sexta-feira, 6 de dezembro de 2019 By: Fred

{clube-do-e-livro} LANÇAMENTO: ESCURIDÃO - ADELAIDE CARRARO - FORMATOS : PDF, EPUB,RTF E TXT

ESCURID��O



D A M E S M A A U T O R A :

A D E L A I D E C A R R A R O

L . O R E N

EDITORA E DISTRIBUIDORA DE LIVROS LTDA.

S��O PAULO



Capa de

MARIO DECIO CAPELOSSI

Direitos autorais adquiridos por:

L. OREN ��� Editora e Distribuidora de Livros Ltda.

Escrit��rio: Avenida Ipiranga, 1.100 - Sala 22

Fone: 34-5338 - S��o Paulo

Impresso no Brasil





1 9 7 4


�� N D I C E G E R A L

I Virgens Neur��ticas 11

II Filosofia? Cada Dia um Homem! 35

III 40 Anos. Seios Duros 47

IV Dinheiro ? Os Homens me dar��o 59

V Dr. Voc�� ter�� uma filha Prostituta 63

VI Gr��vida? P��lulas 79

VII Meus 15 Anos Fervem 85

VIII Largue-me... doi 93

IX Festa do Vale Tudo 103

X O Sem Vergonha 109

XI Oito Homens. Duas Meninas 129

XII Aquela?!? Dorme com o Diretor 155

XIII De uma Chupadinha 179

XIV Juventude.. . Pare 195

P R E F �� C I O

�� bem dif��cil classificar mais um livro de ADE-

LAIDE CARRARO. Quando ela lan��ou o livro "Eu E O

GOVERNADOR", pensei tratar-se apenas de "fofocas", para fins comerciais. Mas, na propor����o em que foram

saindo os seus livros, percebi a t��trica realidade. ADE-

LAIDE CARRARO conta em seus livros toda a verdade

n��a e crua. Verdades que j�� foram notici��rios de Im-

prensa Falada, Televisionada e Escrita. ADELAIDE

CARRARO, uma fr��gil mulher, quase que desamparada,

tem enfrentado sozinha graves problemas com os seus

livros, mas a corajosa escritora n��o deixa de rasgar o

v��u das apar��ncias para revelar-nos, ao vivo, quase todas

as chagas que trituram a nossa sociedade. Neste livro

"ESCURID��O", ADELAIDE CARRARO, na sua natu-

ridade, chega a causar-nos arrepios. Ficamos choca-

dos ao ler este livro, pois n��o acreditava-mos que fosse

poss��vel existir indiv��duos como o pai de Ivete, desti-

tu��do de qualquer freio psicol��gico. Porisso somos obri-

gados a acreditar que existe gente sem escr��pulo e as

vezes as encontramos no mais alto escal��o da socie-

dade.

Toda essa est��ria faz de "ESCURID��O", a nascente

da deprava����o, um fogo vivo em nossas m��os.

Quer um conselho? Deixe de lado a classifica����o li-

ter��ria e veja, depois de terminar de ler mais esta fan-

t��stica obra da querida e corajosa escritora, que resta-

r�� um ardor de fogo, uma brasa viva dentro de voc��.

JO��O DA SILVA PEREIRA



I

Virgens Neur��ticas

Estamos no m��s de Fevereiro. Em S��o Paulo, o ca-

lor �� infernal. Tem horas que chega aos trinta e oito

graus. Isto, para os paulistas, �� um calor de amargar.

Principalmente para n��s, as alunas do Col��gio Sinai,

um dos mais luxuosos dessa cidade, pois as freiras n��o

permitem que usemos trajes mais leves. �� por demais

horr��vel termos que nos abafar dentro destas saias

azuis de um pano um pouco mais grosso que tergal.

Ainda por cima, completando esse torturante uniforme,

temos meias tres-quartos, sapatos pretos pesados e cor-

pete tamb��m azul, sob as saias ��� por si s�� just��ssimas.

Sentimo-nos mais ou menos como v��timas daqueles tor-

niquetes medievais...

O col��gio �� um casar��o estilo colonial, com um mon-

te de janelas amea��adas de desaparecer (por causa das

trepadeiras que sobem pelas paredes, sempre muito bem

cuidadas) e com grupos de chamin��s apontando o c��u,

como se fossem de uma f��brica ou como se fossem imen-

sos falos. Todo o grande edif��cio �� de tijolos expostos e

��� 11 ���

telhas na mesma cor ��� um fosco e escuro alaranjado

��� e �� cercado por um gigantesco parque. Quando che-

guei aqui, logo que bati os olhas nele, fiquei deveras

impressionada. Achei o parque, e tudo o mais, uma be-

leza.

�� uma boa lembran��a e s s a . . .

Agora, eu estou sentada, n��a, ao lado da janela.

Lia um livro chamado "Asco", e j�� n��o me concen-

trava mais na leitura. Depositei o livro no colo e fixei

os olhos no quente ver��o que trazia para dentro do

meu quarto o embriagante perfume de rosas. Elas se

espalham, at�� hoje, por toda a volta do col��gio. Era um

perfume que embalsamava at�� o menor cantinho do ca-

sar��o. Depois do roseiral, se estendia a grama, de um

verde brilhante, que chegava a ofuscar os olhos da gen-

te, quando estavam, como agora, batidas pelos raios do

sol. No meio da grama, tamb��m numa constru����o ao

estilo antigo, d o r m e a grande piscina de ��guas azula-

das, onde era permitido ��s meninas um banho de al-

guns minutos. Isso uma vez por semana e, assim mesmo,

de cal����o e malha, o que nos tornava um bocado rid��-

culas, mesmo depois que nos acostumamos a rocambo-

lesca vis��o de uma a outra. Enfim, bem distante do pon-

to de vista da minha janela, l�� embaixo, as frondosas

��rvores, enfeitadas com mesinhas e bancos de pedra,

onde se permitia a presen��a de visitas, em dias determi-

nados. Agora aquilo tudo parecia long��nquo, apesar de

eu ainda estar ali.

Absorvi-me a contemplar o morrer do sol, quando

Ivete, a minha companheira de quarto, entrou e veio

at�� a janela, para o meu lado.

��� ��, Regina, as rosas coloridas fazem um belo con-

traste com o verde escuro das ��rvores... �� uma be-

leza.

Ivete ficou observando alguns segundos na mesma

dire����o que eu e depois continuou:

��� 12 ���

��� O Ver��o, em S��o Paulo, �� muito mais bonito do

que esperava, quando vim para c��. Agora, quando vol-

tar para Recife, vou poder falar da beleza de tudo isto.

Ivete fez um muxoxo, bastante brejeiro, franzindo

o nariz e apontando para nossa direita.

��� Mas? daqueles vasos cinzentos, com aquelas flo-

res amarelas eu n��o gosto. N��o s��o l�� uma grande ma-

nifesta����o de "prefer��ncia". O decorador falhou ali.

Nisso, sentindo a falta da minha participa����o, Ive-

te olhou para o meu colo e viu o livro "Asco". Escanda-

lizou-se, como eu j�� esperava.

��� Nossa, menina! Voc�� quer ter outro dem��rito por

estar lendo um livro n��o permitido?

S�� a�� eu acordei. Fui quase intempestiva.

��� Dem��rito n��o me importa! Posso ter d��zias deles

que vou continuar lendo este l i v r o ! . . .

Ivete n��o entendeu bem a minha pequena explo-

s��o. N��o tinha condi����es de entender. Apenas balbu-

ciou:

��� Mas por que?

Continuei no mesmo tom, pomo se n��o tivesse in-

terrompido a minha frase anterior:

��� Ele me lembra muit��ssimo o problema da minha

m��e! Como voc�� sabe, ela n��o sai das televis��es! Pica

l�� se arrastando aos p��s daqueles imundos, em busca

de um lugar em alguma novela! Essa autora foi mui-

to feliz fazendo este livro! �� um grande exemplo! Prin-

cipalmente para as mocinhas gananciosas e, ao mesmo

tempo, ing��nuas, que querem o estrelato f��cil e acabam

perdendo tudo sem conseguir nada!

Ivete estava um pouco em estado de confus��o quan-

do eu me interrompi.

��� 13 ���

��� Mas, se a Madre souber que voc�� est�� lendo "isso",

vai ter um frege neste col��gio!

V�� que Ivete n��o iria compreender com facilidade.

Procurei encurtar a conversa, ent��o.

��� Eu digo a ela que pensei que o livro estivesse na

lista de autores permitidos.

��� De qualquer maneira, voc�� tinha que pedir per-

miss��o ao Servi��o de Censura de Livros do col��gio.

Ivete n��o estava sendo inteligente, era f��cil de ver

��� Digo que presumi que isso n��o fosse necess��rio.

Voc�� sabe que eu n��o gosto de dar satisfa����es do que

fa��o, a essa gente. N��o dou satisfa����es do que fa��o, nem

aos meus pais.

Ivete enveredou por outro caminho. No fundo, es-

tava gostando da minha atitude.

��� A Mestra me disse, hoje, que voc�� �� uma menina

brilhante e que deve ajudar a endireitar a sua compa-

nheira de q u a r t o . . .

Agora fui eu quem se surpreendeu e ficou um pou-

co em confus��o. Ivete soltou uma gostosa gargalhada.

��� Imagine, uma menina de quinze anos como voc��,

endireitar uma louca como e u ! . . .

Ivete come��ou a circular pelo quarto, de bra��os aber-

tos, quase dan��ando, como uma lev��ssima gazela. N��o

se interrompeu, e agora, atingia as bordas da ironia,

de uma ironia contida, amarga, como se estivesse com

vontade de chorar.

��� Ivete Cerqueira Cesar, da mais rica fam��lia de

Pernambuco, que d�� milh��es e milh��es pra sustentar

este imenso santu��rio de meninas que est��o loucas pra

sair por a��, abrir as pernas e dar a virgindade a quem

de boas condi����es pra entender por que elas est��o dando!

��� 14 ���

Ivete, enfim, parou no meio do quarto, deixou cair

os bra��os, suspirou fundo e concluiu entredentes:

��� Eu sou a primeira a querer pular essas grades,

pois sinto coisas muito boas quando estou perto de ho-

mem! Eu n��o gosto de escola, nem no Ver��o, nem no

Inverno, nem em qualquer outra esta����o!...

Ent��o, como eu em certas ocasi��es, sem sair do tom

empregado, Ivete mudou completamente o caminho do

assunto.

��� S�� gosto das f��rias! E, por falar em f��rias, eu

aproveitei um bocado as ��ltimas! Espero que voc�� tam-

b��m tenha aproveitado as suas ��� quero dizer, com a

sua fam��lia, com a sua m��e, o seu pai.

Demorei alguns segundos para me levantar da li-

geira letargia em que Ivete havia me lan��ado. Mas con-

segui .

��� Ah, isso de ficar com papai e mam��e n��o faz

diferen��a nenhuma. Falei, deixando o livro sobre a

pequena mesinha pr��xima a janela e me enrolando nu-

ma toalha. ��� Eles sempre jogam a culpa um no ou-

tro por n��o poderem passar as f��rias comigo. Mas eu

n��o ligo. Tenho sempre uma amiga �� disposi����o, e fa��o

da fam��lia dessa amiga a minha fam��lia. Quando a mi-

nha m��e fica sabendo onde eu estou, vai me buscar e

diz que a culpa �� de meu pai. Ela diz que nas minhas

f��rias ele sempre arranja um monte de servi��os extras

e viaja pros confins do judas, l�� pro estrangeiro. Quan-

do ele volta, diz que a culpa �� da minha m��e que me

deixa no col��gio nos feriados e na casa de amigos nas

f��rias. Minha m��e grita que o contrato na tv n��o per-

mite que ela saia quando lhe d�� na bola e que meu pai

�� quem tem obriga����o de vir me buscar.

Aqui, n��o pude evitar ser tamb��m um pouco

amarga.

��� 15 ���

��� Nas minhas f��rias h�� sempre grandes "arranca-

-rabos" l�� em casa. Fazem dramalh��es anormais pela mi-

nha aus��ncia. E imagine voc�� que est��o separados...

Por a�� j�� d�� pra voc�� fazer uma id��ia do que passei

quando estavam juntos. Era um inferno, uma briga

atr��s da outra, e eu ��a sempre a favor da minha m��e.

Parecia que eu me recuperava daquela neurose. Es-

tava ficando melhor a lembran��a.

��� Como eu lhe disse uma vez, eu e ela nos compre-

endiamos muito bem. Pelo menos naquela ��poca, pois

hoje n��s apenas fingimos que nos damos bem.

N��o sei por que, voltei a mim, voltei a enxergar

Ivete. Talvez fosse o meu estado de consci��ncia, a cons-

tante depress��o... Ivete estava deitada na cama, ba-

lan��ando as pernas para o ar. Perguntei, de s��bito:

��� Existe alguma afinidade entre voc�� e seus pais?

Ivete, que parecia n��o se inteirar do meu proble-

ma ou do que eu dizia, parou de balan��ar as pernas no

ar, naquela inoportuna gin��stica, e ficou mais ou me-

nos avermelhada, enquanto gaguejava para responder:

��� Meu pai �� um velho �� antiga. N��o gosta que eu

frequente festas e saia com rapazes. Mas eu saio assim

mesmo e dou aos rapazes todas as liberdades poss��veis

e imagin��rias. As vezes chego em casa com o batom

todo deformado e �� a�� que as coisas esquentam. Eu acho

infernal o meu pai gritando: "Qualquer dia eu te mato!

Voc�� tem que se portar como uma Cerqueira Cesar, n��o

andar por a�� deixando-se bulinar por esses cabeludos

de cal��as apertadas! Eu te mato! Juro que te mato! Voc��

tem que se casar virgem, de v��u e grinalda, como man-

da a tradi����o da fam��lia! E se algum dia, eu n��o a sou-

ber virgem, juro que te mato!"

Ivete riu nervosamente, uma risadinha ir��nica, e,

ap��s a explos��o, debru��ou-se sobre a janela e ficou olhan-

��� 16 ���

do para o parque. Tinha um belo corpo a minha com-

panheira de quarto, um corpo jovem, quente e colan-

te. N��o sei por que, ela topou naquele assunto, e justa-

mente naquele m o m e n t o . . .

��� Voc�� sabe, Regina, que neste intrenato de vir-

gens neur��ticas, quase todas sentem um pequeno for-

migamento pelas outras e at�� mesmo pelas professo-

ras . . .

N��o entendi a princ��pio, mas, logo em seguida, Ive-

te tornou-se mais clara:

��� Voc�� sabe que desconfiam de n��s? Isso �� devi-

do ao fato de voc�� ter cortado contacto com o resto das

meninas e se concentrado mais em mim. Elas s��o umas

invejosas...

S�� n��o entendi aonde Ivete queria chegar.

��� E da��?

��� Da�� que elas pensam que voc�� me ama.

N��o me preocupei muito com aquilo.

��� Elas que v��o pro inferno!

��� De mim elas n��o podem dizer nada, pois eu j��

tive muitos homens e vida livre fora do col��gio.

��� E a meu respeito eu n��o me importo com o que

possam pensar.

Ivete, ent��o, desviou os olhos do parque l�� fora para

mim.

��� Eu acho, Regina, que voc�� devia viver melhor,

por que, queira ou n��o, voc�� poder�� ser escolhida a Rai-

nha da Primavera este ano. Eu sei que vai fazer voc��

muito feliz e voc�� deve ficar mesmo muito feliz por que

��, realmente, a mais bonita de todas n��s. Mas voc�� sabe

que a escolha �� atribu��da por m��ritos, que s��o uma es-

p��cie de atestado moral. Assim, �� necess��rio compreen-

der que se voc�� deseja ser aceita, n��s devemos, cortar

��� 17 ���

as nossas liga����es. Se n��o tomarmos cuidado, podemos

acabar numa situa����o dif��cil. Acho que para o nosso

bem devemos nos separar. Voc�� poder�� ficar no quar-

to da Arlete, eu j�� falei com ela.

��� Mas eu gosto �� de voc��, Ivete, eu amo �� a voc��.

Algu��m j�� disse que devemos amar-nos uns aos outros.

Se nos separarmos agora, vai ser uma esp��eie de con-

firma����o a esses falat��rios, penso eu.

Ivete voltou novamente os olhos para o parque l��

fora.

O que pensam, essas idiotas, que fazemos?

��� Elas pensam que fazemos amor.

��� Pois se eu nem mesmo sei como se faz isso entre

duas mulheres. Voc�� est�� transformando o pensamen-

to das alunas em algo repulsivo.

Ivete, que nessa altura j�� tinha se colocado mais

�� vontade, come��ou a procurar pincel e esmalte para

pintar as unhas. Logo os encontrou, enquanto continuou

no nosso assunto.

��� �� uma caceteac��o dos diabos pra mim o que

est�� acontecendo. Esse falat��rio me deixa com a cuca

fundida. Eu sempre digo a essas meninas que durante

a noite falamos de livros. Digo que voc�� me empresta um

livro e, depois que eu leio, falamos a respeito dele.

Ivete deixou os apetrechos de pintura sobre a sua

cama e come��ou a despir-se. Mais do que nunca, seu

corpo me parecia lindo. N��o se interrompeu a�� tamb��m,

e nem me deu chance de um aparte.

��� Digo que �� pelos livros que nos damos bem assim.

Eu gosto, voc�� gosta, e assim vamos indo. Digo tamb��m

que voc��, apesar de ter s�� quinze anos, �� dona de uma

��� 18 ���

esp��cie de tranquilidade muito original. Digo que �� cal-

ma, ponderada, consciente, de uma consci��ncia dif��cil

de encontrar em adolescentes, hoje em dia.

N��a, com os seios balan��ando gelatinosamente de

acordo com os movimentos do corpo, Ivete se interrom-

peu. Ficou bastante p��lida, olhando para mim, e teve

coragem, ou for��as, de continuar. Ela, sobretudo, n��o

era mentirosa nata. S�� conseguia mentir tranquilamen-

te para os pais. Procurei ser ao m��ximo objetiva, ent��o.

��� Olha, Ivete, vamos ficar aqui neste quarto, e

sem ligar a seja l�� o que for que possam dizer ou pen-

sar! Eu j�� estou cheia de tudo isso! E depois, voc�� tam-

b��m �� inteligente o bastante pra n��o se importar com

mexericos! Isso �� coisa pra crian��a!

Ivete se irritou mais ainda com a minha observa����o.

��� Crian��a n��o tem vida social e sexual fora da es-

cola! E eu tenho!

��� De uma forma ou de outra, voc�� n��o precisa ser

t��o agressiva. Eu estou apenas tentando ajudar. N��o

acho direito voc�� ficar sofrendo por causa desses fala-

t��rios .

Ivete n��o aproveitou a pausa que dei. Passou a pin-

tar as unhas dos p��s. E n��a. o aue, pelas vis��es que

proporcionava, me deixava pouco �� vontade. Mas con.

tinuei assim mesmo.

��� Voc�� diz que tem vida social e sexual l�� fora,

diz que tem quantos homens queira e n��o sei mais o

que, mas lembre-se de uma coisa: do que eu aprendi em

apenas um ano, lendo livros que a professora de Ingl��s

me empresta, voc�� n��o faz nenhuma id��ia.

Sem tirar os olhos das unhas dos p��s, Ivete retru-

cou:

��� 19 ���

��� Voc�� s�� sabe de teoria. Na pr��tica �� mais di-

vertido e, na pr��tica, eu sei tudo.

��� Eu tamb��m posso ser t��o "entendida" quanto

voc��, se me ajudar. Mas enquanto estamos aqui den-

tro, sinto que h�� qualquer coisa em que posso me apoiar

pra ser superior. Aqui dentro, �� poss��vel conversar com

as professoras que gostam da gente, com a Madre e

com as outras, sem precisar ficar me defendendo de

"coisas".

��� N��o adianta nada perder tempo. Ou a gente co-

nhece "coisas" agora ou nos arrependemos pro resto

da vida, n��o importa o que se conhe��a depois. O que

n��o temos �� sempre mais importante do que o que te-

mos. Se voc�� espera, depois vai �� conhecer os amigos

de mam��e. Aqueles que a mam��e indica. E s��o sempre

da nossa idade.

��� A�� �� que est�� a quest��o, Ivete. Voc�� diz que as

pessoas da nossa idade a aborrecem e fica se preocupan-

do com o que elas pensam a nosso respeito. Voc�� nun-

ca vai aprender a viver no seu tempo se for atr��s de

conversa f��til, seja de velhos ou de jovens. Realmente,

n��o a compreendo. Acho que aqui dentro do col��gio

voc�� tem uma ��tima oportunidade de aprender, se gos-

ta de gente velha ou mo��a. �� uma experi��ncia impor-

tante, que s�� a conviv��ncia com as meninas do col��-

gio pode dar a voc��.

Houve alguns segundos de sil��ncio e depois Ivete

atirou com toda for��a o vidro de esmalte contra a pa-

rede. O vidro se espatifou, sujando tudo de vermelho.

Havia se convencido de que eu tinha raz��o. Esperei pas-

sar a explos��o para depois continuar. Apontei a parede.

��� Olhe a parede. Com essa mancha voc�� vai ter

uns mil dem��ritos. Aposto que vai ser dif��cil at�� conse-

guir permiss��o para sair do quarto agora.

20 ���

Ivete encarou-me, os olhos fuzilando:

��� Ora! E quem vai ver? E que me importa a pa-

rede!

��� H�� o risco de uma inspe����o! Eu s�� quero �� sair

daqui! Estou louca pra fumar, pra beber, pra ter os ho-

mens! �� s�� o que eu quero!

Preferi me calar. N��o adiantava nada mesmo. Ive-

te jogou-se na sua cama e ficou de olhos pregados no

teto. Eu fui arrumar meus livros e a�� chegou Arlete.

Ela entrou no quarto, como sempre fazia, intempestiva-

mente, falando em altos brados. Era tamb��m uma be-

l��ssima jovem, alta, com um corpo escultural.

��� Oi, gente, olhem o que estou trazendo.

Arlete tinha um cigarro esquisito nas m��os, nada

constru��do profissionalmente, industrialmente. Parecia

mais um cigarro de palha, desses que os homens do cam-

po fazem com tanto carinho. E a rec��m-chegada foi di-

reto a Ivete, que, j�� sabendo do que se tratava, pulou

da cama.

��� Primeiro eu!

Arlete sentou-se �� beira da cama, junto com Ive-

te, as duas comentando aquele estranho cigarro. Arlete

parecia n��o reter o contentamento. Estava exfuziante.

��� Vamos encher a caveira hoje! Vamos voar!

Ivete j�� estava com o cigarro nas m��os, e Arlete

percebeu a sofreguid��o com que a primeira vivia o mo-

mento.

��� �� s�� uma tragadinha, heim! Pois o "pacau" cus-

tou caro �� bessa!

Ivete n��o ouviu a recomenda����o de Arlete. Sugou

violentamente o cigarro.

��� Isso deixa a gente pensar que est�� no meio de

um monte de h o m e n s . . .

��� 21 ���

Arlete insistiu na recomenda����o. As duas tinham

se esquecido de mim. Era como se eu n��o estivesse pre-

sente .

��� N��o aspire com tanta for��a. Esse �� dos melhores

que existem.

Ivete j�� tinha queimado o fumo a uma boa quan-

tidade. Ent��o come��ou a tossir, at�� ficar quase verme-

lha. Arlete n��o tinha outra coisa a fazer sen��o rir. Eu

ainda n��o havia me recuperado da surpresa inicial. Foi

tudo muito r��pido.

��� Porra, n��o �� que �� forte m e s m o . . . !

Arlete n��o deu tempo a que Ivete se recuperasse.

Tomou-lhe o cigarro das m��os e veio na minha dire����o.

��� Agora voc��, Regina!

Sem querer ser polida, recusei a oferta. Aquilo me

assustava.

��� N��o, eu n��o quero esse neg��cio. Fica pegando

na garganta da gente.

��� Mas aspirando bem devagarinho n��o vai acon-

tecer nada disso, n��o vai dar nem uma tossezinha. O

que aconteceu com a Ivete foi exatamente isso: ela n��o

teve paci��ncia.

Continuei na esquiva.

��� N��o, sinceramente n��o quero fumar esse ne-

g��cio.

Ivete, que se aproximara por tr��s de Arlete, tomou

novamente o cigarro das m��os dela.

��� Deixa pra mim. Eu fumo.

E Ivete tragou o cigarro parecendo gostar muito.

��� Olha, Arlete, vou fumar at�� a metade numa tra-

gada s��. Quero ver se o efeito fica melhor,.

��� 22 ���

Arlete se divertia com a situa����o. Era t��o invete-

rada quanto Ivete. Ou mais.

��� Fica sim. Eu j�� fiz assim uma vez.

Procurei ponderar. Se nos pegam ali, fumando da-

quela erva, certamente nos expulsariam do col��gio.

��� E melhor dar um jeito de dispersar a fuma��a.

Hoje vai haver inspe����o nos quartos e, se n��o me en-

gano, j�� estou ouvindo pessoas no corredor.

Assustadas com o meu alarme, as duas apanharam

as primeiras coisas que viram ��� as roupas de Ivete so-

bre a cama ���, e come��aram a espalhar a fuma��a pelo

ar, procurando fazer com que ela saisse pela janela. Ao

fim de poucos segundos, s�� ficou um cheirinho estra-

nho pelo quarto, isso ap��s Ivete se atirar na cama, por

baixo das cobertas, e abrir um livro de Latim. Arlete

sentou-se em uma cadeira e fingiu que lia Hist��ria. Eu,

continuei arrumando meus livros e, de vez em quan-

do, olhava para a porta, que, ap��s um suspense terr��-

vel, abriu-se, dando passagem a diretora do col��gio, que

entrou farejando o ar, como uma cadela ca��adora.

Permaneci como estava, mas deixando os livros de

lado, em aten����o �� presen��a da diretora. Arlete levan-

tou-se e Ivete tamb��m, mas procurando enrolar-se nu-

ma coberta, como se a diretora tivesse nos surpreendido.

Ao lado dela estavam duas funcion��rias, e o cigarro eu

n��o sabia onde tinha ido parar.

��� Boa tarde, mo��as.

Respondemos como nos permitia nosso estado de

esp��rito, que era suficiente para que a velha hiena n��o

percebesse nada de anormal no quarto. Em seguida, ela

deu uma volta pelo quarto, da mesma forma que as

duas funcion��rias, examinando minuciosamente todos

os cantos. Depois, fixando-nos alternadamente, ciciou:

��� Ouvi dizer que as senhoritas fumam.

��� 23 ���

Eu fiquei quieta. N��o teria tempo de responder,

mesmo que quisesse, pois Ivete e Arlete arregalaram os

olhos, exclamando quase que ao mesmo tempo:

��� N��s!?!

A diretora cruzou os bra��os, numa atitude de so-

berania .

��� Voc��s sim. Sei s�� pelo c h e i r o . . .

Ivete foi sarc��stica:

��� Eu presumo, senhora diretora, que o cheiro vem

l�� do charuto do jardineiro. Ele est�� trabalhando bem

debaixo de nossa janela.

��� Voc�� n��o deve presumir nada, senhorita Ivete.

�� bom que me apresente fatos da pr��xima vez. Se n��o

apresentar, da pr��xima vez que sentir cheiro de cigar-

ro aqui dentro, voc�� ganhar�� vinte dem��ritos. E com

vinte dem��ritos se perde a metade das f��rias, voc��s sa-

bem.

��� Sim, senhora diretora. ��� Murmurou Ivete, hu-

mildemente .

Depois, com al��vio, vimos a diretora sair. Eu dei-

xei-me cair sentada numa poltrona, e respirando fun-

do de satisfa����o por que a megera n��o descobrira nada,

Ivete e Arlete cairam na risada. Arlete falava, entre

uma risada e outra:

��� Se ela soubesse que cigarro ��, qual a marca que

n��s fumamos, acho que ganhar��amos o bilhete azul hoje

mesmo!

Resolvi interferir naquela manifesta����o de irres-

ponsabilidade .

��� Eu n��o disse! N��o devemos fazer nada de erra-

do, ou, pelo menos que a diretora julgue errado! A me-

lhor coisa que a gente tem a fazer �� estudar!

��� 24 ���

Arlete parou de rir. Ou melhor, continuou. Mas ja

sem a euforia de antes.

��� Eu n��o tenho nada para estudar. J�� fechei em

Franc��s, em Ingl��s, em Hist��ria, j�� fechei em tudo.

��� Eu, n��o, ��� exclamei. ��� Por isso tenho que es-

tudar .

��� Ora, por que voc�� n��o cola? ��� perguntou Ivete.

��� Pode ser uma boa solu����o. ��� confirmou Arlete.

N��o tive tempo para nada. Ivete abriu um outro

caminho na conversa, sombria:

��� Eu, nem colar posso. Da ��ltima vez que fiz isso

com uma colega, o resultado dela estava todo errado.

As duas tiramos zero e repetimos o ano. Foi muito cha-

to por que as duas provas estavam iguaizinhas.

Arlete, que j�� estava se cansando daquele assun-

to, n��o suportou mais.

��� �� melhor parar com isso. Na falta do que fazer

��� a ��nica coisa pra fazer nesse ermo ��� vamos falar

em homens. E, por falar em homens, voc�� j�� foi bei-

jada alguma vez, Regina?

��� N��o.

��� N �� o ? ? ? Voc�� est�� com quinze anos e nunca foi

beijada ? ? ?

��� E voc��, Arlete? ��� inquiriu Ivete.

��� Muitas vezes, por uma por����o de homens. E com

a l��ngua bem molhada.

��� �� bom, n��o? ��� perguntou Ivete, interessada.

Eu j�� estava meio tonta com tanta "sensualidade".

E Arlete respondeu a Ivete:

��� Experimente ser beijada por um desses tipos su-

per-machos e que esteja com a cabe��a cheia de "fu-

ma��a"

��� 25 ���

Ivete come��ava a tremer de prazer.

��� Hum, que t e z �� o . . .

Um vermelho vivo estava cobrindo o rosto de Ivete.

E e]a j�� n��o podia mais se controlar.

��� E depois vem aquela hist��ria de "voc�� tem um

lindo corpo que come��a a adquirir formas" e as m��os

bobas come��am a subir e a descer, pra baixo e pra cima,

na gente.

Houve um fr��mito da parte de Ivete. Ele estava

quase gozando na nossa frente.

��� Assim n��o h�� dignidade que resista... ?

Arlete parecia t��o interessada quanto Ivete.

��� E como voc�� reage depois que p��e a dignidade

de lado?

��� Eu n��o me mexo. Fico com o corpo mole e os

bra��os caidos.

��� U��! Por que?

��� D��i menos.

��� N��o entendi.

��� Se o cara come��a a te bulinar com os dedos, voc��

deve descontrair os m��sculos, deve relaxar.

��� Mas s�� com o dedo n��o �� ser seduzida. Quero

saber se voc�� j�� dormiu com algum homem. Se j�� teve

alguma experi��ncia de verdade.

��� Ainda sou virgem, se �� o que voc�� quer saber.

Realmente, nunca tive uma experi��ncia verdadeira, mas

j�� dormi nuazinha com muitos rapazes. Mas isso n��o

quer dizer nada. Pelo menos uma boa parte das garo-

tas que eu conhe��o gostam de dormir abra��adas a ra-

pazes .

��� 26 ���

Resolvi interceder. Aquele assunto estava me inte-

ressando. Mas me interessando tanto que cheguei a es-

tranhar. N��o estava me reconhecendo.

��� Eu nunca tive essa oportunidade ��� interferi ���

e nem saberia dizer quando poder�� acontecer.

Ivete procurou me incentivar:

��� Muito me admira voc�� falar em oportunidade,

Regina. Quando estivemos naquele col��gio misto l�� na

Guanabara, muitas noites eu dormi com rapazes. E olhe

que eu tinha apenas onze anos!

Aproximou-se mais de mim: ��� Quer ver uma outra

oportunidade? Nos fins de semana, no Guaruj��. En-

quanto os velhos jogam cartas, a mo��ada entra nos

apartamentos um do outro e surgem mil oportunidades.

Voc�� perde um punhado de coisas gostosas por passar

os fins de semana aqui no col��gio ou na casa de sua

m��e. Nem mesmo bebe, e j�� tem quinze anos. L�� nas

praias, as meninas que eu conhe��o, e os rapazes, come-

��am a encher a cara j�� nos doze.

��� Ora, voc�� sabe como a mam��e ��. Ela que vive

procurando uma oportunidade na tv, acha que a filha

tem que ser santa. Nada de fumar, nada de beber ou

namorar. ��s vezes bebo cuba-libre escondida.

��� Chiiii! Cuba??? Que tro��o mais enjoado! O ne-

g��cio �� na pinga mesmo. A gente tem que amar o Bra-

sil ou deix��-lo. E como eu o amo mais do que todo mun-

do, bebo pinga, que vem de seu solo.

Ivete rodopiou as m��os pelos ares e concluiu a sua

patri��tica manifesta����o.

��� �� uma esp��cie de homenagem ao nosso pa��s.

Voc�� deve fazer o mesmo.

��� Ora, Ivete, voc�� dizendo tudo isso perto da Ar-

lete vai fazer com que ela pense que eu sou uma ino-

cente, mas eu n��o sou t��o inocente assim, n��o. Afinal,

��� 27 ���

sei muito sobre sexo e o que temos dentro do corpo.

Sei, por exemplo, como s��o os homossexuais e posso, se

voc��s quiserem, explicar como eles se amam.

��� Isso �� velho. Eu at�� vi artistas em atitudes sus-

peitas. Ali��s, acho que voc�� n��o sabe essas coisas de ver-

dade. Fala por que leu nos livros de anatomia, n��o ��?

��� N��o senhora. Foi um rapaz que me contou. Um

rapaz do gin��sio.

��� Aposto que foi um desses repulsivos espinhudos,

que est��o sempre com as cal��as t��o justas que aparece

aquele horripilante amontoado de lado. Oh, Deus, como

os detesto. Gosto �� dos que j�� s��o homens, pois n��o vi-

vem a mostrar o que tem por entre as pernas para se-

rem valorizados. O homem de verdade procura at�� es-

conder. Nem quero conversa com meninos de gin��sio.

S��o t��o desajeitados. Meu gosto mesmo �� pra esses tipos

que sabem ser agrad��veis, que n��o abra��am muito aper-

tado, que n��o deixam cair a bebida da ta��a que seguram

na m��o.

��� Olha, Ivete, l�� vem voc�� novamente com homens

velhos. Com eles n��o h�� futuro. �� s�� dormir n��a, fumar

maconha, beber, beijar, deixar bulinar. A gente tem

mesmo que arranjar um jovem e casar, construir um

lar sadio, onde os nossos filhos aprendam o nosso exem-

plo. N��s estamos estudando no col��gio mais rico de S��o

Paulo e s�� ou��o falar em homens, bebida, sexo e tantas

outras b o b a g e n s . . . !

Arlete e Ivete cairam na gargalhada e foi Arlete

quem falou:

��� Olha a��, Santa Regina! Aposto que quer ser ca-

nonizada. N��o bebe, n��o fuma, n��o foi beijada e nunca

foi vista n��a por homem algum.

��� Voc��s est��o enganadas quanto a Santa. Mas

quanto ao resto, n��o fa��o porque me considero uma

menina. Quando fizer dezoito anos, arranjarei um noivo

��� 28 ���

que ser�� meu marido e me ensinar��, com a experi��ncia

que tiver, todas essas coisas. N��o quero aprender com

ginasianos, nem acho prazer ter qualquer homem nos

meus bra��os, encostar o meu corpo no dele s�� para

sentir o sangue ardendo nas veias. Acho tudo isso que

voc��s pensam uma grande cretinice. Quero ser pura,

levar uma vida pura e amar adoravelmente.

A campainha para o jantar tilintou. As meninas

vestiram-se rapidamente, pois no segundo toque, algu-

ma irm�� poderia surgir para verificar se todas esta-

vam bem arrumadas e com os cabelos amarrados para

tr��s. Todas deviam permanecer na porta do quarto at��

o terceiro toque, que indicava formar fila para o refei-

t��rio. Quem n��o estivesse pronta nesse momento rece-

beria um dem��rito. Eu ocuparia, como sempre aconte-

cia, uma mesa com Ivete, Alice e Renata.

Alice e Renata eram as meninas mais ordeiras do

col��gio. Eram como se esperassem que a inspe����o fos-

se de minuto a minuto. E tinham um posto importan-

t��ssimo dentro do col��gio. Organizavam todas as festas

e eram quem escolhia as jovens e a pe��a mensal que o

nosso teatro encenava. Para se chegar a isso era preci-

so ter as maiores notas em todas as mat��rias. Tamb��m

deviam ter tudo em ordem.

Alice e Renata eram um contraste comigo e com

Ivete, que faziamos do nosso quarto a maior bagun��a.

Durante os primeiros anos na escola, fiz o m��xi-

mo para ser uma aluna exemplar. Mas Ivete, como sem-

pre, com a sua influ��ncia, insistia para que eu me di-

vertisse, pois estava me tornando deprimida de tanto

estudar. Alice e Renata tamb��m faziam parte da comis-

s��o para a escolha da Rainha da Primavera. Elas acha-

vam que eu, apesar de ter uma forte personalidade, n��o

era l�� muito estimada pelo resto da comiss��o. Por isso

tinha, como Ivete me sugerira, de conviver um pouco

mais com as outras meninas, pois eu, sinceramente,

��� 29 ���

queria muito ser Rainha da Primavera. Ivete tinha ra-

z��o quando me aconselhava a estreitar mais amizade

com Alice e Renata. Por isso procurei, no refeit��rio, ser

gentil com ambas.

��� Voc�� quer, por gentileza, me passar o arroz, Re-

nata? ��� falei.

��� Oh, com prazer.

��� Deixe que eu passo, Renata ��� disse Alice, adian-

tando-se a Renata, j�� que estava mais pr��xima de mim,

��� N��o a temos visto no p��tio com as outras meninas,

ultimamente.

��� Ah, �� mesmo. Voc��s nem imaginam como tenho

estudado ��� menti.

��� Estudado?!? Mas dizem que voc�� �� s�� c��rebro,

que s�� l�� uma vez as li����es e logo aprende.

��� Nem tanto ��� respondi.

��� Que tal a sua entrada para o concurso de Rai-

nha da Primavera? ��� perguntou Alice. ��� J�� tem mui--

tos votos?

��� Olha, pra falar a verdade, nem sei se aceita,

riam a minha inscri����o. Voc��s, como s��o da comiss��o,

devem saber.

��� Claro que voc�� est�� inscrita.

��� N��o sabia, francamente. Isso me deixa muito

alegre. E u . . .

��� Se eu fosse t��o bonita quanto voc�� ��� cortou

Alice, excitada ��� ningu��m me tiraria a coroa.

��� Mas Renata j�� foi rainha, n��o foi, Renata?

��� Sim. J�� fui.

��� 30 ���



��� Diga-me uma coisa: como �� que a gente se sente

como majestade?

��� Parece que a gente est�� num outro mundo. Sen-

te-se que a gente �� a dona da festa. �� muito bom. Voc��

sabe que at�� recebi um convite da tv? Fiquei vidrada.

��� Que canal?

��� O quinze.

��� Por que voc�� n��o aceitou?

��� E voe�� acha que os meus pais deixariam? Eles

morrem de ��dio s�� em pensar que posso vir a ser atriz.

Somos de fam��lia quatrocentona; fam��lia tradicional,

como dizem os meus pais. Mas a sua m��e trabalha em

tv, n��o trabalha, Regina? Como ela diz que �� l��?

��� Aposto que �� maior bagun��a ��� emendou Ali-

ce. ��� Diretores fazendo amor com as atrizes e um mun-

do de invertidos oferecendo-se a troco de um minuto

de v��deo. Uns pisando nos outras para subirem de po-

si����o.

��� Sinceramente, eu n��o sei, pois mam��e ignora

essa infinidade de mexericos que voc��s parecem co-

nhecer t��o bem.

As duas ficaram vermelhinhas.

��� Ora, n��o precisa ficar zangada, Regina. N��s s��

quer��amos saber se tudo que sai nas revistas �� verdade.

��� Bem, em primeiro lugar mam��e nunca me fala

sobre isso. Em segundo lugar, mesmo que soubesse n��o

iria divulgar mexericos s��rdidos para duas meninas ino-

centes como voc��s.

As companheiras de mesa riram.

��� �� bom voc�� pensar sempre que estamos com o

p�� direito ��� disse Alice.

��� Bem, afinal, �� o que dizem aqui na escola a seu

respeito.

��� Puxa, como a turma se engana. Ter tantos m��-

ritos n��o quer dizer inoc��ncia.

��� ��. Mas voc��s tem sorte de estarem em todos os

primeiros lugares de moral alta aqui na escola. Tenho

tido v��rios aborrecimentos por que eu e a Ivete prefe-

rimos estudar no nosso quarto.

��� E dizem "coisas" a respeito de voc��s. Eu acho

que voc�� deveria aparecer de vez em quando l�� no nos-

so quarto para podermos estudar juntas. Sabem de uma

coisa? Leve a Ivete. Assim, estudaremos as quatro.

��� Ah, �� uma boa id��ia.

��� Sim. Talvez tamb��m Ivete, estudando bastante,

possa fazer parte da comiss��o.

��� Pois bem, falarei com ela.

Como odiava ser polida e gentil!... Quando a si-

neta deu por terminado o jantar, sa�� correndo para o

parque, e assim que me v�� entre as ��rvores e as flores,

senti como era maravilhoso ter quinze anos. Deixei-me

cair sobre a relva, debaixo de uma ��rvore, e fiquei sen-

tindo a frescura do capim nas minhas costas molhadas

de suor. Com o calor do dia, o cair da noite envolveu todo

o bosque com o perfume quente das flores. Era um al��-

vio estar ali, ao contato da relva ��mida, aspirando aque-

le inebriante perfume, ap��s sentir o odor do grande re-

feit��rio. Fiquei ali, deitada, esquecida de tudo, at�� que

as badaladas do sino que anunciava o recolhimento para

os quartos vibraram no a r . . . Nem liguei. O c��u terri-

velmente escuro e apinhado de estrelas me fez di-

vagar para outros mundos. S�� quando olhei para o ve-

lho casar��o com quase todas as luzes apagadas �� que

me lembrei que era, interna de uma escola. A�� atra-

��� 32 ���



vessei, correndo, o vasto gramado, abri a grande porta,

subi, correndo, a imensa escadaria e ao chegar ao quar-

to, atirei-me na cama.

��� Aonde diabos voc�� se meteu, Regina?

��� No mundo encantado do bosque.

��� Estava doida que voc�� chegasse para lhe per-

guntar se falou com a Renata e com a Alice, como su-

geri?

��� Claro, falei com elas.

��� E que tal? Elas foram legais?

��� Legal��ssimas. At�� nos convidavam para estudar

no quarto delas.

��� ��timo. Vamos dobr��-las. Assim, voc�� ser�� a Rai-

nha este ano.

��� N��o sonhe acordada, Ivete.

��� N��o sonho, querida. Sua coroa �� tremendamente

real.

��� Oh, sua maluquinha, voc�� �� uma boa pra��a! Por

isso eu vou dormir sonhando que estou com a coroa bem

fincada na cabe��a,

II

Filosofia? Cada Dia um Homem!

N��o fui coroada rainha, mas isso n��o me deprimiu

muito por que fui convidada pela fam��lia de Ivete a

passar as f��rias em Recife. Ficamos num lugar cha-

mado Jardim Cai��ara, convenientemente localizado, per-

to de um dos rios que cortam a cidade. Todos diziam que

aquele lugar era a Beverly Hill's do Recife. Maravilho-

sas vilas, escondidas em parques floridos e lindos ban-

gal��s que rodeavam uma encantadora pra��a particular,

pra��a que s�� podia ser usada pelos moradores das vilas

e dos bangal��s. No meio dessa pra��a existia uma enor-

me piscina, artisticamente projetada em arte moderna.

�� sua volta, centenas de mesas de m��rmore branco com

cadeiras de ferro esmaltadas de vermelho.

Ao fim do dia era hora dos que moravam nas vi-

zinhan��as vestirem roupas leves e esperarem o crep��s-

culo, tomando os mais variados refrescos, sentados ��s

mesas na beira da piscina. Era nessa hora, que alguns

diziam que crian��as deveriam estar se banhando para

dormir, que Ivete nos levava para l��. Digo levava por que

Arlete tamb��m estava com a gente. Ivete nos convidou

a entrar no bar, que era mesmo genial, pois era o ��nico

bar onde mocinhas podiam entrar desacompanhadas, sem

��� 35 ���

serem bul��nadas ou, abertamente, alvo de propostas. Sen-

tamo-nos em banquinhos altos ue rodeavam o balc��o e

o "barman" cumprimentou, gentilmente, a Ivete.

��� Como est��, srta.? J�� em f��rias? Espero v��-la

muitas vezes por aqui.

��� Gra��as a Deus estamos fora daquele infernal co-

l��gio e viemos aqui curtir a nossa. Jo��o, voc�� pode nos

servir tr��s martinis.

Polindo os copos com um alvo guardanapo, Jo��o

respondeu:

��� Sinto muito, mas a srta. deve lembrar que �� proi-

bido servir bebidas a menores de dezoito anos.

��� Ora, Jo��o, d�� escondido, como das outras vezes.

Olha, eu compro uma garrafa, escondo na saida do ba-

nho e a gente vai beber debaixo das ��rvores.

��� N��o. N��o, srta. Ivete. A lei �� severa. N��o deve-

mos servir bebidas alc��licas a menores. Por favor, n��o

insista.

Saimos do bar, deprimidas, quando Ivete levantou

um bra��o e come��ou a gesticular e a gritar:

��� A i ! A i ! Ai!

Ari era um homem j�� nos seus trinta anos, cons-

ciente do seu f��sico de pugilista. Fica ali a espera da

mais bonita garota, para conseguir obter um encontro

��ntimo no seu belo bangal�� super-decorado. Era um dos

rapazes mais ricos de Pernambuco Era um homem mui-

t��ssimo atraente para as meninas menores. Um belo

companheiro para beber, dan��ar, nadar, etc.

��� Como v��o, meninas? Solit��rias? E voc��, Ivete,

como est�� bonita! Que coxas, heim! Voc�� fica espeta-

cular dentro desse mini-biquini. S�� que tem um deta-

lhe: existem muitas marcas de gilete por a��, que ras-

pam muito bem.

��� Ora, tonto, o neg��cio aparecendo assim �� ge-

nial. Em Copacabana s�� se v�� jovens e at�� pessoas de

idade com isso aparecendo. �� excitante, n��o ��?

��� Muito escandaloso. N��o me apresenta as outras

bonecas?

��� 36 ���

��� Oh, claro. Regina, paulista, e Arlete, carioea.

As m��os se apertaram.

��� Ari ��� disse Ivete ��� chamei-o para lhe expli-

car que temos necessidade de uns golinhos. V�� l�� no

bar e compre uma garrafa de martini ou vodca, pinga,

qualquer coisa. N��s prometemos beber escondidas.

Tendo vindo a garrafa e os copos, os quatro, senta-

dos a beira da piscina, beberam abertamente. Os quatro

n��o. Tr��s, por que eu preferi um refrigerante.

��� Qual �� o assunto que abordamos, meninas? Fi-

losofia ?

��� N��o me venha com isso ��� disse Ivete. ��� A mi-

nha filosofia, agora nas f��rias, �� cada dia um novo ho-

mem. N��o me preocupo com a arte ou com os estudos,

com a guerra, com as bombas ou com os foguetes que

v��o ��. lua. Meu neg��cio �� me divertir, e muito, pois sin-

to que sou uma parte dessas coisas. Sou uma parte do

foguete, da televis��o, da guerra e da bomba. Assim, eu

preciso de um escape peri��dico.

��� Ent��o eu serei o primeiro homem dessas f��-

rias. Voc�� me aceita?

��� Estou dispon��vel ��� respondeu Ivete, apressa-

damente .

Ari sorriu um sorriso de dentes brancos e brilhan-

tes.

��� Isso me interessa profundamente. Convidarei

mais dois amigos e iremos jantar no meu bangal��.

��� Mas n��o v�� convidar nem um gigol�� ou nem um

ginasiano espinhado, est�� bem?

��� Voce, Ivete, sempre com esse problema... Tra-

rei homens ador��veis, �� claro.

��� Ent��o est�� legal.

��� Homens que amem o anseio da juventude ���

prosseguiu ele. ��� Assim como eu. A juventude de quin-

ze anos me atrai, voc�� sabe.

��� L��gico. Eu sempre soube disso.

��� Eu n��o irei, voc�� vai me desculpar, gim, Ivete?

��� 37 ���

��� Ora, n��o seja cacete e chata, Regina. Aqui, to-

dos s��o pra frente. Ningu��m vai reparar se voc�� jantou

com um ou mais homens. Que �� que vai chegar l�� no

bangal�� e espiar se voc�� est�� comendo ou f a z e n d o . . .

��� Chega, Ivete ��� cortou Ari. ��� A menina n��o co-

nhece os pernambucanos ainda. Talvez pense o diabo da

g e n t e . . .

��� N��o penso nada de anormal. S�� que n��o que-

ro ir.

��� Credo. Voc�� �� uma crian��a mimada. Quantos

anos tem?

N��o me dei ao luxo de responder.

��� Olha aqui, menina, a melhor forma que n��s,

pernambucanos, encontramos para tratar menina mi-

mada �� ignor��-la.

Ari segurou o seu copo e lentamente deu-me as cos-

tas. Eu fiquei analisando a perfei����o da cabe��a daque-

le homem, por tr��s. Sim, tinha uma bela cabe��a, talvez

mesmo pra ser ator l�� em Hollywood, um tipo assim de

Gregory Peck ou Tyrone Power.

Naquele momento em que ia me virando as costas,

Ari tinha uma express��o de arrog��ncia no rosto, uma

arrog��ncia que s�� �� permitida aos jovens milion��rios.

Nesse instante, veio se aproximando outro rapaz,

que tamb��m era bonito de morrer. Um p��o, como diriam

as meninas l�� do col��gio, quando achavam um rapaz de-

veras bonito. Quando chegou bem perto da gente, enco-

lheu os ombros num cumprimento a Ari.

��� Ol��, Ari, bebendo com tr��s bonecas e esquecendo

os amigos heim?

��� N��o sei do que voc�� est�� reclamando pois �� seu

costume que estou imitando.

��� Mas n��o vai continuar com isso, vai?

��� Est�� bem, Ney. Voc�� n��o beber�� com a gente

por que vai jantar conosco l�� em casa. Voc�� n��o devia

ser convidado, pois as garotas aqui s�� gostam de homem

de trinta. Dezoito para elas �� pirralho.

Ney sorriu.

��� 38 ���

��� Claro, meninas, se voc��s quiserem, posso lhes

mostrar o pirralho, que �� um verdadeiro homem.

��� Ora, cale a boca, Ney, pois temos entre n��s uma

santinha. ��� Virou-se para mim. ��� Olhe, �� essa a��.

Ney mediu-me dos p��s a cabe��a.

��� Olhe, garota, voc�� devia sentir-se orgulhosa de

sua beleza. �� uma das adolescentes mais esguias e bo-

nitas que conheci at�� hoje. Seus olhos s��o verdes, ou es-

t��o acentuados pela luz do sol?

��� S��o verdes respondi numa voz de criancinha,

s�� para chate��-lo. Mas ele n��o se deu por vencido e

disse:

��� Essa voz assim mimadinha faz pensar que voc��

est�� querendo flertar comigo . . .

��� Aposto que est�� mesmo ��� emendou Ari.

��� Ora, dane-se se quiser pensar assim. Jamais pre-

tendo conquistar homens me fazendo de crian��a. Quero

conquistar um homem, como j�� disse v��rias vezes, que

tenha uma esp��cie de tranquilidade especial na alma, e

nunca conheci ningu��m assim. E aposto que voc�� tam-

b��m, Ari, n��o o ��.

��� Puxa, como voc�� �� agressiva! Aposto mesmo que

nunca foi beijada.

��� Vamos mudar de assunto. Voc�� demonstra n��o

ter sensibilidade.

��� Sensibilidade ?! ? Quando se trata de coisas gos-

tosas, queridinha?!? Voc�� deve estar maluca.

��� Francamente, que conversa! Vamos parar, n��,

Regina! ��� disse Ivete. ��� Bem, vamos nos arrumar. Es-

cute Ari, onde diabo voc�� vai encontrar outro rapaz?

��� Ora, �� s�� dar um assobio que aparecem uns cem.

Voc�� quer v e r ? . . . Ah, n��o �� preciso assobio. A�� vem

Carlos.

Carlos, num short super-justo, com longos cabelos

brilhantes que lhe caiam nos ombros, era realmente mui-

to simp��tico. Morava na praia de Olinda e era grande

entusiasta de barcos a vela, por isso era o mais quei-

��� 39 ���

mado pela longa exposi����o ao sol marinho. Pouco fre-

quentava a piscina. Ele foi o meu par, ficando Ivete com

Ari e Arlete com Ney.



* * *

O bangal�� era bonitinho e finamente mobiliado. Lo-

go que entramos, Ari ligou a eletrola e serviu uisque pa-

ra todos n��s. Mas todo mundo preferiu gim-tonica, pois

em Pernambuco n��o se usa beber uisque no ver��o. Eu

hesitei, mas Carlos objetou:

��� Ora, Regina. Quinze anos e n��o beber gim ? . . .

Vamos, �� s�� um golinho.

A despeito do meu firme prop��sito de n��o come��ar

a beber t��o cedo, acompanhei Carlos no gim. Depois de

uns goles, animei-me e comecei a ficar encantada,

achando todos simp��ticos. Em pouco tempo j�� parecia

que n��s seis nos conhec��amos h�� anos. Bebi mais uns go-

les e algu��m apagou a luz. Assim dan��amos abstra��da-

mente, s�� com a luz da lua, luz que entrava esverdeada

pela janela, trazendo para o sal��o uma brisa fresca, pois,

apesar de estarmos todos s�� de biquini, o calor era in-

tenso. Da�� a pouco pude perceber Ivete sentada nos joe-

lhos de Ari e Arlete nos de Nev, cada casal em sof��s

diferentes. Carlos parou de dan��ar e me p��s nas m��os

outro copo de bebida. Como eu relutasse, pois come��ava

a me sentir esquisita, ele falou, rispidamente, que eu

n��o era soci��vel e que n��o sabia por que n��o escolhera

qualquer das outras duas garotas.

��� Uma festinha pode converter-se num aconteci-

mento cacetissimo quando se est�� em companhia de

uma garota que n��o quer nada. Nesses casos �� melhor a

gente sentar l�� fora e ficar estudando catecismo. O que

voc�� acha?

��� 40 ���



Apanhei o copo e comecei a ser "soci��vel", pois n��o

iria fazer uma cena. Simplesmente n��o podia estragar a

festa. Carlos segurou-me pela cintura e apertou-me bem

junto ao seu short. Decidi ignorar o que senti DO��S ti-

nha um desejo muito s��rio de me casar toda de branco.

Ningu��m iria manchar o meu vestido de noiva, pensava

enquanto aquilo acontecia.

��� Puxa, voc�� �� fria como gelo ��� disse Carlos, em-

purrando-me para longe dele.

Ari riu, Carlos n��o gostou.

��� �� . . . Voc�� fica a�� com uma garota legal e eu

aqui, morrendo de vontade. O neg��cio �� a gente trocar.

��� Essa aqui tamb��m �� virgem, bobo. Com o tem-

po, com um bom papo, a gente que �� inteligente, con-

segue alguma coisa.

Olhei para as meninas e vi que elas n��o diziam na-

da, pois estavam bastante tocadas. Olhei para Carlos e

n��o pude deixar de sorrir quando vi que seus olhos su-

biam e deciam pelo meu biquini super-justo.

��� Voc��, apesar de feia, �� uma garota muito atra-

ente.

Prendeu-me nos bra��os e beijou-me na testa. Morri

de prazer e ele beijou-me o pesco��o.

��� Voc�� nunca poder�� saber a falta que faz uns

carinhos para um rapaz assim ardente como e u . . . Que-

ria prestar aten����o no que ele dizia, mas ondas de ca-

lor que subiam, a tempos regulares, pelo meu corpo, fa-

ziam revirar o meu est��mago.

Olhei Ivete. Ela e Ari pareciam um s��, deitados no

tapete. Arlete e Ney, agarrados, beijavam-se longamen-

te, parecendo n��o haver mais ningu��m na sala, s�� eles

dois.

Mas aquela estranha sensa����o de enj��o n��o me lar-

gava. Queria correr para fora, mas n��o tinha coragem.

Seria "antisocial". Aguentei mais umas ondas, at�� que

corri feito uma doida para o jardim. Pensei que fosse vo-

mitar, mas, gra��as a Deus, o ar livre levou meu enj��o

como que por encanto. Quando voltei para perto de Car-

los, disse:

��� Estou passadissima... Desculpe-me...

Carlos riu.

��� Olhe, beba agua gelada que lhe far�� bem.

A�� ficamos na janela ouvindo os sussurros dos ou-

tros quatro. Eu sabia que tinha me portado infantilmen-

te e tamb��m sabia que Carlos passaria a ignorar-me.

O jantar foi uma por����o de batatas fritas e mais

bebidas.

* * *

Voltamos para casa as duas horas. Entramos sem

fazer ruido. Ivete e Arlete seguiram para o quarto e eu

fui, p�� ante p��, �� cozinha ver se conseguia um sonrisal,

pois estava com o est��mago dando voltas. Os pais de Ive-

te discutiam na sala. O pai de Ivete dizia:

��� Eu lhe disse que aquela menina precisava de uma

surra. Se eu a pegar, jogo-a pela janela. Duas horas e

ainda est�� com essa turma de malucos.

��� Querido, n��o comece a berrar, sen��o os criados

podem ouvir.

��� Ora, cala a boca. Voc�� n��o sabe ser m��e. Voc��

fica orgulhosa de ter uma putinha dentro de casa.

��� Eu n��o me orgulho de coisa nenhuma, pois eu

sempre disse a voc�� que n��o queria ser m��e de ningu��m.

Foi voc�� quem quis. Agora aguente.

��� Vou esper��-la entrar. Ela hoje vai conhecer um

Cerqueira Cesar.

��� Voc�� n��o vai dizer nada, pois tem consci��ncia do

muro que Ivete ergueu ao seu redor. Talvez seja brinca-

deira, pois essas meninas de hoje fazem todas as tenta-

tivas para se transformarem em adultas.

��� 42 ���



��� Mas voc�� pode reparar que ela faz tudo por s��

mesma, recusando o nosso aux��lio.

O pai de Ivete largou o copo de bebida em cima

da mesinha e, cruzando o sal��o, disse:

��� Ela j�� chegou. O carro est�� estacionado no p��-

tio. V�� cham��-la, sen��o entrarei no quarto sem respeitar

sequer as amigas que a acompanham.

Voltei correndo para o quarto e avisei Ivete. Ela le-

vantou-se na maior calma, vestiu um penhoir de rendas

azul, e sem esperar a m��e cham��-la, foi at�� a sala e en-

frentou o pai com sarcasmo e petul��ncia. O andar segu-

ro com passos largos do pai em sua dire����o n��o a assus-

tou. O velho disse, com voz firme:

��� J�� a proibi de chegar em casa depois da meia-

-noite.

Ivete, p��lida, fixava o pai, exibindo um sorriso sar-

c��stico .

��� Sim. ��� Sua voz estava cheia de ��dio. ��� Voc��

proibiu, mas esqueci. Tive vontade de me divertir. E da��?

��� E da��? E da�� voc�� tem dezesseis anos. E o peso da

lei cair�� sobre seus pais, se o juiz a apanhar nessas far-

ras com esses cabeludos.

��� Se formos pensar em leis, voc�� deveria estar no

fundo de um c��rcere.

Os olhos dos dois se fixaram, desafiadores. Nesse

instante percebi que devia haver um grande segredo en-

tre pai e filha. Tinha certeza de que era um t��trico se-

gredo. Os olhos de Ivete se desviaram dos do pai e pou-

saram nos meus. A�� senti que ela percebera que eu des-

cobrira algo. Ent��o fez tudo para encobrir e respondeu

natural.

��� Pode me dizer, heim, papai, se �� pecado passear,

dan��ar, viver. Voc�� j�� foi mo��o, n��o foi?

Percebi que o velho tamb��m tentava disfar��ar algu-

ma coisa.

��� Mas no meu tempo havia respeito. Meninas n��o

ficavam nas ruas at�� horas.

��� Respeito ? ? ? ��� Parecia que Ivete ia revelar algo,

mas se controlou novamente. ��� Mas hoje �� diferente,

papai.

��� Mas existe a lei.

��� N��o se segure na lei, papai. Ela pode cair na

sua cabe��a.

O pai de Ivete ficou branco. Ia dizer uma coisa mas

disse outra.

��� Ora, voc�� quer destruir-nos. . . N��o v�� que a sua

m��e foi at�� a um psiquiatra por sua c a u s a . . . ?

��� Por minha causa ? ? ? Faz me rir. Talvez algum

dos seus romances tenha dado pra tr��s.

Pensei que um bofet��o iria estalar no rosto de Ive-

te. Mas a m��o daquele homem alto e forte parou no ar,

por longos minutos. O desprezo nos olhos de Ivete cres-

ceu. Ela virou-se e deixou a sala. Quando entrou no

quarto disse:

��� Eles est��o fingindo que se preocupam comigo, s��

por que voc��s est��o aqui. Mam��e sempre foi uma b��bada

cercada de homens. Para esses homens dava tudo, esque-

cendo que eu era uma crian��a que precisava de cari-

nho. ��� Interrompeu-se por instantes e foi a copa, de on-

de voltou com um copo cheio de uisque, que bebia aos

golinhos. ��� Olha, quando mam��e queria estar sozinha,

sempre me empurrava para o bar. Aquele l�� da p^cina.

Ou ent��o viajava e me deixava com papai. ��� Ivete engo-

liu o resto do uisque e repetiu. ��� Com papai, com pa-

pai! Esse monstro! ��� Mas logo voltou a calma e disse:

Com voc��s eu me sinto muito bem.

��� Ora, n��o se aborre��a com isso, Ivete. ��� falei. ���

Mam��e e papai tamb��m, para se livrarem de mim, man-

daram-me para o internato. Diziam que l�� eu estaria em

seguran��a contra os pecados_ do mundo. Sempre que eu

pedia para ficar numa escola semi-interna, mam��e gri-

tava: "Ent��o voc�� quer me ensinar como devo cri��-la?

Voc�� quer modificar ou mesmo exigir que eu modifique

meu sistema de educa����o? Voc�� bem sabe como �� dif��cil

��� 44 ���



para uma jovem como eu andar falando por a�� que tem

uma filha de quinze anos. Isso �� detest��vel". Pelo que

voc�� v��, eu tamb��m sempre fui um problema para ma-

m��e.

��� Eu tamb��m sempre fui um problema para ma-

m��e ��� arrematou Arlete. Ela sempre tem ci��mes

quando algum homem diz: "Sua filha �� ador��vel". Ela

responde com desd��m: "Ah, ��. �� muito bonitinha sim".

Agora anda badalando pelo mundo. Sei de fonte limpa

que anda com amante a tira-colo na frente de papai.

��� Nossos pais ��� exclamou Ivete ��� sentiriam

um al��vio se n��o exist��ssemos.

��� Papai n��o �� l�� dos piores ��� disse eu. ��� Sempre

diz a mam��e para tirar-me do internato. Vamos ver este

ano. Talvez eu fique com mam��e na Guanabara.

��� E em que col��gio voc�� pretende estudar?

��� Talvez em nenhum.

��� N��o �� m�� id��ia ��� disse Ivete, brincando com o

copo.

��� Talvez n��o fosse uma m�� id��ia se a gente fosse

dormir. Estou morrendo de sono.

��� Bem, isso �� l�� com voc��s. Eu vou beber mais uns

goles. E com isso, amigas, deixo-as com a luz apagada.

Dormirei no outro quarto. N��o se assustem se ouvirem

meus pais brigarem, pois eles est��o apavorados com a

id��ia de terem uma filha mulher. Essa id��ia quase mata

mam��e, pois eu tenho dezesseis anos e ela nunca sai dos

vinte e nove.

��� Ah, as m��es de h o j e . . .

III





40 Anos. Seios Duros


No dia seguinte, mandamos Recife para o infer-

no, embora sentissemos um pouco a tristeza, pois iamos

passar uns dias em Olinda, mas Ivete estava doida para

deixar Recife e eu n��o queria mago��-la, pois con-

siderava justo que as pessoas que n��o gostam de certos

lugares se retirem. Al��m disso, os pais viviam bri-

gando por causa dela e eu j�� estava me aborrecendo. J��

no aeroporto quando os motores eram acelerados antes

da decolagem, foi que me lembrei que tinha prometido

a mam��e uns colares e outras bugigangas que agora

nem me lembro.

Quando descemos no gale��o, fiquei contente por ma-

m��e n��o estar nos esperando. Mas quando chegamos ao

nosso apartamento na Av. Atl��ntica, tinha um monte

de amigos de mam��e esperando-nos e todos brindaram

a nossa vinda com champanha. Havia, tamb��m, alguns

que j�� estavam b��bados, apesar de ser bem cedo, Ivete

logo ficou gamada por um dos rapazes. Mario de Castro.

Era esbelto nos seus vinte e seis anos, com uma arro-

g��ncia como se quisesse que a gente n��o notasse uma

papada debaixo do seu queixo. Convidei-o logo a beber

incont��veis martines.

��� 47

Mam��e n��o gostou muito da vinda de minhas duas

amigas.

Quando fomos para a praia no dia seguinte, mam��e

reclamou que n��o t��nhamos empregadas e que aquelas

duas vagabundinhas n��o se deram ao luxo de tirar das

mesinhas nem um dos copos vazios e nem um dos cin-

zeiros cheinhos de tocos de cigarros.

��� S��o umas relachadas ��� falava tirando a saida

de banho e mostrando seu corpo de quarenta anos bem

queimado e belas e rijas formas. ��� Passei pelo quarto e

dei uma espiadinha. Elas dormiam nuas. N��o sei como

posso convidar algu��m, algum homem para dormir no

apartamento Voc�� sabe, n��o ��, Regina, que Mario sem-

pre dorme no sof�� da sala. Voc�� j�� pensou o que ele

poder�� dizer, vendo aquelas duas l��, peladas?

��� Ora mam��e, daqui a pouco elas acordam, tomam

alguns goles de qualquer bebida e v��o para a praia.

��� Bebida??? Logo de manh��!

��� �� costume delas.

��� E voc��, querida, toma leite, n��o ��?

��� Claro. Caf�� com leite.

��� Muito bem. Voc�� ainda �� uma crian��a. Um Cuba,

uma vez ou outra n��o faz mal, mas, agora, outras bebi-

das fortes...

��� Ora m a m �� e . . . eu ia falar de quantos gim-t��ni-

cas havia bebido l�� em Pernambuco, mas s��bita e impe-

rativamente, tapando-nos a luz do sol, apareceu um

dos amigos de mam��e.

��� Paulo, gritou mam��e. Voc�� aqui na Guanabara?

Que surpresa! Quando chegou?

��� Vim da Europa ontem.

Paulo levou a m��o aos olhos e, apertando-os, falou:

��� Puxa, estou um verdadeiro pau-d'agua. J�� bebi

um rio de caipirinhas hoje.

��� 48 ���

Paulo olhou-me e, dirigindo-se a mam��e, falou:

��� N��o vai me dizer que tudo isso a�� �� aquela me-

ninazinha de tran��as que eu conheci?

��� Pois �� ela mesma, e eu vou come��ar a gritar aqui

se algu��m mais falar que a Regina est�� uma mo��a feita.

Isso faz com que eu me torne cada vez mais velha.

��� Ora, voc�� devia orgulhar-se da filha que tem.

��� Oh, Paulo, por favor, mude de assunto. Ou me-

lhor ��� vamos beber mais umas caipirinhas.

��� Posso tomar uma tamb��m, mam��e?

��� N��o, Regina. Caipirinha antes do almo��o n��o lhe

far�� bem.

��� Ora, Carmen, deixe a menina tomar uns goles.

��� S i m . . . Mas s�� uma ��� permitiu mam��e.

Paulo brindou com o copo cheio as minhas f��rias.

Levantou o copo bem alto e gritou:

��� �� Regina, que sempre receba permiss��o da ma-

m��e para muitos e muitos outros goles.

Fiquei olhando-o, meio hipnotizada por a q u i l o . . .

* * *

Mais tarde, Arlete e Ivete chegaram, em companhia

de Mario, um outro amigo de mam��e.

��� Ol��, pessoal, essa praia est�� infernal mesmo.

Foi servida mais uma rodada de bebida. Ivete prefe-

riu a dela pura. Passamos a manh�� bebendo. Quero dizer,

passaram os outros, pois eu parei na primeira.

As meninas estavam em super-biquinis. Paulo achou

que devia convidar mais uns homens, mais tr��s, para ve-

��� 49 ���

rem ��� disse ��� os belos corpos, pernas de carnes firmes

dessas lindas meninas esbeltas e alt��ticas. Apostou que

viriam uns cem, que seria s�� ele levantar um dedo e di-

zer dos seios rijos, morenos, que enchiam os biquinis at��

fazer transbordar as carnes para todos os lados, de ga-

rotas como n��s, com apenas quinze anos. Continuou di-

retamente a mam��e.

��� Olhe s��, Carmen, como essas meninas de hoje

t��m corpo de mulher, de carnes duras e sensuais. Isso

passa desapercebido ��s mulheres de quarenta anos,

n��o ��?

A felicidade e a seguran��a com que usava seu belo

corpo, cheio de vitalidade, at�� aquele momento, fizeram

mam��e encolher-se toda, parecendo uma velha.

��� Ora, Paulo ��� retruquei ���, mam��e tamb��m tem

um belo corpo, com m��sculos firmes, pois sempre prati-

cou muitos esportes.

��� Eu sei, Regina, mas corpo de quinze fala clara-

mente que est�� pronto para o amor. Os homens perce-

bem isso. Talvez essas meninas n��o sintam isso pois

acho que jamais foram beijadas ou nunca se entrega-

ram as v��rias car��cias do amor. Elas talvez nem perce-

bam que t��m l�� dentro muitas paix��es fortes, que s��o a

necessidade de amar inteiramente.

N��s rimos e corremos para o mar. Paulo, Mario e

mam��e ficaram de longe ouvindo nossas gargalhadas,

que soavam estranhamente quando come��amos a nos

empurrar umas ��s outras e quando as enormes e esver-

deadas ondas vinham se aproximando. Logo depois nos

deitamos na areia para tomar banho de sol e fomos cer-

cadas por rapazes intrusos, dos quais n��o gostamos.

Eram do tipo procedente do resplandescente e ofuscante

mundo ginasiano, aqueles que nos enchiam de t��dio.

Sorte que logo chegou um amigo da mam��e, e fez com

que os garotos deixassem as macias areias e fossem para

bem longe.

��� 50 ���

Era Andr��, bronzeado de sol e carregando sua mmi-

-espregui��adeira.

��� Al��, Regina, quem s��o as bonequinhas ?

��� Quais?

��� As duas, ora.

��� Amigas do col��gio. Ivete e Arlete, levantaram a

cabe��a.

��� Oi ��� disseram as duas.

��� Onde est�� sua m��e?

��� Ali, olhe, com Paulo e M��rio.

��� Chi, sua m��e sempre com aquele bastardo do

M �� r i o . . . Aposto que dormiu l�� no apartamento.

��� Sim, dormiu no sof�� da sala.

��� Que voc�� acha disso?

��� Eu gosto Tem qualquer coisa sublime um ho-

mem dentro de casa. A gente fica at�� pensando que tem

um lar completo, com pai e m��e. Isso atrai.

��� Cristo, garota! Nunca pensei que voc�� sentisse

falta de seu pai. Mas olhe aqui: cuidado com esse pai,

pois ele �� um invertido. Ele n��o vale nada.

��� Porque o cuidado com ��le?

��� Porque ele �� o tipo de camarada, metido a artis-

ta, a intelectual, e tem um certo encanto para as moci-

nhas . Por outro lado, essas mocinhas inocentes n��o sa-

bem o que �� um invertido, e a�� entra oi nteresse delas

por este canalinha.

A risada de Ivete se perdeu pela praia.

��� Imagine, n��s interessadas por um meio ho-

mem. .. Como �� mesmo o seu nome?

��� Andr��.

��� Viu, Andr��, nossa especialidade n��o �� esse tipo

de homem! ��� replicou, ir��nica.

��� 51 ���

Voc�� gabe, gomos apenas pobres crian��as.

Andr�� n��o entendeu a ironia e exclamou:

��� Por isso �� que falo, por voc��s serem crian��as com

corpo de mulher, e de mulher atraente. Eu estou avisan-

do ue a maioria dos amigos de Carmem s�� gostam de

tirar proveito disto. Olhem, vou lhes apresentar uns jo-

vens da mesma idade de voc��s. S��o bons rapazes, e es-

t��o passando o ver��o aqui. Querem conhec��-los ?

Esprememos os rostos na areia, quase nos sufocando

de tanto rir.

��� De que est��o rindo?

��� Voc�� seria a ultima pessoa do mundo a saber.

Olhe, Andr��, mam��e vem para c��. E por falar em ma-

m��e, ser�� que ela arranjou o papel que tanto desejava

na novela da televis��o?

��� Creio que o contrato dela foi anulado.

��� Mas ela ia trabalhar sem c o n t a t o . Era s�� um

bico.

��� Ora, os artistas sem contrato s��o chutados por

a�� aos ponta-p��s. Ela se humilha muito. Por isso nin-

gu��m quer contrat��-la.

Suspirei e pedi a Andr�� para falar mais baixo, pois

as meninas deveriam passar um m��s em minha casa, na

Guanabara.

��� Acho que voc�� n��o devia incentivar essas garo-

tas para ficarem no apartamento de sua m��e, pois ela

est�� quebrada.

��� Mas as coisas est��o assim t��o graves?

��� Regina, eu conhe��o sua m��e h�� anos. Ela n��o

est�� mais naquela forma do passado. Novelas de televi-

s��o s��o umas bombas. Ela �� doida se pensa que h�� al-

gu��m invis��vel que lhe fornecer�� um grande papel em

mil novelas, dando condi����es para ela ter h��spedes aos

montes. O que voc�� tem a fazer �� convenc��-la a acabar

��� 52 ���

com essa loucura de gastar o que n��o pode. Eu penso

que voc�� compreender�� essas coisas. Essas meninas a��,

devem gastar um dinheir��o s�� de comida, pois est�� se

vendo que est��o bem nutridas... Voc�� deve me descul-

par por eu estar lhe contando essas coisas. Voc�� ainda

est�� com o p�� na inf��ncia, e n��o deve arcar com a res-

ponsabilidade que uma mocinha nunca devia ter. Po-

nho-a a par desses fatos porque j�� �� tempo de voc�� descer

das alturas da fantasia, para o ch��o duro e negro da

terra que pisamos.

��� N��o, Andr��. Juro que n��o me incomodo de sair

da luz do sol infantil e cair no mundo real. Mas acho o

diabo, fico chatead��rrima de ter que falar ��s amigas que

viemos �� Guanabara enfrentar uma fal��ncia. Afinal, es-

sas meninas a�� vivem naquele mundo encantado da fan-

tasia e ilus��o. N��o casa de Ivete, ali��s, na mans��o de

Ivete, l�� em Pernambuco, a gente �� servida como rainha.

Ivete e os pais gostam muito de beber. H�� uma adega

cheinha, com estoques de u��sque, gim, bourbon, enfim,

as mais finas variedades de bebidas. Agora n��o sei o

que fa��o.

��� Bem, por enquanto convide as suas amigas, ali��s

pergunte, se gostariam de ir at�� o meu apartamento,

para beber alguma coisa.

��� Mas elas beberam at�� agora. Creio que estejam

mortas de fome.

��� Ora, Regina, l�� temos fartura. N��o estou na ban-

carrota .

As garotas ficaram encantadas com o convite. Eu

at�� esqueci mam��e, parada l�� na praia, cercada de ho-

mens. Mam��e, a grande atriz de televis��o, como se jul-

gava.

* * *

��� 53 ���

Entramos no apartamento de Andr��. Subitamente

lembrei que mam��e sempre me aconselhava a n��o en-

trar em apartamentos de homens. Mas, afinal, decidi sor-

rindo quando me ocorreu que n��o estava s��, e depois n��o

tinha muita import��ncia, pois n��o se tratava de um An-

dr�� qualquer, de forma que esqueci que era uma me-

nina com mais duas meninas. Ele me chamou para a

cozinha e abriu a geladeira. "Rosbife", azeitonas, to-

mates e ovos duros. Chamei Ivete e Arlete e preparamos

de melhor maneira poss��vel o almo��o, enquanto Andr��

telefonava.

Quando voltamos para a sala com o que t��nhamos

preparado nas bandejas, encontramos dois rapazes. Sen-

tamo-nos aos pares no sof��, e Andr�� cerrou as cortinas

para que tudo ficasse em penumbra.

A bebida foi servida e em minutos as bandejas fica-

ram vazias.

Quis beber uisque para aniquilar a perturba����o de

encarar a realidade que mam��e estava quebrada. Mas

logo fiquei tonta e me estirei no sof��.

��� Cristo, Regina, pensei que voc�� fosse mais forte!

��� �� a primeira vez que bebo bebida t��o forte. Olhe,

Andr��, nessa hora, com o teto rodando, �� que vejo que

essa vida artificial e sofisticada n��o vale nada. Juro que

tenho vontade de largar tudo.

��� Mas voc�� pode tentar, Regina. Ainda n��o est��

apodrecida pela malandragem de toda essa ilus��o que

nos cerca.

��� N��o, n��o ir�� adiantar nada. Fui criada no meio

do luxo, comendo do bom e do melhor, frequentando os

melhores col��gios. Fui criada assim e nunca ser�� dife-

rente. Talvez, se me tivessem criado num grupo escolar

qualquer e me feito trabalhar com dez anos, tudo seria

diferente. Agora j�� estou acostumada com roupas finas,

com muito dinheiro. Estou me acostumando com bebidas

��� 54 ���

caras, me levantando ao meio dia e almo��ando as

quinze.

��� Voc�� fala como se tivesse trinta anos.

��� Se algum dia tive uma inf��ncia, hoje ela est��

ha quil��metros de dist��ncia. Ali��s, agora sinto-me uma

verdadeira mulher. Mas uma mulher que n��o sabe lutar

para sobreviver. Sei que a luta pela exist��ncia, para

mim, seria perturba����o e confus��o.

��� Quero gelo e ��� gritou Ivete, j�� meio tocada. ���

Gelo �� o mesmo que me encostar em um homem, sentir

um calor agrad��vel e uma gostosa sensa����o. Voc��s n��o

entendem o que os meus dezesseis anos sentem nos bra-

��os de um homem? �� uma sensa����o viva e contagiante,

de fogo e de tes��o que cresce conforme a coisa deie

tamb��m cresce.

O jovem que estava com Ivete foi at�� a cozinha e

trouxe o gelo. Logo em seguida, seus corpos aproxima-

ram-se. O rapaz inclinou-se sobre ela e foi beijando-a no

rosto, no pesco��o, e foi descendo. Ivete abriu as pernas.

��� Voc�� �� uma jovem vibrante. Vou ensin��-la, mui-

tas coisas. Comprima-se contra o meu r o s t o . . . Assim,

v a m o s . . .

Levantei-me r��pida e gritei:

��� Calma, Ivete. Voc�� disse que era uma menina

descente. N��o vai se permitir dar-nos um espet��culo de-

primente, vai?

��� Ora, Regina, j�� perdi minha identidade na emo-

����o do sexo. Nunca tive uma emo����o assim. Minha men-

te est�� envenenada e meu todo latejante. Afinal, n��o

sou de pedra. Quero ser possuida, mas possuida pelo lado

certo.

Eu tamb��m j�� estava meio b��bada. Sen��o n��o teria

gritado.

��� 55 ���

��� Voc�� �� uma suja! Devia sentir nojo de si mes-

ma.

��� Nojo? E por que? Nada mais poder�� acontecer

al��m de eu me tornar mulher. E eu adoro ser mulher...

��� Mas pense nas consequ��ncias.

��� Que consequ��ncias?

��� Ora, voc�� poder�� ficar gr��vida.

Ivete riu. Apalpou o bolsinho que tinha no biquini e

sacudiu uma caixinha de pl��stico ao dizer:

��� E pra que servem as p��lulas?

��� Bem, Ivete, se voc�� continuar assim, acabou-se a

festa.

Ela deu uma risada.

��� Voc�� �� mesmo de amargar, Regina ��� sentou-se

no sof��. ��� Voc�� conseguiu cortar as asas da minha von-

tade. Agora vou ficar entendiada, s�� com comidas, be-

bidas e prosinha.

J�� v�� que aqui na Guanabara estou dando azar.

��� Voc�� est�� nos deixando chocadas, isso sim.

O companheiro de Ivete saiu do sof�� e sentou-se em

uma poltrona, empunhando um novo copo de u��sque.

��� Sinto muito, pessoal ��� Disse ele ��� pensei que

a garota fosse mulher. E, como mulher, acho que ela

deve sempre esperar tentativas desse tipo por parte do

sexo oposto.

��� Eu n��o o estou culpando pelas tentativas. Al��m

disso, n��o tenho nada com a vida de Ivete. Mas �� que as-

sim, em p��blico, o neg��cio fica rid��culo. Se voc�� quiser

avan��ar o sinal, isso �� l�� com voc��, mas n��o na minha

frente.

��� 56 ���

O rapaz deu de ombros e continuou bebendo e fu-

mando Alias, todos fumando.

Eu nunca tinha fumado e, por isso, Andr�� disse:

��� Sua m��e j�� sabe ? Para mim �� uma surpresa v��-la

fumar.

��� Sempre h�� a primeira vez, n��o ��, Andr��? E de-

pois, tudo que eu fa��o �� para me vingar de duas pessoas.

Algum dia voc�� saber�� quem s��o.

��� 57 ���



IV

Dinheiro? Os Homens me dar��o

O nosso apartamento, alugado, com mob��lia, ficava

bem na Avenida Atl��ntida. Era grande, com tr��s quar-

tos, e n��o estava decorado a meu gosto, pois tinha m��-

veis pesados e antigos e com grosso tapete de uma cor

indefinida. As janelas da frente davam para o mar e o

edif��cio ficava a poucos metros do Copacabana Palace

Hotel. Quando cheguei a Copacabana senti que teria uma

vida ador��vel naquele apartamento. Mas depois que An-

dr�� falou a respeito de mam��e estar quebrada, fiquei

apavorada, pensando a todo instante que tocavam a

campainha e que seria um oficial de justi��a trazendo a

ordem de despejo. Quando a noite caia sobre o meu

quarto �� que me tranquilizava um pouquinho. Por que

�� noite a lei n��o trabalhava. Assim me diziam. N��o dis-

se nada a mam��e do que Andr�� havia me contado. Tam-

b��m n��o podia mandar as minhas amigas embora pois

eu vivia muito solit��ria e sem elas morreria de isola-

mento. Por isso, resolvi, procurar papai, para pedir um

dinheiro a fim de passarmos aquele m��s. Mas onde achar

papai? Meus pais estavam desquitados h�� muitos anos,

a bem dizer uns dez. Eu passava quase todo o meu tem-

po pensando, em como seria formid��vel se meus pais es-

tivessem juntos e que olhassem por mim. Com que an-

��� 59 ���

siedade eu esperava ver papai. A coisa que eu mais que-

ria era ser dirigida pelos dois e n��o ter que decidir coisa

alguma. Ter um lar. Oh, Deus, que felicidade se os velhos

se reconciliassem!

Estava em certa manh�� perto da janela, pensando

em tudo isso, quando mam��e entrou na sala.

��� Ol��, querida. Dormiu bem? ��� Sem esperar res-

posta, continuou. ��� Quer um drinque?

��� N��o, mam��e.

��� Por que est�� t��o cismada?

��� Nada, m a m �� e . . .

��� Ora, minha filha, sei que voc�� �� silenciosa e pen-

sativa, mas hoje est�� al��m de tudo perturbada.

��� N��o �� nada. Estou s�� pensando.

��� Regina, gostaria que me dissesse o que est�� pen-

sando. Talvez eu possa ajud��-la. Parece, quero dizer. . .

isso significa, possivelmente, que voc�� est�� ficando mo��a

e se afastando de mim.

��� Talvez.

Mam��e ficou desanimada. Foi at�� o bar e se serviu

de uma bebida.

��� Quer que acorde as suas amigas? Isso talvez a

anime.

��� N��o. Estou bem.

��� Claro que n��o est��. Sentada a��, t��o deprimida...

Por que n��o convida alguns rapazes para sair? Por exem-

plo, poderiam ir at�� S��o Conrado, ou mesmo dar um pas-

seio na Ilha do Paquet��. Olhe, nossos vizinhos s��o uns

bons rapazes. Quer que eu telefone para l��?

��� N��o. Eu acho que as minhas amigas os odiariam,

pois s��o crian��as demais.

��� Crian��as???

��� Sim. N��s gostamos de nos divertir com homens.

��� Bem, voc�� n��o pode prosseguir nessa atitude.

Suas amigas v��o achar que voc�� �� cacete.

��� 60 ���

��� Sinto muito. Elas me conhecem h�� muitos anos

e nunca disseram que as caceteei!

��� Bem, ent��o deixe que elas acordem. Eu vou pe-

dir ao Paulo que as levem para beber e nadar no Copa-

cabana Palace. Eu mesma pago.

��� Isso ficar�� muito caro.

��� Nem tanto. ��� Mam��e olhou-me como se me vis-

se pela primeira vez.

��� J�� sei o que a est�� preocupando. �� dinheiro,

n��o ��?

��� ��.

��� Quem foi que lhe falou?

��� O qu��?

��� Que estamos quebradas?

��� Eu percebi.

��� N��o, Regina. Algu��m mencionou o ato. Voc�� es-

t�� mentindo.

��� Pelo amor de Deus, mam��e. Eu a vejo pedindo

dinheiro para todos os homens que aparecem.

��� Nada. Nada.

��� Olhe aqui, Regina. Logo n��o teremos mais esse

problema. Eu vou fazer uma novela.

��� Isso s��o babozeiras.

��� Como?

��� Eu disse que s��o babozeiras.

��� Voc�� n��o acredita em mim?

��� Perdoe-me.

��� Um diretor me prometeu o papel principal de

uma novela.

��� 61 ���

Dei de ombros. Que poderia eu dizer? Havia tanta

coisa, mas eu preferi umas poucas palavrinhas.

��� Eu quero o papai.

��� Seu pai? E por que?

��� Mam��e, por favor, me diz onde ele est��. Isso ��

muito importante para mim.

��� Ora, minha filha, ele est�� em S��o Paulo. Mas que

bicho a mordeu para voc�� querer o seu pai?

��� O bicho da saudade.

��� S�� isso? N��o acredito.

��� O bicho da necessidade tamb��m Eu preciso de

dinheiro.

��� 62 ���



V

Dr., voc�� ter�� uma filha prostituta!

Logo que chegou ao Aeroporto, papai me telefonou.

Eu o contemplei e o achei lindo de morrer, quando nos

vimos. Alto, moreno, com um sorriso franco e encanta-

dor. Agora, dentro do t��xi, n��o tirava os olhos dele e

estava felic��ssima por que atendera ao meu chamado.

Papai era m��dico cirurgi��o em S��o Paulo.

��� Voc�� est�� linda, minha filha. Onde podemos ir,

para conversar �� vontade?

��� Em qualquer restaurante.

Pela janela do t��xi, ele olhava para todos os restau-

rantes, at�� que se decidiu por um, �� beira-mar.

��� Espero que goste. Se n��o gostar, pode escolher o

que mais lhe agradar, pois o dia e os restaurantes s��o

todos seus.

O restaurante era chiqu��rrimo. Mas, ao sentarmos ��

mesa, caiu entre n��s um sil��ncio constrangedor. Eu ti-

nha tanta coisa a lhe falar, mas a mente n��o destilava

coisa alguma. Tudo parecia vetado. Papai parecia tam-

b��m n��o querer interferir na minha mente. Talvez fos-

se melhor n��o falar em dinheiro. Pareciamos dois desco-

nhecidos. Tamb��m, naqueles anos todos, haviamos pas-

��� 63 ���

sado apenas algumas horas juntos. Como era doloroso o

desquite, meu Deus! Eu tinha sido feita, eu era daque-

la carne que estava ali na minha frente e n��o tinhamos

nada em comum. Oh! meu Deus, por que n��o o

fazia ficar ali e chamava mam��e e n��s tr��s iriamos para

um lugar s�� nosso, cheio de paz? Por que aquele homem

que era meu pai, tinha que ficar ali, s��rio, esfor��ando a

imagina����o, a fim de encontrar assuntos para conversar

com a sua pr��pria filha?

��� O que voc�� gostaria de comer, Regina?

��� Quero beber.

��� Beber?

��� Onde, diabos, voc��, com quinze anos, aprendeu a

beber ?

��� Com todos.

��� Como todos??? Mas voc�� ainda �� uma menina!

��� Uma menina sem pais. Jogada. E vou aprender

muita coisa ainda.

��� Voc�� deve falar essas coisas para sua m��e.

Fiquei sem saber o que falar.

��� Eu preferia que voc�� n��o bebesse.

��� Mas eu quero uisque.

Papai pediu duas doses.

��� Gosto muito de estar perto de voc��, minha filha.

��� Sim, papai. Faz um ano que n��o o vejo. Acho

que o senhor gosta mesmo.

��� Voc�� cresceu muito, nesse ano.

��� Tinha que crescer, n��o ��, papai?

O gar��on trouxe as bebidas, azeitonas e legumes

cruz. Comecei a beber e me senti mais confortada.

��� Regina, a juventude n��o deve procurar conforto

na bebida.

��� Com pais separados, vai procurar conforto on-

de? E, depois, n��o existe mais juventude moralizada.

��� Ainda insiste? Voc�� n��o deve beber!

��� 64 ���

��� S�� faltam tr��s anos para eu beber legalmente. Se

vou beber daqu1 a tr��s anos, come��o agora. O senhor n��o

acha infernal?

Prefiro n��o dar resposta. ��� Disse friamente.

��� N��o h�� mesmo uma resposta para uma menina

que bebe ilegalmente, perto do pai, e ��le n��o tem autori-

dade para faz��-la parar.

��� Bem, n��o estou aqui para tratar dessas coisas.

S�� a acho muito crian��a para estar bebendo.

Virei o conte��do do copo e olhei desafiante para

papai. Queria mago��-lo, queria que ��le sentisse que uma

menina sem lar n��o tinha chance de coisa alguma.

��� Acenda o meu cigarro, papai.

��� Tamb��m fuma?

��� �� a ��poca, papai. Hoje em dia n��o se bebe furti-

vamente e nem se fuma na privada, como se fazia an-

tigamente .

��� Acho bom n��o falarmos desse assunto. Voc�� me

deixa ressentido, pois discute comigo como sua m��e sem-

pre fazia. Voc�� est�� se parecendo tanto com sua m��e, que

nessas discuss��es me deixa irritado.

��� Ora, papai, h�� tantos casais que n��o se desqui-

tam por causa dos filhos. Voc�� e a mam��e me privaram

dcs anos que as outras crian��as podem desfrutar alegre-

mente, tendo o pai como companheiro nas festinhas de

anivers��rio. Privaram-me, tamb��m, dos olhares proteto-

res e ciumentos que outras crian��as encontram nas fa-

ces de seus p a i s . . .

Papai mudou de assunto.

��� Bem Regina, penso que voc�� est�� se sentindo no

auge da alegria por ter sa��do do col��gio.

��� Quem n��o se sentiria contente por sair de um

internato? O senhor sabe o que �� passar todos os dias

vendo todo mundo com a mesma cor de roupa ? Aqui em

Copacabana, a gente fica at�� espantada com a variedade

de cores que cobre todo mundo andando de l�� pr�� c��.

��� 65 ���

Ficamos algum tempo em sil��ncio. Eu com o meu co-

ra����o saltando e a garganta seca, pois ia pedir uma coisa

muito importante a ele.

��� Papai ��� disse eu, subitamente ��� porque o se-

nhor n��o faz uma visitinha a mam��e? ��� Por favor, v��

sim. Isso me faria muito feliz.

��� N��o, Regina. Sua m��e me atribuiria muita res-

ponsabilidade. Ela �� um problema. Algo muito s��rio.

Sinto muito ter que falar a verdade a respeito de sua

m��e. Mas ela �� muito dif��cil, e eu n��o conseguia compre-

ender os seus caprichos. Pedia para ela largar suas an-

dan��as pela televis��o, para cuidar mais de voc��, que era

uma criancinha.

��� Mas voc�� tamb��m n��o interferia no modo errado

que mam��e me criava. Lembro que, uma vez, eu implo-

rei a voc�� para me levar ao zool��gico, mas, porque ma-

m��e estava dormindo e n��o devia acord��-la, voc�� disse

n��o. Aquilo me doeu tanto como se eu tivesse recebido

uma punhalada em pleno cora����o, pois pensava que era

s�� estender a minha m��ozinha e amparar-me em voc��

que tudo se fortificaria, pois voc�� era o homem, era o

pai, era o equilibrado, era o que raciocinava.

��� Ora, minha filha, eu n��o podia me intrometer

ou interferir na maneira de educar de sua m��e. N��o po-

dia assumir um outro modo de educ��-la. Sua m��e, era

a respons��vel pela sua disciplina.

��� L��gico que podia ��� pedi mais uisque p papai

mandou o gar����o servir. ��� Mas, todas as vezes que dis-

cutimos essa quest��o, o senhor tenta sempre jusificar-se.

��� N��o �� isso, Regina. �� que tudo aconteceu h�� tan-

tos anos. Voc�� ainda continua a fazer a mesma coisa,

continua a pensar no passado. Ora, n��o adianta voc��

querer que eu me defronte com sua m��e.

��� Ent��o voc�� quer que eu os jogue um contra o

outro? Ent��o farei isso, de agora em diante. ��� Papai fi-

cou vermelho e mudou o assunto.

��� 66 ���

��� Gostaria de saber se, pelo menos, podemos jan-

t a r . . .

��� N��o sei ��� respondi agressiva. ��� Preferia outro

uisque.

��� N��o ficarei mais um minuto nessa mesa se voc��

tomar outra bebida. Dois u��sques j�� s��o suficientes.

��� Que �� que voc�� pretende agora, papai? Se en-

volver nos meus gostos ? Quer por acaso come��ar a diri-

gir a minha vida ? Voc�� j�� se esqueceu que desistiu de

me educar h�� muitos anos? Quando eu mais precisava

de voc��, nem para me levar as festinhas voc�� serviu.

Agora que sou menina mo��a, e preciso de meus pais jun-

tos, para que eu tenha um pouco de felicidade, j�� que

fiquei quase toda a minha vida num internato, vem voc��

com lorotas, que mam��e �� isso e aquilo. Mas n��o faz

mal, papai. Eu juro que me vingarei. Me vingarei por vo-

c��s continuarem desquitados. Vou fazer as piores coisas

que uma menina de quinze anos poderia fazer. Vou me

atolar na lama e arrast��-los comigo. Todos saber��o que o

grande m��dico, o famoso cirurgi��o, n��o passa de um in-

diferente. Todos saber��o que, o homem escolhido para

as maiores confer��ncias em todo o mundo, abandonou

sua filha ainda beb�� e a deixa, j�� mocinha, a passar as

maiores necessidades. ��� Olhei bem nos olhos de papai

e conclui, petulante:

��� Voc��, doutor Alberto Albuquerque, vai ter uma

filha prostituta. E das piores, voc�� vai ver.

��� Est�� bem. Regina. Seja o que voc�� quiser. Se

afunde na lama, n��o me incomodo. N��o posso ser o res-

pons��vel, desde que voc�� se recusa a fazer qualquer coisa

que eu lhe pe��a.

��� Ent��o sou eu que recuso, n��o ��, papai? Realmen-

te, voc�� tem mais uma qualidade que eu desconhecia:

Covardia. N��o sei como foi que voc�� conseguiu chegar a

invej��vel situa����o que ocupa. Talvez passando sobre os

��� 67 ���

mais f r a c o s . . . Eu pe��o para voc�� me dar um lar e voc��

vem dizer que eu me recuso a fazer o que voc�� manda.

Francamente... A ��ltima vez que o vi faz exatamente

um ano, e eu me recusei a obedec��-lo. N��o �� da gente

morrer de rir ? Agora compreendo at�� as discuss��es pre-

c a t a i s de voc��s. Era isso - - - mam��e estava sempre

embriagada, quando eu estava ainda em sua barriga. L��

dentro, eu sentia o cheiro do ��lcool, e sabia que voc�� n��o

estava raivoso por ver um feto b��bado, mas sim que mor-

ria de raiva pelo fato de mam��e gastar todo seu dinheiro

em bebidas e a�� as suas discuss��es chegavam a um au-

ge que o fazia querer estrangul��-la.

��� Pelo amor de Deus, Regina, pare de falar de sua

m��e.

��� Sen��o voc�� sair�� da mesa, n��o ��, papai? �� s�� isso

que sabe falar. Pode me largar aqui. Eu n��o me inco-

modo. Mas voc�� e mam��e v��o se arrepender. Agora vou

dar por terminada a nossa conversa. Quem vai sair da

mesa serei eu, depois que voc�� me der o dinheiro de que

necessito.

��� Quanto?

��� Cinco milh��es.

Papai ficou branco e gritou:

��� Cinco milh��es??? Mas sua m��e falou que quem

pagou o col��gio este ano fui eu? E olhe que n��o foi ba-

rato. Gastei milh��es.

��� E da��? N��o fui eu que pedi para vir ao mundo.

E depois, voc�� sempre tem a mania de falar sobre dinhei-

ro gasto comigo. Para voc��, dinheiro n��o deveria signi-

ficar coisa algum?, pois voc�� tem muito.

��� Para mim, dinheiro significa muita coisa pois eu

fa��o um esfor��o enorme para ganh��-lo. Voc�� �� igualzi-

nha a sua m��e. S�� se preocupa com o que eu posso dar a

voc��s.

��� 68 ���

��� Vou tomar mais um gole, papai, pois sinto von-

tade enorme de chorar. Voc�� n��o me ama. Juro que at��

gostaria se eu morresse.

��� N��o seja petulante, Regina.

��� Voc�� ao menos devia ter esp��rito esportivo ou

mesmo senso de humor. Exclamei.

��� N��o vejo nada engra��ado nisso.

��� N��o v�� por que n��o quer.

��� Ora, escuta...

��� Est�� bem. Est�� bem. N��o quer me dar o dinhei-

ro? Me venderei a qualquer homem na rua.

��� Por favor, filha. Cinco milh��es �� muito.

Vendo-me irredut��vel, papai suspirou e disse:

��� Pensei que voc�� tivesse me chamado por que a

saudade lhe apertava o cora����o.

Sorri.

��� N��o, papai. Eu o chamei por que mam��e est��

quebrada e eu preciso de dinheiro. Mas o mais importan-

te : eu chamei para ver se conseguia colar os peda��os do

nosso mundo. Mas estou me afogando e ningu��m se re-

solve a me salvar.

��� Como voc�� pode dizer uma coisa dessa, menina?

Se a situa����o da sua m��e n��o �� est��vel voc�� fica comigo

em S��o Paulo at�� que ela melhore. Voc�� pode voltar pa-

ra o internato ou escolher um outro col��gio. Temos um

colosso de boas escolas como a que voc�� estava.

��� S�� se voc�� levar mam��e, tamb��m.

��� Olhe, Regina, estou lhe dizendo que voc�� viveria

melhor na minha companhia. Sei que a sua m��e a magoa

muito. Voc��, eu quero, mas a sua m��e n��o.

��� 69 ���

��� Bem, sendo assim, prefiro viver com mam��e.

Olhei para papai e v�� que ele embranquecia. Por is-

so, disse:

��� Mam��e, apesar de viver rodeada de falsas amigas

e de falsos amigos, anda muito solit��ria.

Papai demorou para responder.

��� Eu j�� sabia o que voc�� ia dizer enquanto a obser-

vava, minha filha. Voc�� j�� decidira e estava apenas fin-

gindo. Eu mesmo permiti que voc�� crescesse como uma

menina sem pai. Eu a deixei e agora reconhe��o que er-

rei deixando a cust��dia com sua m��e. Agora �� tarde pa-

ra modificar a minha posi����o.

��� N��o �� tarde n��o, papai. �� s�� voc��s se reconcilia-

rem. Eu terei um lugar sad'o para crescer com uma for-

ma����o moral elevada.

��� Sei tudo isso, minha filha. Sei que o seu bem-es-

tar est�� acima de toda essa confus��o que aconteceu em

nossas vidas. Mas eu j�� esclareci dizendo tudo a respeito

de sua m��e e eu juro que n��o poderei viver com ela. Es-

t�� acima das minhas for��as.

��� Mas eu o amo tanto, papai. Amo-o como amo a

mam��e. Por que vivemos separados?

��� S��o coisas da vida, minha filha. Agora me diga

para que quer o dinheiro. E pe��a o jantar.

Enquanto comia, expliquei:

��� Ser�� ��timo ter o dinheiro, porque Ivete e Arlete,

duas de minhas amigas do col��gio, est��o aqui na Guana-

bara. O senhor sabe, as fam��lias delas sempre me con-

vidam para f��rias e fins-de-semana.

��� Ivete n��o �� aquela garota que a superintendente

disse que �� m�� companhia para voc��?

��� Que superintendente?

��� 70 ���

��� L�� do col��gio.

��� Oh, aquela �� uma idiota. Nunca gostou de Ivete

por que Ivete �� uma garota pra frente, que detesta ser

mandada. Oh, papai, fico pensando e at�� estreme��o em

pensar que voc�� n��o poder�� me dar o dinheiro. Essas me-

ninas adoram a praia de Copacabana. Toda essa bagun-

��a de praia as deixa malucas. Dizem sempre que, quan-

do acordam pela manha, correm �� janela para ver se o

mar est�� ali ainda ou se foi para o mundo de sonhos de

onde parece ter surgido.

��� Mas eu acho que voc��s deveriam passar as f��rias

em um lugar mais tranquilo onde exista atmosfera de

paz. Isso aqui �� muito agitado.

��� N��o para garotas de quinze anos.

Papai sorriu.

Depois do jantar me deu um cheque de dois mil

cruzeiros.

��� Mas, papai... eu p e d i . . .

��� N��o v�� me recriminar por n��o ter o dinheiro que

voc�� pretende, Regina. Tenho dificuldades em arranjar

dinheiro. Contudo, penso que se voc��s passarem o m��s

economizando, dar�� perfeitamente.

Peguei o cheque logo, antes que papai se arrependes-

se. Despedi-me dele depois.

No dia seguinte, acordei cedo, corri para o banco e,

com o dinheiro na bolsa, meus primeiros pensamentos

foram comprar bebidas. Comprei-as e, da janela do apar-

tamento, eu, Ivete e Arlete brindamos a beleza de Copa-

cabana .

��� �� uma cidade ador��vel ��� disse Arlete, fitando

da janela os lindos desenhos que beiravam a praia. ���

Gosta daqui, n��o, Regina?

��� 71 ���



��� E quem n��o gostaria?

��� Se n��o tivesse tantos homens queimadinhos eu

n��o gostaria ��� disse Ivete, tomando, de uma vez, o con-

te��do do copo.

��� Cristo, Ivete. Voc�� s�� pensa em homens!

��� Ivete ficou pensativa e depois respondeu:

��� Penso tanto em homens para esquecer... Bem,

para esquecer um certo h o m e m . . .

��� O grande amor de sua vida? ��� perguntei.

Ivete ficou p��lida e apertou o rosto com as m��os. Por

um momento, pensei ver l��grimas em seus olhos, antes

que ela escondesse o rosto.

* * *

Nessa mesma tarde, Paulo chegou com um Impala

e nos levou a dar uma volta pela Guanabara. A vis��o

dos edif��cios de apar��ncias iguais por todas as ruas que

passamos, fez-me sentir a saudade da grandiosa e mal

feita S��o Paulo, com seus altos pr��dios, m��dios pr��dios,

pequenos pr��dios, tudo na maior bagun��a, atravessados

por pontes elevadas que mostravam mais de perto suas

fachadas de estuque pintadas de cores encardidas. Na-

quele momento, olhando a famosa Copacabana, senti

uma sensa����o de paz, esquecendo, por momentos, a dis-

cuss��o que tive com papai. Agora, sentia dificuldades em

lembrar do que hav��amos falado, embora n��o me esque-

cesse da promessa de me vingar se ele n��o voltasse pa-

ra mam��e.

Paulo passou pelo apartamento de M��rio e subimos

todos para cham��-lo.

A porta foi aberta pela empregada de uniforme azul

dando-nos a impress��o de estar com um dos nossos uni-



formes do col��gio. Entramos na sala muito bem decora-

da, com poltronas de ar e grandes almofadas de espuma,

de diversos formatos, jogadas por todos os lados.

Nos atiramos nas poltronas, soltando gritinhos his-

t��ricos de medo que elas estourassem. Depois, manda-

mos a empregada servir bebidas enquanto apanh��vamos

cigarros nas mesinhas. Foi o instante em que surgiu Ma-

rio, vindo de um dos quartos, vestindo um roup��o bran-

co que n��o lhe escondia muitas partes do corpo. Estava

totalmente queimado pelo sol. Tinha uma cor de choco-

late.

��� Ol��, pessoal. Que surpresa formid��vel v��-los no-

vamente .

Juntou-se a n��s e ficamos todos bebendo, fumando

e conversando. Uma certa hora, pedi a M��rio para ir

trocar de roupa, pois queria dar um mergulho na pisci-

na que existia no seu pr��dio.

��� Claro, meu bem. Venha para o meu quarto.

0 quarto estava em formid��vel desordem. Ele co-

me��ou a apanhar roupas daqui e dali, xingando a empre-

gada, como se a coitada tivesse culpa dele trocar de rou-

pa de cinco em cinco minutos e jog��-las por todos os

lados.

��� Essa empregada �� um suino. Fica sempre beben-

do e quando est�� meio tocada n��o arruma nada. N��o

repare, Regina. Fique a vontade e se acha que deve cha-

mar as suas amigas, grite que elas vir��o.

��� N��o, M��rio. Nessa hora, acho que est��o inteira-

mente embriagadas e n��o poder��o entrar na piscina.

��� Ent��o eu subo com voc��. A piscina fica no ��lti-

mo andar.

��� Eu sei. Vim com mam��e uma vez. Voc�� n��o se

lembra ?

Ele bateu na testa.

��� Oh! Mas voc�� era t��o pequena. Mas, Cristo, agora

voc�� est�� um bocado legal. ��� M��rio ia falando enquanto

me guiava para o elevador. Ao chegarmos �� piscina, s��

encontramos dois rapazinhos que, com suas risadas in-

fantis, enchiam o ar.

Nadamos e nos sentamos nas espregui��adeiras.

M��rio perguntou-me:

��� Voc�� est�� gostando daqui?

��� De onde?

��� Da Guanabara.

��� Muito! Tudo �� formid��vel. S�� que n��o conhe��o

muitos rapazes.

��� Ora! Isso n��o �� problema. Eu estou aqui. Vou

arrumar um colosso de festas. Voc�� bebe, n��o ��?

��� Bebo.

��� Fuma?

��� Sim.

��� S�� cigarros ?

��� S��.

��� Nunca experimentou outras coisas?

��� N��o.

��� E suas amigas?

��� N��o sei. Eu n��o ia falar que elas fumavam ma-

conha no col��gio.

��� Voc�� quer experimentar?

Lembrei-me da vingan��a. Agora ia come��ar. A filha

do grande cirurgi��o fumando maconha.

��� Quero.

M��rio tirou um cigarro da cigarreira e me deixou

dar umas tragadinhas.

��� 74 ���

Logo me senti enjoada e ia desistir, quando a ima-

gem de papai se fez bem n��tida.

��� Fumei o cigarro inteirinho e me senti meio tonta

mas. . . feliz!

��� Gostou?

��� N��o �� l�� grande coisa.

M��rio n��o se deu por achado.

��� Voc�� quer ir a uma festa de fechar o com��rcio?

As mo��as tem que ir com o vestido bem decotado, ofe-

recendo os seios para facilitar o neg��cio.

Encarei-o com dureza. Ele fez de conta que n��o

percebeu.

��� Realmente, para ser uma garota pra frente, vo-

c�� tem que frequentar festas desse tipo, ou piores. Se-

n��o fica parecendo uma caipira.

Eu tinha que continuar a vingan��a. Aceitei.

��� E quando �� essa festa?

��� Hoje mesmo. �� s�� convocar a. turma.

��� Oh! Seria maravilhoso! Adoro festas, mas acon-

tece que n��o tenho nem um vestido decotado.

��� Isso se arranja.

��� Ent��o eu topo.

Assim, naquele momento, comecei a vingan��a que

prometera a papai se ele n��o voltasse para junto de

mam��e. Nesse momento comecei a adotar o padr��o de

vida da juventude transviada. Telefonei a mam��e di-

zendo que iamos passar a noite na casa de uma amiga

de Arlete que, inadvertidamente, encontramos quando

tomavamos um coquetel. Mam��e ficou muito contente,

��� 75 ���

talvez por que fosse economizar o jantar. Voltamos pa-

ra o sal��o e M��rio comunicou �� turma a tal festa.

��� Mas precisamos arrumar um companheiro para

Arlete.

��� Ora, �� s�� telefonar para Andr��.

No apartamento de M��rio tinha um mont��o de

vestidos super-decotados, que fomos usar sem sutian.

Mas, para mim, que tinha saido h�� t��o pouco tempo

de um internato, n��o usar sutian era meio indecente.

Mas, depois de uns goles, a coisa ficou natural. Toma-

mos mais uns goles e fomos para a festa, que estava

sendo realizada no apartamento de um jovem da mi-

nha idade, que os pais estavam viajando.

Quando chegamos, o apartamento estava apinhado

de gente. Fiquei meio encabulada. Quase todos os ra-

pazes estavam com tudo a mostra. As meninas era

aquele Deus nos acuda. Uma mais decotada que a ou-

tra. Os seios a mostra e os vestidos abertos na frente,

mostrando as coxas e o resto. Eu n��o estava acostu-

mada com tanta gente, e com tanta fuma��a de cigar-

ros . Um conjunto de rapazes com os cabelos enormes

come��ara a tocar. Os pares dan��avam e alguns pre-

feriam ir para os quartos para ficarem mais a von-

tade. Mario segurou-me pela cintura e, apertando-me

contra ele, come��ou a dan��ar, me levando.

��� Sabe que voc�� �� uma jovem muito atraente e

que tem seios lind��ssimos? J�� foram tocados por al-

gu��m?

Decidi ignorar a pergunta. Mas M��rio n��o tirava

os olhos do meu corpo. Seus olhos subiam e desciam.

Eu sabia que meus seios eram morenos, erectos e du-

rinhos, e fiquei toda arrepiada quando Mario abaixou

a cabe��a at�� eles e sugou-lhes os bicos, fazendo-me

quase desmaiar.

��� 76 ���



��� Tenho certeza de que voc�� gostou muito. Gos-

taria de lev��-la para um lugar mais tranquilo. Aqui

est�� muito quente e cheio.

��� Onde poder��amos ir?

��� Para o meu apartamento.

��� Seria formid��vel. Mas, e as minhas amigas?

��� Nesse momento, elas a ignoram.

��� N��o. Fica para outro dia. Hoje eu j�� estou

meio tonta.

A festa terminou as seis horas da manh�� e fomos

todos para o apartamento de M��rio Deitamos ali mes-

mo, nas almofadas da sala, pois n��o aguent��vamos

mais de cansadas. Tinhamos bebido muito, muito

mesmo.

Daquele dia em diante fomos a muitas festas e

conheci uma infinidade de rapazes. Eram meninos ain-

da, que andavam �� solta, pois os pais viajavam para as

Bermudas, para Nova York, It��lia, ��frica, enfim, para

mil lugares diferentes, e os filhos se esborrachavam de

beber, fumar e frequentar as mais ousadas festas. E vi-

viam se lastimando por terem sido atirados ao mundo

livre antes do tempo. Eu observei que quase todos aque-

les meninos que n��o saiam das festas n��o tinham con-

seguido concluir seus cursos de gin��sio pois estavam

constantemente suspensos e, quase sempre, por bebe-

deira ou por fumar maconha.

Eu apreciava essas festas e a intimidade do nosso

grupo, que se sentia ligado por uma esp��cie de revolta

contra os pais. Todos tinham uma queixinha contra o

pai ou contra a m��e. Tamb��m comecei a gostar da

abund��ncia de bebidas e da falta de pudor dessas fes-

tas. Nela encontrei o carinho que jamais tive em casa.

N��o sei bem isso. Talvez fosse o carinho dos amigos

que me deixava t��o f e l i z . . . As afei����es casuais, as

frequentes propostas que recebia, preenchiam a falta

de carinho dos meus pais e, com o correr do tempo,

reduziam a solid��o, que ficava coberta de cinzas den-

tro do meu cora����o. Mas, era s�� vir um ventinho, que

as cinzas iam para longe. Quando, a noite deitava,

sentia uma falta terr��vel do amor que nunca encon-

trara em meus pais. Ent��o pensava na garrafa que

estava em cima do criado mudo e, de gole em gole,

ia me atolando na lama.

��� 78 ���



VI

Gr��vida? P��lulas

Naquela noite que dormimos no apartamento de

M��rio eu fui a primeira a acordar. Olhei no rel��gio

pendurado na parede. Era exatamente, treze horas.

Levantei-me do almofad��o com a cabe��a rodando.

A empregada de M��rio entrou nesse instante e per-

guntou :

��� Quer tomar o caf�� aqui ou na cozinha?

��� Na cozinha.

Enquanto tomava o caf�� com leite, entrou Ivete.

Olhando para dentro da x��cara, gritou:

��� N��o, n��o �� poss��vel! Caf�� com leite! Voc�� deve

estar biruta, garota!

��� Ora, n��o vejo porque.

��� Ent��o vai ver! ��� Olhou para a empregada e

gritou:

��� Hei.me d�� uma dose dupla de u��sque!

��� Assim voc�� acabar�� uma alcoolatrazinha.

��� �� s�� isso que meus pais merecem! ��� Replicou

��� 79 ���



Ivete ��� ter por filha uma alco��latra pois os dois j��

o s��o!

A�� foi que a lembran��a da vingan��a que tinha pro-

metido veio �� tona.

Empurrei a x��cara de caf�� e pedi o mesmo que

Ivete.

��� Bem. Tamb��m beber sem comer �� chato. Hei,

empregada. Bota a�� salame, queijo, azeitonas e biscoi-

tinhos.

��� Olhe Regina, conte-me o que andou fazendo na

festa. N��o a vi uma ��nica vez.

��� N��o viu porque n��o quis. Estive o tempo todo

dan��ando com M��rio. E, por sinal, ele me convidou

para vir aqui no apartamento para ficarmos mais a

vontade.

��� Fant��stico! E voc�� aceitou?

��� N��o.

��� Boba!

��� Boba?

��� Claro!

Olhei bem para Ivete.

��� V o c �� . . .

��� Uma surpresa n��, Regina? M as, finalmente, a

coisa aconteceu.

��� N��o acredito.

��� Juro.

��� Quanto tempo?

��� Essa noite.

��� N��o? N��o �� poss��vel.

��� Claro. Eu estava numa tremenda bebedeira e

ele, o espertinho, aproveitou.

��� Paulo! Virgens! Se mam��e souber...

��� O que tem ? N��o se preocupe. Eu sei tomar as

p��lulas.

��� E que tal?

��� Olhe: o neg��cio arde pr�� burro. Mas �� legal.

��� E agora? Se os seus pais souberem?

Ivate ficou me olhando fixamente, como se n��o me

visse. Mas eu vi aquela coisa no seu olhar. Era como

os seus belos olhos se transformassem em olhos de

v��bora. Dissimulou e respondeu indiferentemente:

��� Isso eu vou deixar pr�� pensar depois. Agora que-

ro fazer amor muitas vezes, para passar a fome dos

meus dezesseis anos. Puxa, se visse que p��nis grande

e lindo que ele t e m ! . . . �� da gente morrer debaixo

dele!

��� Mas voc�� gosta do sujeito?

��� Que sujeito?

��� Ora, Ivete, do Paulo.

��� Ah, voc�� sabe que nem me ocorreu perguntar

ao meu cora����o?

��� E a coisa vai continuar? Quero dizer as re-

la����es?

��� Nem h�� d��vida. Pois foi o que acabei de dizer:

morrer debaixo dele!

��� Eu tamb��m gostaria de ter Mario agora s�� para

mim. Mas h�� tanta gente aqui no apartamento.

��� Por isso n��o. Vou acordar Arlete, Andr�� e Peulo.

Iremos para o apartamento de sua m��e. Voc�� nos en-

contrar�� l�� daqui a algumas horas. Mas tem um pro-

bleminha; e se sua m��e perguntar por voc��?

��� Ora, mam��e est�� doidinha para que eu perca

a virgindade. Ela vai dar hurras de alegria.

��� Nem tanto, Regina. Acho sua m��e meio qua-

drada.

��� 81 ���

��� �� que ela �� uma grande atriz.

E assim foi feito. Ficamos, naquele enorme apar-

tamento, eu e M��rio. Os empregados n��o contavam.

* * *

Acabei de tomar o u��sque e fiquei na sala espe-

rando M��rio acordar. Fiquei imaginando como seria

bom estar deitada ao lado dele, beijando-o longamente.

De s��bito, algu��m me agarrou por tr��s e me tapou os

olhos. M��os macias, quentes e perfumadas. Meu cora-

����o parecia querer saltar do peito. As m��os eram de

M �� r i o . . . Levantei as minhas m��os e fiquei tentando

tirar as deles de meus olhos. Venci e M��rio, rindo, foi

preparar duas doses de bebidas.

��� Espero n��o t��-la assustado.

��� De forma alguma.

Ele foi para o quarto.

��� Regina! ��� gritou l�� de dentro ��� gostaria de

tomar a sua bebida aqui? Estou meio cansado. Ainda

n��o estou bem desperto.

Fui e sentei-me na cama, ao seu lado. O quarto

estava imerso na penumbra.

��� Gostou da festa?

��� N��o, M��rio. Na verdade, quando se sai de um

internato, espera-se ver coisas perfeitas. A festa de on-

tem liquidou as minhas ilus��es. S�� por isso n��o gostei.

��� Mas gostou de dan��ar comigo?

��� Gostei. Mas estou com o corpo todo dolorido.

��� Quer que eu lhe fa��a uma massagem?

��� N��o sei, M��rio. N��o sei se ficaria bem.

��� Olhe, �� s�� voc�� pensar que eu sou realmente

um massagista.

��� 82 ���

��� Mas eu nunca fui a um massagista. A gente

tem que ficar n��a?

��� Claro.

Ocorreu-me, subitamente, que talvez n��o devesse

mostrar as minhas partes ��ntimas a um homem por

que meu corpo e meus seios ele j�� estava cansado de

ver em vestido de festa e quando tom��vamos banhos

de sol sem a parte de cima do m a i �� . Mas, a outra

parte, essa n��o. Juro que morria de vergonha. A�� a

coisa estourou dentro do meu c��rebro.

��� Voc�� eu quero, Regina, mas a sua m��e n��o. ���

A voz de papai martelou nos meus ouvidos.

Deixei M��rio tirar minha roupa e me deitei de bru-

��os na cama, a seu pedido.

��� Voc�� tem um corpo de carnes firmes, bem quei-

madinho de sol. S�� em pensar que tenho esse belo corpo

em minhas m��os, esque��o que seu massagista...

Eu adorava a sensa����o de fogo que queimava as

minhas veias quando aquelas m��os corriam pelo meu

corpo. Sentia que todo ele estava vestido de uma sen-

sa����o viva que crescia cada vez mais. Virei-me e en-

costei o meu corpo no corpo de M��rio e me comprimi a

ele. Deliciosamente, ele beijou-me a boca e foi descendo.

Depois, separou as minhas pernas e ficou olhando fixa-

mente no meio delas, dizendo:

��� Estou conhecendo hoje, pela primeira vez, a

virgindade.

Eu quis fechar as pernas, mas ele segurou-me fir-

memente os joelhos, escancarando-as.

��� Calma, Regina. Voc�� vai gostar. Eu juro que

ainda n��o conhecia a membrana t��o falada. �� uma pe-

linha esbranqui��ada, muito insignificante, mas que con-

forme o caso leva at�� ao crime. �� bela a virgindade ..

A cabe��a de M��rio foi se aproximando e senti sua

l��ngua ardente querendo arrebentar a insigniicante pe-

linha. Tomei-me de intensa vibra����o. Nunca meu san-

gue correra trazendo uma vibra����o como aquela. Mas

��� 83 ���

a sua l��ngua era fr��gil, e ele sabia disso. Deitou-se por

cima de mim e meu corpo come��ou a viver uma in-

tensidade que me fazia perder a consci��ncia. Foi quando

um grito animalesco escapou da minha garganta, sem

que eu pudesse ret��-lo. Suas carnes j�� estavam dentro

de mim. Eu era mulher. Papai havia de ficar bran-

quinho quando soubesse, pois era dos tais moralistas

hip��critas.

��� N��o, M��rio. A culpa foi minha. Fui eu que o

provoquei. Eu quero me vingar de algu��m e a melhor

maneira �� fazer coisas erradas. As piores. Agora eu

gostaria que voc�� me levasse para casa.

��� Ok. Vou trocar-me e buscar o carro.

��� Enquanto isso vou tomar mais um gole. ��� Dis-

se-lhe virando o conte��do do copo de uma vez.

��� 84 ���



VII





Meus 15 anos Fervem


Entrei no quarto das meninas e fiquei admirando

a desordem. Fechei a porta depressa, para mam��e n��o

ver. N��o encontrei nem um lugar para sentar. As ca-

mas estavam lotadas de roupas. O ch��o, coberto de dis-

cos. Enfim parecia ter havida l�� um terremoto. Ivete,

sentada no ch��o em cima das pernas, esmaltava as

unhas, e Arlete, deitada em cima de um monte de

an��guas e vestidos, acompanhava o ritmo da m��sica,

balan��ando as pernas. Corri e desliguei a eletrola. Ivete

levantou a cabe��a e Arlete, repousando a cabe��a num

travesseiro, fitaram-me.

��� Como foi, hem, Regina?

��� Foi legal o neg��cio?

��� Bem, e u . . . M �� r i o . . . Quer dizer... n��s manti-

vemos rela����es, se �� isso que voc��s querem saber.

��� Mas essa �� grande, querida. Grande de morrer.

��� disse Ivete. ��� Ent��o agora voc�� n��o �� mais uma

menina ? Agora �� uma mulher. Legal. Legal pr�� burro.

E como foi? Doeu muito?

��� Como se eu tivesse levado uma punhalada. Mas

isso n��o faz diferen��a agora. Para todos os efeitos eu

��� 85 ���

ainda sou uma menina de quinze anos, virgem. Mas

por dentro j�� sou uma mulher experimentada.

Arlete sorriu, sacudindo a cabe��a.

��� Mas que hist��rias s��o essas, gente?

��� Simplesmente que Regina n��o �� mais virgem.

Arlete cruzou as m��os debaixo da cabe��a.

��� Juro, nunca poderia imaginar que isso pudesse

acontecer a voc��, Regina.

��� Voc�� quer dizer: n��s d u a s . . . n��o �� Arlete ? ���

Exclamou Ivete.

��� Voc�� tamb��m! Poxa, �� mesmo engra��ado que

voc��s, umas inocentes escolares, j�� tenham essa expe-

ri��ncia t��o grande. Gozado, as voltas que a vida d��.

Agora vou precisar arranjar um homem tamb��m para

mim. Sinto necessidade de restabelecer uma superio-

ridade moral para n��o ficar feito boba ��� disse Ar-

lete.

Melhor �� arranjar logo dois para ficar diferente de

voc��s duas.

��� Mas eu sempre tive mais que dois ��� argu-

mentou Ivete, com orgulho.

��� Olhe gente: n��o devemos acanalhar a coisa. Por

outro lado, fiz para me vingar de meus pais. Mas estou

contente por ter revelado o meu segredo a voc��s.

��� Essa �� a sua justificativa, hem Regina? ���

disse Arlete. ��� Porque voc�� quer se vingar de seus

pais?

��� Pelo desquite.

��� Ent��o, eu tamb��m vou me vingar, pelo aban-

dono. Maus pais est��o na Europa e o que eu sei deles

�� s�� pelo cheiro do cheque que me enviam todos os

meses.

��� 86 ���

��� Pois ent��o seja nossa c��mplice.

��� Bem, o neg��cio �� que eu preciso escolher um

homem legal, e n��o esses est��pidos colegiais.

��� N��s n��o fizemos com colegiais est��pidos mas

com rapazes j�� vividos ��� disse Ivete. ��� Olhe, Arlete:

Andr�� �� um belo tipo!

��� �� . . . Vou escolher. Talvez apare��a coisa melhor.

Caimos na risada.

��� Voc��s viram mam��e?

��� Disse que ia �� televis��o.

��� A h ! Bem, voc��s tomam alguma coisa?

��� Claro, estamos com a garganta seca.

��� Escolha nessa desordem toda um bom disco pa-

ra nos acompanhar na bebida.

��� Que tal Roberto Carlos?

��� Grande.

Voltei com a garrafa de conhaque, acendemos ci-

garros e, bebendo, ficamos ouvindo m��sica. Era t��o gos-

toso ficar ali deitada na cama em sil��ncio. Era bom es-

tar de f��rias. Era bom ter perdido a virgindade com um

rapaz, como M��rio. Tamb��m era bom estar com duas

amigas que conhecia t��o bem e com as quais n��o tinha

necessidade de esconder nada. Constitu��amos um mun-

do feliz estando assim juntas, um mundo sem segredos

e sem censuras. Naquele momento, ouvindo Roberto

Carlos, fiquei pensando que seria formid��vel se nossas

vidas n��o seguissem rotas diferentes. Como gostaria que

estiv��ssemos sempre juntas, sem qualquer tens��o ou

incompreeins��o. Nossa amizade refor��ava-se pelos segre-

dos que deix��vamos transparecer em nossas almas. E

foi Ivete quem quebrou o sil��ncio.

��� 87 -

��� Olhe a��, Regina, a�� perto de voc��. A carta que

enviei aos meus pais devolvida pelo correio. Vai ver que

o velho vem aqui bisbilhotar a minha vida. Aposto que

ele mandou mam��e para uma esta����o de ��guas.

��� Mas a sua m��e fica na esta����o de ��guas sem o

seu pai?

��� Voc�� bem sabe que os dois bebem pra burro. Mas

mam��e n��o liga para as minhas aus��ncias. Diz, uma

vez ou outra, que essas minhas estadas com amigos s��o

muito prolongadas. E �� s��.

��� E se o seu pai vier aqui, o que far��?

��� �� muito dif��cil dizer. Pode ser que me esconda

e mande dizer que j�� voltei para casa. Voc�� sabe, eu

n��o suporto ficar na companhia de meus pais. Est��o

sempre b��bados. Mam��e, quando bebe, �� legal, mas pa-

pai �� duro de aguentar. Por isso passo em casa o menos

tempo poss��vel. Acho mesmo que quando ainda dormia

no ber��o j�� sentia vontade de estar longe de meus pais.

Principalmente de papai.

Ivete calou-se de repente. E bebeu de uma vez tudo

tudo o que restava do copo.

��� Mas por que eles bebem tanto?

��� Acho que come��aram como n��s, aos quinze anos.

Um sil��ncio f��nebre caiu sobre o quarto.

��� Fale de seu pai, Ivete ��� pedi.

Ivete arregalou os olhos. Seus l��bios se abriram mas

n��o saiu nem um som. Depois, sorriu meio sem-gra��a

e come��ou.

��� Papai �� violento. Quebra tudo quando �� contra-

riado em alguma coisa. Eu n��o o respeito por que ele

faz tudo para me atormentar. Se eu vou a festas e fico

at�� muito tarde, durmo na casa de amigas. E papai

��� 88 ���

sempre diz: "Aposto que est�� dormindo com algum va-

gabundo". Fica louco de raiva. Voc�� sabe, somos da alta

sociedade. H�� nessa vida muito luxo, bailes de todas as

esp��cies, jantares e banquetes. A gente n��o pode ficar

a toda hora agarrada a saia da m��e, voc�� n��o acha?

��� Mas ele j�� lhe bateu alguma vez?

Pensei que Ivete n��o fosse responder. E sua voz saiu

cheia de ��dio.

��� Uma vez ele me deu uns tabefes, mas eu lhe

dei um pontap�� naquele lugar que foi s�� pena que voou.

Eu n��o tenho medo dele. Se algum dia ele tentar me

agredir, juro que lhe dou um tiro, ou dois, conforme

for preciso, para mat��-lo.

��� ��, Ivete. Eu sei a vida desagrad��vel que voc��

vive com seus pais, mas tanto ��dio a s s i m . . . ?

Arlete sentou-se na cama e disse:

��� Eu tamb��m sei a vida horr��vel que Ivete vive

com os pais, mas n��o quero saber mais nada a respeito.

Tenho horror de homens do tipo do pai de Ivete. ��

melhor a gente mudar de assunto. Olhem, eu acho que

a gente devia mudar de rapazes, conhecer nova turma.

��� Oh! gente, seria maravilhoso. Adoro fazer novas

amizades.

��� Eu acho formid��vel estar na Guanabara, mas o

problema �� que n��o conhe��o outros rapazes, sem ser es-

ses que vivem nos rodeando na praia.

��� Bem, Regina, agora que a gente j�� n��o �� mais

virgem, posso arrumar um colosso de festas. Antes n��o

seria poss��vel porque voc�� se sentiria deslocada.

��� Mas, Ivete, se eu, que sou do sul, n��o conhe��o

muitos rapazes morando aqui, imagina v o c �� . . .

��� 89 ���

��� Ora, querida, n��o se esque��a que um monte de

cariocas frequentam minha mans��o l�� em Pernam-

buco . . .

E por falar nisso, temos uma tremenda festa para

amanh��. Provavelmente voc�� far�� novas e ricas amiza-

des. Depois que a turma souber que voc�� tem quinze

anos e j�� est�� furada, n��o haver�� problema de esp��cie

alguma.

��� Ei ��� exclamou Arlete ��� Voc��s est��o esquecen-

do de mim.

��� Nessa voc�� n��o poder�� entrar, criancinha. S��

depois.

��� Mas se a minha oportunidade de arranjar um

belo e bom amante for hoje, hem? O que voc��s me di-

zem?

��� V�� l��. Talvez voc�� esteja certa. Com algum de

meus amigos voc�� se encontrar�� a si mesma.

��� E encontrar�� a oportunidade de se revelar mu-

lher.

��� Oh! ��� exclamou Arlete ��� isso ser�� maravilho-

so. Adoro o contacto com homens e voc��s imaginam

ent��o sentir um homem inteirinho? Vai ser de enlo-

quecer!

Arlete levantou-se e, rodando de bra��os abertos pe-

lo quarto, repetiu: ��� Vai ser de enloquecer!

��� Olhe, pessoal: o melhor �� a gente ir se arru-

mando para a festa. Vamos at�� a av. Nossa Senhora

de Copacabana comprar vestidos e coisas novas. ��� Foi

dizendo Arlete.

N��s tr��s saimos em micro-vestidos que mam��e cer-

tamente odiaria, e com sand��lias tran��adas at�� as

coxas.

Na Avenida Nossa Senhora de Copacabana, quan-

do olh��vamos vitrines escolhendo coisas, Ivete gritou:

��� 90 ���

��� J�� consegui arrumar o destruidor da sua vir-

gindade, Arlete. Olhe aquele ali. �� rico pra xux��. Es-

tuda na Inglaterra. Dizem que no mesmo col��gio que

o Pr��ncipe Charles.

Arlete olhou para todos os lados e, com os c��lios

posti��os piscando tremendamente, falou:

��� Cad��? N��o vejo nenhum tipo londrino aqui.

��� Voc�� n��o vai querer que um p��o daqueles este-

ja a p��, n��o ��, querida? Olhe ali, naquele mustang

met��lico. Espere. Ele j�� nos viu. Chi, est�� descendo do

carro, fazendo parar o tr��nsito. Olhem, todo mundo

est�� xingando. Veja s�� os nomes.

��� Hei, Ivete, traga as amigas. Vamos at�� S��o Con-

rado.

Jos�� era, de fato, um homem simp��tico. Alto, mo-

reno, bem queimado. Em S��o Conrado sentamo-nos em

bancos toscos e ficamos tomando agua de coco.

Jos�� logo gostou de Arlete, pois ela estava atraen-

te com seus oculos escuros e seu ar de menina sofisti-

cada.

��� Quanto tempo voc�� leva para conquistar Arlete,

heim Jos��? Est�� querendo ir naquela festa hoje a

noite.

��� Bem, depende de ela estar com vontade...

��� Morrendo ��� disse Arlete. ��� Meus quinze anos

fervem de ansiedade.

��� Mas voc�� �� menor?

��� Quinze anos.

��� Mas depois n��o vai haver bronca.

��� Que nada. Meus pais est��o na Europa. Eu sou

filha ��nica e fa��o o que bem entendo.

��� 91 ���

��� Sabe, Jos��, ��� Ivete falou rindo, ��� Arlete, quan-

do �� beijada sente o cora����o arrepiar.

��� O cora����o?

Caimos na risada.

��� Bem Arlete, eu tenho apartamento em Bota-

fogo. Espero-a l�� ��s quatro da tarde, amanh��. N��o po-

der�� ser hoje, o que sinto muit��ssimo, porque acabo de

comprar um carro esporte e ia busc��-lo quando as en-

contrei. A festa ser�� transferida para amanh��. Deixa

pra mim.

��� 92 ���



VIII

Largue-me... dois

��s quatro horas do dia seguinte, vimos o lindo car-

ro esporte, de linhas baixas e convers��vel, estaciona-

do no meio fio.

��� Puxa que carro! O homem tem gosto.

��� Precisa saber se �� dele, Regina.

��� Claro. Ivete. Olhe ali no espelhinho. Leia o que

est�� escrito. Jos�� Siqueira.

��� Voc�� est�� nervosa, Arlete?

��� Nem um pouquinho.

��� Quer que subamos com voc��?

��� N��o. Se fosse um col��quio com a professora

do col��gio, a�� sim, eu precisaria de ajuda.

��� Olhe, eu acho que essa cal��a Lee, just��ssima, e

t��o apertada, vai atrapalhar um pouco.

��� E voc�� acha que vou ficar de cal��a?

O povo que passava, virava-se para ver quem ria

t��o escandalosamente. Arlete entrou no pr��dio abanan-

do a m��o e andando:

��� 93 ���

��� At�� a pr��xima, queridas. Depois lhes conto tim-

tim por tim-tim.

* * *

Depois, Arlete contou:

��� Entrei no pr��dio e apertei a vista na penumbra,

para ver onde era o elevador.

��� O que deseja, srta.?

O zelador de cabelos brancos fitava-me, com um

rosto carrancudo.

��� Eu e s t o u . . . Bem eu desejo falar com o senhor

Jos�� Siqueira.

��� Ele a convidou?

��� Sim.

��� Um momento. Ligou para o apartamento dele...

��� Pode subir mocinha, apartamento 208.

��� Ok. Obrigada. Fiquei meio embara��ada, pois

nem sabia onde era o elevador.

O zelador me acompanhou, e com um riso c��nico

abriu a porta dizendo: A porta do apartamento tam-

b��m est�� aberta. �� s�� entrar.

Jos�� estava recostado em um sof��, lotado de al-

mofadas. Achei-o petulante pois n��o se dera nem ao

luxo de ir me buscar no sagu��o.

Levantou-se quando entrei por uma porta j�� aberta.

��� Meu Deus!! Voc��s tinham que ver como ele esta-

va vestido. Usava um camisol��o branco de seda que lhe

cobria os p��s. Tinha nas m��os, ali��s em cada dedo, um

enorme anel. Quando entrei, fez uma rever��ncia.

_ 94 ���

��� Entre, querida ��� disse sorrindo ��� Como voc��

�� maravilhosa vindo para mim. Espere, eu a ajudo a

tirar o casaco. Sou um cavalheiro, sabe? N��o fui es-

per��-la l�� embaixo porque trocar de roupa se torna

enfadonho. Vou servi-la de alguma bebida, ou voc�� s��

bebe coca?

��� U��sque com gelo.

Entrou logo depois com uma bandeija de prata,

com dois copos da bebida e sentou-se ao meu lado, di-

zendo: ��� Estou com uma ressaca infernal, mas tam-

b��m estou com a l��ngua para fora de vontade de beber

Bebia aos goles, enquanto falava:

��� Arlete, voc�� est�� celestial. Dev��amos ficar aqui

a tarde toda. N��o sei porque voc�� quer ir naquela fes-

ta. ��� Deslizou sua m��o pelas minhas pernas.

��� Dizem que �� uma festa fant��stica. Montes e

montes de gente nua. dan��ando e quando est��o cansa-

das deitam-se no ch��o e . . .

��� Realmente, �� a juventude, ��� falou com um

sorriso leve ��� juventude que acha que o sexo deve ser

livre e feito ��s claras. E voc��, o que acha a�� nos seus

quinze anos?

��� Acho que o amor deve ser livre, por isso aqui

estou. N��o ser virgem n��o �� mais problema hoje.

��� Mas para casar ��.

��� S�� as quadradas pensam a s s i m . . .

��� Voc�� parece uma menina muito bem cuidada.

��� ��, tenho muito dinheiro, e me cuido. Ali��s, cui-

do do corpo.

��� E do esp��rito?

��� Apesar de meus vinte anos, ainda penso como

os amigos. A alma tem que ser cuidada. Mas foi ma-

��� 95 ���

ravilhoso voc�� ter vindo. Tenho certeza de que vai cor-

rer tudo bem.

Ele olhava-me fixamente. Tirou o copo de minha

m��o e as apertou ternamente.

Sorri e lhe perguntei:

��� Voc�� est�� escandalizado com o meu jeito?

��� N��o, n��o. Absolutamente. S�� que fico a imagi-

nar como ser�� realmente a juventude daqui a alguns

anos.

��� Eu acho muito infantil ficar me preocupando

com o que possa acontecer daqui a alguns anos. Prefiro

viver o presente, se voc�� achar melhor. Se n��o, vamos

ficar aqui filosofando, como sacerdotes budistas. Voc��,

vestido assim, est�� parecendo um deles.

��� Aqui no Rio �� a moda, voc�� tem visto homens

vestidos assim? N��o?

Muito me admiro. Isso �� o "weston", t��o famoso.

��� Tive pouca conviv��ncia com o sexo oposto. Che-

gamos a alguns dias de Recife.

��� A h !

��� Como ele n��o resolvia falar em cama, eu logo

pensei que fosse homossexual. A�� fiquei estudando-o,

enquanto ele se recostava, langorosamente, contra as

almofadas do sof��. Tinha uma face atrante, e parecia

extraordinariamente aquele s��mbolo do homem em de-

cad��ncia sexual. Ser��, pensei, que todo mundo acha que

ele �� vigoroso e ningu��m sabe de seu segredo? Ele olha-

va-me sorrindo. Ent��o lhe falei:

��� Olha aqui, Jos��, voc�� pensa que ter intimidade

comigo �� pervers��o?

��� 96 ���

��� Oh! ��� Disse ele sorrindo. ��� Voc�� est�� com mui-

ta pressa. Calma, menina. Isso n��o se faz assim, sem

mais nem menos.

��� �� que minhas amigas est��o me esperando l��

perto de seu carro.

��� Minha querida crian��a, voc�� devia estar ame-

drontada, e n��o permitir que homem algum a possuisse.

Podia, agora, recuar e sair correndo daqui levando o que

os homens brasileiros pensam valer mais que tudo, mes-

mo m a i s que o car��ter, que a honra, que a bondade, que

a dignidade, que a nobreza de esp��rito: a virgindade.

Mas sei que a sua juventude est�� enraizada na atual

idade. Para voc�� e as jovens de hoje, a juventude ��

um jogo de satisfa����es do qual se tem que participar. Vo-

c�� sabe que tem muito a perder nesse decadente mun-

do belo e perigoso. Contudo, minha linda crian��a, est��

determinada a manter a sua posi����o. Sente que ser��

desprezada, se continuar virgem, no seu mundo de jo-

vens que t��m um mundo �� parte, e esse mundo tam-

b��m �� seu. Voc�� quer agarr��-lo com unhas e dentes e,

para isso, tem que seguir jogando, sem se surpreender

com coisa alguma.

Voltou a pegar minhas m��os.

��� Sinto uma imensa atra����o por voc��. Voc�� �� de-

safiante. Venha c��.

Levou-me para o quarto.

��� Puxa, at�� que enfim, ��� disse Ivete ��� mas con-

tinue. Fez ou n��o fez?

��� Calma, chego l��. Eu disse que ia contar tim-

tim por tim-tim. O leito era grande e redondo, forrado

��� 9 7 ���

de seda negra, com um monte de almofadas coloridas

�� volta. Em dado momento, ele disse:

��� Bem, acho melhor voc�� tirar a roupa.

Depois, ele veio at�� mim e beijou-me na boca, de-

liciosamente, dizendo:

��� A decis��o �� sua. Fico ou n��o fico presente?

Dei de ombros. N��o deixei por menos: Ora, quem

vai funcionar �� voc��, Jos��. N��o sei como devo fazer. ��

a primeira vez.

��� Oh, ent��o tudo deve ser maravilhoso e rom��n-

tico. Vou colocar um disco na vitrola enquanto voc��

se deita. Quer Wagner, Bach, Chopin, F r a n z . . . ?

��� Chopin.

��� Tirei a roupa e fiquei olhando onde deitar. Afas-

tei algumas almofadas e recostando-me na cama, fiquei

ouvindo Chopin, enquanto ele foi at�� o banheiro. Ouvi

o chuveiro. O disco, o chuveiro, e eu l��, n��a, feito uma

tonta. Tive uma vontade enorme de correr �� janela e

chamar o primeiro homem que passasse. Mas nisso ele

surgiu, n��, friccionando as costas com uma toalha.

��� Voc�� tem um lindo corpo, seios retos, grandes

coxas e cintura fina. Assim deitada, parece uma deusa

grega.

��� Chi ��� fiquei pensando. ��� banho, disco, deu-

sa. Quanta chatea����o para entrar no rol das mulheres

desvirginadas. Puxa, como o homem era dif��cil. Era um

homem desencorajador. N��o aguentei mais. Quando ele

foi �� frente do espelho pentear os cabelos, sentei-me na

cama e gritei:

��� 98 ���

��� Olhe aqui, Jos��. Ou voc�� �� um incapaz ou est��

brincando comigo?

��� Ele sentou-se ao meu lado na cama e me empur-

rou delicadamente contra as almofadas.

��� Sabe que seu corpo assim moreno fica maravi-

lhoso entre essas almofadas brancas?

��� Sei ��� disse eu, zangada. ��� mas acho que para

voc�� nada disso interessa. Voc�� n��o pode amar, n��o ��?

��� Um fluxo de sangue abrazou-lhe o rosto. Ouvia-

-se-lhe o cora����o bater, t��o forte que fiquei im��vel.

��� Vou lhe mostrar ��� disse. ��� Voc�� jamais es-

quecer�� esta tarde. ��� Subiu na cama como um le��o.

Depois, ficamos abra��ados numa doce lassid��o, acon-

chegados um ao outro.

��� S�� isso? ��� perguntou Ivete.

��� Ora, eu tamb��m n��o vou dizer como foi que

abri as pernas e o neg��cio entrou, que ele gemeu e que

eu gemi. Isso todo mundo faz igual. Voc�� gemeu e gri-

tou, Regina. Pois eu tamb��m gemi e gritei.

��� E depois, o que ele disse?

��� N��o sei por que, mas Jos�� �� t��o esquisito. Quan-

do levantou-se da cama, olhou-me longamente e disse:

��� Pronto, agora v�� para o seu lar em peda��os,

para os rapazes ricos da turminha da Ivete, que riem

pelas costas da facilidade com que possuem a garota

que escolherem. V�� para o seu mundo onde s�� existe

sexo e n��o existe o amor. Se voc�� tivesse um pouco de

vergonha sabe o que faria agora? Deitaria de bru��os e

choraria.

��� Ora, mas que homem besta. Por que voc�� n��o

mandou para a merda ou para a puta-que-o-pariu?

��� 99 ���

��� Nem liguei para o que ele disse. Que tal, vamos

�� festa?

Voltamos para o apartamento e mam��e n��o havia

chegado. Ficamos tomando u��sque, numa garrafa mes-

mo, e fumando.

��� Puxa, se a gente tivesse aqui um daqueles ci-

garros de maconha, seria vibrante, heim, gente?

��� Eu n��o gostei muito ��� exclamei, depositando

a garrafa em cima de mesinha. Arlete e Ivete me olha-

ram admiradas.

��� N��o v�� nos dizer que voc�� j�� fumou o fuma��a?

��� Que fuma��a?

��� �� como chamamos os cigarros de maconha l��

no col��gio?

��� Claor que fumei. ��� falei com orgulho. ��� M��-

rio deixou-me fumar um inteirinho.

��� E o que voc�� sentiu?

��� Uma tonteirinha, e me pareceu que me reani-

mou um pouco o esp��rito. Fiquei meio vidrada.

Ivete riu.

��� V��, querida. Acho que ele lhe deu foi um ci-

garro de fumo de corda, porque maconha fumada a

primeira vez faz a gente se sentir mal pra burro.

��� E o que se sente?

��� Bem, todo mundo sente uma estranha sensa-

����o de sono. Depois das primeiras tragadas sobem l��

do est��mago ondas de mal-estar de minuto a minuto.

Um suor frio banha o rosto da gente e o enjoo do es-

t��mago faz a cabe��a ficar girando. Eu quase vomitei

as tripas. Nunca me senti t��o mal durante todos os

meus dezesseis anos.

��� 100 ���

��� E por que voc�� continua fumando?

��� A gente se acostuma. Agora a sensa����o �� dife-

rente quando fumo um fuma��a. Parece que estou vi-

vendo em c��mara lenta. �� gostoso e gozado.

��� Ent��o voc��s querem dizer que n��o fumei ma-

conha ?

��� Claro, querida. Mas na festa de hoje haver��

maconha, e muita. Voc�� vai ver como �� diferente. Vai

ser divertido como o diabo. Quero ver Regina fumar

um fuma��a.

Suspirei e bebi mais um gole da garrafa e a passei

para Arlete.

��� Eu devia ter sabido disso. ��� falei. ��� Algu��m

j�� me havia falado dos sintomas. Quer dizer que aquele

cretino do M��rio me enganou e, enganando-me, cortou

a minha vingan��a. Mas n��o faz mal. Hoje afundarei

mais um p�� na lama fumando maconha de verdade.

��� Sua m��e est�� demorando, Regina. Acho melhor

a gente ir se vestindo. J�� s��o nove horas e os rapazes

aparecer��o para nos buscar l�� pelas dez.

��� Telefone para ela.

Liguei o telefone para o canal de televis��o e foi

um custo para mam��e atender.

��� Mam��e, olha, n��s vamos numa festa. N��o sa-

bemos a hora que voltaremos. N��o se preocupe, t��?

��� Otimo, querida. Fiquei encantada com seu te-

lefonema. Estou ensaiando a novela. Obtive um papel

formid��vel. Depois do ensaio irei com a turma aqui da

tv para uma boate, por isso fique na festa sossegada.

��� Mas, mam��e, a senhora disse a papai que se ele

custeasse as despesas do apartamento que ia largar m��o

de novelas e de cinema.

��� 101 ���

��� Ora, querida, falei por falar. N��o se incomode

que seu pai paga tudo. Divirta-se, meu bem.

Quando desliguei, sentei-me desanimada no sof��.

��� O que houve? Sua m��e foi contratada?

��� Sim. ��� disse eu, tristemente. ��� Os malditos

pap��is na tv levam para longe, mais longe, o lar que

eu sempre almejo, com os meus pais reunidos. Ela acei-

ta uns papeizinhos que, para ela, psicologicamente, ��

de uma grande atriz. Mas no fundo o que ganha n��o

d�� nem pra comprar um sabonete.

Sentei-me e acendi um cigarro.

��� O engra��ado �� que ela �� um fracasso como atriz,

mas �� a ��nica coisa que a faz gostar da pr��pria exis-

t��ncia. Pequenos pap��is fazem com que ela se considere

um ��xito. Um insignificante papel numa novela vale

mais do que um marido, uma filha e um lar.

��� 102 ���





IX





Festa do Vale Tudo


Na festa, ficamos conhecendo in��meros e diferen-

tes rapazes. Chamavam-na a "Festa do Vale-Tudo". No

enorme sal��o, a orquestra ensurdecia a gente. A tur-

ma pulava, agarrados como se fosse, cada par, um s��,

Todos os que queriam defenda a sua m�� reputa����o e a

baixa moralidade estavam presentes. Digo, reputa����o e

moralidade baixa de jovens da alta sociedade, desses

tipos que um quer aparecer mais que o outro. Eu achei

que eles, com os peitos n��s, com os pesco��os enfeita-

dos com in��meros colares, correntes, medalhas, esta-

vam fantasticamente unidos por uma rebeli��o comum

contra a falta de um lar sadio. Tamb��m, eu, vendo

aquele bando de jovens ricos e livres nos seus verdes

anos, podia fazer o que bem me aprouvesse. Senti que

mais crescera dentro de mim o abandono em que me

via e comecei a gostar da abund��ncia de bebidas e da

falta de cerim��nia e dos gestos escandalosos do pessoal

dessa festa. Na turma, encontrei uma receptividade

que me emocionou. A afei����o dos homens, quase me-

ninos, que me faziam as mais diversas propostas, a

camaradagem na bebida, os di��logos, os carinhos pre-

encheram nessa noite o vazio que sentia dentro do meu

cora����o. Nessa festa, a bebedeira que tomei me levou

a um quase esquecimento do desquite dos meus pais.

Aceitamos o convite de alguns rapazes e fomos para o

apartamento de um deles. Quando chegamos, senti que

havia batido o meu recorde de capacidade de resist��n-

cia. Estava completamente b��bada, mas assim mesmo

aceitei o desafio de meus companheiros e bebi at�� cair.

Acordei na manh�� seguinte, com as sacudidelas de

Arlete.

��� Acorde, Regina. S��o seis horas.

Abri os olhos, olhei para os lados e vi que estava

em uma sala deitada no ch��o. Perto de mim havia um

rapaz dormindo. Levantei-me e tentei acordar o jovem.

��� N��o adianta ��� observou Ivete, lugubremente

��� ele est�� desacordado de tanto beber.

��� Me d�� um cigarro.

��� N��o temos mais. Mas ainda h�� bebida.

��� N��o. Ainda estou tonta.

��� Tonta ou b��bada?

��� Estou s��bria, mas morrendo de fome.

��� N��o existe cozinha neste apartamento?

��� Vamos procurar.

��� Tem cozinha, tem geladeira e nada para co-

mer.

��� Vamos descer e procurar um bar, eu sei l�� o

que. A fome que estou sentindo �� tremenda.

O bar estava quase vazio. Sentamo-nos em banqui-

nhos girat��rios e pedimos uma m��dia com p��o e man-

teiga .

O caf�� com leite tinha um bom gosto naquela hora

que o est��mago roncava de fome. Ivete comprou cigar-

��� 104 ���

ros e ficamos no bar fumando. Perto de n��s estavam

sentados dois homens, que nos olhavam sorrindo. Um

deles fixou-se em Ivete e disse:

��� A farra dessa noite esteve legal, heim, garota.

N��o querem lazer amor com a gente agora? N��S so-

mos dois, mas garanto que nem dez homens nos tiram

a prosa. Somos resistentes pra burro.

��� Ambos devem olharem-se para depois dirigirem

a palavra a jovens como n��s.

O homem deu uma risadinha e baixinho conspirou

com o outro. Depois, exclamou:

��� Voc��s s��o umas putas. E como querem ser olha-

das, ent��o?

��� Acho bom a gente sair daqui, ��� sussurrei a

Ivete e Arlete ��� se a gente for ligar para esses tipos,

haver�� esc��ndalo.

��� Mas, voc�� n��o disse que queria se vingar de

seus pais. Olhe, acho que n��o haver�� melhor oportu-

nidade .

��� Ah, fant��stico. Ent��o vamos entrar para o es-

c��ndalo. Mas, como come��ar?

��� Assim ��� falou Ivete, lan��ando o caf�� no rosto

de um dos homens, que veio como um le��o por cima

da gente. Jogamos sobre ele copos e garrafas, tudo que

estava ao nosso alcance. Um policial entrou. E, en-

quanto os primeiros raios de sol banhavam a praia' n��s

entramos no carro preto da pol��cia.

Papai, a chamado de mam��e, veio de S��o Paulo

para nos tirar da delegacia. Levou uma esfrega do

delegado por me deixar assim solta. Sorri, quando ele

me perguntou onde havia passado a noite.

��� Uma farra, papai, e com homens.

��� N��o acredito! Voc�� gosta de escandalizar as

pessoas ?

��� 105 ���

��� Escandalizar n��o, papai. Hoje voc�� atolou esses

brilhantes pezinhos, envoltos em sapatos car��ssimos, na

lama. como prometi. Toda a pol��cia, agora, sabe que eu

sou uma putinha.

Papai n��o respondeu. Nos entregou ao homem do

elevador, pedindo para nos deixar no apartamento, pois

mam��e nos esperava. Ivete me deu uma cotovelada,

quando chegamos �� porta do apartamento.

��� E se sua m��e nos mandar embora?

��� Ela que experimente. Pois se foi ela mesma

quem me mandou ficar na festa at�� quando eu bem

entendesse.

Batemos na porta e mam��e abriu.

��� Regina, a essa hora? ��� exclamou mam��e,

fechando a porta depois de entrarmos.

��� Mas, mam��e, voc�� deixou.. .

��� Voc�� vive a mentir ��� disse mam��e, zangada

��� Deixei voc�� ir a uma festa e n��o a uma bacanal. Seu

pai, assim, pode cortar a nossa mesada.

��� Que corte! Assim talvez voc�� resolva voltar pa-

ra junto dele e se comportar como m��e e esposa.

��� Olhe aqui! N��o �� poss��vel voc�� querer organi-

zar a minha vida. Se n��o me caso outra vez �� porque

seu pai tem muito dinheiro para nos levar a uma vi-

dinha de ricas.

��� T�� bem, mam��e. N��s queremos dormir.

��� A empregada est�� limpando os quartos. Esta-

vam parecendo chiqueiros. As suas a m i g a s . . .

��� Por favor, mam��e. O apartamento tamb��m ��

meu. Papai disse que eu mando aqui tanto quanto voc��.

��� Seu pai? Diga a ele que cuide da pr��pria vida

e deixe de explorar os sentimentos de uma menina

��� 106 ���

��� Olhe, mam��e, ��� expliquei pacientemente ���

papai n��o manda nos meus sentimentos. Ele �� um ho-

mem forte de verdade, e eu gosto muito dele. Nunca

tenta me influenciar em coisa alguma. Agora deixe a

gente em paz.

Olhei para as minhas amigas e disse: ��� Voc��s que-

rem bebida antes da gente ir dormir, n��o querem?

Mam��e ficou de bra��os cruzados, batendo a ponta

do p��, envolto em chinelo de pel��cia cor de rosa, no

tapete de cor indefinida enquanto fomos para a co-

zinha .

��� Para mim, gim com soda, Regina.

��� Com gelo?

��� Claro.

��� E voc��, Arlete?

��� U��sque.

��� Tamb��m com gelo?

��� Pode ser.

Nisso, a voz da empregada fez-se ouvir:

��� Dona Regina, telefone.

��� Atendo aqui. Pode colocar no gancho.

Era Jos��.

��� Oh Jos��! ��� exclamei ��� �� formid��vel ouvi-lo.

Sim, gostaria muito. As amigas est��o perto. Arlete?

Est�� sim. Olhe, arranje uma companhia para Ivete.

Silvio, um rapaz que esteve na festa de ontem? Ok,

Desliguei e disse ��s meninas: ��� Olhe, tem uma turma

velejando por a��. Cada barco leva seis pessoas. Jos��

nos convidou a ir com ele.

��� Mas n��s n��o iamos dormir? ��� disse Ivete, se

espregui��ando. ��� Estou morrendo de sono.

��� Que sono que nada. Voc�� tem apenas quinze

anos. Vamos apanhar os biquinis.

��� 107 ���



Ao atravessarmos a sala olhei para mam��e. Ela

bebia um c��lice de conhaque e parou para perguntar:

��� Por que toda essa correria?

��� Vamos sair com alguns amigos. Olhe, mam��e,

n��o sabemos a hora da volta.

��� Olhe aqui, Regina, n��o suporto mais essas suas

maluquices. N��o quero ver minha filha vivendo dessa

forma.

��� �� s�� voc�� dizer uma palavra que meu sistema

de vida mudar��.

��� Que palavra?

��� Que volta para papai.

��� Nem vou discutir a quest��o. N��o h�� alterna-

tiva. Eu n��o posso adaptar-me �� vida de seu pai e

est�� acabado.

��� Ent��o voc�� tem que arcar com as consequ��n-

cias das minhas maluquices. Tchau, mam��e. Vou cair

em outra farra.



X

Oito homens, duas meninas.

O mar estava, realmente, muito calmo e cheio de

barcos �� vela, nessa manh��. Jos��, Silvio e um outro

rapaz que ficou sendo par de Ivete, manobravam o

barco assobiando. N��s tr��s, deitadas no fundo do bar-

co, sentindo no corpo nu aquele calor abrasador que

vinha do sol que era uma bola fulgurante, com seus

raios cortando o claro c��u azul, davam uma impres-

s��o t��o irreal a tudo que nos rodeava, depois de ter-

mos passado uma noite dan��ando e fazendo outras coi-

sas na penumbra.

Fiquei silenciosa e pensativa debaixo daquele sol,

pensando como era gozada a vida. Quando era nene-

zinho, a pagem me levava �� praia e me deixava deita-

dinha no meio da ��gua azulada, tendo o cuidado de

n��o deixar o sol me queimar muito. Quando estava

mais crescida, era o sol o meu querido, onde passava

horas a fio me tratando. H�� um ano atr��s, saida do in-

ternato, corava quando, deitada ao sol, e biquini, al-

gum rapaz soltava qualquer piadinha a respeito do meu

corpo. Agora, deitada, nua, com esse mesmo sol a me

queimar, tinha em minha frente tr��s homens que me

devoravam com olhares s��dicos e ao alcance da m��o

uma garrafa de uisque. Era engra��ado pensar que eu

��� 109 ���

n��o queria nada daquilo, que o que eu queria era, sim-

plesmente, estar sentada em uma salinha, com a jane-

la aberta, onde o sol pudesse entrar e beijar os bot��es

de rosa que estariam num vaso azul, em cima de uma

mesa com uma toalha bem branquinha. Sentado em

uma poltrona estaria o papai lendo o jornal e mam��e

a lhe perguntar se queria um cafezinho que teria aca-

bado de coar. Papai deixaria o jornal, sorriria e acei-

taria. Eu olharia os dois e me sentiria feliz. Saberia

que eles se amavam e eu partilharia desse amor. Mas

a salinha foi desmanchada pelo grito de Ivete.

��� Cuidado! O barco vai virar!

De fato, um vento forte que veio cortando ondas

enormes que se formavam requebrando num estrondo

ensurdecedor para se perderem na praia, quase virava

o barco, se n��s todos n��o tiv��ssemos, imediatamente,

for��ado o lado mais alto at�� que o mesmo se equili-

brasse. E a��, Jos�� achou melhor irmos para uma ilha

particular onde a turma prometera se reunir.

Fomos recebidos �� porta por um rapaz de "short",

que nos proibiu de entrar assim de Ad��o e Eva.

��� Que nova �� essa? ��� exclamou Jos��. ��� Voc��

n��o est�� querendo dizer que teremos de nos vestir.

��� Infelizmente, sim. Bote a�� qualquer tro��o. At��

uma folha de parreira serve. Mas o sexo tem que estar

tapado.

Caimos na risada.

��� Esperem aqui. Ou melhor, venham comigo. Te-

nho um amigo que tem casa nessa ilha. Acho que ��

aquela, aquela mesmo. L�� encontraremos roupas de ba-

nho, ou pelo menos algo semelhante.

A casa estava vazia e trancada. Jos�� for��ou uma

janela e entramos. Num guarda-roupa encontramos bi-

quinis e os rapazes encontraram "shorts". Voltamos e

��� 110 ���

entramos num grande sal��o repleto de jovens que con-

versavam aos picadinhos e j�� estavam alegr��ssimos. Ive-

te, Arlete e os tr��s rapazes ficaram entretidos com a

mo��ada. Eu abri caminho e fui procurar qualquer coi-

sa para beber. Entrei na cozinha e fui preparar um

martini, quando entrou uma jovem segurando um co-

po com u��sque.

��� Ol��! ��� disse ela. ��� N��o nos conhecemos?

��� Creio que n��o.

��� Ent��o vamos nos apresentar.

��� Regina.

��� Clara.

��� Com quem voc�� veio?

��� Com Jos�� Siqueira e uma turminha.

��� Ah, o J o s �� . . .

��� Voc�� o conhece?

��� Quem n��o o conhece? ��� sorriu ela. ��� �� um

dos homens mais desfrut��veis da sociedade. Antiga-

mente, era um sem-vergonha. Hoje deflora meninas.

Mas �� um moralista.

��� Como pode ser moralista s e . . .

��� As meninas se oferecem. Uma vez, aqui mesmo,

neste sal��o, uma pequena se ofereceu a ele e eles fi-

zeram amor na frente de todo mundo. Tem pequenas

que o acham abomin��vel, mas o suportam por que ele

nada em ouro. Eu, principalmente, o acho muito es-

quisito. E voc��?

��� Ah, eu o conhe��o muito pouco. Ele �� namorado

de uma amiga.

��� Namorado??? ��� debochou Clara.

��� 1 1 1 ���

��� Amante.

��� Ela se ofereceu?

��� Sim.

��� Ah, como corre a juventude. Olhe, Regina, vem

para c�� um rapaz amigo meu. Quero dizer, era amigo.

Como n��o fa��o quest��o de v��-lo, deixo-a s��. Tchau.

O jovem entrou na cozinha. Era o ��nico que pare-

cia s��brio naquele meio. Analisei-o rapidamente. Ti-

nha um ar abstra��do. Era queimado e com apar��ncia

petulante. Devia ter uns vinte e seis anos. Bem velho,

em rela����o aos frequentadores habituais das festas a

que eu costumava ir. Os seus cabelos castanhos dou-

rados faziam um lindo contraste com os seus olhos de

um negro brilhante, fazendo sobressair, na pele bem

morena, os dentes brancos e luminosos. Quando me

olhou, v�� que seu olhar era cr��tico e reservado. Fixou-

me diretamente, eu fiquei descontrolada. Preparou uma

bebida e me ofereceu.

��� Martini?

��� J�� tenho.

��� Estudante?

��� Sim.

��� Senai?

��� ��.

��� Puxa, parece que n��o existe outro col��gio em

S��o Paulo. Senai. S�� Senai. Pelo que vejo �� um mem-

bro dessa turma a�� fora.

��� Come��o a fazer parte. E voc��?

Sorriu e falou r��pido, sem parar.

��� A turma. . . quero dizer, essa turma bebe e fu-

ma at�� perder os sentidos. Isso �� repugnante. Mas eu

n��o entendo muito desse neg��cio, essa vontade de se

��� 112 ���

auto-destruir. Eu n��o quero ser moralista, mas me pa-

rece que, se voc�� come��ar a fazer parte da turma, vai

acabar se dando mal. �� melhor n��o come��ar. Olhe, d��

uma olhada l�� no sal��o. Todos b��bados, ou cheios de

entorpecentes. Caidos pelo ch��o, agarrados, dan��ando

como se estivessem em c��mera lenta. Beber algo, acho

certo. Mas beber para se destruir...!

��� Mas se voc�� n��o os aprecia por que est�� aqui?

��� Voltei para dar uma espiada.

��� Voltou?

��� Sim. Quando frequentava a turma n��o conse-

guia boas notas, via meus melhores amigos morrerem

de tanto t��xico, olhei para dentro de mim e fiz um ba-

lan��o da vida que estava levando. Ent��o perguntei a

mim mesmo: ,Para que viver, se eu mesmo estou me

matando?" Ent��o deixei a turma e dediquei-me ao tra-

balho de me reformar. De um b��bado e toxic��mano, nas-

ceu um escritor.

��� Voc�� escreve?

��� Sim. Lan��arei no pr��ximo m��s o meu terceiro

livro.

��� Qual �� o meu nome?

��� Raul de Castro.

��� Ah.

��� Ah o que?

��� Voc�� �� escritor de sexo, n��o ��?

��� Voc�� n��o pode ter lido nenhuma das minhas

obras pois me parece t��o crian��a.

��� N��o, sinceramente n��o o conhecia. Mas n��o ��

por isso, por voc�� escrever sobre sexo, que falo, pois

eu e as minhas amigas lemos tudo no g��nero. Adelaide

Carraro, por exemplo, n��s a a c h a m o s legal pra burro.

��� 1 1 3 ���

��� Eu tamb��m a conhe��o. Ali��s, a conhe��o pessoal-

mente. Ela escreve os livros proibidos, mas no fundo,

bem no fundo, �� uma moralista.

��� J�� desconfiava.

��� Por que?

��� Por que eu tamb��m detesto ter que frequentar

tudo isso, detesto fazer o que fa��o, mas �� preciso.

��� N��o a entendo. Mas h�� alguma coisa na con-

vic����o de que voc�� n��o quer ficar assim perdida.

��� Claro que eu n��o quero, mas os meus pais sim.

��� Seus pais?

��� �� uma outra hist��ria, que n��o vai lhe interessar.

��� Algo assim como auto-piedade ? Manifestando

��dio ao mundo, assim como aquela turma?

��� Quase que voc�� acerta. Talvez seja isso que sin-

to. �� pena de mim mesmo por n��o ter um lar. E, de

certa forma, me sinto igual a eles. Na ��nsia de me des-

truir porque estou oca por dentro.

��� N��o vou lhe falar como um intelectual, mas co-

mo um homem batido pela vida. Voc��s, os jovens, es-

t��o perdendo tempo manifestando tanta revolta. A

gente fica indignado de ver aquilo ali: meninas e me-

ninos, homens e mulheres de amanh��, que poderiam

formar um Brasil melhor, mais sadio, mais cheio de

amor, a�� jogados como trapos humanos.

��� A gente formaria um Brasil melhor se tivesse

uma fam��lia melhor.

��� Mas a juventude n��o tem que esperar vir da

fam��lia os bons exemplos. Os jovens devem pensar que

eles �� que t��m de formar uma fam��lia. �� engra��ado o

que pensa uma menina como voc��. Como �� o seu nome?

��� Regina.

��� 114 ���

��� Pois ��, Regina, o que voc�� quer fazer ��� ou

melhor, acho que j�� fez ��� tomar entorpecentes, be-

ber, fazer amor com todo mundo, para se vingar dos

seus pais, �� covardia.

��� Covardia??? Por que n��o est�� acontecendo com

voc��? Ningu��m, hoje em dia, respeita uma mocinha que

tem pais desquitados. Eu critico os meus pais e culpo-

os por me fazerem andar por a��.

��� Voc�� os critica, os culpa, mas aposto que vive

��s custas deles.

��� Ora, e ��s custas de quem poderia viver uma

menina de quinze anos?

��� A sua pr��pria. Em vez de andar por a��, poderia

trabalhar e deixar de viver se lamentando, na bebida,

por seus pais estarem separados. Devia procurar algum

lugar para dar aulas, ou coisa parecida.

��� Bem, mas a coisa n��o �� t��o simples assim.

��� Olhe, Regina ��� Raul me olhou com renovado

interesse ��� voc�� n��o �� o que eu havia julgado a prin-

cipio, uma pern��stica e f��cil garota. Sei que n��o deixa

se levar pelos demais. Voc�� disse que se despreza por

estar aqui, que detesta tudo isso. Por que ent��o n��o

sai disso tudo, agora, e de cabe��a erguida?

��� Por que ainda n��o chegou a hora.

��� Ent��o quer continuar a vingan��a?

��� Quero.

��� Bem, n��o sei por que pensei tudo aquilo logo

que a v��. A�� �� que est�� o mal em certos homens: eles

d��o valor a uma garota e, quando v��o ver, sentem que

a dosagem alco��lica de seu sangue �� de cem por cento.

Depositei o c��lice de martini em cima da pia e

falei.

��� 115 ���

��� Nunca vi ningu��m medir as qualidades de al-

gu��m em rela����o ao ��lcool. Por isso, n��o sei se ter no

sangue cem por cento de ��lcool �� bom ou ruim.

��� Isso quer dizer que a garota est�� desclassifi-

cada moralmente. Moral zero: j�� nem serve pra dormir

com um homem.

Olhei-o com desprezo.

��� N��o lhe daria esse prazer nem se voc�� fosse o

��ltimo homem sobre a terra.

Dei de ombros e deixei a cozinha. Mas n��o antes

de apanhar um outro copo de bebida. Na sala, em meio

�� turma j�� podre de tanto beber, de repente algu��m

falou:

��� Meu Deus, Regina, voc�� aqui nesse meio? Est��

mesmo se atirando na lama?

��� Ol��, M��rio, como vai?

��� Continuo dizendo que �� um verdadeiro sacril��-

gio sua m��e deixar um broto lindo assim se desperdi-

��ar desse jeito. Puxa, n��o a vejo desde aquele dia. Onde

tem andado?

Brinquei com ele.

��� Nos bra��os de um principe.

Ele tamb��m brincou.

��� De verdade? Parab��ns, garota. Assim voc�� po-

der�� dar mais conforto a sua m��e.

��� E por mais um sof�� para voc�� dormir na sala?

Ele deu uma risada.

��� Falando s��rio, tenho sentido a sua falta.

��� Por que voc�� n��o vai l�� em casa fazer compa-

nhia a mam��e?

��� 116 ���

��� Depois do que aconteceu, sinceramente, n��o te-

nho coragem.

��� U��, fazer amor n��o �� crime.

��� Deflorar menor ��.

��� Eu o provoquei.

��� Mas a sua m��e n��o querer�� saber disso.

��� Mam��e n��o se importa comigo.

��� Seu pai?

��� Ora, M��rio, voc�� bem sabe que n��o tenho quem

se importe comigo ��� as coisas que eu pensava, quan-

do achava que n��o tinha pais, voltaram a me atormen-

tar. E o desejo de vingan��a veio mais forte.

��� Olhe, M��rio, vamos na cozinha beber. Quero fi-

car embriagada.

A�� comecei a beber copo depois de copo e logo co-

me��ou a se formar junto de n��s uma turminha. Um

dos rapazes disse:

��� Ora, menina, n��o fique a�� nesse embalo, beben-

do sem um homem para lhe dizer que a ama. Pois eu

a amo, sabe, querida?

Apesar de estar quase b��bada, v�� que o rapaz esta-

va bambo das pernas e quase perdendo os sentidos.

Mas assim mesmo teve for��as para me abra��ar. Agar-

rando-me fortemente, quis me atirar no ch��o. N��o sei

quem me libertou, para dizer:

��� Eu tamb��m a amo, meu bem, seja mais boazi-

nha comigo. Deixe ver esse corpo. Fa��a uma demons-

tra����o tirando a roupa ao som dessa m��sica.

V�� que o homem dan��ava e batia palmas e volta-

va a me abra��ar. Tamb��m n��o sei quem, enla��ando-me

nos bra��os, resgatou-me do amplexo do homem e disse:

��� 117 ���

��� N��o fa��a amor com eles, boneca. Fa��a comigo.

Beijou-me na boca e escorregou a m��o pelo meu corpo.

��� Ei, largue a garota! Agora �� minha vez!

E eu, numa r��pida sucess��o, passava de bra��os a

bra��os, sendo beijada por todo mundo. Das duas uma:

ou eu n��o era t��o vulgar assim ou n��o estava gostando

da coisa, porque tentei me libertar da rodinha de

homens mas n��o consegui, pois mal me aguentava nas

pernas e sentia a cabe��a girar. Sabia que tinha de aca-

bar na cama com algum daqueles homens. Senti-me

erguida em bra��os fortes, e passos r��pidos me leva-

vam para algum lugar. Senti o colch��o macio e m��os

��geis que tiravam o meu biquini. Sentia que estava

n��a, mas n��o tinha coragem de abrir os olhos, para

ver a cara do homem que ��a me possuir.

Passei muito tempo com os olhos fechados e como

ele n��o se aproximava resolvi ver o que estava aconte-

cendo. Fui abrindo os olhos bem de vagarzinho. Cabelos

castanhos dourados, olhos brilhantes, negros, e dentes

luminosos, Raul de Castro, o escritor. Ele sorriu, e disse:

��� Voc�� est�� querendo, n��o est��?

Virei o rosto para o lado, me lembrando que al-

gum tempo atr��s tinha-lhe dito que n��o dormiria com

ele nem se fosse o ��ltimo homem sobre a terra. E ele

continuou:

��� Olhe, Regina, fiz uma inspe����o na turma e n��o

encontrei uma garota t��o inteligente ou linda como vo-

c��, e assim decidi procur��-la e a encontro no meio de

um monte de homens. Que diabo, voc�� faz quest��o que

todos saibam que �� uma garota f��cil? T��o f��cil que

est�� a��, nua, na minha frente. Eu s�� tive um trabalho,

o de lhe tirar a roupa. E olhe que voc�� gosta muito

desse neg��cio, pois seus pais n��o est��o aqui para se-

rem magoados. Mas eu n��o a quero. Garotas assim me

repugnam. Agora vista-se, que a levarei para casa.

��� 118 ���

Fiz um tremendo esfor��o e consegui sentar na ca-

ma. Olhando-o friamente, falei, com a lingua meio en-

rolada:

��� Ora, puritano metido a intelectual. Eu ia me

levantar mesmo, assim que vi que era voc��. Pois j�� dis-

se que n��o terei nada com voc��, nem que seja o ��lti-

mo homem sobre a terra.

��� Se voc�� n��o estivesse embriagada eu ia lhe mos-

trar a facilidade com que qualquer homem poderia

possu��-la. Agora vista-se. Vamos embora.

��� Ir embora? Voc�� est�� maluco. Ainda h�� tanta

bebida.

��� Bem, eu estou pronto para ir.

��� Ent��o v��. Eu vou descer daqui e vou beber ���

respondi, descendo da cama. Mas as pernas n��o me

aguentaram e ca�� no ch��o.

Raul, sol��cito, veio em meu socorro. Ajudou-me a

me vestir e, apoiada nele, desci para o sal��o. A turma

estava quase baqueada. Alguns casais ainda se encon-

travam de p�� e faziam um esfor��o sobre-humano para

n��o cair. Desprendi-me dos bra��os de Raul e, tran��an-

do as pernas, disse:

��� Vou beber. Quero beber.

Raul apanhou-me e, pondo-me dentro de seu car-

ro, levou-me para um restaurante. Chamou o gar��om

e mandou servir o jantar, n��o antes de me cobrir com

seu palet��.

��� Temos pouca coisa, meu senhor, pois j�� est��

quase na hora de fechar.

��� Cristo! Cinco horas! Como as horas passam!

Bem, sirva-nos o que tiver.

��� Frango alho e ��leo e arroz.

��� 119 ���

��� Est�� bem.

Quando o gar��om afastou-se, Raul olhou para as

mesas vazias, cobertas com toalhas de xadrez e per-

guntou-me :

��� Voc�� j�� veio aqui?

��� N��o. Costumo frequentar restaurantes mais ca-

ros. Mas gostei de conhecer esse, pois �� um local que

tem um ar muito calmo e puritano.

��� ��, de fato! ��� exclamou Raul ��� Aqui n��o ��

um lugar adequado para a juventude barulhenta que

toma aquelas tremendas bebedeiras e se agarram fa-

zendo "tudo" em qualquer lugar.

��� Esse "tudo" �� amor?

��� Claro. Voc�� n��o viu como aquela turma faz

amor? Voc�� n��o viu que estavam deitados em todos os

lugares da festa, at�� mesmo no jardim? Francamen-

te, n��o sei como elas se arranjam com a gravidez.

��� Tomam p��lulas anticoncepcionais.

��� Voc�� toma?

��� Tomo.

��� Sem receita m��dica?

��� A gente sempre d�� um jeito com o farmac��u-

tico.

��� Mas voc�� n��o pode tomar as p��lulas.

��� Por que?

��� Por que s�� tem quinze anos

��� Mas existe idade estipulada?

��� Aqui no Brasil n��o sei, mas em outros pa��ses,

principalmente na ��ustria, a idade m��nima �� de dezes-

seis anos.

��� 120 ���

��� Por que essa discrimina����o?

��� Segundo um grande genicologista austr��aco, o

ov��rio e o ��tero precisam de muitos anos para atingir

o seu total desenvolvimento. A p��lula corta esse pro-

cesso natural e provoca a atrofia desses ��rg��os. Al��m

disso, �� prejudicial ao crescimento do esqueleto.

��� Fant��stico! Ent��o estou na hora de tomar mui-

tas p��lulas, pois todos dizem que sou muito alta para

quinze anos. E como �� que a p��lula age sobre o esque-

leto para impedi-lo de crescer?

��� Sob a influ��ncia dos horm��nios adicionalmen-

te ministrados. Acelera-se a calcifica����o das juntas ��s-

seas e interrompe-se, prematuramente, o crescimento da

mocinha.

��� Puxa. Quem lhe disse tudo isso?

��� L�� num livro sobre ginecologia moderna.

��� �� . . . L e g a l . . . Mas creio que a turma prefere

atrofia do que soltar filhos por a��, ou praticar aborto.

��� O melhor mesmo seria voc�� aconselhar as me-

ninas da turma a voltar para casa. Aqueles rapazes da

turma n��o s��o companhia que preste para qualquer mo-

cinha. Voc�� viu o que fizeram com voc�� hoje? N��o im-

porta para eles quem seja a menina, filha de milion��-

rios onde pobres...

��� Ms, na turma, n��o existe filho de pobre. L�� h��

mais pobres do que eu. E depois os rapazes da turma

n��o t��m culpa pois a mo��a que vai l��, vai por que quer

ir.

��� Ora, acabe com essa hist��ria de defend��-los ���

disse Raul, chateado. ��� Tamb��m acho que quem vai

l��, vai por que quer, mas voc�� sabe perfeitamente ao

que estou me referindo.

��� 121 ���

��� Que todos queriam fazer amor comigo? Mas voc��

estava fazendo p a r t e . . .

��� �� uma pena que voc�� esteja meio tonta ainda.

Faz tudo para n��o me compreender.

��� Para falar mesmo a verdade, quem est�� desorien-

tado �� voc��, pois demonstrou que tem a mesma repu-

ta����o da turma.

��� Preferia que voc�� deixasse de me incluir nessa

turma. Fazia mais de anos que eu n��o via o pessoal. J��

disse que voltei para dar uma espiada.

O gar��om aproximou-se e serviu o jantar. Raul pe-

diu dois martinis.

��� �� pra voc�� n��o misturar as bebidas.

��� Muito gentil.

A�� fiquei reparando que Raul era bem diferente dos

homens que at�� agora conhecera. Impunha respeito e

autoridade. Por isso sabia que devia ficar profundamen-

te entediado com a conversinha do pessoal que estava

naquela festa.

��� Sabe, Regina, eu desejo pedir desculpas por t��-la

aborrecido nessa festa. Sinceramente, estava deslocado,

provavelmente por que sinto pena de ver tantos jovens

se perderem assim. E n��o me acostumo mais com esse

tipo de gente.

Isso me deixou calma e feliz. Ent��o ele se lembrava

de que tinha me magoado. Era legal ter algu��m que

se preocupava com o bem-estar da gente.

��� Ora, n��o ligue para isso. Creio que agi como uma

crian��a. Mas o que voc�� fez, j�� n��o tem import��ncia

pois voc�� se desculpou. Agora, a ��nica coisa que est��

me preocupando s��o as minhas amigas. Fico pensando

onde elas est��o.

��� 122 ���

Ele suspirou.

��� Devem ter voltado para o seu apartamento, ou

dormiram no apartamento de algum rapaz.

��� ��, acho que ficaram com Jos��. Puxa, n��o devia

ter saido sem falar com elas.

��� E encontr��-las onde, naquela bagun��a?

��� De fato, voc�� tem raz��o. Bem, eu quero ir para

casa.

��� Sabe, gostaria de encontrar-me com voc�� ou-

tras vezes. Qual �� o n��mero do seu telefone?

Olhei para ele com os olhos arregalados.

��� Apenas jantar e conversar, se voc�� quiser.

Sorri e dei-lhe o n��mero.

* * *

Quando cheguei em casa, dei uma olhada no quarto

das meninas. Vi dois biquinis jogados no ch��o e as ca-

mas vazias. Voltei para a sala-de-estar onde encontrei

os olhos de mam��e pousados em mim.

��� De biquini a essa hora da manh��? N��o �� poss��-

vel, Regina! Voc�� est�� determinada a perturbar com-

pletamente a minha vida. Voc�� passou um dia e uma

noite fora de casa. Quero saber onde esteve.

��� Estive em uma festa, mam��e, com Ivete e Ar-

lete.

��� Oh, Regina, desde quando voc�� aprendeu a men-

��� 123 ���

tir? Ivete e Arlete estiveram aqui ha minutos, vestiram-

se e foram encontrar os namorados. Disseram que n��o

a viram desde que entraram no sal��o.

��� Pois ��, mam��e. A�� est��. Eu fiquei longe delas.

Foi s��.

��� N��o quero que voc�� viva assim. Como uma per-

dida.

��� J�� disse que serei uma santa se v o c �� . . .

��� N��o continue. Voc�� tem que parar de ir a essas

festas intermin��veis. Voc�� deve se portar como uma me-

nina de fam��lia.

Sorri e disse, ir��nica:

��� Para se portar como menina de fam��lia �� pre-

ciso ter a fam��lia.

��� Mas eu sou a sua fam��lia. E j�� estou ficando

doente com tudo o que voc�� tem feito desde que saiu

do col��gio.

��� A senhora n��o sabe nem a metade do que ando

fazendo. Prometi a papai atol��-lo na lama. Seu nome

ser�� escrito a lodo se ele n��o me dar o lar que tanto

desejo.

��� Voc�� j�� tem um lar. Esse aqui. N��o venha com

justificativas para as suas sem-vergonhices.

��� Que lar, mam��e ? Voc�� vive de l�� para c�� nas te-

levis��es e papai naquela cl��nica em S��o Paulo. Que dia-

bo de lar �� esse? Lar que eu conhe��o �� pai e m��e juntos

para amar os filhos. Para voc�� e papai eu n��o signi-

fico mais nada. Sou s�� carne e osso que precisa comer e

��� 124 ���

vestir. E o carinho, o amor, a ternura, a compreens��o,

o respeito, a alegria, o sorriso, a felicidade, que emanam

de um lar, onde est��o? Lares como esse andam a�� aos

ponta-p��s.

Mam��e sorriu amarga e disse:

��� Infelizmente, �� isso aqui que voc�� tem que reco-

nhecer como lar e �� aqui que voc�� tem que se formar

dignamente para poder formar o seu lar, que espero ser

sadio e feliz.

��� Sem voc�� e papai reunidos, nunca poderei pensar

em formar o meu lar.

Mam��e esmagou o cigarro ainda inteirinho e, vol-

tando-se, foi para o seu quarto dizendo:

��� Jamais voltarei para junto de seu pai.

Olhei desanimada para as costas da mam��e e pen-

sei:

��� O lar que eu esperava deu mais um passo para

tr��s.

Fui para o quarto das meninas e logo peguei no

sono, acordando, horas mais tarde, com Arlete gritando;

��� Regina! Ei, Regina! acorde! Temos uma ��tima

bebida!

��� Que horas s��o?

��� Dezesseis.

��� Puxa, estou dormindo desde as oito horas.

��� N��s n��o dormimos at�� agora. Divertimo-nos a

valer no apartamento de um jovem que conhecemos on-

tem. Olhe, voc�� nem faz id��ia de como �� o apartamento.

Tem piscina dando de frente para o mar.

��� Ora, Arlete, existem milhares de apartamentos

assim, aqui na Guanabara, com piscina e tudo.

��� 125 ���

��� Mas isso n��o importa. Eu quero lhe contar dos

homens que fizeram aquilo com a gente.

��� Homens???

��� Homens. Claro! No plural.

Sentei-me r��pida na cama.

��� Fale baixo. Mam��e pode escutar.

��� Escutar o que? ��� perguntou Ivete, entrando no

quarto e j�� tirando o vestido de baile e jogando-o sobre

a cama.

��� Que tivemos v��rios homens hoje?

��� Regina n��o acredita ? ��� Ivete afastou com a m��o

as cortinas da janela, na tentativa de fazer passar um

pouco de ar, pois o calor da tarde estava insuport��vel.

��� N��o acredito mesmo.

��� Pois �� verdade. Arlete com quatro e eu com qua-

tro.

��� E todos fizeram?

��� Mas a troco do que voc��s fizeram isso?

��� �� bacana. A gente se divertiu �� bessa ��� disse

Ivete, sentando-se na cama. ��� Homem foi feito para

satisfazer o sexo oposto, e a�� est�� a moral da quest��o.

��� Voc��s s��o infernais, uma juventude que sabe pe-

car, heim, meninas?

��� Ora, Regina, os jovens tamb��m pecam, ou voc��

acha que s��o s�� os maiores de dezoito anos que frequen-

tam bacanais?

Espreguicei-me e, deitando-me com as m��os cruza-

das sobre a cabe��a, fiquei ouvindo-as contarem o que

��� 126 ���

haviam feito com os oito homens. �� simplesmente ine-

narr��vel. Arlete foi buscar copos e, servindo-se de co-

nhaque, falou:

��� Olhe, vamos dormir um pouco, pois temos en-

contros com tr��s deles para jantarmos no Canec��o.

��� T�� bem, ent��o vamos dormir, sen��o vou perder

o meu auto-controle ou me desintegrar ��� disse Ive-

te, deitando-se nua como sempre fazia.

Em seguida, as duas dormiram como anjinhos.

��� 127 ���



XI

O sem-vergonha.

As vinte horas, olhamos da janela os homens chega-

rem. As meninas tinham acordado naquela hora e ainda

n��o estavam prontas, por isso eu, que j�� estava num ves-

tido de baile, fui escolhida para descer e avis��-los, mas

n��o antes de pedir para as meninas que n��o fizessem

muito barulho, pois mam��e estava mesmo danada. Na

hora que ia saindo, a empregada avisou-me que mam��e

sair�� para jantar fora. Parei de andar e olhei para a

empregada, com raiva.

��� Ent��o mam��e saiu. Hoje pela manh�� ela me deu

a impress��o de se importar com a vida que eu vinha le-

vando. E agora sai assim, sem dizer nada, sem aos menos

me avisar.

��� Bem, dona Regina. N��o adianta a senhora ficar

com essa raiva. Eu n��o tenho culpa.

��� Olhe aqui, Maria. Des��a e avise aqueles homens

l�� do Impala vermelho que podem subir. Mam��e vai me

pagar.

Quando fiquei s��, senti uma vontade louca de chorar,

pois o incidente da manh�� fora para mam��e uma quest��o

sem import��ncia. Acho mesmo, que era tudo fingimento.

��� 1 2 9 ���

��� Al��, menina! ��� os homens me cumprimenta-

ram com anima����o. ��� Como v��o as coisas? A empre-

gada disse que v��o mal.

��� O que quer dizer com isso, heim, Maria?

A empregada baixou a cabe��a e n��o respondeu.

Os homens tomaram posse da sala, estabeleceram-se

nas poltronas e, colocando os p��s sobre a mesinha, pedi-

ram algo para beber. Estendi-me sobre o sof�� e mandei

a empregada servir uisque. Embora n��o estivesse com

vontade de beber, acompanhei os homens na primeira

rodada, pensando que, de qualquer forma, mam��e have-

ria de saber que os homens estiveram no nosso aparta-

mento.

Eles eram, realmente, uns tipos que n��o agradariam

aos meus pais ou aos pais de minhas amigas. Eram do

tipo cafageste, mal encarados e mal vestidos, com sapa-

tos empoeirados e sem meias. Um deles perguntou:

��� E as outras duas, onde est��o?

��� No quarto, se vestindo.

��� Posso ir at�� l��?

��� Bem ��� respondi atrapalhada ��� acho que

elas n��o iriam gostar.

��� Como n��o iriam gostar? Estivemos com elas a

manh�� toda. Eu e mais uns amigos.

��� Elas me contaram.

��� Ent��o posso ir?

Ele se levantou e dirigiu-se para a porta do quarto.

Quando a porta se abriu, Ivete e Arlete apareceram nos

vestidos longos.

��� Puxa, voc��s demoraram, meninas! Eu j�� ia en-

trar para ajud��-las, pois estava realmente imposs��vel a

espera.

��� 130 ���

��� Que diabo est�� dizendo esse homem? A gente n��o

demorou nem cinco minutos.

Chamei Ivete e Arlete para a cozinha.

��� Olhe, gente, Deus sabe que n��o sou ningu��m

para andar pregando moral, mas n��s agir��amos como

idiotas se f��ssemos sair com esses sujeitos abertamente.

Voc��s terem dormido com eles, j�� foi um grande erro. O

que voc��s fizeram �� uma coisa bem diferente do que

manter rela����es com um algu��m. Voc��s sabem que pro-

meti fazer tudo para magoar meus pais.

Prosseguirei, jogando-os cada vez mais na lama, mas

n��o com tipos como esses.

��� E onde est�� a diferen��a desses homens e os ho-

mens com quem dormimos sempre? ��� quis saber Ivete.

��� Olhe, eu acho que voc�� estava b��bada quando

fez o que fez com quatro desses sujeitos. E agora est��

mais b��bada ainda, para fazer essa pergunta.

��� Ent��o por que voc�� os convidou a subir?

��� Por que n��o tinha visto a cara deles.

��� Olhe, Regina, eles s��o homens iguais aos outros.

N��o adianta voc�� vir com serm��o.

��� N��o, Arlete. Nunca em minha vida pensei em

passar serm��o em algu��m. Mas tenho direito de defen-

der a mim e �� minha casa.

��� Penso que voc�� est�� assustada a toa, querida

eles s��o boas pessoas.

��� Isso significa que voc��s v��o sair com eles?

��� Claro.

��� Eu n��o irei. N��o sou obrigada a moldar minha

vida na vida de voc��s.

��� 131 ���

��� Nessa altura as horas passam e a gente n��o vai

se divertir nem um pouquinho ��� choramingou Arlete.

��� At�� arranjar novas companhias,..

��� �� s�� telefonar ��� respondi.

��� Bem, ent��o telefone para algu��m diferente. N��o

para os que j�� conhecemos.

��� Vou telefonar para Jos��. Ele poderia nos levar

para jantar.

��� Jos��! Jos��! ��� disse Arlete. ��� J�� estou enjoada

de ver sempre as mesmas caras. Voc�� n��o vai querer

ficar saindo com essa turma durante anos. Sinceramen-

te, s�� por que esses homens s��o um pouquinho menos

alinhados que os nossos outros amantes voc�� faz um tre-

mendo carnaval.

Nisso um dos homens entrou na cozinha e disse,

meio embriagado, com uma express��o no rosto que n��o se

sabia ser de raiva ou n��o.

��� Voc��s est��o nos fazendo de palha��os? V��m ou

n��o v��m nos fazer companhia?

��� J�� vamos ��� respondi friamente.

��� Vai ser divertido como o diabo a gente passar a

noite aqui neste apartamento. Voc��s sabem, fiz planos a

tarde toda sobre a garota que seria a minha parceira

hoje. Mas nunca pensei que seria uma coisa assim.

Ele ia falando e andando para o meu lado, com as

m��os estendidas, querendo agarrar-me.

��� Olhe, o melhor �� o senhor ficar onde est��.

��� N��o, minha boneca, eu a desejo tremendamente

e quero que voc�� se porte como as suas amiguinhas se

portaram hoje de manh��. Elas deram sem a gente in-

sistir.

��� Sua m��e n��o deve demorar muito, n��o ��, Regi-

na ? ��� disse a empregada, vendo a express��o infernal no

rosto do sujeito.

��� 1 3 2 ���

O homem virou-se para Maria e disse, abrindo-se

num sorriso c��nico:

��� Meu anjo, a m��e dela deve ser uma igual a essas

duas a��. Sen��o, n��o deixaria uma beleza dessas em casa,

sozinha. Ela, pela amostra, n��o deve ser l�� muito de-

cente. Por isso, se ela aparecer, a gente d�� um jeito nela

tamb��m.

Felizmente, outro homem entrou sorridente e, pe-

dindo um u��sque duplo, sem gelo, disse:

��� �� melhor a gente ir para o Canec��o, sen��o fica

muito tarde e n��o acharemos mais lugares.

��� Eu n��o vou sair daqui ��� disse o primeiro ho-

mem. ��� Vou d o r m i r com a minha companheira. ��� e

olhando para mim, com olhos meios mortos, continuou:

��� Olhe aqui meu bem, que tal fazermos amor a noite

toda?

O segundo homem riu.

��� Pare de fazer proposta �� garota. N��o v�� que

elas est��o assustadas?

��� V�� para o diabo que o carregue! Se meta com a

sua garota, aquela putinha ali! Essa aqui �� minha! Foi

o que combinamos, n��o foi?

Enquanto os homens discutiam, pedi �� empregada

para ligar a mam��e pedindo que ela viesse para casa ur-

gente. A empregada desapareceu no quarto de mam��e.

Quando a discuss��o estava no auge, entrou o terceiro

homem e, conciliador, perguntou aos companheiros se

queriam mais um gole.

A�� tomaram conta da cozinha tamb��m. Abriram a

geladeira e retiraram tudo o que havia para comer. O

que n��o apreciavam, atiravam para cima a pia, ou da

mesa. Bebiam todas as bebidas que encontravam, mis-

turando tudo.

��� 1 3 3 ���

A empregada voltou dizendo que mam��e n��o po-

dia atender o telefone, porque, assim que terminou o

jantar, entrara para os est��dios de grava����o.

��� Ent��o ligue para S��o Paulo, para o Hospital das

Cl��nicas. Chame o meu pai e diga para ele tomar um

avi��o e vir urgente.

��� Mas, dona Regina, daqui a pouco eles v��o em-

bora ou levam as senhoritas pra boate.

Permaneci em sil��ncio, olhando os copos em que o

homem bebia. Depois, ele veio at�� onde eu estava e ofere-

ceu-me um copo cheio de uisque. Apanhei o copo en-

quanto ele se voltava para encher o seu e a�� fiquei pen-

sando que n��o devia ter permitido ��queles homens en-

trarem no apartamento, sem os conhecer. Estava mui-

to amedrontada, mas n��o podia permitir que os homens

ou as meninas o percebessem. Agora, com aqueles tr��s

b��bados trancados com a gente, comecei a sentir que a

minha vingan��a era muito perigosa. Sentia que devia

manter uma determinada posi����o. Devia desprezar-me

por sentir medo. Se papai soubesse como me sentia crian-

��a naquela hora, ele n��o poderia resistir e me daria o

lar que eu vinha sonhando h�� muito tempo.

Um dos homens varou os quartos a procura do ba-

nheiro onde trancou-se e come��ou a vomitar em estron-

dos. Eu mesma resolvi telefonar para papai. Para isso,

corri ao quarto, mas assim que entrei, o primeiro homem

entrou comigo e trancou a porta. Olhei para ele e pa-

ra a porta, fazendo um esfor��o enorme para me manter

tranquila, pensando que tudo aquilo que estava aconte-

cendo fazia parte do mundo que eu escolhera. O meu

mundo era aquele. O mundo que eu desejava a fim de

encontrar tudo que eu sonhava: um lar. O homem vi-

nha devagar, se aproximando, enquanto eu me afastava

com os olhos fixos nele, naqueles olhos morteiros, em-

bassados pela bebida. Ouvi-o dizer:

��� 134 ���

��� Amo voc��, boneca. Voc��, com esse corpo, me dei-

xa louco. Voc�� �� um desafio a qualquer homem, seja ele

de que classe ou ra��a for. Eu a quero, eu a desejo.

Pousou sua m��o sobre meu ombro e senti seu h��lito

fedorento e quente bem perto do meu rosto. Puxou-me

com brutalidade e, abra��ando-me, tentava me beijar. Fiz

um esfor��o enorme, me retorci toda para sair daqueles

bra��os gigantescos, fazendo com que os enfeites do ves-

tido de baile ca��ssem pelo ch��o. Os cabelos se soltaram

da fivela e me cairam no rosto, dificultando a minha de-





fesa.


��� Jesus... ��� pensei. ��� O medo est�� crescendo l��

dentro. Estou deveras amedrontada. Que emo����o estra-

nha �� o medo... Nunca antes o havia sentido...

Desesperadamente, tentei reassumir o auto-contro-

le, empurrando o enorme t��rax do homem.

��� Vamos, meu bem ��� continuou ele, com aquele

bafo quente na minha cara. ��� Eu a esperei o dia todo..

N��o adianta fazer for��a, pois voc�� est�� �� minha merc��,

Ceda ou se arrepender��.

��� Quem vai se arrepender �� o senhor se n��o me sol-

tar j�� e j��!

��� S�� depois de t��-la inteirinha. Vamos, n��o me

aborre��a com esse fricote. Eu sei que voc�� n��o presta,

que �� uma vagabunda igual as suas amigas.

Ele come��ou a passar a m��o pelo meu corpo, com ar

de propriet��rio.

��� Eu a estou excitando o suficiente para que voc��

caia correndo na cama e me chame depressinha.

Cuspiu no ch��o do quarto e afroxou um pouco os

bra��os. Foi a�� que eu aproveitei para desvencilhar-me e,

abrindo a porta, rapidamente, corri atravessando a sala

de estar, abr�� a porta que dava para o hall e desci cor-

��� 135 ���

rendo as escadarias, de dois em dois degraus. Falei com

o zelador.

��� Olha, dona Regina, eu n��o posso largar a por-

taria sozinha. �� melhor a senhora chamar a pol��cia.

Primeiro telefonei para papai e expliquei a situa����o.

Ele suspirou fundo.

��� Est�� bem, Regina. N��o chame a pol��cia. Daqui

h�� uma hora estarei a��.

��� Uma hora??? At�� l�� eles j�� nos assassinaram. ��

melhor eu chamar a pol��cia.

��� N��o chame. N��o quero passar pelo que passei a

outra vez. Chame algum dos amigos de sua m��e.

E desligou. Mas eu estava determinada a continuar

com a minha vingan��a. Por isso chamei a pol��cia, que

levou os tr��s homens e, em um outro carro, n��s que fo-

mos encaminhadas ao juizado de menores onde minu-

tos depois papai apareceu.

O juiz lhe passou um daqueles serm��es, sem ao me-

nos respeitar o famoso cirurgi��o que parecia fulo de rai-

va quando se aproximou de mim, falando bem alto.

��� Ca�� em outra, heim Regina? Da pr��xima vez

juro por tudo que h�� de mais sagrado que n��o gastarei

um n��quel para v��-la solta. De outra vez pe��o ao juiz

de menores para a deixar internada. Ele tomar�� conta

de voc�� muito melhor do que a sua m��e.

��� Voc�� falou com os homens para ver a cara de-

les, papai- Talvez assim sinta o que foi que passei, aper-

tada nos bra��os de um deles.

��� Estou entusiasmad��ssimo por ouv��-la falar em

homens.

Nisso entrou um monte de rep��rteres e os fot��gra-

fos estouraram as suas l��mpadas na nossa dire����o.

Um dos rep��rteres quis entrevistar papai, mas ele, dan-

��� 136 ���

do-lhes as costas, foi para o seu carro, me chamando aos

gritos. De qualquer forma, papai nos deixou na porta

de casa, dizendo que ia dormir na Guanabara e que no

dia seguinte me ligaria.

Logo pela manh��, fui acordada por mam��e, pois pa-

pai me chamava ao telefone. Ele estava col��rico, pois

Ivete, Arlete e eu enfeit��vamos as p��ginas dos jornais

matutinos com manchetes deselegantes, dizendo de

quem era a filha.

��� N��o me fa��a mais uma dessas, pois sen��o cor-

to-lhe a mesada. Juro!

O ruido do telefone desligando e a voz de mam��e:

��� Quem era?

��� Papai.

��� O que queria, ligando t��o cedo?

��� Ele est�� na Guanabara.

��� ��timo. Preciso urgente de um vestido, de um par

de sapatos e bolsa. Terei que me apresentar bem chic.

N��o �� maravilhoso, Regina, ter seu pai t��o perto quando

se precisa de dinheiro?

��� Ele vai cortar a minha mesada.

Mam��e levantou-se e, com os olhos desmesurada-

mente abertos, falou gaguejando:

��� Mas, por que?

Fui at�� a porta do apartamento apanhar o jornal e,

logo na primeira p��gina, vi nossas caras. Entreguei-o a

mam��e que o leu e ficou balan��ando a cabe��a estupifi-

cada.

��� Aqui, dentro da sua casa??? N��o �� poss��vel, Re-

gina!

��� 137 ���

��� Mas, mam��e, eu n��o s a b i a . . .

��� N��o venha com desculpas. Voc�� n��o tem o di-

reito de me fazer perder o pouco que seu pai nos d��.

Voc�� �� infernal... Oh, meu Deus, imagine se ele nos

cortar a mesada. ��� Apertou a cabe��a entre as m��os. ���

Oh, como sofrem os pais. Voc�� quer destruir-nos. Todos

voc��s; essa juventude moderna, quer acabar com a

gente. Sei que nunca admitir��o que est��o erradas. Ago-

ra, deixe-me s��. V�� para o seu quarto.

Sa��, fechando a porta, e fui para o quarto das me-

ninas. Acordei-as. Abriram os olhos se espregui��ando.

��� Que horas s��o?

��� Dez.

��� Puxa, e voc�� vem acordar a gente a essa hora!

Fomos dormir de madrugada.

��� Voc��s devem dar gra��as ao papai por estarem

aqui, deitadinhas como dois anjinhos. Se fosse pelo se-

nhor juiz de menores voc��s estariam ainda em cana at��

agora. Agora escutem o que eu vou ler para voc��s. Pri-

meiro olhem essa fotografia, bem na primeira p��gina.

Arlete arrancou-me o jornal das m��os e gritou:

��� Olhe, Ivete, como saimos legais. At�� parecemos

artistas de Hollywood, mas daquelas artistas mais ba-

canas que moram em Beverly Hills.

Ivete debru��ou-se bocejando e batendo a m��o na bo-

ca, olhou o jornal.

��� �� muito bacana mesmo, mas o diabo �� se papai

ver. Ele vai ficar fulo de raiva.

Apanhei o jornal das m��os de Arlete e l�� alto.

��� Regina Albuquerque, Arlete Sampaio de Souza e

Ivete Cerqueira, jovens da alta sociedade, residentes na

Avenida Atl��ntica, 241, apartamento 93, ontem �� noite

��� 138 ���

foram submetidas aos maiores vexames por tr��s h o -

mens desclassificados que a jovem Regina Albuquerque

introduziu no apartamento. Foi imposs��vel entrevistar

seu pai, o famoso cirurgi��o Alberto de Albuquerque, que

veio de S��o Paulo prestar depoimento ao juiz de menores,

que classificou o caso de "juventude perdida".

Ivete e Arlete riram at�� as l��grimas.

��� Olhe, gente, n��o riam assim t��o alto que mam��e,

depois que leu a not��cia, ficou uma fera. Agora est�� mui-

to perturbada e n��o quer que a incomodem! Por isso ��

bom a gente levantar e ir para a praia.

��� Primeiro vamos beber alguma coisa ��� sugeriu





Arlete.


��� Ora, �� muito cedo. O melhor �� a gente comer





ovos fritos e beber leite.


��� Bahhhhh... L�� vem voc�� com leite. Ali��s, teve

uma boa id��ia. Traga leite com conhaque ��� retrucou

Arlete, acendendo um cigarro.

��� Para mim, martini doce, querida. Traga a gar-

rafa, sim?

��� T�� bem, deixe eu preparar a bebida, pois fa��o

um martini excelente e voc��s sabem disso. Para mim

ser�� u��sque.

Bebemos, fumamos e depois fomos �� praia do Ar-

poador. Mas, logo depois do primeiro banho, Ivete disse:

��� �� verdade, Regina, a gente n��o tem escolhido





muito bem as companhias.


��� Claro. Voc�� viu em que atrapalhada nos mete-

mos ontem �� noite?

��� Foi bom para a sua vingan��a.

��� Ah, l�� isso oi. Papai ficou possesso e mam��e,

ent��o, nem se fala. Mas, no fundo, eu fiquei com pena

��� 139 ���

dos dois, pois aqueles homens n��o s��o companhias para

jovens como n��s.

Sentamos na areia e Ivete ficou matutando com

quem poder��amos sair �� tarde. De repente, ela deu um





pulo.


��� Ah, j�� me lembrei. Cada uma deve telefonar pa-

ra o rapaz que mais lhe agradar todos esses dias.

��� Ent��o vamos para casa almo��ar e a�� faremos o

programa para a tarde ou a noite.

Seguimos para o apartamento, debaixo de in��meros





convites e estridentes assobios.


Tocamos a campainha. Uma chave girou a fecha-

dura e Maria abriu a porta.

��� Cad�� a mam��e?

��� Ela saiu, dona Regina. Foi gravar.

��� T�� bom. Olhe, sirva o almo��o. O que se tem para

comer?

��� Ainda n��o comecei o almo��o.

��� Diabo, a gente tem que sair e voc�� vem com essa

molengada toda. Fa��a a�� uns bifes e batatas.

O telefone tocou e eu fui atender.

��� B voc��, Regina?

��� Sim.

��� Falando Raul.

��� Ah, n��o! Que surpresa! Estava pensando em vo-

c�� agorinha mesmo.

��� Mentirosa.

��� Juro!

��� 140 ���

��� Voc�� tem compromisso para a noite?

��� N��o.

��� Ent��o jantaremos l�� no Recreio dos Bandeiran-





tes.


��� Maravilhoso! Olhe, passe para me apanhar l��





pelas vinte horas.


��� Est�� bem. E, obrigado por ter aceito o meu con-





vite.


��� Puxa, que comodidade, heim, Regina? Nem pre-

cisou procurar o seu homem por telefone.

��� Voc�� j�� pensou com quem ir�� jantar?

��� J��. Espere, vou telefonar.

Depois que Carlos aceitou o convite de Ivete foi a

vez de Arlete, que ligou para o Ivan.

��� Pronto, todas temos compromisso para a noite.

E a tarde, vamos ficar chupando o dedo?

��� Foi o que pensei. Bom, o negocio �� a gente ir

at�� o apartamento do Jos��. L�� est�� sempre cheio de





gente alegre.


Como fic��ssemos indiferentes, disse, ir��nica:

��� Voc�� se lembra dele, n��o ��, Arlete?

��� Creio que n��o.

��� Esquisito. Foi ele o primeiro homem em sua





vida.


��� Sinceramente, depois de passar por tantos, j�� me





havia esquecido.


��� Bem crian��as ��� gritou a empregada. ��� o al-

mo��o est�� servido.

��� Traga bebidas.

��� 1 4 1 ���

��� Uisque! ��� gritou Arlete.

��� Dois! ��� disse Ivete.

��� Tr��s! ��� falei.

E, rindo, nos afundamos nas poltronas e ficamos





bebendo e fumando.


��� Mas, e o almo��o? ��� choramingou a empregada.

��� Deixe pra l��. Vamos almo��ar na casa de um





amigo.


Apanhei o carro de mam��e e, alegres, nos dirigimos

para o apartamento de Jos��. Assim que rodei alguns

metros, ouvi um apito.

��� �� a pol��cia, Regina! ��� exclamou nervosa Ar-





lete.


��� P�� na taboa! ��� gritou Ivete.

��� N��o, Regina. Pare! Voc�� �� menor. Vai dar um





galho dos diabos.


��� Deixe dar.

Ivete me incentivava a correr. Mas, num farol ver-

melho, tive que parar.

Na pol��cia, fomos obrigadas a esperar horas at�� que

mam��e conseguisse ser avisada e ela entrou na delega-

cia com as m��os na cabe��a, gritando:

��� Voc�� est�� determinada a me deixar louca? N��o

sabe que �� menor e n��o pode dirigir? Sabe ou n��o

sabe ?

��� Sei.

��� Ent��o por que pegou o carro?

��� Ora mam��e pra que haveria de pegar o carro?

��� 142 ���

��� Vou avisar seu pai. Voc�� qualquer hora atro-

pela algu��m.

��� Voc�� perde a mesada, mam��e.

��� Posso perder, mas juro que n��o vou me respon-

sabilizar por voc�� perante a lei.

��� Ent��o �� preciso chamar o papai. �� melhor voc��

resolver logo, pois estamos cansadas. J�� faz quatro ho-

ras que estamos esperando aqui, sentadas e temos com-

promisso para jantar fora.

��� N��o chamarei o seu pai. E voc�� n��o sair�� mais

de casa.

��� Oh, mam��e, n��o diga bobagem perto das mi-

nhas amigas. Afinal, o que h�� de mais em guiar um car-

ro? Por que essa pol��cia quadrada fez todo esse esc��n-

dalo?

��� Nem vou discutir a quest��o. O delegado que a

mande para o abrigo de menores. Juro que eu mesma

assinarei a peti����o para voc�� ficar no abrigo.

��� E voc�� perde o apartamento, o mobili��rio, o car-

ro, as roupas finas, as j��ias, etc.

Mam��e ficou andando de l�� para c��, falando alto.

��� N��o quero v��-la mais em delegacia. N��o faz nem

um m��s que voc�� saiu do col��gio e essa �� a terceira vez

que �� detida. Sei que posso pedir a minha filha um pou-

co de considera����o pois sei que ela �� capaz disso. Ainda

h�� alternativa. Voc�� promete que pedir�� ��s suas amigas

para irem embora e eu assinarei a responsabilidade.

��� N��o, nunca! S�� se voc�� prometer voltar para

p a p a i . . .

��� Nem vou discutir a quest��o.

��� Ent��o, em que ficamos? ��� perguntou o dele-

gado.

��� 143 ���

Mam��e manteve-se silenciosa. Eu, ent��o, sugeri ao

delegado que chamasse papai.

��� N��o! ��� disse mam��e, derrepente. ��� Eu assino.

Assinou o termo de responsabilidade e, aliviada, dei

o bra��o ��s amigas e saimos da delegacia.

Bem, ��� disse mam��e quando entramos no carro.

��� gra��as a Deus, dessa vez, tudo terminou bem. Mas na

pr��xima deixarei o juiz de menores resolver.

��� T�� bem, mam��e. Agora, por favor, deixe-nos na

porta daquele edif��cio ali. Iremos passar a tarde com

umas amigas.

Quando mam��e desapareceu ao longe, Arlete gri-

tou:

��� Puxa, em que fria ��amos nos metendo! Agora que

deixamos aquela chata pol��cia, vamos celebrar bebendo

qualquer coisa.

��� Beber? Onde?

��� Num b a r . . .

Sentamos nas cadeiras girat��rias de um barzinho

bem legal na Avenida Nossa Senhora de Copacabana.

��� Tr��s u��sques ��� pediu Arlete.

��� N��o vendemos bebidas alco��licas para menores.

��� Chi, outro quadrado! ��� falou Ivete.

��� Quadrado ou n��o, obedecemos a lei.

��� Ok, meninas, vamos tentar em outro bar.

Passamos uma meia hora visitando bares, mas to-

dos se negaram a nos servir.

��� O neg��cio �� a gente ir festejar no apartamento

de Jos��.

��� 1 4 4 ���

Subimos e encontramos o apartamento com alguns

rapazes.

Jos�� nos recebeu sorrindo.

��� Ei, menininhas, est��vamos mesmo precisando de

voc��s.

Os rapazes usavam cal��as "blue-jeans" acinturadas,

bem abaixo dos quadris, e camisas furadinhas.

��� Olhe, meninas, s��o os jovens do conjunto "Os Pra

Frente". Cantam no Canec��o.

Tomamos uns goles e depois almo��amos. Os meni-

nos do conjunto vieram com aquela xaropada toda de

escolher quem dormiria com uma de n��s. Mas, gra��as

ao Jos��, eles nos deixaram em paz e ficaram discutindo

a possibilidade de mam��e apresent��-los a algu��m in-

fluente da TV. Paulista.

��� Voc�� sabe, aqui na Guanabara n��o existe mais

caminho para n��s. Levamos um tombo e, quando al-

gu��m cai nesta cidade, a ��nica coisa a fazei �� sair e

fortificar-se em outra cidade. S��o Paulo �� a terra de er-

guer os caidos.

��� N��o sei se mam��e poder�� ajud��-lo.

��� Mas Jos�� me disse que nas tvs de S��o Paulo sua

m��e �� muito conhecida.

��� Eu falo com ela. Mas n��o sei se voc��s consegui-

r��o sair daqui.

��� Ora, por que n��o?

��� Bem, eu acho uma coisa gozada essa Guanaba-

ra. A gente passa algum tempo aqui e depois �� duro se

acostumar em outro lugar. Quanto mais a gente fica,

mais dif��cil de sair �� preciso um motivo muito forte

para partir.

��� E n��s temos. Estamos quebrados. Depois de

terminado o nosso contrato no Canec��o arrumamos so-

��� 145 ���

mente um programinha vagabundo para cantarmos no

r��dio. N��s preeisamos nos apresentar em S��o Paulo.

��� �� . . . ��� Respondi. ��� Tentarei ajud��-los. Falo

com mam��e ainda hoje, se poss��vel, pois ela est�� uma

fera.

Por que?

O guarda de tr��nsito nos pegou. E o earro era

de mam��e. Ela teve que assinar um termo de respon-

sabilidade e agora haver�� inqu��rito e mil e uma coisi-

nhas mais.

Um dos rapazes, olhou paia mim, Ivete e Arlete e

falou:

��� Sua m��e ou os pais dessas meninas t��m raz��o

de ficarem feras, pois essa liberdade excessiva que a ju-

ventude exige p��e em p��nico qualquer fam��lia.

��� Mas n��s temos que viver como a nossa ��poca re-

quer. N��o podemos viver o passado. Somos o futuro.

��� Futuro insatisfeito no corpo e na alma.

��� Insatisfeito por que? ��� reclamou Ivete, petu-

lante.

��� Por que voc��s, jovens, procuram nos entorpecen-

tes, na bebida, no sexo, o calor para viver.

��� Bem, l�� isso �� verdade ��� respondi. ��� N��o te-

mos o calor de um lar e �� por isso que procuramos, em

tudo o que voc�� disse, um modo de escapar da ang��stia

que nos oprime o cora����o, por sermos adolescentes sem

amor, adolescentes perdidas nessa grande cidade de ci-

mento armado, cheias de melancolia e afli����o, gritando,

em gritos mudos, afeto e carinho dos pais.

��� Mas voc��s podem se recuperar. Podem procurar

um outro meio de vida. O que voc��s andam fazendo n��o

�� o certo. Essa hist��ria de conflitos entre pais e filhos ��

��� 146 ���

universal e nem todos os filhos desse conflito se ati-

ram assim para o abismo. Existe a recupera����o.

��� A Guanabara n��o �� cidade para ningu��m tentar

urna recupera����o ��� disse Jos��.

��� N��o vejo por qu��. Ent��o S��o Paulo �� pior ainda

��� retrucou outro jovem.

��� Vamos mudar de assunto ��� a voz de Arlete

encheu a sala. ��� Ningu��m quer sair da bebida, do se-

xo e das bolinhas Olhe, Jos��, por favor, mande esse Mes-

sias a�� parar com esse serm��o. J�� falou o bastante esta

tarde. A gente fica at�� doente com tanta moraliza����o.

Parece at�� que somos deca��das.

��� Deca��das ou n��o, voc��s n��o devem estar se estra-

gando assim. Gosto muito da nossa juventude e detesto

ver como rolam envoltos em lama para o pecado.

��� Pecado??? O que �� isso? ��� Disse Ivete, caindo

na risada.

O rapaz ficou vermelhinho e disse ir��nico:

��� Voc�� j�� ouviu falar em Cristo?

��� Ah, aquele filho de Deus feito homem?

O rapaz continuou na mesma ironia.

��� Jesus Cristo teve que morrer crucificado, san-

grando por todos os lados para que seu Pai perdoasse os

pecados dos homens. Voc��s n��o devem viver em peca-

do e . . .

��� Mo��o, por favor, pare de falar. Deixe a gente

viver em pecado. O problema �� nosso. E por falar em

problemas temos que sair correndo pois precisamos nos

arrumar.

��� �� verdade. O nosso jantar.

��� Mas, antes vamos beber mais uns goles ��� disse

Arlete, com olhar de desafio cravado no rosto do mo��o

do serm��o. ��� L�� em casa, a m��e da Regina escondeu

todas as bebidas.

��� 147 ���

��� Arlete, querida, voc�� �� uma idiotazinha. Se ma-

m��e escondeu as bebidas, existem milhares de bares, ar-

maz��ns, super-mercados, para se comprar outras.

Caimos na risada, bebemos uisque, pegamos cigar-

ros que estavam em cima da mesinha, dentro de um sa-

patinho de prata, e fomos pela avenida, fumando, at��

chegarmos ao apartamento. Raul chegou junto com Car-

los e, logo em seguida, Ivan. Carlos sugeriu irmos todos

para um restaurante que ficava num daqueles pr��dios

perto da Lagoa Rodrigo de Freitas e eu fiquei contente

com a id��ia de Carlos pois estava determinada a impe-

dir que meu cora����o batesse mais r��pido, ficando a s��s

com Raul. N��o queria me apaixonar e n��o queria dar

nenhuma oportunidade a Raul de passar-me um daque-

les serm��es. Com mais companhia, Raul ficaria calado,

como de costume.

��� Oh, Carlos, fico satisfeito com a sugest��o ���

disse, enquanto entr��vamos todos no Impala de Ivan,

pois Carlos estava com um carro esporte e Raul com um

Karman-Ghia.

Sentamo-nos em mesas perto ao conjunto que toca-

va, estridentemente, m��sicas da juventude. Raul estava

morto de raiva.

��� Olhe aqui ��� disse-me enquanto dan����vamos.

��� Sinceramente, n��o estava com um pingo de vontade

de vir jantar em companhia dessas crian��as e nem de

ficar ouvindo essa m��sica de doidos. N��o suporto essas

coisas. O melhor �� a gente ir para um lugar mais so-

cegado.

��� Ora, Raul, �� o meu ambiente. Eu tamb��m sou

crian��a.

��� Para falar a verdade, voc�� �� mais do que crian-

��a. Ent��o n��o sentiu que eu a convidei por que tinha

algo muito importante para lhe falar?

��� 148 ���

��� E o que ��?

��� Aqui n��o poderei falar.

��� Por que? ��� sorri. ��� S��o as crian��as, ou coisa as-

sim, que o atrapalham?

��� Ningu��m me atrapalha. Gosto de crian��as dor-

mindo a essa hora. Gostei de estudantes no tempo que

era estudante. Gosto de adultos agora que sou adulto.

Uma progress��o just��ssima, voc�� n��o acha?

��� Eu adoro essa m��sica e essa dan��a maluca.

��� Sei muito bem que voc�� n��o gosta disso ��� dis-

se ele, sorrindo.

��� Bem, na verdade n��o gosto mesmo. Mas voc��,

com essa obsess��o de n��o gostar da minha turma, me

deixa chateada,

��� Ope express��o horr��vel, Regina. E u , . .

��� Voc��, pelo que me pareee. n��o tem fraqueza al-

guma. �� auto-suficiente em todos os pontos de vista.

Raul acendeu um cigarro e retrucou.

��� Sempre as pessoas amigas dizem o mesmo. Mas

eu, como qualquer mortal, tenho os meus defeitos. Mas

prefiro n��o demonstr��-los.

A m��sica cessou e voltamos para a mesa. Ivan pe-

diu bebidas e n��s, as meninas, esvaziamos as nossas ta-

��as em segundos. Raul levantou a cabe��a olhando-me fi-

xamente e, vendo que eu pegava o u��sque duplo de Ivan

e secava o copo logo em seguida, abaixou a cabe��a e fi-

cou batendo a cinza do cigarro. Quando um grupo ba-

rulhento de rapazes e mo��as invadiu o resturante, olhei

para Raul e vi que ele n��o conseguia acender um novo

cigarro. Um dos rapazes era meu conhecido e logo que

me viu se pos a gritar:

��� 149 ���

��� Ol��, Regina! Como vai, queridinha?

Chegou-se a nossa mesa quase caindo, pois as pernas

n��o conseguiam sustent��-lo, e, beijando-me no rosto,

disse:

��� Olhe aqui, querida, encontrei o M��rio e ele disse

que a est�� procurando por toda parte para lhe fazer ou-

tra massagem, daquelas de se ficar nua e d e p o i s . . . A��

ele cochichou o resto em meu ouvido e caiu na risada,

Raul ergueu as sobrancelhas e disse r��spido:

��� Pare de falar bobagens �� minha companheira.

��� V�� para o inferno! N��o estou falando com voc��

E depois Regina �� de todos. Todos podemos dormir com

ela. Ela n��o �� ego��sta, pois todos sabem que ela �� a

maior, na cama.

Raul, vermelho de raiva, levantou-se e atirando a

cadeira para tr��s, ia agarrar o jovem, quando Carlos e

Ivan vieram concili��-los.

��� N��o ligue para o que ele diz. Est�� b��bado n��o

est�� vendo?

��� B��bado ou n��o, ele que cale a boca, sen��o parto-

-lhe a cara.

��� Ora, que h��, puritano? ��� sorriu o meu conhe-

cido, friamente. ��� Est�� mesmo ficando ciumento. Bas-

tardo. N��o esque��a de que n��o �� o ��nico camarada a

fazer amor com ela. O meu col��gio inteirinho j�� a tre-

pou. E olhe que o col��gio tem dezenas de quartos e em

cada quarto dormem quatro alunos, todos jovens e fo-

gosos.

��� Pelo amor de Deus, Ivan! ��� implorou Raul. ���

Largue os meus bra��os, pois mato esse camarada, esse

b��bado.

��� 150 ���

��� Mata nada, Eu bebo mas n��o paro de funcionar

Pergunte a�� pra Regina.

��� Solte-me, Ivan. Tire essas m��os de mim, por fa-

vor, pois ningu��m vai dizer coisas assim �� Regina. Nin-

gu��m!

O gerente do restaurante se aproximou de n��s. Dis-

se ao meu conhecido:

��� Quer dar o fora daqui, antes que eu mande jog��-

4 o na rua.

0 meu conhecido respondeu.

��� Ora, meu velho, voc�� nem sabe do que est�� fa-

lando e j�� vem com essa f��ria toda.

��� Sei sim. Um vizinho de mesa, aqui desses casais,

disse que o senhor est�� faltando com o respeito a uma

das meninas,

��� Menina ? ? ? Ora, seu gar��om, pergunte a ela quan-

tos abortos j�� andou fazendo por a��. Eu a encontro sem-

pre em todas as espeluncas do raio do mundo que fre-

quento e sempre ela est�� ��� quero dizer, elas est��o ��� com

homens diferentes, bebendo e fumando com caras de

deca��das, �� isso mesmo, seu gar��om. Meninas deca��das,

perdidas, envoltas em lama.

��� Vamos! Vamos! Fora! Fora daqui! Fora! Fora.

��� Ora, que me interessa ser posto para fora desse

restaurante depois que Copacabana inteirinha, me jo-

gou para fora de seus bares. Eu tamb��m posso ser cha-

mado de menino. Sabe quantos anos eu tenho, senhor

gar��on? Dezessete anos. Dezessete anos cheios de ��l-

cool, de entorpecentes e de nada. Eu tamb��m sou um

menino deca��do, perdido, envolto em lama.

��� �� mais uma raz��o para voc�� sair daqui. Meno-

��� 151 ���

res s�� devem entrar aqui acompanhados de adultos. Va-

mos. Eu o acompanho.

O chefe dos gar��ons, muito satisfeito, segurava o

bra��o do meu conhecido e o conduzia para fora.

Ivan largou Raul, que levantou a cadeira e sentou-

se. Os outros fizeram o mesmo e por uns minutos o si-

l��ncio cobriu o grupo. Foi Ar��ete quem o interrompeu,

falando-me.

��� N��o fique perturbada, Regina. �� apenas mais

um incidente de b��bados e isso a n��s n��o abala.

N��o respondi, pois estava danada com aquele jo-

vem b��bado, pois nunca tivera nada com ele. Simples-

mente, certa vez, n��s nos encontramos numa festa. Era

a segunda vez que o via.

Senti Raul pegar o meu bra��o e passando-o por so-

bre o dele afagou carinhosamente a minha m��o, sorrindo

par�� os meus olhos, e disse:

��� Mas, afinal, para que tanto sil��ncio? Vamos pe-

dir mais bebidas. O que quer tomar?

��� Nada. Estou terrivelmente enojada de tudo.

��� Eu sei, querida. Por isso �� que acho que um gole

viria a calhar bem.

��� N��o! ��� decidi rapidamente. ��� Creio que n��o

estou com vontade de beber nada mesmo. Sabe o que

realmente quero? Ir para minha casa. Sei que voc��s

v��o achar esquisito, pois ainda s��o apenas nove horas.

M a s . . . ��� parei de falar, pois estava com vontade de

chorar.

Raul apertou meu bra��o e, fazendo-me levantar,

despediu-se do grupo. Passando os bra��os pelos meus

Ombros, falou;

��� 152 ���

��� N��o acreditei no que aquele jovem falou. Por

isso levo-a para casa, mas com uma condi����o.

��� Qual ��? Quer beber comigo l�� em casa?

��� Nada disso. Compreendo muito bem como se

sente. Proponho irmos almo��ar e, �� tarde, pegarmos um

cinema.

��� Est�� certo ��� respondi, sentindo as l��grimas

correrem pelo meu rosto.

��� Regina. . . juro que n��o acreditei.

��� Eu sei. Raul. Mas choro por que n��o queria pas-

sar por aquilo.

��� Eu sei.

��� Mas, se papai e mam��e quisessem, eu jamais vol-

taria a me encontrar com essa turma de jovens fardos.

��� Mas �� voc�� que tem de querer, Regina.

��� N��o, Raul. O que passei essa noite �� culpa dos

meus pais. Agora chego em casa e sabe quem encontro

l��, para me consolar.

��� Quem?

��� Sombras. Sombras de dois jovens que se casa-

ram por amor, que tiveram uma filha do amor, e hoje

vivem separados. Sim. Raul, abra��arei e chorarei nos

bra��os de sombras negras...

��� Quer que eu fique com voc�� at�� sua m��e voltar

da tv?

��� N��o, pois voc�� ficaria esperando um talvez. Pois

ela sempre diz antes de sair de casa que talvez volte, se-

n��o dormir no est��dio mesmo.

Paul abriu a porta do apartamento para eu entrar

o se afastou desaparecendo na noite. Eu fechei a porta

e me recostando na mesma, gritei:

��� Mam��e, papai, j�� cheguei!

As sombras negras se revolveram e o sil��ncio t��trico

levou a minha voz para bem longe, ficando somente o

eco vibrando no enorme apartamento.

��� 153 ���





XII

Aquele??? Dorme com o diretor.

O dia seguinte amanheceu com uma fria chuva, que

caia na praia, enchendo-a de sombras de solid��o. Eu le-

vantei-me cedo e fui ao quarto das meninas, mas elas

tinham passado a noite fora. Liguei a eletrola, preparei

uma dose de u��sque e acendi um cigarro. Fiquei tentan-

do adivinhar onde estariam dormindo Arlete e Ivete.

Em algum apartamento com Carlos e Ivan, de certo. A��

fiquei pensando em mam��e. Tamb��m ela havia dormido

fora. Talvez se eu mudasse o modo de tratar mam��e

teria uma chance dela voltar com papai. Por isso man-

dei a empregada fazer um variado almo��o e mandei, do

bar, vir a champanha mais cara. Alguns minutos depois

a porta do elevador bateu e os passos de mam��e ressoa-

ram pela sala. Mas, olhando mam��e, senti que alguma

coisa andava mal. Mam��e provavelmente havia chorado

pois tinha os olhos vermelhos.

��� Quer tomar alguma coisa, mam��e?

��� N��o se incomode. Eu mesma preparo.

��� Aconteceu alguma coisa?

��� Sim. N��o farei mais a novela. O papel foi da-

do para a Cristina.

��� Aquela que dorme com o diretor, n��o �� essa?

��� Por favor, minha filha. N��o diga coisas assim

Cristina �� uma grande atriz. Ela garante boa audi��ncia.

O diretor n��o poderia fazer nada, pois foi advertido ener-

gicamente. Bom Ibope ou rua. Olhe, Regina, a Guana-

bara �� dura mesmo para se vencer. Todos me disseram,

quando tentei tv, no in��cio da minha carreira aqui. To-

dos tinham raz��o. O que �� duro �� a luta pela sobrevi-

v��ncia e cada qual deve se defender. Aqui na Guanaba-

ra n��o existe pena, d�� ou piedade. Cristina s�� tem a

novela e eu ainda tenho o seu pai.

Meu cora����o quase parou. Mam��e, com o fracasso

da novela, talvez permitisse que papai voltasse para ca-

sa. Eu tinha certeza de que, apesar de todo o fel que

papai cobria, mam��e ainda o amava apaixonadamente.

��� Quer dizer que voc�� est�� sentindo falta de papai?

��� Ah n��o. Seu pai tornaria as coisas mais dif��ceis

do que est��o. N��o sinto a m��nima falta dele. A vida de

uma artista �� assim mesmo Cheia de altos e baixos. Eu

devo me levantar sozinha. Seu pai s�� atrapalharia,

A�� senti que devia deixar mam��e sozinha. Fui a co-

zinha e disse �� empregada para servir qualquer coisa pa-

ra o almo��o e que escondesse a champanha.

Sem as meninas, o apartamento estava triste. Pen-

sei aonde poderia ir para me distrair um pouco, pois es-

tava infernalmente deprimida com os problemas de ma-

m��e. Ent��o descobri aonde queria ir. Queria ver Raul.

Liguei para ele.

��� Al��?

Al��, Raul, �� Regina. Gostaria de falar com voc��.

��� Quando?

��� Agora.

��� 156 ���

��� Est�� bem. Espero-a l�� na praia em frente ao Co-

pacabana Palace.

��� N��o. Eu prefiro ir a�� ao seu apartamento.

��� Claro. Pode vir.

Quando cheguei, ele perguntou-me:

��� O que vai mal, menina?

��� Nada. Queria apenas bater um papo com voc��.

Espero n��o o estar aborrecendo ou coisa que o valha.

��� N��o me aborrece em nada. Olhe, teme um ca-

fezinho enquanto batemos o papo.

Acabei de tomar a x��cara de caf�� e disse:

��� Raul, mam��e anda dando murros para partici-

par de bons pap��is na tv e s�� conseguiu fazer papel de

idiota. Eu gostaria de que algu��m falasse com o diretor

da tv para n��o contrat��-la mais. Assim ela talvez volte

para papai. O que devo fazer?

��� Olhe, Regina, eu acho que voc�� est�� terrivelmen-

te cansada de compartilhar da infelicidade de seus pais.

Pense em encontrar o rapaz certo e a�� voc�� se casaria e

n��o ficaria mais solit��ria. Fa��a um lar sadio, onde de-

ver�� imperar o amor e a compreens��o.

��� N��o adianta tentar iludir-me, Raul. Voc�� deve

saber que homem algum se casar�� comigo quando sou-

ber o que aconteceu e que vivo ao l��u, pois sou filha de

pais desquitados.

��� Mas voc�� tem m��e Regina. Sua m��e olha por

voc��.

��� Minha m��e n��o quer ser m��e. Ela nunca me re-

preende em nada. Deixa que eu fa��a o que bem enten-

da. Tenho uma excessiva liberdade. Fa��o da minha vi-

da o que bem entendo. Saio com quem quero e fa��o o

��� 157 ���

que quero. Minha m��e poucas vezes me aconselhou a

fazer isso ou aquilo, mas eu n��o me abro com ela, n��o

conto meus segredos a ela, n��o sei porque n��o a sinto

m��e. O que quer dizer isso, heim, Raul?

��� �� por que voc�� a quer junto de seu pai. Os dois

juntos ser��o para voc�� a for��a que a guiar�� pelos ��spe-

ros caminhos da vida. Se eles estivessem juntos, voc��

contaria �� sua m��e as coisas que a perturbam, como es-

t�� contando para mim, mas j�� que isso �� imposs��vel, vo-

c�� deve fazer um esfor��o e deixar sua m��e ser m��e.

��� N��o sei, Raul. S�� confiarei nela o dia que me

der o lar que sempre almejei. Lar com pai e m��e.

��� Voc�� j�� falou umas duzentas vezes sobre esse lar

e eu n��o canso de repetir que o lar voc�� poder�� formar

com um bom rapaz que a ame e que a respeite.

��� N��o, eu quero o meu lar sonhado, com os meus

pais juntos.

��� Est�� bem, Regina. Agora vamos sair para voc��

se distrair um pouquinho. Est�� muito nervosa.

��� N��o, obrigada. Eu quero ir para casa.

��� Ok. Eu a levo. Deixe ir buscar o carro.

Enquanto Raul guiava, senti dentro de mim que a

observa����o que fazia do seu belo semblante me dava um

desejo louco de beij��-lo. Sim, gostaria que aquela boca

arrogante se enfiasse inteirinha dentro da minha. Raul

era um homem no duro. O corpo esbelto, as m��os for-

tes e grossas pelo trabalho. Agora que estava ali olhan-

do para ele, a seu lado, sentia que ele poderia ser o ra-

paz que o futuro me daria para formar o lar sadio de que

fal��vamos h�� pouco. N��o, Raul n��o seria o homem

para se casar com uma jovem pecadora. Mas a atra����o

que eu come��ara a sentir por ele parecia se fortificar

mais e mais.

��� 1 5 8 ���

Depois de me despedir de Raul, entrei no aparta-

mento e encontrei mam��e falando com um senhor c

Quando v�� o rosto do homem, meu cora����o gelou.

Era o pai de Ivete.

Fiquei parada na porta um longo tempo, vendo-o be-

ber um enorme copo de uisque e falando de um modo

como s�� os alco��latras sabem se expressar. Depois que

Ivete me contou tanta coisa a respeito dele foi que v��

que a express��o de seu rosto era, realmente, estranha e

me pareceu, de fato, perigosa. N��o voltou a cabe��a quan-

do o cumprimentei, mas sua voz rouca ressoou pela

sala.

��� Ivete est�� a�� com voc��, como sua m��e disse?

Relutei em responder, olhando para mam��e, que fa-

lou por mim.

��� Ivete saiu com Arlete, senhor Cerqueira. Daqui

a pouco estar��o de volta.

��� Mas, senhora, eu gostaria que minha filha n��o

ficasse por a��. Talvez a senhora possa dar uns conse-

ihos a ela para que volte comigo para Pernambuco. Ela

disse que s�� viria passar as f��rias de ver��o, e as f��rias

j�� terminaram. As aulas j�� come��aram e n��o sei de mi-

nha filha.

Pedi licen��a ao senhor Cerqueira e fui esperar Ive-

te na porta do pr��dio. N��o demorou muito e elas des-

ceram de um luxuoso carro. Corri para elas e gritei:

��� Ivete, sabe quem est�� l�� em cima?

��� Papai.

��� Como adivinhou?

��� E quem mais poderia deix��-la t��o nervosa as-

sim?

��� 159 ���

��� Ele veio busc��-la.

��� N��o irei.

��� J�� come��aram as aulas.

��� Que se danem.

��� Que pretende fazer?

��� N��o sei bem. Acho que vou procurar por a�� um

"fuma��a". Fumo e esque��o que tenho de me rebelar con-

tra o velho.

��� E onde voc�� vai encontrar maconha a essa ho-

ra?

��� Ora, h�� tantas bocas de fumo aqui na Guanaba-

ra. Digamos, l�� no Castelinho.

��� Mas se voc�� �� apanhada com um cigarro de ma-

conha pode ser castigada com pena de um a cinco anos

de cadeia.

��� Ora, Regina, voc�� est�� sabendo demais.

��� Eu n��o" �� a lei. Conhe��a o artigo 281 do nos-

so C��digo Penal. O C��digo pune a todos, indistintamen-

te: viciados, traficantes, consumidores eventuais, etc.

��� Chi, Regina, hoje voc�� est�� quadrada. O neg��cio

�� eu n��o tomar droga nenhuma e enfrentar o velho com

a cara bem limpa. Vamos l��.

Quando entramos na sala, o pai de Ivete a cumpri-

mentou muito agitado, como se estivesse ansioso por

desviar das pessoas presentes a aten����o do seu jeito de

alco��latra...

��� Ivete, querida, que alegria em v��-la. Vim busc��-

-la. Voc�� sabe, as aulas j�� iniciaram.

��� N��o volto praquele col��gio, papai. Nem Regina e

nem Arlete v��o voltar.

��� 160 ���



Mas voc�� parecia t��o satisfeita l�� no Senai.

��� Era fingimento. O senhor sabe perfeitamente

que a diretora de l�� disse que eu me sentirla mais feliz

em outro estabelecimento.

��� Mas, em Pernambuco h�� bons col��gios.

��� Eu nem ligo.

��� Escute, Ivete, eu gostaria que voc�� tivesse um

pouco de considera����o pelo menos por sua m��e.

��� Como considera����o, papai, se voc��s se impreg-

nam de ��lcool.

��� Ivete!

��� Que h��, papai? O senhor sabe que a emprega-

da encontrar�� sempre um frasco de uisque sobre o seu

criado-mudo todas as manh��s.

O pai de Ivete olhou para mam��e sem largar o co-

po de bebida e falou.

��� Gostaria, dona Carmen, que Ivete n��o se sentis-

se suficientemente �� vontade nessa casa para responder

assim. As vezes nem sabemos por que �� t��o revoltada

contra n��s, que procuramos dar-lhe tudo do melhor.

Nunca nos importamos que ela chegue em casa com

v��rios convidados, onde passam meses em festas sem

que Ivete nos pe��a permiss��o ou mesmo sem nos dar avi-

so algum. S�� a reprovamos quando soubemos que se

envolveu com uma turma que fumava maconha e eram

viciados em outras drogas.

Ivete encarou o pai, enfrentado-o com petul��ncia,

��� Fumava n��o: fumo! Fumo em busca de sensa-

����es que possam me fazer fugir de pais b��bados e indi-

ferentes .

��� Ingrata ��� disse o pai de Ivete bebendo outro

gole de uisque. ��� Gera����o de ingratos. In��teis. Que-

��� 161 ���

rem fugir de alguma coisa. De que coisa? Se voc��s, ju-

ventude perdida, trabalhassem como eu trabalhei...

Com quinze anos era mensageiro da firma, hoje sou do-

na Sou dono por que nunca quis fugir dos fantasmas

que a mocidade de hoje v�� em toda parte. Sou dono, por

que trabalhei duro e abri caminho para cima. Nunca

precisei erva e nem me interessei por estupefacientes,

para integrar-me na sociedade.

Ivete deu uma gargalhada.

��� Ora, papai, as drogas s��o um s��mbolo da nova

gera����o. Toda a juventude mundial �� orientada pelas

drogas. �� o mesmo: quem tem qualquer dor toma,

quase que automaticamente, um comprimido. Quem

tem indisposi����o estomacal toma Alka-Seltzer, quem

est�� nervoso toma qualquer calmante, e n��s, a juventu-

de, n��o estamos satisfeitos com os nossos pais, com o

nosso governo, fumamos maconha, ora essa.

Na sala caiu um grande sil��ncio, s�� se ouvindo a

respira����o forte do pai de Ivete, que encarou-a, nervoso,

e gritou:

��� Cale a boca! N��o vou permitir que minha filha

fale abertamente que �� uma viciada em drogas. J�� n��o

chega o que todos est��o murmurando l�� em Pernambu-

c o : que minha filha n��o passa de uma prostituta aqui

na Guanabara.

��� Papai, voc�� �� um quadrado mesmo. Hoje em dia

o amor �� livre. Durmo com rapazes para satisfazer as

necessidades do meu f��sico. Se eu fosse homem seria

muito mais simples, me masturbava e pronto.

O pai de Ivete, roxo de ��dio, saltou da cadeira e,

num movimento r��pido, apanhou Ivete pelos cabelos e

arremessou-a contra a parede, gritando:

��� Ent��o �� verdade! Tudo pelo que trabalhei duran-

te a minha vida foi para cobri-la de ouro, para voc�� andar

��� 162 ���

por a�� com essa turma de delinquentes juvenis, sua

miser��vel!

Ivete olhou-nos embara��ada, alisando a vasta ca-

beleira e depois, encarando o pai, disse calmamente:

��� Gra��as a Deus, voc�� est�� mostrando ��s minhas

amigas que esp��cie de pai ��. Agora elas saber��o que ��

um alco��latra mesmo, desses alco��latras que toda filha

tem vergonha de apresentar como pai. Um pai que pen-

sa que, por que d�� dinheiro ao filho, esse mesmo filho

�� feliz. Agora todos saber��o por que busco a paz nos

entorpecentes. Por que o meu pai b��bado pensa que

me deu o que, o que? Ouro, dinheiro? Diabos que car-

reguem o seu dinheiro. Dinheiro a gente pode obter de

mil maneiras, mas um pai de verdade e um lar, �� muito

dif��cil. Isso voc�� n��o poder�� me dar nunca, por que a

bebida fez as suas id��ias se afundarem nesse maldito

dinheiro que voc�� ganhou at�� arrebentar os dedos, co-

mo diz. A bebida age como a maconha, meu querido

pai, faz o est��mago urrar, a boca secar e o sistema ner-

voso central, respons��vel pela percep����o, pelo racioc��nio,

perder a capacidade de controle, e a pessoa fica assim

como voc��. Um louco furioso, agredindo a pr��pria filha

a quem ele nunca poder�� oferecer paz, carinho, compre-

ens��o e amor.

O pai de Ivete a encarou, subitamente silencioso e

pensativo. Depois, pegando o copo de bebida e esvazian-

do-o de uma s�� vez, disse:

��� N��s, sua m��e e eu, j�� quisemos lhe oferecer um

lar decente onde s�� reinaria o amor, mas voc�� formou

dentro do col��gio uma turma que fez de n��s alvo de zom-

barias. Sua m��e voc�� a fez passar como exemplo de m��e

indiferente e b��bada e e u . . .

��� E voc�� como b��bado que �� ��� interpelou Ivete,

branca de raiva. ��� com tudo o que acaba de dizer, res-

ponda: onde est�� esse lar? Se eu fiz o que voc�� est�� fa-

��� 163 ���

lande, o que �� pura mentira, pois se os colegas riram de

mam��e �� por que ela estava b��bada mesmo ��� ent��o por-

que abandonou a id��ia do lar sadio e puro? Ora, por que

n��o lutou por ele. Por que, j�� que queria que mam��e e

voc�� me dessem esse lar t��o falado, n��o deixaram de lado

a tolice dos estudantes. S�� por que eles riram, voc��s se

afundaram mais na bebida e o meu larzinho se desfez

como fuma��a? Ora, papai, v�� contar essa hist��ria de lar

para o diabo. Voc�� vem com cada justificativa besta.

Mam��e bebendo pra l��. Voc�� bebendo pra c��. E a lou-

cura juvenil da filha e que �� condenada pela sociedade.

Agora voc�� pede por a culpa nos meus dezessete anos,

mas n��o h�� muito tempo para justificativas, pois os

meus dezoito anos, a maior idade, est��o a��, papai.

O pai de Ivete permaneceu em sil��ncio, olhando pa-

ra o copo vazio em sua frente. Mam��e suspirou nervo-

sa, apanhou o copo do senhor Cerqueira e preparou uma

dose com gelo, que a empregada tinha acabado de tra-

zer.

��� Ponha duas doses, senhora. Ou melhor, encha o

copo. Sei que beber n��o me faz bem nenhum, mas co-

mo parar de beber quando se vive nessa ��poca em que

os filhos mandam na pr��pria vida e tratam os pais co-

mo se esses tivessem quinze anos?

Mam��e encheu o copo e falou:

��� Olhe, senhor Cerqueira, eu n��o disse nada at��

agora por que julguei que n��o tinha o direito de inter-

vir, mas algum dia as nossas meninas v��o sentir o que

�� ser pai ou ser m��e. Temos que deix��-las dar cabe��adas

durante muito tempo, as mesmas cabe��adas que n��s de-

mos em nossa juventude. O que hoje explicamos a elas

em minutos elas levar��o anos para aprender por si mes-

mas. Algum dia elas compreender��o que n��o queremos

ver nesses filhes tristes e amargurados. Que n��s nos

amarguramos por eles e que, ao tomarmos a decis��o por

eles �� simplesmente para n��o v��-los sofrer mais tarde.

��� 164 ���

Como ��, senhor Cerqueira, que as nossas filhas pedem

ver na mocidade que grande luta �� viver? Como pode-

r��o ver que a vida �� feita de caminhos entrela��ados de

espinhos e que para abri-los existir��o mil obst��culos e

imensas barreiras que a toda hora se agigantam em nos-

sa frente. Nossa juventude �� composta de meras crian-

��as que insistem em fazer tudo por si mesmas, recusan-

do o conselho dos pais. Algum dia eles vir��o at�� n��s e

procurar��o conversar e pedir aux��lio para as suas almas

amarguradas.

��� Penso que o que a senhora falou n��o leva a coisa

alguma. Antigamente n��o havia a discuss��o entre pais e

filhos, mas havia o respeito. Hoje, por que bebemos, eles

bebem, por que fumamos eles fumam. Enfim, tudo o

que um adulto faz eles querem fazer. Pecam imensa-

mente, mas dizem sempre que a lei est�� do lado deles.

��� Somos menores. Nossos pais s��o cs respons��veis.

Que v��o para o diabo os filhos.

��� Besteira em cima de besteira ��� disse Ivete, sain-

do da saia, enquanto o pai a observava, sacudindo a

cabe��a.

Antes de Ivete cruzar a porta, ele gritou:

��� Dona Carmen vai aconselh��-la a partir comigo.

Ivete nem ligou, desaparecendo em seguida pela por-

ta que se fechou ��s suas costas.

Um sil��ncio pesado desceu sobre o apartamento,

quebrado de repente pelo volume da vitrola, que Ivete

elevou ao m��ximo. Olhei para Arlete, que disse:

��� ��, Ivete sabe preencher o v��cuo do sil��ncio. Va-

mos l�� impedir que ela derrube a casa.

Entramos no quarto e Arlete gritou:

��� Ei, Ivete �� um desperdicio essa m��sica assim

t��o alta, N��o h�� raz��o alguma para isso,

��� 165 ���

Ivete jogou os cabelos para tr��s e nos olhou cheia

de raiva.

��� Como n��o h�� raz��o? Meu pai quer mostrar-se

conservador. Vem aqui fingindo uma s��rie de id��ias so-

bre o meu futuro e depois solta as cachorros e me agri-

de. J�� que n��o posso agrad��-lo, elevo essa m��sica como

um sinal de protesto.

��� Mas protestar o que, Ivete? ��� a voz de mam��e

encheu o quarto. ��� O seu pai tem raz��o. Voc�� n��o po-

de ficar aqui para sempre. Tem que voltar a sua or��pria

casa, seu col��gio.

��� �� . . . ��� disse Ivete. ��� �� uma situa����o infernal.

N��o sei que diabo esse homem veio se intrometer na

minha vida. ��� Apanhou um cigarro e o acendeu nervo-

samente. ��� Quer que eu v�� embora, n��o ��, dona Car-

mem?

��� Infelizmente, voc�� tem que ir, e Arlete tamb��m.

Pois preciso organizar a vida de Regina.

A�� eu perguntei.

��� Organizar como, mam��e?

��� Ora, voc�� n��o pode continuar nessa vida.

Olhei-a petulante.

��� Que vida mam��e!

Mam��e jogou a m��o para todos os lados e titubeou.

��� E s s a . . . essa vida, sem uma defini����o. N��o es-

tuda n �� o . . .

Virei os olhos, ir��nica, e continuei.

��� .. .N��o tem um lar, n��, mam��e?

��� Ora, Regina, vamos parar com essa conversa.

N��o queira se esconder atr��s de toda essa... essa...

��� 166 ���

Mam��e saiu do quarto gritando:

��� Vou esperar uma hora para essas meninas arru-

marem tudo. Ficarei esperando-a na sala em compa-

nhia do pai de Ivete.

Assim que mam��e saiu, Ivete franziu a testa, jogou

o cigarro no ch��o e esmagou-o com o p��, falando:

��� Voc�� concorda, Regina?

��� Com o que?

��� Com as id��ias de sua m��e. Voc�� quer que a gente

v�� embora.

Sinceramente, n��o sabia o que falar. Fiquei olhando

para as duas amigas, feito boba. At�� que Arlete falou:

��� Tenho uma id��ia, para ficarmos livres de nossos

pais.

��� E qual �� ? ��� Ivete e eu perguntamos numa s�� voz.

��� Vamos nos casar.

A gente arranja um homem e casa.

Ivete caiu na cama as gargalhadas.

��� Como �� divertido, disse engasgando-se no riso.

N��o �� coisa que se pode chamar de vulgar.

Casar... Casar e quem querer�� casar com tr��s me-

ninas furadas por todos os lados?

��� Voc�� se julga bem difamada, hem Ivete? ��� dis-

se-lhe Arlete. Todos os lados n��o. Eu s�� perdi a virgin-

dade.

Ivete continuou rindo.

��� Ent��o perdeu tudo. Voc�� n��o sabe, bobalhona,

que aqui no Brasil a virgindade �� considerada condi����o

essencial para o casamento? Os brasileiros n��o V��o se

preocupar se voc�� est�� furadinha em outras partes ou

��� 167 ���

se usou a boquinha para certas chupadinhas. O que eles

fazem quest��o �� do homem integral, querem que o seu

p��nis retinho seja o primeiro a abrir o conduto vaginal

da esposa. Se descobrir que o homem j�� se foi, apelam

para o C��digo Penal Brasileiro, que anula o casamento.

Ivete sentou-se na cama e ficou pensativa por um

momento e depois falou com o dedo em riste:

��� S�� se a gente for �� pol��cia e denunciar um cara

qualquer com quem a gente j�� andou. A��, se o infeliz

n��o casar, ter�� a pena de reclus��o, pois o nosso C��digo

tamb��m reza. ��� O rapaz que seduzir mulher virgem

com menos de dezoito anos, ter�� que cumprir de dois a

quatro anos de reclus��o e n��s tr��s fomos seduzidas com

menos de dezoito anos.

��� Mas ningu��m nos seduziu, ��� articulei s��ria ��� e

se voc��s querem saber a verdade, eu encontrei o homem

que ser�� meu marido.

As duas me olharam arregalando os olhos e Ivete

perguntou:

��� E o que ele acha de voc�� n��o ser mais virgem?

��� Bem. ��� falei sentando-me em uma cadeira e

cruzando as m��os no colo ��� ele acha que uma simples

membrana n��o ser�� impecilho para a estabilidade de

um casamento. Um homem arrebentado n��o poder�� in-

terferir num casal que possui equil��brio emocional, afi-

nidades sociais, culturais e religiosas...

Pela primeira vez em minha vida vi Ivete s��ria,

quando perguntou: ���

��� E quem �� esse cara t��o inteligente? N��o �� bra-

sileiro, n��?

��� Claro que �� brasileiro! Hoje em dia, nem todos

os homens brasileiros pensam que a integridade himenal

possa atestar a honestidade de uma esposa.

��� 168 ���

Ivete riu e brincou, mas eu sentia que tudo era

for��ado.

��� Eh! Eh! Bicho, voc�� �� legal! Onde aprendeu

todas essas coisas?

Rimos, pois ador��vamos g��ria que pouco us��vamos,

j�� que a juventude que frequent��vamos n��o era dada a

esse tipo carregado da guia.

��� Aprendi com Raul.

As duas se levantaram.

��� �� infernal! Ent��o �� o Raul? �� o que mais disse

esse fen��meno de brasileiro, a respeito de t��o importante

assunto? ��� Olhe, Regina, bote o Raul para pregar em

pra��a p��blica, assim esses ignorantes brasileiros v��o en-

tender que o buraco da frente pode estar tapado por

uma pl��stica e l�� no esp��rito a escolhida pode ser uma

vigarista. Dessas que casam virgens mas, depois de al-

gum tempo, descobrem que o padeiro ou o leiteiro tem

um neg��cio maior do que o marido, a�� o esposo adorado

vai trabalhar e o que tem a "coisa" grande deita no

calor de seu c o r p o . . .

��� Olhe, Ivete. Vamos falar de n��s. Eu acho que

Raul pensa muito bem. Ele esteve me explicando que,

hoje em dia, uma certa classe de homens brasileiros,

principalmente os que nunca tiveram um dist��rbio ps��-

quico, acham que o conceito de honra n��o se situa em

determinada parte de nosso organismo. Raul diz la-

mentar muito que o amor, que poder�� levar um casal a

amplos caminhos, fique condicionado a um pedacinho

de pele intacta.

Nesse instante mam��e entrou e olhando para Ivete

falou:

��� Seu pai a espera.

Ivete sentou-se na cama e, cruzando as pernas, sen-

tou-se s o b r e as mesmas, respondendo:

��� 169 ���

��� Diga ao "coroa" que estamos discutindo a virgin-

dade, esse velho tabu ultrapassado. Por isso, n��o posso

atend��-lo.

Mam��e ficou branca.

��� Vamos, seu pai est�� cansado.

O rosto de Ivete se cobriu de uma certa agonia

quando se levantou e disse baixinho:

��� Est�� bem, diga ao velho para esperar mais um

instantinho, que vou arrumar as malas.

Quando mam��e saiu, Ivete, abriu a sua gaveta, jo-

gou algumas roupas dentro de uma sacola. Parou e res-

pirou profundamente, depois falou:

��� Olhe Regina, eu n��o vou, nem se me cortarem

a cabe��a, para junto de meus pais. Me d�� algum di-

nheiro, eu vou para S��o Paulo.

Sa��mos pela porta da cozinha e descemos as escadas

correndo. Ta passando um rapaz de motocicleta e Ivete

pediu uma carona. Na garupa da moto, abra��ando o

corpo do jovem, com o rosto enterrado em suas costas,

foi a minha ��ltima vis��o de Ivete.

O pai de Ivete, tr��pego e vermelho, saiu do aparta-

mento para ir pedir provid��ncias �� pol��cia.

No dia seguinte acompanhei Arlete at�� ao aeroporto

do Gale��o. Ia para a casa de uma tia, no Rio Grande do

Sul.

* * *

��� 170 ���





Estou s��. Abro a porta do apartamento, mas um si-

l��ncio g��lido sobe pelas escadarias e me percorre inteiri-

nha. Fecho a porta novamente. Ando pela sala, entro

no quarto, saio, entro na cozinha, volto para a sala,

abro novamente a porta. O frio, o sil��ncio. Fecho a por-

ta. Vou at�� o telefone e quando o tiro do gancho e come��o

a discar o n��mero de Raul, ou��o algo estalar no meu

c��rebro.

��� N��o, Regina ��� voc�� prometeu que se vingaria.

Seus pais continuam desquitados. Coloque o fone no

gancho.

Virei para um lado, para outro lado e comecei a

girar como doida, no meio da sala, gritando:

��� Papai, mam��e, Raul, Ivete, A r l e t e . . .

S�� o sil��ncio o g��lido sil��ncio. Sil��ncio. Sil��ncio.

Estava s��.

��� 171 ���

Nos dias que se seguiram n��o atendi os telefone-

mas de Raul e tamb��m n��o sai do quarto, por mais que

mam��e insistisse, quando vinha dormir em casa.

Alguns dias depois, recebi uma carta de Ivete, que

dizia:

Regina, querida, cheguei ao inferno. S��o Paulo est��

uma verdadeira merda. Estou morando num pequeno

apartamento de quarto, pia e banheiro, na Regional da

S��. Regional da S�� quer dizer que moro no c��rculo cen-

tral, que inclui os seguintes bairros: S��, Santa Efigenia,

Bela Vista, Liberdade, Bom Retiro, Santa Cec��lia, Acli-

ma����o, Consola����o, Barra Funda, Br��s, Cambuci,

Mo��ca, Pari, Cerqueira Cesar. O meu apartamento fica

na Barra Funda. N��o sei se sobreviverei nesta monta-

nha de pedras. Aqui, vive-se sem o verde, sem alegria,

respirando quilos de polui����o. S��o Paulo �� a cidade

mais densamente povoada do pa��s. (Tudo o que estou

lhe contando foi-me explicado por uma pessoa que tra-

balha na prefeitura. Eu o conheci quando, desesperada,

procurava algum dinheiro para dar o fora. Por isso

aguento o p��o que o diabo amassou. Olhe s�� se n��o te-

nho raz��o de odiar esta Capital, escura e cinzenta.

Voc�� f�� pensou ter que lutar todo os dias com 200 mil

carros particulares que circulam pelo centro, do lado

de 7 mil ��nibus e uns 20 mil t��xis? Agora, fique no meio

de todos esses carros e olhe para o alto, pr��dios e mais

pr��dios. Sufoca. Agora, respire. Polui����o. Ou��a: o ba-

rulho quase arrebenta os t��mpanos. Onde se esconde o

sossego?

Juro que estou neur��tica. Mil e oitocentas tonela-

das de lixo s��o recolhidas por dia, por 201 servidores

que ocupam 63 caminh��es para atender a todo o cen-

tro de S��o Paulo. Voc�� viu em quanto lixo estou envol-

vida? E esses vinte e cinco km2 que s��o a Regional, s��o

divididos por mais de um milh��o de pessoas que, todos

os dias, circulam pelas vinte mil oficinas e ind��strias,

pela quarenta mil lojas e pelos incont��veis escrit��rios

��� 172 ���



que se localizam neste inferno de asfalto de paralele-

p��pedos, de escapamentos e de chamin��s donde sae essa

f��tida fuma��a cimenta que me afoga de minuto a mi-

nuto. Imagine, Regina, que aqui neste centro de S��o

Paulo, o homem vive verticalmente, pois, de tantos me-

tros, s�� sobram para cada pessoa quinze m2. Voc�� j��

pensou viver uma vida em quinze m2? Ent��o, querida

Regina, estou aqui cercada por todos os lados de fu-

ma��a, concreto, carros e pr��dios. Ah! ia me esquecendo.

Tamb��m tenho cento e quinze quil��metros de galerias

para passear. Nessa f��ria de tr��nsito e de tudo procuro

algo com que possa distrair os meus dezessete anos.

Aqui, a juventude pobre, n��o tem nada para passar o

tempo. A�� ela descamba para o negativo. Para encurtar

o tempo em que poderei, novamente, estar na querida

Guanabara, comprei um gravador e passo a gravar tudo

o que acontece. La vai uma novidade: vou trabalhar, con-

segui um emprego na Petrobr��s. Os escrit��rios de meu

futuro emprego ficam bem pertinho de onde moro, posso

ir a p��, num edif��cio de vinte e oito andares e fica na

Av. S��o Jo��o. O nome dele �� Andraus, mas todos os

chamam de Pr��dio da Pirani, pois as lojas da Pirani

ocupam tres andares desse pr��dio. Vou gravar o meu

primeiro dia de trabalho e lhe mandarei a fita. Saiba

que estou mima fossa infernal. Vejo tudo negro. Ah!

Regina, venha em meu socorro, n��o quero ficar aqui,

juro, juro que vejo tudo preto. Adeus.

IVETE

S��o Paulo 21/02/72

Quando acabei de ler a carta, fiquei olhando no in-

finito, e s�� via, l�� bem longe, a palavra Adeus

Adeus, mas Ivete disse que voltaria. Fiquei mor-

��� 173 ���

rendo de pena da minha amiga. Quando mam��e che-

gou, mostrei-lhe a carta.

��� Voc�� a mandou embora, n��, mam��e? Voc�� a jo-

gou nesse inferno que ela diz na carta.

��� Ora, Regina! Ivete est�� exagerando. Seu pai

adora S��o Paulo. Ele mora no Morumbi e nunca quis

trocar S��o Paulo pela Guanabara.

��� Mas ela mora no centro. Voc�� n��o v�� que ela

diz que est�� vivendo sufocada por tantos pr��dios?

Mam��e preparou duas bebidas. Deu-me uma e con-

tinuou: ��� N��o pense mais em Ivete. Ela, agora, vai tra-

balhar e ent��o dar�� valor ao dinheiro.

��� Mas ela est�� s��, s�� como eu, mam��e. E estan-

do s��, passam-se mil e uma coisas ruins em nossos c��re-

bros. Estou intrigada pelo que Ivete escreveu. Ela nunca

ficava na fossa, n��o estava sujeita ��s flutua����es de es-

tado de esp��rito e, contudo, essa carta demonstra pro-

funda depress��o. Geralmente, a m��goa de Ivete era mal-

dizer as bebedeiras dos pais. Tinha verdadeiro ��dio do

pai. Quando ela tinha onze anos o pai a chamou para

a sala de visitas. Estavam sozinhos em casa. Ivete sor-

rindo (naquele tempo adorava o pai) sentou-se ao seu

joelho e ele ent��o..

N��o tinha coragem de continuar. Mam��e, pas-

sou-me a m��o pelos cabelos. Continuem Regina, quem

sabe se, ouvindo tudo, poderemos fazer alguma coisa por

ela. Talvez possamos convid��-la para morar conosco.

��� Oh, mam��e, ser�� infernal, maravilhosamente in-

fernal. A�� criei coragem e continuei, pensando j�� na vin-

da de Ivete.

��� Bem, mam��e, a m��e de Ivete bebia e jogava mui-

to, deixando-a sempre com o pai, que come��ou a lhe en-

sinar coisas sobre o sexo. Ela, nas noites em que a m��e

��� 174 ���

jogava, ia para a cama dos pais, pois tinha medo de dor-

mir sozinha. Foi a�� que ele come��ou a fazer-lhe ver que

j�� estava ficando mocinha. E lhe dizia:

��� Olhe, minha filhinha, esses carocinhos a�� v��o

crescer e formar dois grandes seios. Voc�� quer os seios

bem grandes, como a Gina Lolobrigida, n��o quer?

��� Quero.

��� Ent��o para isso �� preciso que o papai os chupe

muito.

A boca de seu pai, sugando os carocinhos duros,

traziam lagrimas doloridas mas o pai n��o se importa-

va e tentava ainda for��ar o p��nis em seu sexo.

Uma noite quando o pai a chamou, ela j�� apren-

dera coisas do sexo com as amiguinhas de col��gio, cho-

rando gritou:

��� Papai eu quero ficar virgem at�� casar.

Meu pai olhou-a, admirado:

��� Quem est�� lhe ensinando coisas depravadas? J��

sei, �� nesse maldito col��gio, juro que voc�� n��o ir�� mais

frequent��-lo. Agora, venha c��!

��� N��o vou!

Ele a encarou com a boca meio aberta e com os

olhos desmesuradamente abertos, desprovidos de emo����o

veio em sua dire����o.

Recuou morrendo de medo. O pai confiava todo o

seu corpo, encolhida em seus bra��os, quando trovoava,

ou quando sentia medo do escuro. Sentia na parede ��s

suas costas. Ele agarrou-a jogou-a de bru��os no sof��.

Sentiu suas m��os, as m��os que ela beijava dizendo sor-

rindo. ��� A ben����o, papai. Agora, elas lhe arrancavam

a calcinha e sentia todo peso de seus corpo e alguma

coisa dura sendo enfiada em meu ��nus. At�� hoje n��o

esque��o, como tudo era dolorido estranho e forte, aque-

le pesado corpo sobre meu pr��prio corpo a domina-lo.

Senti o p��nis do papai amolecer e sair de dentro de mim.

Quando ele se levantou, rapidamente ficou de p�� no sof��

e suas m��os voaram para a garganta do pai e algo mui-

��� 175 ���

to profundo gritou dentro de si, que ela devia destrui-lo.

Papai se afastou, mas eu continuei pendurada, e

n��o largava a sua garganta. Mordia-o e o arranhava,

at�� que despenquei e cai no ch��o chorando gritei: ���

��� Eu queria ser virgem!

Ele cinicamente respondeu: ��� Eu te deixei virgem

me abandonou e foi e m b o r a . . .

O pai viajou por dois anos. Ivete come��ou a odia-lo

e como a m��e bebia muito, n��o teve a quem se queixar.

Aquilo queimava como brasa dentro dela e ent��o resol-

veu contar a algu��m.

Mam��e mudou de posi����o na poltrona e disse sem

grande emo����o:

��� Bem, o pai de Ivete ergueu um muro ao redor

dela, mas voc�� n��o tem nada com isso. ��� Ivete n��o ��

problema seu.

��� Mas, mam��e, ela precisa de algu��m, voc�� n��o

pode ficar indiferente, Ivete est�� profundamente abala-

da. Devemos traz��-la de volta.

��� N��o, Regina. Gra��as a Deus, ela se foram. Sua

vida agora, ser�� infinitamente mais f��cil. Vamos, Re-

gina, de-me o seu copo para eu encher. Vamos brindar

o emprego de Ivete e nossa independ��ncia dom��stica.

Eu estou determinada a lhe dar uma nova vida.

Olhei para mam��e com o cora����o cheio de espe-

ran��a .

Voltar�� para papai?

Mam��e voltou-se r��pida.

��� N��o tenho a menor vontade de voltar para seu

pai. Nossa uni��o n��o leva a coisa alguma. Nossa vi-

da ser�� sempre uma eterna discuss��o. A nova vida

de que lhe falo �� sobre um contrato que terei com uma

TV. Isto n��o �� ilus��o, ou sonho apenas, como aquelas

est��rias inventadas por produtores sem escr��pulos.

Com esse diretor j�� trabalhei. Ele sabe do que sou

capaz, profissionalmente. Juro que chegou a oportuni-

��� 176 ���

dade que estava esperando. Irei ganhar muito dinheiro.

Voc�� ir�� estudar. Eu trabalharei para voc�� n��o preci-

sar lutar a murros para abrir um caminho neste mundo

cheio de obst��culos.

��� Oh, mam��e, �� tudo maravilhoso! Mas n��o sei

por que, sinto que existe na minha frente um imenso

muro cinzento. Parece-me o fim de tudo o que eu so-

nhava. Parece o fim de meus dezessete anos.

��� Ora, querida, isso �� depress��o pelas f��teis ten-

tativas de voc��s quererem transformar-se em adultos.

As menininhas de hoje s��o umas bobinhas em que-

rer governar suas vidas sem o aux��lio dos p a i s . . .

��� Pais???

��� J�� sei, Regina. Vamos, vamos, telefone para um

de seus amiguinhos e v�� se distvair um pouco.

��� N��o, mam��e, n��o tenho a m��nima vontade.

��� N��o vai continuar nesse confinamento de quar-

to, vai?

��� N��o sei. Por favor, deixe-me s��.

��� 177 ���



XIII

D�� uma chupadinha!

O tempo mudou muito nos dias que se seguiram.

Chovia ��� e fazia muito frio. A praia estava sempre

encoberta por uma n��voa branca e infernal. Eu ficava

bebendo e fumando, trancada em meu quarto. S�� saia

para as refei����es. N��o sei quantos dias se passaram at��

ouvir a voz da empregada.

��� Dona Regina, uma encomenda de S��o Paulo.

Pulei da cama e corri para a porta, abrindo-a de

sopet��o. Junto da empregada estava um homem. 0lhei-o,

interrogativamente.

��� Sou da pol��cia. Gostaria de falar com sua m��e.

Senti meus olhos alargarem-se e perguntei com voz

tr��mula:

��� A c o n t e c e u . . . aconteceu alguma coisa a Ivete?

Meus olhos arregalados devem t��-lo assustado.

��� N��o, menina. Por favor, onde posso encontrar

seu pai ou sua m��e?

��� 179 ���



��� Mam��e est�� na TV.

A��, dei-lhe o endere��o.

O homem entregou-me um pacote e a carta que es-

tava enfiada no barbante, ele a guardou no bolso, di-

zendo :

��� A carta �� para sua m��e.

N��o quis nem saber, corri para o quarto e arran-

quei o barbante. Era uma fita T.D.K. ��� Cassete C-60,

que Ivete prometera mandar-me.

Corri, abri o guarda-roupa e peguei o meu gravador.

A fita adaptava-se perfeitamente.

Avisei a empregada que em hip��tese nenhuma me

perturbasse.

��� Mas, se sua m��e chegar?

��� J�� disse que ningu��m deve incomodar-me. Nin-

gu��m, ouviu? Bati a porta e dei duas voltas na fecha-

dura, deitei-me, acionei o bot��o do gravador e a voz de

Ivete encheu o quarto:

��� Oi, Regina. Como lhe prometi, aqui estou. Vou

contar pra voc��, tim-tim-por-tim-tim, como ser�� o meu

dia de hoje. Espere, deixe ver na folhinha que dia ��. Dia

vinte e quatro de fevereiro, quinta-feira, meu primeiro

dia de trabalho. Bem, eu estou sentada na cama metida

em um roup��o vermelho. J�� tomei o meu caf�� e agora

acendo um cigarro e vou at�� a janela e abro a cortina

para ver como est�� o dia que ser�� o meu primeiro dia

de trabalho.

O c��u azul e um c��lido sol, cobrindo todo esse monte

de cimento e pedras que odeio. Sei que voc�� conhece

tudo isso e me parece que gosta desse tremendo S��o

Paulo que, com seus afiados dentes de pr��dios desiguais,

vai triturando a gente. Hoje estou mais enojada de to-

da essa esfuma��ante cidade e dos homens que ela abriga

nos seus bra��os horrorosos, de elevados enervantes.

Sabe porque digo isso? L�� vai! Todos os homens

que conheci, intimamente, querem ser chupados. Logo

que voc�� aceita uma carona, o filho da puta tira o "ne-

g��cio" para fora e quando chega num lugar mais ou

menos deserto, puxa a cabe��a da gente para baixo e im-

plora .

Quem est�� com essa mania �� o homem que paga o

aluguel desta espelunca onde moro. Essa noite foi hor-

r��vel. Ele me obrigou a ficar com o seu p��nis, horas, na

boca. Voc�� sabe que eu n��o sou do tipo dom��stico mas

tamb��m n��o topo certas coisas. O que se passou essa

noite me deixou super deprimida. Juro que farei qual-

quer coisa para n��o voltar mais para este apartamento.

Ainda n��o sei o que ser��, mas algo ter�� que acontecer.

Ainda estou confusa e um solu��o aperta a minha gar-

ganta. H�� ru��dos que um gravador n��o grava, sen��o ou-

viria quantos gemidos tristes saem de meu cora����o.

S��o sete horas, tenho que entrar no servi��o ��s oito, por

isso, visto o meu micho vestido vermelho, cal��o sapatos

bem altos, tipo Carmem Miranda, tamb��m vermelhos,

apanho minha bolsa tiracolo e saio para o meu primeiro

trabalho.

J�� estou na rua. Homens mal vestidos, p��lidos e

desnutridos, cruzam a todo instante, o meu caminho.

S��o os oper��rios paulistas. Quase todos levam na m��o

um embrulhinho, que se percebe logo que �� a marmita,

onde est�� o magro almo��o.

Voc�� est�� vendo como j�� entendo de pobreza. Bem,

na Av. S��o Jo��o, avisto o grande bloco de cimento ar-

mado: �� o Edif��cio Andraus, mas que vou chamar de

pr��dio da Pirani como todo mundo, pois nos seus tr��s

primeiros andares, est��o as lojas Pirani. Entro no pr��-

dio pela Av. S��o Jo��o e me encontro no meio de mil e

um objetos que, logicamente, s��o da Pirani.

��� 181 ���

Os rapazes e as mo��as, alegres e risonhos, conversam

animados, pois ainda n��o �� hora de pegar no "batente".

Entro no elevador e digo:

��� Petrobr��s.

Entro nos grandes escrit��rios, vejo um monte de

gente jovem, alegre e os olhos dos jovens homens se vol-

tam para minhas pernas e um assovio coletivo corta os

ares, trazendo um sorriso espont��neo nos l��bios bem

pintados da jovem que me dirige a palavra.

��� As suas ordens.

��� Por favor, gostaria de falar com o Sr. Gedeon

Coutinho.

A mo��a olhou para o gravador.

��� Voc�� �� rep��rter?

��� N��o.

��� Ent��o, para que est�� gravando?

��� Por ser o meu primeiro dia de trabalho.

��� Mas isso n��o �� novidade para ningu��m. Todo

mundo trabalha.

��� N��o, os milion��rios.

Ela sorriu e me olhou com ar divertido.

��� Ah! Ent��o voc�� �� milion��ria?

��� Est�� vendo. At�� voc�� est�� admirada.

Tamb��m para mim �� um dia todo especial. Tra-

balho!

��� Voc�� acha que haver�� algum inconveniente em

eu estar gravando?

��� Bem, aqui nunca aconteceu. Mas acho que nin-

gu��m vai bronquear. A Petrobr��s entende a juventude!

Um momentinho vou ligar para o Sr. Coutinho.

��� 1 8 2 ���

O Sr. Gedeon �� muito legal. Jovem, bonito e sim-

p��tico .

Sua voz �� suave, voc�� n��o acha, hem Regina?

��� Quantos anos voc�� tem?

��� Dezessete.

��� �� datilografa?

��� N��o.

��� Fala ingl��s?

��� N��o.

��� Franc��s?

��� N��o.

��� Arquivista?

��� N��o.

Ele co��a o queixo.

��� O que voc�� sabe fazer. E o que pode mostrar ao

seu favor.

��� Estudei no melhor, no mais caro col��gio daqui.

��� Isso n��o diz nada, Ivete.

��� Sou milion��ria.

��� Milion��ria???

��� Meus pais.

��� Porque n��o volta para eles?

��� Odeio-os.

��� Jogatina, ��lcool, viagens e . . . bem.

��� 183 ���



��� Bem?

��� Havia muita falta de carinho e compreens��o.

��� Mas voc�� �� rica. Trabalhando aqui tira o em-

prego de outra que tenha maior necessidade.

��� Por favor, d��-me o emprego. N��o quero mais

ficar nesta sociedade onde corre o dinheiro. Dentro dela

a gente �� um cat��logo para festas e reuni��es. Eu quero

trabalhar. Por favor Sr. Coutinho.

��� Est�� bem. Voc�� ser�� minha secret��ria. Pegue

aquela m��quina e fique treinando. Olhe ��� disse sorrin-

do de dedo em riste ��� mas para trabalhar �� preciso des-

ligar o gravador.

Bem, Regina, mais tarde conversaremos. S��o exa-

tamente nove horas, vou come��ar a "catar milho".

Al��, Regina. Pratiquei, �� m��quina, a manh�� inteiri-

nha e j�� estou escrevendo muito bem. Mas sinceramen-

te, ficar trancada o dia todo no d��cimo segundo andar

de um edif��cio, n��o est�� pr�� mim. �� muito mon��tono,

ou melhor, �� horr��vel, sabendo-se que existe uma Copa-

cabana. J�� s��o tr��s e meia e s�� ou��o o barulho do tic-

tac da m��quina. N��o sei o que est�� se passando comigo:

olho. olho o rel��gio como se algo muito grave possa

acontecer. Ora, devem ser os nervos, eles devem estar

agitados, porque est�� chegando a hora de sair e eu n��o

sei para onde ir. Jurei de p��s juntos que para o apar-

tamento n��o voltarei mais. Agora est��o faltando cinco

minutos para as quatro.

��� Fogo, pessoal. Corram! O edif��cio est�� pegando

fogo!

Voc�� ouviu Regina, um jovem pois a cabe��a na

porta e disse que esse bloco de cimento armado com

��� 184 ���

vinte e oito andares, que fica no cora����o de S��o Paulo

est�� pegando fogo. N��o �� para rir. Se f o s s e . . .

Mas, minha Nossa Senhora da Aparecida, �� fogo

mesmo. Ou��o medonhos gritos de angustia. Seguro o

gravador, penduro a minha bolsa no pesco��o e estou cor-

rendo para algum lugar. Chego no corredor e estou en-

volta numa imensa fuma��a negra que me tapa a vis��o.

O calor est�� horr��vel. Sinto o vestido pregar no corpo,

pois todo ele �� um rio de suor. Estou sendo empurrada

de um lado para o outro. Desculpa e a tosse. Regina.

Regina, �� medonho! De todos os lados v��m gritos de so-

corro e de medo. Agora posso ver um homem com o pa-

vor estampado no rosto, onde sobressaem olhos esbuga-

lhados, com as roupas encarcadas, segurando uma man-

gueira contra inc��ndio e faz com que jatos de ��gua nos

alcancem para nos refrescar e aliviar a fuma��a que est��

nos sufocando. Algu��m est�� gritando para ele:

��� N��o adianta essa mangueira contra o inferno

Sr. Gilberto Epting, o pr��dio todo est�� em chamas. J��

morreu muita gente, vamos subir, corra! Venha tamb��m

mocinha.

��� Meu nome �� Ivete.

��� Ent��o corra Ivete!

��� Correr como? Essa gente em desespero �� capaz

de nos esmagar.

��� Esmagada, queimada ou sufocada, vamos subir

para a ��rea, l�� no ��ltimo andar.

Estou subindo as escadas sem mesmo pisar no ch��o,

arrastada por um monte de gente que grita chamando

os nomes dos mais variados Santos. Piso em coisas

moles que sei que �� gente que desmaiou e ficou massa-

crada no caminho. Estamos diante de uma porta preta

fechada.

Centenas de olhos esbugalhados olham para tr��s,

o fogo. Estamos encurralados pelas terr��veis chamas.

��� 185 ���



De repente, um mundo de m��os aparecem e num es-

for��o tremendo conseguem arrombar a porta. Como um

estouro de gado, a ��rea que �� um heliporto, �� invadida

por umas quinhentas pessoas. O heliporto �� todo cer-

cado por um murinho baixo da altura de meus joelhos.

Olho para baixo a Av. S��o Jo��o, milhares de pessoas,

homens, mulheres e crian��as, ajoelhadas em redor do

grande edif��cio, est��o rezando e pedindo a Deus a nos-

sa salva����o, pois todo o pr��dio, olhando aqui de cima,

desgra��adamente, se transformou numa verdadeira e

medonha tocha de cimento armado.

Um homem que est�� junto de mim, que vim a sa-

ber e engenheiro da Siemens do Brasil, est�� dizendo

que estamos sem sorte. O vento est�� soprando em di-

re����o sul-norte, �� o grande e impiedoso propulsio-

nador do fogo que teve in��cio (soubemos por um dos

jovens que �� funcion��rio da "Pirani"), na sec����o de apa-

relhos eletr��nicos. Disse ele, que, em pouco menos de

dez minutos, o fogo tomou os cinco primeiros andares

e, dali para cima, tudo ardeu em fra����es de segundos.

Olho l�� para baixo e vejo enormes labaredas que o

vento faz sair pelas janelas, como horrendas serpentes

amarelas que penetram nos andares de cima devoran-

do tudo. Se enroscando no pr��dio, a serpente est�� su-

bindo. Mais alguns andares e ela estar�� dando voltas

no heliporto onde estamos encurralados. A porta onde

entramos na ��rea est�� trancada e ouvimos batidas de

dezenas de m��os e gritos de vozes sufocadas pedindo

socorro. Mas a porta n��o pode ser aberta, pois dois sar-

gentos da Pol��cia Militar n��o permitem, pois o acu-

mulo de pessoas poder�� impedir a descida dos helic��p-

teros. Esses militares acabam de se atirar de uns tr��s

metros de altura, de um dos muitos helic��pteros que

sobrevoam o heliporto. Vieram ajudar, porque tal �� o

p��nico dos que est��o aqui, que, se o aparelho pousar, cor-

re o risco de ser invadido, virado e at�� pode explodir.

N��s estamos rodeando o sargento que diz chamar-se

Serafim, e pertencer �� Companhia de Opera����es Espe-

ciais. Mesmo preparado para qualquer surpresa, trei-

nado em contraguerrilhas, sobreviv��ncia na selva, pi-

loto e paraquedista, o sargento Serafim parece trau-

matizado com este ch��o escaldante que torra homens,

mulheres e crian��as que se rasgam e ficam n��s para

amenizar um pouco o calor que �� infernal. Todos, como

animais ferozes, pedem ao sargento para salv��-los. Da-

qui a pouco essas pessoas apavoradas s��o capazes de

enlouquecer. Agora mesmo, um homem sobe na amu-

rada, pega um fio e, apesar do esfor��o de todos n��s, ele

largou o corpo e est�� dependurado uns quatro metros

abaixo da ��rea. Oh! Deus! ��� grita. O fio �� curto. Ele ago-

ra, com os olhos esbugalhados, tenta subir pelo fio. ��� Me

ajude pessoal, puxem o fio! Dezenas de m��os est��o

tentando al����-lo, mas suas m��os est��o se desprenden-

do e o corpo se faz no espa��o. Todos, tanto aqui do

heliporto como l�� em baixo, soltam horr��veis gritos de

desespero. Eu senti o seu corpo que se esborrachou no

terra��o do pr��dio vizinho que �� bem mais baixo do que

o que est�� em chamas. Agora as labaredas est��o apa-

recendo, est��o no andar de baixo da ��rea e saem t��o

altas que cobrem quase todo o lado direito do heli-

porto. N��s corremos todos para o lado esquerdo. De

repente o vento joga-as para onde estamos e, em p��-

nico e aos gritos, corremos para o outro lado. Um ra-

paz grita: ��� "N��o aguento mais!" Sobe na amurada e

m��os se erguem para segur��-lo, mas ele se perde no

espa��o, caindo no mesmo lugar que o seu companhei-

ro de infort��nio. N��s tamb��m estamos tr��mulas e de-

sesperadas, pois n��o sabemos se vamos sair daqui com

vida. Nuvens de fuma��a negra cobrem, sufocando-nos.

Gritos dos que est��o fechados l�� dentro, o calor do fogo

ferindo e fazendo desmaiar muitos dos que me ro-

deiam . Mais um jovem salta para a morte e vai reunir-

se aos dois primeiros, no edif��cio da Rua Pedro Am��-

rico. Perto de mim est�� uma jovem gritando de dor,

pois uma gigantesca labareda que acaba de passar le-

��� 1 8 7 ���

vada pelo vento, deixou um bafo t��o quente que arran-

cou toda a pele da perna e do bra��o dela, que est��o em

carne viva, ficando logo assustadoramente inchados.

J�� s��o dezoito horas e os helic��pteros continuam

tentando descer, mas parece que eles est��o temendo o

desabamento do pr��dio. Se o pr��dio desabar morrer��o

mais de mil pessoas, pois entre n��s que estamos aqui

no heliporto e os que est��o l�� dentro, calcula-se esse

n��mero. Estamos ouvindo pelo r��dio que o Governa-

dor de S��o Paulo, Sr. Laudo Natel, est�� autorizando a

mobiliza����o de todas as ambul��ncias estaduais, para

que possam socorrer as v��timas do inc��ndio. Tam-

b��m ouvimos o diretor do Pronto-Socorro do Hospital

das Cl��nicas, Sr. Valdomiro de Paula, que mais de trin-

ta m��dicos, anestesistas e enfermeiros est��o de pronti-

d��o para atender os atingidos pelas chamas. Est��o pre-

paradas camas, macas, nos p��tios do hospital e filas

de doadores de sangue se fazem presentes. Agora, Regina

um helic��ptero tenta pousar no meio da mais negra

fuma��a, mas uma dezena de pessoas corre pisando nos

que est��o desmaiados para serem as primeiras a salvar-

se. Mas o helic��ptero sobe novamente. O sargento Se-

rafim, pede calma dizendo que o salvamento s�� ser��

poss��vel se todos tiverem calma e sangue-frio. O sar-

gento quer dominar o p��nico e grita:

��� Pessoal! Senta! Senta! Senta!

Todos, como d��ceis crian��as, sentam no ch��o, que

est�� em brasa.

��� Levanta! Levanta! Levanta!

Todos se levantam.

Assim o sargento Serafim prepara a sinaliza����o

para o primeiro pouso.

Sinto-me como num manic��mio.

O sargento gritando:

��� 188 ���

��� Senta! Levanta!:

Estouros de vidros quebrados, pessoas esmurran-

do a porta para entrar, os helic��pteros sobrevoan-

do sem poder pousar, pessoas rasgando as roupas,

outras queimadas soltando urros de dor, outras des-

maiadas e outras se atirando no espa��o. Agora o sar-

gento Cassariga pede a alguns rapazes para colabo-

rarem.

��� Voc��s que est��o bonzinhos, ajudem aqui, a gente!

Fazem um cord��o de isolamento, para a descida

do primeiro helic��ptero que surge, envolto em uma nu-

vem de fuma��a, e tenta o pouso. Mas o povo invade a

pista e ele al��a v��o, novamente. Apesar disso, quatro

pessoas conseguem pular a bordo, tendo uma se agar-

rado no esqui no aparelho e com grande esfor��o �� pu-

xada para seu interior.

��� O resgate come��a muito mal, grita o Capit��o

Caldas, (outro militar que pulou de um helic��ptero

para manter a ordem). ��� Tudo fracassar�� se houver

novas invas��es. Vou pedir refor��os, outro tumulto e

estaremos perdidos.

��� Perdidos porque, Capit��o? ��� falou uma jovem,

chorando:

��� Ent��o o pr��dio pode desabar?

��� Vai desabar! Vai desabar! gritava a multid��o

hist��rica.

��� Calma! calma! ��� O pr��dio n��o desabar��. Eu e

os dois sargentos estamos aqui, n��o �� verdade?

E n t �� o . . . ��� Olhe, vamos mantendo a ordem, est�� che-

gando outro helic��ptero.

O aparelho pousou e as pessoas invadiram-no em

grande tumulto, mas tiveram que descer �� for��a, pois

a ordem era de que, em primeiro lugar, fossem embar-

cadas as pessoas desmaiadas.

��� 189 ���

Foi, requisitado socorro m��dico urgente, pois o n��-

mero de queimados pelo morma��o era cada vez maior.

Agora est�� chegando um outro helic��ptero, de onde

descem oito m��dicos, trazendo apenas o equipamento es-

sencial e muito leite, que me obrigam a tomar dizen-

do que �� bom para combater a intoxica����o da fuma��a.

Mas o engra��ado �� que ningu��m quer beber o leite.

Apanham o saquinho e despejam no rosto, bra��o, per-

nas, enfim, banham-se com ele.

O salvamento est�� sendo feito normalmente. J�� s��o

poucas as pessoas para serem levadas, por isso o sar-

gento Serafim manda que se abra a porta do terra��o.

Estou bem em frente a porta aberta. O espet��culo ��

horr��vel. H�� gente caida por toda a escadaria. Muitos

gemidos e pedidos de ��gua.

Agora, Regina, ou��a a voz desse bravo sargento Cas-

sariga.

��� Gente, voc��s est��o salvos, mas precisam colabo-

rar. Vamos subir devagar, com muito cuidado. N��o

podemos carregar todos de uma vez. �� preciso or-

dem. Calma.

Os sargentos descem a escada devagarinho para n��o

pisar nas pessoas amontoadas e desmaiadas. Algumas

pessoas, horrivelmente queimadas, rastejam escada aci-

ma. Uma mo��a, trazida nos bra��os pelo sargento Cassa-

riga, o agarra e, beijando-o, grita:

��� Voc�� me salvou! Voc�� me salvou!

O sargento chora.

Por toda a escadaria dos ��ltimos andares, as cenas

s��o as mesmas.

Agora, o sargento Serafim faz a respira����o boca-a-

boca, num homem desmaiado, enquanto o sargento

Cassariga massageia-lhe o peito.

��� 190 ���

O homem volta a s�� e �� levado para cima. A essa al-

tura j�� �� noite fechada. O sargento escreve um D (des-

cida) no ch��o, para orientar o pouso. Pede lanterna e

o pr��ximo helic��ptero traz umas quarenta.

Muitas pessoas simulam ferimentos para serem co-

locados na turma de prioridade. O maior medo de todos

�� que o pr��dio desabe.

O horrendo crepitar do fogo continua, agora subin-

do e entrando pela porta aberta do terra��o.

Uma chama enorme passa por perto queimando-me

as pernas que est��o em carne-viva, ardendo infernal-

mente. Levanto o bra��o, para me defender de outra la-

bareda e a mesma fica sem pele. Olhe, Regina, n��o sei

se esse gravador chegar�� at�� voc��. Escute, estou dando

o seu endere��o. Se algu��m achar esse gravador, pe��o en-

tregar a Regina de Albuquerque, A v . . . n . �� . . . arjt.��...

Guanabara.

Por um momento pensei que ia desmaiar, a fuma-

��a e o calor est��o aumentando. Penso estar com qua-

renta graus de febre. H�� muitos feridos na minha fren-

te para entrar no helic��ptero.

Uma menina, perto de mim, grita, chamando o pai.

Come��o a ter uma sensa����o de frio e forte sonol��n-

cia. A menina continua gritando pelo pai. Quero me

afastar dela e ando para a porta do terra��o que pare-

ce uma enorme boca escancarada, vomitando fogo. Olho

para tr��s e a menina chora, a menina est�� num imenso

espa��o vazio. A menina est�� falando e dela sai a mi-

nha voz gritando:

��� N��o papai! N��o papai!

Estou ca��da e sinto o peso de meu pai, o p��nis de

meu pai entrando em mim. Meu corpo treme. Aperto a

cabe��a.

A porta est�� a um passo envolta em fogo.

��� 1 9 1 ���

Ou��o, ainda, a menina chamar pelo pai, os feridos

gemendo, o povo gritando, os helic��pteros sumindo a fu-

ma��a me sufocando e o fogo cresce na minha frente, me

mostrando essa enorme cidade feita s�� de ferro, cimen-

to e pedras. O f o g o . . .

Onde estou? Meu corpo, �� uma chaga. Como doi!

Dou mais um passo em dire����o ao fogo.

Eu n��o quero voltar para o apartamento. O ho-

mem fez com que eu chupasse a noite toda. Minha boca

doi. O fogo est�� a um passo. Minha fam��lia, onde est��?

Meu pai em cima de mim!

Mais um passo.

O fogo. O fogo. O f o g o . . .

��� 192 ���





Fiquei olhando para o gravador, estupificada, n��o

sei quanto tempo. Subitamente, sa�� correndo, batendo

todas as portas e me vi frente a mam��e que saia do ele-

vador e, me vendo transfigurada, abra��a-me.

A��, chorei, histericamente gritando:

��� Mam��e, quero ir para S��o Paulo, Ivete deve estar

ferida, queimada.

��� Ivete, morreu, Regina!

Olhei para mam��e, com os olhos esbugalhados, e

balbuciei.

��� Mor-re-e-e-e-u?

��� Queimada. No grande inc��ndio do pr��dio da Pi-

rani. Na televis��o, um policial me procurou e me en-

tregou uma carta revelando o encontro do cad��ver de

Ivete, totalmente carbonizado.

Ivete se suicidou.



XIV

Juventude... P a r e . . .

As ondas n��o cessam de ir e vir, ainda sujas pela tor-

rencial chuva que caira durante a noite. O c��u parece

lavado do grande calor que abrasou a Guanabara. Estou

deitada na praia sentindo a umidade penetrar no meu

corpo. A praia est�� deserta. Contemplando-a, vejo que

ela me faz lembrar muito de Ivete e consegue, realmen-

te, me fazer acreditar que aquele belo e jovem corpo ��

um peda��o de qualquer coisa calcinada. A��, debru��o-me

na areia e choro hist��ricamente. Ivete. Ivete agora �� um

peda��o de carv��o, jogada n��o sei onde. Tudo estava em

peda��os. Mam��e passa as noites com homens da novela

e pouco aparece em casa. Papai iniciou uma viagem

pelo mundo onde participar�� de v��rias confer��ncias so-

bre o transplante de cora����o.

R a u l . . . Raul. Onde est�� Raul? N��o consigo v��-lo.

Levantei-me sacudi a areia dos cabelos e enchuguei os

olhos com as costas da m��o. Olhei para o mar. O mar

que tanto Ivete e eu adorava-mos estava melanc��lico e

parecia-me cada minuto mais l��gubre e as ondes que

tantas vezes pulava-mos as gargalhadas formavam fi-

guras fant��sticas ornadas de sinistras aur��olas que me

chamavam para seus bra��os deformados. Comecei a an-

dar para elas cambaleante como se estivesse b��bada.

��� 195 ���

De repente flutuando em cima de uma grande onda

Ivete com os bra��os estendidos sorrindo para mim.

Chamei-a aos gritos, mas e la virou-se e subindo e

descendo conforme o movimento das ondas fugiu de

mim se perdendo na bruma, seca que come��ava a cobrir

o mar. Pensei que estivesse ficando louca, sentia mes-

mo que tinha avan��ado um pouco al��m do limite que

separa a raz��o da dem��ncia.

J��. me via num hosp��cio naquela vida de pavorosa

monotonia. Comecei a tremer e sentir a garganta quei-

mar como fogo. A ��gua chegava aos meus joelhos. Mi-

nhas pernas estavam bambas e era com enorme sacri-

f��cio que conseguia empurrar a ��gua para mais um

passo.

Aonde estava indo?

A h ! J�� me lembrava. Procurava chegar at�� onde

Ivete estava. Ela tinha desaparecido ali, ali adiante.

Agora a ��gua se enroscava a minha cintura como

uma serpente que se retorcia e estendia a l��ngua ver-

melha, mostrando os dentes num macabro sorriso. Sen-

ti que meu cora����o acelerava e eu tremia de medo. Ive-

te, gritei chorando. Ivete:

A ��gua j�� alcan��ava os meus ombros. Minha cabe-

��a doia horrivelmente.

Eu sabia que a morte tinha o comprimento de um

palmo, e poderia cobrir num segundo a minha cabe��a.

Mas n��o retrocedi um passo. Meus olhos vagaram por

todos os lados. Estava s��, castigada pelo vento que co-

me��ara furioso levantando meus cabelos pelo ar e sen-

tia que as minhas palavras eram som, palavras que s��

Ivete podia ouvir.

��� Porque corremos tanto? Porque n��o aceitamos

a juventude nos dar, o que oferece a todos os jovens de

mente sadia? E. Corremos. Corremos muito. E o fim do

��� 196 ���



caminho �� um imenso espa��o angustiante e negro onde

estou entrando.

Acabou de ler?

Que far�� agora?

Est�� deprimido?

Eu s a b i a . . .

Fa��a como eu.

Diga para a juventude:

Jovem, n��o corra tanto. N��o entre no mundo do

adulto sem chegar a sua vez. Pise nos seus anos, pas-

so a passo, sem sair um pouquinho do caminho limpo

da lei. Juro, que, assim, voc�� n��o encontrar�� aquele bu-

raco negro, fundo e vazio que nos mostra ADELAIDE

CARRARO.

��� 197 ���

tos criticar��o esse livro.

Mas, intimamente, acei-

tar��o, gostar��o e ir��o de-

vorar at�� a ��ltima pala-

vra com sofreguid��o; por

tratar-se de verdades, que

desejamos, e necessita-





mos conhecer.


Era preciso que surgis-


se ADELAIDE CARRA-

RO, esta mulher extraor-

din��ria, que profunda-

mente sens��vel aos pro-

blemas alheios, atira-se

contra tudo, e contra

todos na defesa dos me-

nos protegidos da sorte,

com a ��nica arma que se

faz mister, e sabe usar:

"A Pena" a arranc��ndo-

nos dos olhos, a venda,





que nos impossibilita de


ver nos bastidores da so-


ciedade toda sua imund��-

cie!

Mas, n��o" se escandali-





zem.


�� o s��culo XX, em toda

plenitude. �� a b��blia, com

suas predi����es c r i s t �� s ,

desfolhando-se em sua

��poca exata.







---------- Forwarded message ---------
De: Bons Amigos lançamentos 



O Grupo Bons Amigos  tem a satisfação de lançar hoje mais um livro digital para atender aos deficientes visuais 

Escuridão - Adelaide Carraro

 Livro doado por Leandro e digitalizado por Fernando Santos

Sinopse:
Conta a história de três meninas  que percorrem o caminho da.....
Sobre a autora:  
BIOGRAFIA: 
 Adelaide Carraro (30 de julho de 1936 - São Paulo, 8 de janeiro de 1992) foi uma escritora  brasileira de sucesso no século passado.

Ficou órfã aos quatro anos e foi viver em um orfanato na cidade

de Vinhedo em São Paulo.

Seu primeiro texto que chegou ao conhecimento público foi a crônica Mãe, que lhe rendeu um prêmio aos treze anos de idade.Nunca se casou, mas adotou 2 crianças.


Sua obra:

Adelaide Carraro deixou uma obra bastante extensa, com mais de quarenta edições, tendo mais de dois milhões de exemplares vendidos, entre eles O estudanteO estudante IIO Estudante IIIMeu professor, meu herói e Eu e o governador. Este último é o seu texto mais polêmico, referente à descrição de um suposto romance com Jânio Quadros em seu período como governador de São Paulo. Outro livro polêmico da autora é "O Passado Ainda Dói", cujo tema é sua breve passagem como repórter da TV S, de São Paulo, emissora do SBT. Adelaide Carraro faleceu aos 55 anos de idade, vítima de câncer, e deixou como legado, 46 livros publicados.

Seus livros foram lançados pelas editoras Livraria Exposição do Livro, L'Oren, Global, Gama e Farma Livros. Sua grande rival, no mundo literário, era a escritora Cassandra Rios, cujos livros eram publicados pela Editora Record.

Fonte

https://pt.wikipedia.org/wiki/Adelaide_Carraro


Lançamento  :

a)https://groups.google.com/forum/?hl=pt-BR#!forum/solivroscomsinopses

b)http://groups.google.com.br/group/bons_amigos?hl=pt-br

Este e-book representa uma contribuição do grupo Bons Amigos  para aqueles que necessitam de obras digitais como é o caso dos deficientes visuais e como forma de acesso e divulgação para todos. 

É vedado o uso deste arquivo para auferir direta ou indiretamente benefícios financeiros. 
 Lembre-se de valorizar e reconhecer o trabalho do autor adquirindo suas obras







 

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Livros:

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Áudios diversos:

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