos mandam na pr��pria vida e tratam os pais co-
mo se esses tivessem quinze anos?
Mam��e encheu o copo e falou:
��� Olhe, senhor Cerqueira, eu n��o disse nada at��
agora por que julguei que n��o tinha o direito de inter-
vir, mas algum dia as nossas meninas v��o sentir o que
�� ser pai ou ser m��e. Temos que deix��-las dar cabe��adas
durante muito tempo, as mesmas cabe��adas que n��s de-
mos em nossa juventude. O que hoje explicamos a elas
em minutos elas levar��o anos para aprender por si mes-
mas. Algum dia elas compreender��o que n��o queremos
ver nesses filhes tristes e amargurados. Que n��s nos
amarguramos por eles e que, ao tomarmos a decis��o por
eles �� simplesmente para n��o v��-los sofrer mais tarde.
��� 164 ���
Como ��, senhor Cerqueira, que as nossas filhas pedem
ver na mocidade que grande luta �� viver? Como pode-
r��o ver que a vida �� feita de caminhos entrela��ados de
espinhos e que para abri-los existir��o mil obst��culos e
imensas barreiras que a toda hora se agigantam em nos-
sa frente. Nossa juventude �� composta de meras crian-
��as que insistem em fazer tudo por si mesmas, recusan-
do o conselho dos pais. Algum dia eles vir��o at�� n��s e
procurar��o conversar e pedir aux��lio para as suas almas
amarguradas.
��� Penso que o que a senhora falou n��o leva a coisa
alguma. Antigamente n��o havia a discuss��o entre pais e
filhos, mas havia o respeito. Hoje, por que bebemos, eles
bebem, por que fumamos eles fumam. Enfim, tudo o
que um adulto faz eles querem fazer. Pecam imensa-
mente, mas dizem sempre que a lei est�� do lado deles.
��� Somos menores. Nossos pais s��o cs respons��veis.
Que v��o para o diabo os filhos.
��� Besteira em cima de besteira ��� disse Ivete, sain-
do da saia, enquanto o pai a observava, sacudindo a
cabe��a.
Antes de Ivete cruzar a porta, ele gritou:
��� Dona Carmen vai aconselh��-la a partir comigo.
Ivete nem ligou, desaparecendo em seguida pela por-
ta que se fechou ��s suas costas.
Um sil��ncio pesado desceu sobre o apartamento,
quebrado de repente pelo volume da vitrola, que Ivete
elevou ao m��ximo. Olhei para Arlete, que disse:
��� ��, Ivete sabe preencher o v��cuo do sil��ncio. Va-
mos l�� impedir que ela derrube a casa.
Entramos no quarto e Arlete gritou:
��� Ei, Ivete �� um desperdicio essa m��sica assim
t��o alta, N��o h�� raz��o alguma para isso,
��� 165 ���
Ivete jogou os cabelos para tr��s e nos olhou cheia
de raiva.
��� Como n��o h�� raz��o? Meu pai quer mostrar-se
conservador. Vem aqui fingindo uma s��rie de id��ias so-
bre o meu futuro e depois solta as cachorros e me agri-
de. J�� que n��o posso agrad��-lo, elevo essa m��sica como
um sinal de protesto.
��� Mas protestar o que, Ivete? ��� a voz de mam��e
encheu o quarto. ��� O seu pai tem raz��o. Voc�� n��o po-
de ficar aqui para sempre. Tem que voltar a sua or��pria
casa, seu col��gio.
��� �� . . . ��� disse Ivete. ��� �� uma situa����o infernal.
N��o sei que diabo esse homem veio se intrometer na
minha vida. ��� Apanhou um cigarro e o acendeu nervo-
samente. ��� Quer que eu v�� embora, n��o ��, dona Car-
mem?
��� Infelizmente, voc�� tem que ir, e Arlete tamb��m.
Pois preciso organizar a vida de Regina.
A�� eu perguntei.
��� Organizar como, mam��e?
��� Ora, voc�� n��o pode continuar nessa vida.
Olhei-a petulante.
��� Que vida mam��e!
Mam��e jogou a m��o para todos os lados e titubeou.
��� E s s a . . . essa vida, sem uma defini����o. N��o es-
tuda n �� o . . .
Virei os olhos, ir��nica, e continuei.
��� .. .N��o tem um lar, n��, mam��e?
��� Ora, Regina, vamos parar com essa conversa.
N��o queira se esconder atr��s de toda essa... essa...
��� 166 ���
Mam��e saiu do quarto gritando:
��� Vou esperar uma hora para essas meninas arru-
marem tudo. Ficarei esperando-a na sala em compa-
nhia do pai de Ivete.
Assim que mam��e saiu, Ivete franziu a testa, jogou
o cigarro no ch��o e esmagou-o com o p��, falando:
��� Voc�� concorda, Regina?
��� Com o que?
��� Com as id��ias de sua m��e. Voc�� quer que a gente
v�� embora.
Sinceramente, n��o sabia o que falar. Fiquei olhando
para as duas amigas, feito boba. At�� que Arlete falou:
��� Tenho uma id��ia, para ficarmos livres de nossos
pais.
��� E qual �� ? ��� Ivete e eu perguntamos numa s�� voz.
��� Vamos nos casar.
A gente arranja um homem e casa.
Ivete caiu na cama as gargalhadas.
��� Como �� divertido, disse engasgando-se no riso.
N��o �� coisa que se pode chamar de vulgar.
Casar... Casar e quem querer�� casar com tr��s me-
ninas furadas por todos os lados?
��� Voc�� se julga bem difamada, hem Ivete? ��� dis-
se-lhe Arlete. Todos os lados n��o. Eu s�� perdi a virgin-
dade.
Ivete continuou rindo.
��� Ent��o perdeu tudo. Voc�� n��o sabe, bobalhona,
que aqui no Brasil a virgindade �� considerada condi����o
essencial para o casamento? Os brasileiros n��o V��o se
preocupar se voc�� est�� furadinha em outras partes ou
��� 167 ���
se usou a boquinha para certas chupadinhas. O que eles
fazem quest��o �� do homem integral, querem que o seu
p��nis retinho seja o primeiro a abrir o conduto vaginal
da esposa. Se descobrir que o homem j�� se foi, apelam
para o C��digo Penal Brasileiro, que anula o casamento.
Ivete sentou-se na cama e ficou pensativa por um
momento e depois falou com o dedo em riste:
��� S�� se a gente for �� pol��cia e denunciar um cara
qualquer com quem a gente j�� andou. A��, se o infeliz
n��o casar, ter�� a pena de reclus��o, pois o nosso C��digo
tamb��m reza. ��� O rapaz que seduzir mulher virgem
com menos de dezoito anos, ter�� que cumprir de dois a
quatro anos de reclus��o e n��s tr��s fomos seduzidas com
menos de dezoito anos.
��� Mas ningu��m nos seduziu, ��� articulei s��ria ��� e
se voc��s querem saber a verdade, eu encontrei o homem
que ser�� meu marido.
As duas me olharam arregalando os olhos e Ivete
perguntou:
��� E o que ele acha de voc�� n��o ser mais virgem?
��� Bem. ��� falei sentando-me em uma cadeira e
cruzando as m��os no colo ��� ele acha que uma simples
membrana n��o ser�� impecilho para a estabilidade de
um casamento. Um homem arrebentado n��o poder�� in-
terferir num casal que possui equil��brio emocional, afi-
nidades sociais, culturais e religiosas...
Pela primeira vez em minha vida vi Ivete s��ria,
quando perguntou: ���
��� E quem �� esse cara t��o inteligente? N��o �� bra-
sileiro, n��?
��� Claro que �� brasileiro! Hoje em dia, nem todos
os homens brasileiros pensam que a integridade himenal
possa atestar a honestidade de uma esposa.
��� 168 ���
Ivete riu e brincou, mas eu sentia que tudo era
for��ado.
��� Eh! Eh! Bicho, voc�� �� legal! Onde aprendeu
todas essas coisas?
Rimos, pois ador��vamos g��ria que pouco us��vamos,
j�� que a juventude que frequent��vamos n��o era dada a
esse tipo carregado da guia.
��� Aprendi com Raul.
As duas se levantaram.
��� �� infernal! Ent��o �� o Raul? �� o que mais disse
esse fen��meno de brasileiro, a respeito de t��o importante
assunto? ��� Olhe, Regina, bote o Raul para pregar em
pra��a p��blica, assim esses ignorantes brasileiros v��o en-
tender que o buraco da frente pode estar tapado por
uma pl��stica e l�� no esp��rito a escolhida pode ser uma
vigarista. Dessas que casam virgens mas, depois de al-
gum tempo, descobrem que o padeiro ou o leiteiro tem
um neg��cio maior do que o marido, a�� o esposo adorado
vai trabalhar e o que tem a "coisa" grande deita no
calor de seu c o r p o . . .
��� Olhe, Ivete. Vamos falar de n��s. Eu acho que
Raul pensa muito bem. Ele esteve me explicando que,
hoje em dia, uma certa classe de homens brasileiros,
principalmente os que nunca tiveram um dist��rbio ps��-
quico, acham que o conceito de honra n��o se situa em
determinada parte de nosso organismo. Raul diz la-
mentar muito que o amor, que poder�� levar um casal a
amplos caminhos, fique condicionado a um pedacinho
de pele intacta.
Nesse instante mam��e entrou e olhando para Ivete
falou:
��� Seu pai a espera.
Ivete sentou-se na cama e, cruzando as pernas, sen-
tou-se s o b r e as mesmas, respondendo:
��� 169 ���
��� Diga ao "coroa" que estamos discutindo a virgin-
dade, esse velho tabu ultrapassado. Por isso, n��o posso
atend��-lo.
Mam��e ficou branca.
��� Vamos, seu pai est�� cansado.
O rosto de Ivete se cobriu de uma certa agonia
quando se levantou e disse baixinho:
��� Est�� bem, diga ao velho para esperar mais um
instantinho, que vou arrumar as malas.
Quando mam��e saiu, Ivete, abriu a sua gaveta, jo-
gou algumas roupas dentro de uma sacola. Parou e res-
pirou profundamente, depois falou:
��� Olhe Regina, eu n��o vou, nem se me cortarem
a cabe��a, para junto de meus pais. Me d�� algum di-
nheiro, eu vou para S��o Paulo.
Sa��mos pela porta da cozinha e descemos as escadas
correndo. Ta passando um rapaz de motocicleta e Ivete
pediu uma carona. Na garupa da moto, abra��ando o
corpo do jovem, com o rosto enterrado em suas costas,
foi a minha ��ltima vis��o de Ivete.
O pai de Ivete, tr��pego e vermelho, saiu do aparta-
mento para ir pedir provid��ncias �� pol��cia.
No dia seguinte acompanhei Arlete at�� ao aeroporto
do Gale��o. Ia para a casa de uma tia, no Rio Grande do
Sul.
* * *
��� 170 ���
Estou s��. Abro a porta do apartamento, mas um si-
l��ncio g��lido sobe pelas escadarias e me percorre inteiri-
nha. Fecho a porta novamente. Ando pela sala, entro
no quarto, saio, entro na cozinha, volto para a sala,
abro novamente a porta. O frio, o sil��ncio. Fecho a por-
ta. Vou at�� o telefone e quando o tiro do gancho e come��o
a discar o n��mero de Raul, ou��o algo estalar no meu
c��rebro.
��� N��o, Regina ��� voc�� prometeu que se vingaria.
Seus pais continuam desquitados. Coloque o fone no
gancho.
Virei para um lado, para outro lado e comecei a
girar como doida, no meio da sala, gritando:
��� Papai, mam��e, Raul, Ivete, A r l e t e . . .
S�� o sil��ncio o g��lido sil��ncio. Sil��ncio. Sil��ncio.
Estava s��.
��� 171 ���
Nos dias que se seguiram n��o atendi os telefone-
mas de Raul e tamb��m n��o sai do quarto, por mais que
mam��e insistisse, quando vinha dormir em casa.
Alguns dias depois, recebi uma carta de Ivete, que
dizia:
Regina, querida, cheguei ao inferno. S��o Paulo est��
uma verdadeira merda. Estou morando num pequeno
apartamento de quarto, pia e banheiro, na Regional da
S��. Regional da S�� quer dizer que moro no c��rculo cen-
tral, que inclui os seguintes bairros: S��, Santa Efigenia,
Bela Vista, Liberdade, Bom Retiro, Santa Cec��lia, Acli-
ma����o, Consola����o, Barra Funda, Br��s, Cambuci,
Mo��ca, Pari, Cerqueira Cesar. O meu apartamento fica
na Barra Funda. N��o sei se sobreviverei nesta monta-
nha de pedras. Aqui, vive-se sem o verde, sem alegria,
respirando quilos de polui����o. S��o Paulo �� a cidade
mais densamente povoada do pa��s. (Tudo o que estou
lhe contando foi-me explicado por uma pessoa que tra-
balha na prefeitura. Eu o conheci quando, desesperada,
procurava algum dinheiro para dar o fora. Por isso
aguento o p��o que o diabo amassou. Olhe s�� se n��o te-
nho raz��o de odiar esta Capital, escura e cinzenta.
Voc�� f�� pensou ter que lutar todo os dias com 200 mil
carros particulares que circulam pelo centro, do lado
de 7 mil ��nibus e uns 20 mil t��xis? Agora, fique no meio
de todos esses carros e olhe para o alto, pr��dios e mais
pr��dios. Sufoca. Agora, respire. Polui����o. Ou��a: o ba-
rulho quase arrebenta os t��mpanos. Onde se esconde o
sossego?
Juro que estou neur��tica. Mil e oitocentas tonela-
das de lixo s��o recolhidas por dia, por 201 servidores
que ocupam 63 caminh��es para atender a todo o cen-
tro de S��o Paulo. Voc�� viu em quanto lixo estou envol-
vida? E esses vinte e cinco km2 que s��o a Regional, s��o
divididos por mais de um milh��o de pessoas que, todos
os dias, circulam pelas vinte mil oficinas e ind��strias,
pela quarenta mil lojas e pelos incont��veis escrit��rios
��� 172 ���
que se localizam neste inferno de asfalto de paralele-
p��pedos, de escapamentos e de chamin��s donde sae essa
f��tida fuma��a cimenta que me afoga de minuto a mi-
nuto. Imagine, Regina, que aqui neste centro de S��o
Paulo, o homem vive verticalmente, pois, de tantos me-
tros, s�� sobram para cada pessoa quinze m2. Voc�� j��
pensou viver uma vida em quinze m2? Ent��o, querida
Regina, estou aqui cercada por todos os lados de fu-
ma��a, concreto, carros e pr��dios. Ah! ia me esquecendo.
Tamb��m tenho cento e quinze quil��metros de galerias
para passear. Nessa f��ria de tr��nsito e de tudo procuro
algo com que possa distrair os meus dezessete anos.
Aqui, a juventude pobre, n��o tem nada para passar o
tempo. A�� ela descamba para o negativo. Para encurtar
o tempo em que poderei, novamente, estar na querida
Guanabara, comprei um gravador e passo a gravar tudo
o que acontece. La vai uma novidade: vou trabalhar, con-
segui um emprego na Petrobr��s. Os escrit��rios de meu
futuro emprego ficam bem pertinho de onde moro, posso
ir a p��, num edif��cio de vinte e oito andares e fica na
Av. S��o Jo��o. O nome dele �� Andraus, mas todos os
chamam de Pr��dio da Pirani, pois as lojas da Pirani
ocupam tres andares desse pr��dio. Vou gravar o meu
primeiro dia de trabalho e lhe mandarei a fita. Saiba
que estou mima fossa infernal. Vejo tudo negro. Ah!
Regina, venha em meu socorro, n��o quero ficar aqui,
juro, juro que vejo tudo preto. Adeus.
IVETE
S��o Paulo 21/02/72
Quando acabei de ler a carta, fiquei olhando no in-
finito, e s�� via, l�� bem longe, a palavra Adeus
Adeus, mas Ivete disse que voltaria. Fiquei mor-
��� 173 ���
rendo de pena da minha amiga. Quando mam��e che-
gou, mostrei-lhe a carta.
��� Voc�� a mandou embora, n��, mam��e? Voc�� a jo-
gou nesse inferno que ela diz na carta.
��� Ora, Regina! Ivete est�� exagerando. Seu pai
adora S��o Paulo. Ele mora no Morumbi e nunca quis
trocar S��o Paulo pela Guanabara.
��� Mas ela mora no centro. Voc�� n��o v�� que ela
diz que est�� vivendo sufocada por tantos pr��dios?
Mam��e preparou duas bebidas. Deu-me uma e con-
tinuou: ��� N��o pense mais em Ivete. Ela, agora, vai tra-
balhar e ent��o dar�� valor ao dinheiro.
��� Mas ela est�� s��, s�� como eu, mam��e. E estan-
do s��, passam-se mil e uma coisas ruins em nossos c��re-
bros. Estou intrigada pelo que Ivete escreveu. Ela nunca
ficava na fossa, n��o estava sujeita ��s flutua����es de es-
tado de esp��rito e, contudo, essa carta demonstra pro-
funda depress��o. Geralmente, a m��goa de Ivete era mal-
dizer as bebedeiras dos pais. Tinha verdadeiro ��dio do
pai. Quando ela tinha onze anos o pai a chamou para
a sala de visitas. Estavam sozinhos em casa. Ivete sor-
rindo (naquele tempo adorava o pai) sentou-se ao seu
joelho e ele ent��o..
N��o tinha coragem de continuar. Mam��e, pas-
sou-me a m��o pelos cabelos. Continuem Regina, quem
sabe se, ouvindo tudo, poderemos fazer alguma coisa por
ela. Talvez possamos convid��-la para morar conosco.
��� Oh, mam��e, ser�� infernal, maravilhosamente in-
fernal. A�� criei coragem e continuei, pensando j�� na vin-
da de Ivete.
��� Bem, mam��e, a m��e de Ivete bebia e jogava mui-
to, deixando-a sempre com o pai, que come��ou a lhe en-
sinar coisas sobre o sexo. Ela, nas noites em que a m��e
��� 174 ���
jogava, ia para a cama dos pais, pois tinha medo de dor-
mir sozinha. Foi a�� que ele come��ou a fazer-lhe ver que
j�� estava ficando mocinha. E lhe dizia:
��� Olhe, minha filhinha, esses carocinhos a�� v��o
crescer e formar dois grandes seios. Voc�� quer os seios
bem grandes, como a Gina Lolobrigida, n��o quer?
��� Quero.
��� Ent��o para isso �� preciso que o papai os chupe
muito.
A boca de seu pai, sugando os carocinhos duros,
traziam lagrimas doloridas mas o pai n��o se importa-
va e tentava ainda for��ar o p��nis em seu sexo.
Uma noite quando o pai a chamou, ela j�� apren-
dera coisas do sexo com as amiguinhas de col��gio, cho-
rando gritou:
��� Papai eu quero ficar virgem at�� casar.
Meu pai olhou-a, admirado:
��� Quem est�� lhe ensinando coisas depravadas? J��
sei, �� nesse maldito col��gio, juro que voc�� n��o ir�� mais
frequent��-lo. Agora, venha c��!
��� N��o vou!
Ele a encarou com a boca meio aberta e com os
olhos desmesuradamente abertos, desprovidos de emo����o
veio em sua dire����o.
Recuou morrendo de medo. O pai confiava todo o
seu corpo, encolhida em seus bra��os, quando trovoava,
ou quando sentia medo do escuro. Sentia na parede ��s
suas costas. Ele agarrou-a jogou-a de bru��os no sof��.
Sentiu suas m��os, as m��os que ela beijava dizendo sor-
rindo. ��� A ben����o, papai. Agora, elas lhe arrancavam
a calcinha e sentia todo peso de seus corpo e alguma
coisa dura sendo enfiada em meu ��nus. At�� hoje n��o
esque��o, como tudo era dolorido estranho e forte, aque-
le pesado corpo sobre meu pr��prio corpo a domina-lo.
Senti o p��nis do papai amolecer e sair de dentro de mim.
Quando ele se levantou, rapidamente ficou de p�� no sof��
e suas m��os voaram para a garganta do pai e algo mui-
��� 175 ���
to profundo gritou dentro de si, que ela devia destrui-lo.
Papai se afastou, mas eu continuei pendurada, e
n��o largava a sua garganta. Mordia-o e o arranhava,
at�� que despenquei e cai no ch��o chorando gritei: ���
��� Eu queria ser virgem!
Ele cinicamente respondeu: ��� Eu te deixei virgem
me abandonou e foi e m b o r a . . .
O pai viajou por dois anos. Ivete come��ou a odia-lo
e como a m��e bebia muito, n��o teve a quem se queixar.
Aquilo queimava como brasa dentro dela e ent��o resol-
veu contar a algu��m.
Mam��e mudou de posi����o na poltrona e disse sem
grande emo����o:
��� Bem, o pai de Ivete ergueu um muro ao redor
dela, mas voc�� n��o tem nada com isso. ��� Ivete n��o ��
problema seu.
��� Mas, mam��e, ela precisa de algu��m, voc�� n��o
pode ficar indiferente, Ivete est�� profundamente abala-
da. Devemos traz��-la de volta.
��� N��o, Regina. Gra��as a Deus, ela se foram. Sua
vida agora, ser�� infinitamente mais f��cil. Vamos, Re-
gina, de-me o seu copo para eu encher. Vamos brindar
o emprego de Ivete e nossa independ��ncia dom��stica.
Eu estou determinada a lhe dar uma nova vida.
Olhei para mam��e com o cora����o cheio de espe-
ran��a .
Voltar�� para papai?
Mam��e voltou-se r��pida.
��� N��o tenho a menor vontade de voltar para seu
pai. Nossa uni��o n��o leva a coisa alguma. Nossa vi-
da ser�� sempre uma eterna discuss��o. A nova vida
de que lhe falo �� sobre um contrato que terei com uma
TV. Isto n��o �� ilus��o, ou sonho apenas, como aquelas
est��rias inventadas por produtores sem escr��pulos.
Com esse diretor j�� trabalhei. Ele sabe do que sou
capaz, profissionalmente. Juro que chegou a oportuni-
��� 176 ���
dade que estava esperando. Irei ganhar muito dinheiro.
Voc�� ir�� estudar. Eu trabalharei para voc�� n��o preci-
sar lutar a murros para abrir um caminho neste mundo
cheio de obst��culos.
��� Oh, mam��e, �� tudo maravilhoso! Mas n��o sei
por que, sinto que existe na minha frente um imenso
muro cinzento. Parece-me o fim de tudo o que eu so-
nhava. Parece o fim de meus dezessete anos.
��� Ora, querida, isso �� depress��o pelas f��teis ten-
tativas de voc��s quererem transformar-se em adultos.
As menininhas de hoje s��o umas bobinhas em que-
rer governar suas vidas sem o aux��lio dos p a i s . . .
��� Pais???
��� J�� sei, Regina. Vamos, vamos, telefone para um
de seus amiguinhos e v�� se distvair um pouco.
��� N��o, mam��e, n��o tenho a m��nima vontade.
��� N��o vai continuar nesse confinamento de quar-
to, vai?
��� N��o sei. Por favor, deixe-me s��.
��� 177 ���
XIII
D�� uma chupadinha!
O tempo mudou muito nos dias que se seguiram.
Chovia ��� e fazia muito frio. A praia estava sempre
encoberta por uma n��voa branca e infernal. Eu ficava
bebendo e fumando, trancada em meu quarto. S�� saia
para as refei����es. N��o sei quantos dias se passaram at��
ouvir a voz da empregada.
��� Dona Regina, uma encomenda de S��o Paulo.
Pulei da cama e corri para a porta, abrindo-a de
sopet��o. Junto da empregada estava um homem. 0lhei-o,
interrogativamente.
��� Sou da pol��cia. Gostaria de falar com sua m��e.
Senti meus olhos alargarem-se e perguntei com voz
tr��mula:
��� A c o n t e c e u . . . aconteceu alguma coisa a Ivete?
Meus olhos arregalados devem t��-lo assustado.
��� N��o, menina. Por favor, onde posso encontrar
seu pai ou sua m��e?
��� 179 ���
��� Mam��e est�� na TV.
A��, dei-lhe o endere��o.
O homem entregou-me um pacote e a carta que es-
tava enfiada no barbante, ele a guardou no bolso, di-
zendo :
��� A carta �� para sua m��e.
N��o quis nem saber, corri para o quarto e arran-
quei o barbante. Era uma fita T.D.K. ��� Cassete C-60,
que Ivete prometera mandar-me.
Corri, abri o guarda-roupa e peguei o meu gravador.
A fita adaptava-se perfeitamente.
Avisei a empregada que em hip��tese nenhuma me
perturbasse.
��� Mas, se sua m��e chegar?
��� J�� disse que ningu��m deve incomodar-me. Nin-
gu��m, ouviu? Bati a porta e dei duas voltas na fecha-
dura, deitei-me, acionei o bot��o do gravador e a voz de
Ivete encheu o quarto:
��� Oi, Regina. Como lhe prometi, aqui estou. Vou
contar pra voc��, tim-tim-por-tim-tim, como ser�� o meu
dia de hoje. Espere, deixe ver na folhinha que dia ��. Dia
vinte e quatro de fevereiro, quinta-feira, meu primeiro
dia de trabalho. Bem, eu estou sentada na cama metida
em um roup��o vermelho. J�� tomei o meu caf�� e agora
acendo um cigarro e vou at�� a janela e abro a cortina
para ver como est�� o dia que ser�� o meu primeiro dia
de trabalho.
O c��u azul e um c��lido sol, cobrindo todo esse monte
de cimento e pedras que odeio. Sei que voc�� conhece
tudo isso e me parece que gosta desse tremendo S��o
Paulo que, com seus afiados dentes de pr��dios desiguais,
vai triturando a gente. Hoje estou mais enojada de to-
da essa esfuma��ante cidade e dos homens que ela abriga
nos seus bra��os horrorosos, de elevados enervantes.
Sabe porque digo isso? L�� vai! Todos os homens
que conheci, intimamente, querem ser chupados. Logo
que voc�� aceita uma carona, o filho da puta tira o "ne-
g��cio" para fora e quando chega num lugar mais ou
menos deserto, puxa a cabe��a da gente para baixo e im-
plora .
Quem est�� com essa mania �� o homem que paga o
aluguel desta espelunca onde moro. Essa noite foi hor-
r��vel. Ele me obrigou a ficar com o seu p��nis, horas, na
boca. Voc�� sabe que eu n��o sou do tipo dom��stico mas
tamb��m n��o topo certas coisas. O que se passou essa
noite me deixou super deprimida. Juro que farei qual-
quer coisa para n��o voltar mais para este apartamento.
Ainda n��o sei o que ser��, mas algo ter�� que acontecer.
Ainda estou confusa e um solu��o aperta a minha gar-
ganta. H�� ru��dos que um gravador n��o grava, sen��o ou-
viria quantos gemidos tristes saem de meu cora����o.
S��o sete horas, tenho que entrar no servi��o ��s oito, por
isso, visto o meu micho vestido vermelho, cal��o sapatos
bem altos, tipo Carmem Miranda, tamb��m vermelhos,
apanho minha bolsa tiracolo e saio para o meu primeiro
trabalho.
J�� estou na rua. Homens mal vestidos, p��lidos e
desnutridos, cruzam a todo instante, o meu caminho.
S��o os oper��rios paulistas. Quase todos levam na m��o
um embrulhinho, que se percebe logo que �� a marmita,
onde est�� o magro almo��o.
Voc�� est�� vendo como j�� entendo de pobreza. Bem,
na Av. S��o Jo��o, avisto o grande bloco de cimento ar-
mado: �� o Edif��cio Andraus, mas que vou chamar de
pr��dio da Pirani como todo mundo, pois nos seus tr��s
primeiros andares, est��o as lojas Pirani. Entro no pr��-
dio pela Av. S��o Jo��o e me encontro no meio de mil e
um objetos que, logicamente, s��o da Pirani.
��� 181 ���
Os rapazes e as mo��as, alegres e risonhos, conversam
animados, pois ainda n��o �� hora de pegar no "batente".
Entro no elevador e digo:
��� Petrobr��s.
Entro nos grandes escrit��rios, vejo um monte de
gente jovem, alegre e os olhos dos jovens homens se vol-
tam para minhas pernas e um assovio coletivo corta os
ares, trazendo um sorriso espont��neo nos l��bios bem
pintados da jovem que me dirige a palavra.
��� As suas ordens.
��� Por favor, gostaria de falar com o Sr. Gedeon
Coutinho.
A mo��a olhou para o gravador.
��� Voc�� �� rep��rter?
��� N��o.
��� Ent��o, para que est�� gravando?
��� Por ser o meu primeiro dia de trabalho.
��� Mas isso n��o �� novidade para ningu��m. Todo
mundo trabalha.
��� N��o, os milion��rios.
Ela sorriu e me olhou com ar divertido.
��� Ah! Ent��o voc�� �� milion��ria?
��� Est�� vendo. At�� voc�� est�� admirada.
Tamb��m para mim �� um dia todo especial. Tra-
balho!
��� Voc�� acha que haver�� algum inconveniente em
eu estar gravando?
��� Bem, aqui nunca aconteceu. Mas acho que nin-
gu��m vai bronquear. A Petrobr��s entende a juventude!
Um momentinho vou ligar para o Sr. Coutinho.
��� 1 8 2 ���
O Sr. Gedeon �� muito legal. Jovem, bonito e sim-
p��tico .
Sua voz �� suave, voc�� n��o acha, hem Regina?
��� Quantos anos voc�� tem?
��� Dezessete.
��� �� datilografa?
��� N��o.
��� Fala ingl��s?
��� N��o.
��� Franc��s?
��� N��o.
��� Arquivista?
��� N��o.
Ele co��a o queixo.
��� O que voc�� sabe fazer. E o que pode mostrar ao
seu favor.
��� Estudei no melhor, no mais caro col��gio daqui.
��� Isso n��o diz nada, Ivete.
��� Sou milion��ria.
��� Milion��ria???
��� Meus pais.
��� Porque n��o volta para eles?
��� Odeio-os.
��� Jogatina, ��lcool, viagens e . . . bem.
��� 183 ���
��� Bem?
��� Havia muita falta de carinho e compreens��o.
��� Mas voc�� �� rica. Trabalhando aqui tira o em-
prego de outra que tenha maior necessidade.
��� Por favor, d��-me o emprego. N��o quero mais
ficar nesta sociedade onde corre o dinheiro. Dentro dela
a gente �� um cat��logo para festas e reuni��es. Eu quero
trabalhar. Por favor Sr. Coutinho.
��� Est�� bem. Voc�� ser�� minha secret��ria. Pegue
aquela m��quina e fique treinando. Olhe ��� disse sorrin-
do de dedo em riste ��� mas para trabalhar �� preciso des-
ligar o gravador.
Bem, Regina, mais tarde conversaremos. S��o exa-
tamente nove horas, vou come��ar a "catar milho".
Al��, Regina. Pratiquei, �� m��quina, a manh�� inteiri-
nha e j�� estou escrevendo muito bem. Mas sinceramen-
te, ficar trancada o dia todo no d��cimo segundo andar
de um edif��cio, n��o est�� pr�� mim. �� muito mon��tono,
ou melhor, �� horr��vel, sabendo-se que existe uma Copa-
cabana. J�� s��o tr��s e meia e s�� ou��o o barulho do tic-
tac da m��quina. N��o sei o que est�� se passando comigo:
olho. olho o rel��gio como se algo muito grave possa
acontecer. Ora, devem ser os nervos, eles devem estar
agitados, porque est�� chegando a hora de sair e eu n��o
sei para onde ir. Jurei de p��s juntos que para o apar-
tamento n��o voltarei mais. Agora est��o faltando cinco
minutos para as quatro.
��� Fogo, pessoal. Corram! O edif��cio est�� pegando
fogo!
Voc�� ouviu Regina, um jovem pois a cabe��a na
porta e disse que esse bloco de cimento armado com
��� 184 ���
vinte e oito andares, que fica no cora����o de S��o Paulo
est�� pegando fogo. N��o �� para rir. Se f o s s e . . .
Mas, minha Nossa Senhora da Aparecida, �� fogo
mesmo. Ou��o medonhos gritos de angustia. Seguro o
gravador, penduro a minha bolsa no pesco��o e estou cor-
rendo para algum lugar. Chego no corredor e estou en-
volta numa imensa fuma��a negra que me tapa a vis��o.
O calor est�� horr��vel. Sinto o vestido pregar no corpo,
pois todo ele �� um rio de suor. Estou sendo empurrada
de um lado para o outro. Desculpa e a tosse. Regina.
Regina, �� medonho! De todos os lados v��m gritos de so-
corro e de medo. Agora posso ver um homem com o pa-
vor estampado no rosto, onde sobressaem olhos esbuga-
lhados, com as roupas encarcadas, segurando uma man-
gueira contra inc��ndio e faz com que jatos de ��gua nos
alcancem para nos refrescar e aliviar a fuma��a que est��
nos sufocando. Algu��m est�� gritando para ele:
��� N��o adianta essa mangueira contra o inferno
Sr. Gilberto Epting, o pr��dio todo est�� em chamas. J��
morreu muita gente, vamos subir, corra! Venha tamb��m
mocinha.
��� Meu nome �� Ivete.
��� Ent��o corra Ivete!
��� Correr como? Essa gente em desespero �� capaz
de nos esmagar.
��� Esmagada, queimada ou sufocada, vamos subir
para a ��rea, l�� no ��ltimo andar.
Estou subindo as escadas sem mesmo pisar no ch��o,
arrastada por um monte de gente que grita chamando
os nomes dos mais variados Santos. Piso em coisas
moles que sei que �� gente que desmaiou e ficou massa-
crada no caminho. Estamos diante de uma porta preta
fechada.
Centenas de olhos esbugalhados olham para tr��s,
o fogo. Estamos encurralados pelas terr��veis chamas.
��� 185 ���
De repente, um mundo de m��os aparecem e num es-
for��o tremendo conseguem arrombar a porta. Como um
estouro de gado, a ��rea que �� um heliporto, �� invadida
por umas quinhentas pessoas. O heliporto �� todo cer-
cado por um murinho baixo da altura de meus joelhos.
Olho para baixo a Av. S��o Jo��o, milhares de pessoas,
homens, mulheres e crian��as, ajoelhadas em redor do
grande edif��cio, est��o rezando e pedindo a Deus a nos-
sa salva����o, pois todo o pr��dio, olhando aqui de cima,
desgra��adamente, se transformou numa verdadeira e
medonha tocha de cimento armado.
Um homem que est�� junto de mim, que vim a sa-
ber e engenheiro da Siemens do Brasil, est�� dizendo
que estamos sem sorte. O vento est�� soprando em di-
re����o sul-norte, �� o grande e impiedoso propulsio-
nador do fogo que teve in��cio (soubemos por um dos
jovens que �� funcion��rio da "Pirani"), na sec����o de apa-
relhos eletr��nicos. Disse ele, que, em pouco menos de
dez minutos, o fogo tomou os cinco primeiros andares
e, dali para cima, tudo ardeu em fra����es de segundos.
Olho l�� para baixo e vejo enormes labaredas que o
vento faz sair pelas janelas, como horrendas serpentes
amarelas que penetram nos andares de cima devoran-
do tudo. Se enroscando no pr��dio, a serpente est�� su-
bindo. Mais alguns andares e ela estar�� dando voltas
no heliporto onde estamos encurralados. A porta onde
entramos na ��rea est�� trancada e ouvimos batidas de
dezenas de m��os e gritos de vozes sufocadas pedindo
socorro. Mas a porta n��o pode ser aberta, pois dois sar-
gentos da Pol��cia Militar n��o permitem, pois o acu-
mulo de pessoas poder�� impedir a descida dos helic��p-
teros. Esses militares acabam de se atirar de uns tr��s
metros de altura, de um dos muitos helic��pteros que
sobrevoam o heliporto. Vieram ajudar, porque tal �� o
p��nico dos que est��o aqui, que, se o aparelho pousar, cor-
re o risco de ser invadido, virado e at�� pode explodir.
N��s estamos rodeando o sargento que diz chamar-se
Serafim, e pertencer �� Companhia de Opera����es Espe-
ciais. Mesmo preparado para qualquer surpresa, trei-
nado em contraguerrilhas, sobreviv��ncia na selva, pi-
loto e paraquedista, o sargento Serafim parece trau-
matizado com este ch��o escaldante que torra homens,
mulheres e crian��as que se rasgam e ficam n��s para
amenizar um pouco o calor que �� infernal. Todos, como
animais ferozes, pedem ao sargento para salv��-los. Da-
qui a pouco essas pessoas apavoradas s��o capazes de
enlouquecer. Agora mesmo, um homem sobe na amu-
rada, pega um fio e, apesar do esfor��o de todos n��s, ele
largou o corpo e est�� dependurado uns quatro metros
abaixo da ��rea. Oh! Deus! ��� grita. O fio �� curto. Ele ago-
ra, com os olhos esbugalhados, tenta subir pelo fio. ��� Me
ajude pessoal, puxem o fio! Dezenas de m��os est��o
tentando al����-lo, mas suas m��os est��o se desprenden-
do e o corpo se faz no espa��o. Todos, tanto aqui do
heliporto como l�� em baixo, soltam horr��veis gritos de
desespero. Eu senti o seu corpo que se esborrachou no
terra��o do pr��dio vizinho que �� bem mais baixo do que
o que est�� em chamas. Agora as labaredas est��o apa-
recendo, est��o no andar de baixo da ��rea e saem t��o
altas que cobrem quase todo o lado direito do heli-
porto. N��s corremos todos para o lado esquerdo. De
repente o vento joga-as para onde estamos e, em p��-
nico e aos gritos, corremos para o outro lado. Um ra-
paz grita: ��� "N��o aguento mais!" Sobe na amurada e
m��os se erguem para segur��-lo, mas ele se perde no
espa��o, caindo no mesmo lugar que o seu companhei-
ro de infort��nio. N��s tamb��m estamos tr��mulas e de-
sesperadas, pois n��o sabemos se vamos sair daqui com
vida. Nuvens de fuma��a negra cobrem, sufocando-nos.
Gritos dos que est��o fechados l�� dentro, o calor do fogo
ferindo e fazendo desmaiar muitos dos que me ro-
deiam . Mais um jovem salta para a morte e vai reunir-
se aos dois primeiros, no edif��cio da Rua Pedro Am��-
rico. Perto de mim est�� uma jovem gritando de dor,
pois uma gigantesca labareda que acaba de passar le-
��� 1 8 7 ���
vada pelo vento, deixou um bafo t��o quente que arran-
cou toda a pele da perna e do bra��o dela, que est��o em
carne viva, ficando logo assustadoramente inchados.
J�� s��o dezoito horas e os helic��pteros continuam
tentando descer, mas parece que eles est��o temendo o
desabamento do pr��dio. Se o pr��dio desabar morrer��o
mais de mil pessoas, pois entre n��s que estamos aqui
no heliporto e os que est��o l�� dentro, calcula-se esse
n��mero. Estamos ouvindo pelo r��dio que o Governa-
dor de S��o Paulo, Sr. Laudo Natel, est�� autorizando a
mobiliza����o de todas as ambul��ncias estaduais, para
que possam socorrer as v��timas do inc��ndio. Tam-
b��m ouvimos o diretor do Pronto-Socorro do Hospital
das Cl��nicas, Sr. Valdomiro de Paula, que mais de trin-
ta m��dicos, anestesistas e enfermeiros est��o de pronti-
d��o para atender os atingidos pelas chamas. Est��o pre-
paradas camas, macas, nos p��tios do hospital e filas
de doadores de sangue se fazem presentes. Agora, Regina
um helic��ptero tenta pousar no meio da mais negra
fuma��a, mas uma dezena de pessoas corre pisando nos
que est��o desmaiados para serem as primeiras a salvar-
se. Mas o helic��ptero sobe novamente. O sargento Se-
rafim, pede calma dizendo que o salvamento s�� ser��
poss��vel se todos tiverem calma e sangue-frio. O sar-
gento quer dominar o p��nico e grita:
��� Pessoal! Senta! Senta! Senta!
Todos, como d��ceis crian��as, sentam no ch��o, que
est�� em brasa.
��� Levanta! Levanta! Levanta!
Todos se levantam.
Assim o sargento Serafim prepara a sinaliza����o
para o primeiro pouso.
Sinto-me como num manic��mio.
O sargento gritando:
��� 188 ���
��� Senta! Levanta!:
Estouros de vidros quebrados, pessoas esmurran-
do a porta para entrar, os helic��pteros sobrevoan-
do sem poder pousar, pessoas rasgando as roupas,
outras queimadas soltando urros de dor, outras des-
maiadas e outras se atirando no espa��o. Agora o sar-
gento Cassariga pede a alguns rapazes para colabo-
rarem.
��� Voc��s que est��o bonzinhos, ajudem aqui, a gente!
Fazem um cord��o de isolamento, para a descida
do primeiro helic��ptero que surge, envolto em uma nu-
vem de fuma��a, e tenta o pouso. Mas o povo invade a
pista e ele al��a v��o, novamente. Apesar disso, quatro
pessoas conseguem pular a bordo, tendo uma se agar-
rado no esqui no aparelho e com grande esfor��o �� pu-
xada para seu interior.
��� O resgate come��a muito mal, grita o Capit��o
Caldas, (outro militar que pulou de um helic��ptero
para manter a ordem). ��� Tudo fracassar�� se houver
novas invas��es. Vou pedir refor��os, outro tumulto e
estaremos perdidos.
��� Perdidos porque, Capit��o? ��� falou uma jovem,
chorando:
��� Ent��o o pr��dio pode desabar?
��� Vai desabar! Vai desabar! gritava a multid��o
hist��rica.
��� Calma! calma! ��� O pr��dio n��o desabar��. Eu e
os dois sargentos estamos aqui, n��o �� verdade?
E n t �� o . . . ��� Olhe, vamos mantendo a ordem, est�� che-
gando outro helic��ptero.
O aparelho pousou e as pessoas invadiram-no em
grande tumulto, mas tiveram que descer �� for��a, pois
a ordem era de que, em primeiro lugar, fossem embar-
cadas as pessoas desmaiadas.
��� 189 ���
Foi, requisitado socorro m��dico urgente, pois o n��-
mero de queimados pelo morma��o era cada vez maior.
Agora est�� chegando um outro helic��ptero, de onde
descem oito m��dicos, trazendo apenas o equipamento es-
sencial e muito leite, que me obrigam a tomar dizen-
do que �� bom para combater a intoxica����o da fuma��a.
Mas o engra��ado �� que ningu��m quer beber o leite.
Apanham o saquinho e despejam no rosto, bra��o, per-
nas, enfim, banham-se com ele.
O salvamento est�� sendo feito normalmente. J�� s��o
poucas as pessoas para serem levadas, por isso o sar-
gento Serafim manda que se abra a porta do terra��o.
Estou bem em frente a porta aberta. O espet��culo ��
horr��vel. H�� gente caida por toda a escadaria. Muitos
gemidos e pedidos de ��gua.
Agora, Regina, ou��a a voz desse bravo sargento Cas-
sariga.
��� Gente, voc��s est��o salvos, mas precisam colabo-
rar. Vamos subir devagar, com muito cuidado. N��o
podemos carregar todos de uma vez. �� preciso or-
dem. Calma.
Os sargentos descem a escada devagarinho para n��o
pisar nas pessoas amontoadas e desmaiadas. Algumas
pessoas, horrivelmente queimadas, rastejam escada aci-
ma. Uma mo��a, trazida nos bra��os pelo sargento Cassa-
riga, o agarra e, beijando-o, grita:
��� Voc�� me salvou! Voc�� me salvou!
O sargento chora.
Por toda a escadaria dos ��ltimos andares, as cenas
s��o as mesmas.
Agora, o sargento Serafim faz a respira����o boca-a-
boca, num homem desmaiado, enquanto o sargento
Cassariga massageia-lhe o peito.
��� 190 ���
O homem volta a s�� e �� levado para cima. A essa al-
tura j�� �� noite fechada. O sargento escreve um D (des-
cida) no ch��o, para orientar o pouso. Pede lanterna e
o pr��ximo helic��ptero traz umas quarenta.
Muitas pessoas simulam ferimentos para serem co-
locados na turma de prioridade. O maior medo de todos
�� que o pr��dio desabe.
O horrendo crepitar do fogo continua, agora subin-
do e entrando pela porta aberta do terra��o.
Uma chama enorme passa por perto queimando-me
as pernas que est��o em carne-viva, ardendo infernal-
mente. Levanto o bra��o, para me defender de outra la-
bareda e a mesma fica sem pele. Olhe, Regina, n��o sei
se esse gravador chegar�� at�� voc��. Escute, estou dando
o seu endere��o. Se algu��m achar esse gravador, pe��o en-
tregar a Regina de Albuquerque, A v . . . n . �� . . . arjt.��...
Guanabara.
Por um momento pensei que ia desmaiar, a fuma-
��a e o calor est��o aumentando. Penso estar com qua-
renta graus de febre. H�� muitos feridos na minha fren-
te para entrar no helic��ptero.
Uma menina, perto de mim, grita, chamando o pai.
Come��o a ter uma sensa����o de frio e forte sonol��n-
cia. A menina continua gritando pelo pai. Quero me
afastar dela e ando para a porta do terra��o que pare-
ce uma enorme boca escancarada, vomitando fogo. Olho
para tr��s e a menina chora, a menina est�� num imenso
espa��o vazio. A menina est�� falando e dela sai a mi-
nha voz gritando:
��� N��o papai! N��o papai!
Estou ca��da e sinto o peso de meu pai, o p��nis de
meu pai entrando em mim. Meu corpo treme. Aperto a
cabe��a.
A porta est�� a um passo envolta em fogo.
��� 1 9 1 ���
Ou��o, ainda, a menina chamar pelo pai, os feridos
gemendo, o povo gritando, os helic��pteros sumindo a fu-
ma��a me sufocando e o fogo cresce na minha frente, me
mostrando essa enorme cidade feita s�� de ferro, cimen-
to e pedras. O f o g o . . .
Onde estou? Meu corpo, �� uma chaga. Como doi!
Dou mais um passo em dire����o ao fogo.
Eu n��o quero voltar para o apartamento. O ho-
mem fez com que eu chupasse a noite toda. Minha boca
doi. O fogo est�� a um passo. Minha fam��lia, onde est��?
Meu pai em cima de mim!
Mais um passo.
O fogo. O fogo. O f o g o . . .
��� 192 ���
Fiquei olhando para o gravador, estupificada, n��o
sei quanto tempo. Subitamente, sa�� correndo, batendo
todas as portas e me vi frente a mam��e que saia do ele-
vador e, me vendo transfigurada, abra��a-me.
A��, chorei, histericamente gritando:
��� Mam��e, quero ir para S��o Paulo, Ivete deve estar
ferida, queimada.
��� Ivete, morreu, Regina!
Olhei para mam��e, com os olhos esbugalhados, e
balbuciei.
��� Mor-re-e-e-e-u?
��� Queimada. No grande inc��ndio do pr��dio da Pi-
rani. Na televis��o, um policial me procurou e me en-
tregou uma carta revelando o encontro do cad��ver de
Ivete, totalmente carbonizado.
Ivete se suicidou.
XIV
Juventude... P a r e . . .
As ondas n��o cessam de ir e vir, ainda sujas pela tor-
rencial chuva que caira durante a noite. O c��u parece
lavado do grande calor que abrasou a Guanabara. Estou
deitada na praia sentindo a umidade penetrar no meu
corpo. A praia est�� deserta. Contemplando-a, vejo que
ela me faz lembrar muito de Ivete e consegue, realmen-
te, me fazer acreditar que aquele belo e jovem corpo ��
um peda��o de qualquer coisa calcinada. A��, debru��o-me
na areia e choro hist��ricamente. Ivete. Ivete agora �� um
peda��o de carv��o, jogada n��o sei onde. Tudo estava em
peda��os. Mam��e passa as noites com homens da novela
e pouco aparece em casa. Papai iniciou uma viagem
pelo mundo onde participar�� de v��rias confer��ncias so-
bre o transplante de cora����o.
R a u l . . . Raul. Onde est�� Raul? N��o consigo v��-lo.
Levantei-me sacudi a areia dos cabelos e enchuguei os
olhos com as costas da m��o. Olhei para o mar. O mar
que tanto Ivete e eu adorava-mos estava melanc��lico e
parecia-me cada minuto mais l��gubre e as ondes que
tantas vezes pulava-mos as gargalhadas formavam fi-
guras fant��sticas ornadas de sinistras aur��olas que me
chamavam para seus bra��os deformados. Comecei a an-
dar para elas cambaleante como se estivesse b��bada.
��� 195 ���
De repente flutuando em cima de uma grande onda
Ivete com os bra��os estendidos sorrindo para mim.
Chamei-a aos gritos, mas e la virou-se e subindo e
descendo conforme o movimento das ondas fugiu de
mim se perdendo na bruma, seca que come��ava a cobrir
o mar. Pensei que estivesse ficando louca, sentia mes-
mo que tinha avan��ado um pouco al��m do limite que
separa a raz��o da dem��ncia.
J��. me via num hosp��cio naquela vida de pavorosa
monotonia. Comecei a tremer e sentir a garganta quei-
mar como fogo. A ��gua chegava aos meus joelhos. Mi-
nhas pernas estavam bambas e era com enorme sacri-
f��cio que conseguia empurrar a ��gua para mais um
passo.
Aonde estava indo?
A h ! J�� me lembrava. Procurava chegar at�� onde
Ivete estava. Ela tinha desaparecido ali, ali adiante.
Agora a ��gua se enroscava a minha cintura como
uma serpente que se retorcia e estendia a l��ngua ver-
melha, mostrando os dentes num macabro sorriso. Sen-
ti que meu cora����o acelerava e eu tremia de medo. Ive-
te, gritei chorando. Ivete:
A ��gua j�� alcan��ava os meus ombros. Minha cabe-
��a doia horrivelmente.
Eu sabia que a morte tinha o comprimento de um
palmo, e poderia cobrir num segundo a minha cabe��a.
Mas n��o retrocedi um passo. Meus olhos vagaram por
todos os lados. Estava s��, castigada pelo vento que co-
me��ara furioso levantando meus cabelos pelo ar e sen-
tia que as minhas palavras eram som, palavras que s��
Ivete podia ouvir.
��� Porque corremos tanto? Porque n��o aceitamos
a juventude nos dar, o que oferece a todos os jovens de
mente sadia? E. Corremos. Corremos muito. E o fim do
��� 196 ���
caminho �� um imenso espa��o angustiante e negro onde
estou entrando.
Acabou de ler?
Que far�� agora?
Est�� deprimido?
Eu s a b i a . . .
Fa��a como eu.
Diga para a juventude:
Jovem, n��o corra tanto. N��o entre no mundo do
adulto sem chegar a sua vez. Pise nos seus anos, pas-
so a passo, sem sair um pouquinho do caminho limpo
da lei. Juro, que, assim, voc�� n��o encontrar�� aquele bu-
raco negro, fundo e vazio que nos mostra ADELAIDE
CARRARO.
��� 197 ���
tos criticar��o esse livro.
Mas, intimamente, acei-
tar��o, gostar��o e ir��o de-
vorar at�� a ��ltima pala-
vra com sofreguid��o; por
tratar-se de verdades, que
desejamos, e necessita-
mos conhecer.
Era preciso que surgis-
se ADELAIDE CARRA-
RO, esta mulher extraor-
din��ria, que profunda-
mente sens��vel aos pro-
blemas alheios, atira-se
contra tudo, e contra
todos na defesa dos me-
nos protegidos da sorte,
com a ��nica arma que se
faz mister, e sabe usar:
"A Pena" a arranc��ndo-
nos dos olhos, a venda,
que nos impossibilita de
ver nos bastidores da so-
ciedade toda sua imund��-
cie!
Mas, n��o" se escandali-
zem.
�� o s��culo XX, em toda
plenitude. �� a b��blia, com
suas predi����es c r i s t �� s ,
desfolhando-se em sua
��poca exata.
De: Bons Amigos lançamentos
Sinopse:
Ficou órfã aos quatro anos e foi viver em um orfanato na cidade
Seu primeiro texto que chegou ao conhecimento público foi a crônica Mãe, que lhe rendeu um prêmio aos treze anos de idade.Nunca se casou, mas adotou 2 crianças.
Adelaide Carraro deixou uma obra bastante extensa, com mais de quarenta edições, tendo mais de dois milhões de exemplares vendidos, entre eles O estudante, O estudante II, O Estudante III, Meu professor, meu herói e Eu e o governador. Este último é o seu texto mais polêmico, referente à descrição de um suposto romance com Jânio Quadros em seu período como governador de São Paulo. Outro livro polêmico da autora é "O Passado Ainda Dói", cujo tema é sua breve passagem como repórter da TV S, de São Paulo, emissora do SBT. Adelaide Carraro faleceu aos 55 anos de idade, vítima de câncer, e deixou como legado, 46 livros publicados.
Seus livros foram lançados pelas editoras Livraria Exposição do Livro, L'Oren, Global, Gama e Farma Livros. Sua grande rival, no mundo literário, era a escritora Cassandra Rios, cujos livros eram publicados pela Editora Record.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Adelaide_Carraro
Lançamento :
a)https://groups.google.com/forum/?hl=pt-BR#!forum/solivroscomsinopses
b)http://groups.google.com.br/group/bons_amigos?hl=pt-br
Este e-book representa uma contribuição do grupo Bons Amigos para aqueles que necessitam de obras digitais como é o caso dos deficientes visuais e como forma de acesso e divulgação para todos.
Lembre-se de valorizar e reconhecer o trabalho do autor adquirindo suas obras
Livros:
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