domingo, 31 de julho de 2011 0 comentários By: Fred

<> livros-loureiro <> link palestra espirita Sr. Moraes 29.07.11



----
From: Pedro-UOL
Segue link palestra Sr. Moraes 29.07.11
 



--







mmarceli2010@gmail.com
http://renovandoatitudes-marceli.blogspot.com/
http://cantinhodamarceli.blogspot.com
Skype: crmarini2333


livros - loureiro <http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro>

http://www.livros-loureiro.blogspot.com/
 

http://www.romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
 
 
http://www.romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
 








Animais, ame-os, respeite-os, proteja-os!


--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

<> livros-loureiro <> [Renovando Atitudes] Palestra Sr. Moraes - 29.07.11



--
Postado por Marceli Marini no Renovando Atitudes em 8/01/2011 03:05:00 AM

--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

[Revista XXX] Playboy's Hot Housewives (2011-10)

<> livros-loureiro <> [Livros] de Edgard Armond no 4shared


Repassando de

--



--
M. Loureiro
livros - loureiro
http://www.manuloureiro.blogspot.com/
http://www.livros-loureiro.blogspot.com/
http://www.romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/ 
http://www.romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
Mania de Livros

Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos. 

(Antoine de Saint-Exupéry)


--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

<> livros-loureiro <> 100.Revistas.de.guitarra

100.Revistas.de.guitarra.

         



--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

<> livros-loureiro <> [livro] Sab.Esp.Natal 01.1 - Aconteceu No Natal (PR)














Repassando, em anexo


Descrição: Sab.Esp.Natal 01.1 - Janet Dailey - Aconteceu No Natal (The Healing Touch)(PR)


M. Loureiro
 
livros-loureiro

http://www.manuloureiro.blogspot.com/  
http://www.livros-loureiro.blogspot.com/ 
http://www.romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/ 
http://www.romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos.

Antoine de Saint-Exupéry



--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

<> livros-loureiro <> [livro] Julia Hist.1262 - Pedido De Natal




Em anexo:

Descrição: Julia Hist.1262 - Anne Gracie - Pedido De Natal (The Virtuous Widow)






 
M. Loureiro
 
livros-loureiro

http://www.manuloureiro.blogspot.com/  
http://www.livros-loureiro.blogspot.com/ 
http://www.romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/ 
http://www.romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

Só se vê bem com o coração, o essencial é invisível aos olhos.

Antoine de Saint-Exupéry


--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

{clube-do-e-livro} AUDIOLIVRO DOS ESPÍRITOS DE ALLAN KARDEC EM VOZ HUMANA NO HD 4SHARED

 

Olá, bons amigos:

                         Mais um audiolivro espírita para todos. Desta vez é o audiolivro dos Espíritos de Allan Kardec em voz humana.

 

AUDIOLIVRO DOS ESPÍRITOS:

 

CD 1:

 

PARTE 1:

 

http://www.4shared.com/file/zeGjnC54/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart1.html

 

 

PARTE 2:

 

http://www.4shared.com/file/ClFVV4sb/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart2.html

 

 

 

PARTE 3

 

http://www.4shared.com/file/L6DrG8Q9/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart3.html

 

 

PARTE 4:

 

http://www.4shared.com/file/maaWjMYx/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart4.html

 

 

PARTE 5:

 

http://www.4shared.com/file/csXlp_yP/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart5.html

 

 

PARTE 6:

 

http://www.4shared.com/file/hQEXpqs5/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart6.html

 

CD 2

 

 

 

PARTE 1

 

 

http://www.4shared.com/file/Gs-1IxbU/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart1.html

 

 

 

 

PARTE 2

 

http://www.4shared.com/file/KFzik6fy/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart2.html

 

PARTE 3

 

http://www.4shared.com/file/9DuNyQTB/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart3.html

 

PARTE 4:

http://www.4shared.com/file/tsvBoKk5/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart4.html

 

 

Muita paz!

 

Bezerra

Livros:

http://bezerralivroseoutros.blogspot.com/

 Áudios diversos:

http://bezerravideoseaudios.blogspot.com/

https://groups.google.com/group/bons_amigos?hl=pt-br

 

 

 

--
Seja bem vindo ao Clube do e-livro
 
Não esqueça de mandar seus links para lista .
Boas Leituras e obrigado por participar do nosso grupo.
==========================================================
Conheça nosso grupo Cotidiano:
http://groups.google.com.br/group/cotidiano
 
Muitos arquivos e filmes.
==========================================================
 
 
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no Grupo "clube do e-livro" em Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para clube-do-e-livro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para clube-do-e-livro-unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em http://groups.google.com.br/group/clube-do-e-

<> livros-loureiro <> AUDIOLIVRO DOS ESPÍRITOS DE ALLAN KARDEC EM VOZ HUMANA NO HD 4SHARED

 

Olá, bons amigos:

                         Mais um audiolivro espírita para todos. Desta vez é o audiolivro dos Espíritos de Allan Kardec em voz humana.

 

AUDIOLIVRO DOS ESPÍRITOS:

 

CD 1:

 

PARTE 1:

 

http://www.4shared.com/file/zeGjnC54/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart1.html

 

 

PARTE 2:

 

http://www.4shared.com/file/ClFVV4sb/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart2.html

 

 

 

PARTE 3

 

http://www.4shared.com/file/L6DrG8Q9/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart3.html

 

 

PARTE 4:

 

http://www.4shared.com/file/maaWjMYx/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart4.html

 

 

PARTE 5:

 

http://www.4shared.com/file/csXlp_yP/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart5.html

 

 

PARTE 6:

 

http://www.4shared.com/file/hQEXpqs5/CD_1_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart6.html

 

CD 2

 

 

 

PARTE 1

 

 

http://www.4shared.com/file/Gs-1IxbU/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart1.html

 

 

 

 

PARTE 2

 

http://www.4shared.com/file/KFzik6fy/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart2.html

 

PARTE 3

 

http://www.4shared.com/file/9DuNyQTB/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart3.html

 

PARTE 4:

http://www.4shared.com/file/tsvBoKk5/CD_2_LIVRO_DOS_ESPRITOSpart4.html

 

 

Muita paz!

 

Bezerra

Livros:

http://bezerralivroseoutros.blogspot.com/

 Áudios diversos:

http://bezerravideoseaudios.blogspot.com/

https://groups.google.com/group/bons_amigos?hl=pt-br

 

 

 

--
Você recebeu esta mensagem porque está inscrito no
Grupo "livros-loureiro" nos Grupos do Google.
Para postar neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro@googlegroups.com
Para cancelar a sua inscrição neste grupo, envie um e-mail para
livros-loureiro+unsubscribe@googlegroups.com
Para ver mais opções, visite este grupo em
http://groups.google.com.br/group/livros-loureiro?hl=pt-BR
 
Os nossos blogs:
http://manuloureiro.blogspot.com/
http://livros-loureiro.blogspot.com/
http://romancesdeepoca-loureiro.blogspot.com/
http://romancessobrenaturais-loureiro.blogspot.com/
http://www.loureiromania.blogspot.com/

<> livros-loureiro <> [Festival Audio Livros e Livros Historias Infantis] - Parte 01 - 5 Livros (São 72 histórias)

Amigos, inicio com este post o envio de áudio livros e livros de histórias infantis, as mais variadas. São 72 histórias para vosso entretenimento.

 

Cada Post terá 5 historias numeradas para que voces não se percam.

 

 

 

01 - Malandragens de um Urubu

 

Link Para Download:

 

http://www.fileserve.com/file/S82gW2v/urubu.rar

 

 

 

02 - Menino Triste

 

Link Para Download:

 

http://www.fileserve.com/file/zYhM6da/triste.rar

 

 

 

03 - Severino faz Chover

 

Link Para Download:

 

http://www.fileserve.com/file/CKGQKPf/severino.rar

 

 

 

 

04 - A salamanca do Jarau

 

Link Para Download:

 

http://www.fileserve.com/file/E36PdFe/salamanca.rar

 

 

 

05 - Saci Pererê

 

Link Para Download:

 

http://www.fileserve.com/file/Pa2p9k6/saci.rar

 

 

 

Quer Parar de Fumar e Não consegue?

 

Visite: http://rfragoso2.blog.uol.com.br/

 

E VIVA MELHOR...

 

Visite: http://rfragoso2.blogspot.com

 

CD & Multimidia Blog

Repleto de Excelente material para download

Confira, divirta-se e aproveite para assinar as atualizações.

 

 

Quer acessar uma planilha  com todos os links do  CD´s & Multimidia Blog?  Lá existem centenas de CD´s Completos para você baixar Clique no Link Abaixo:

 

http://spreadsheets0.google.com/ccc?hl=pt_BR&key=tEKyYmU1-dmBeWw8n_m_uMA&hl=pt_BR

 

 

Conheça o mais novo Grupo Google para downloads, o CD´s & Multimidia Grupo e se gostar inscreva-se:

 

http://groups.google.com/group/cds-e-multimidia/

 

Fraternais Abraços

Ricardo Fragoso

 

Descrição: Descrição: Descrição: Descrição: cid:image009.png@01CC0487.C2563F30

Brasil/São Paulo/Capital

DNA by RFragoso

[Revista XXX] Playboy - Argentina (2009-01)

[Revista] Four Four Two - UK (2011-09)

<> livros-loureiro <> [Revista] Four Four Two - UK (2011-09)

<> livros-loureiro <> Lançamento Arcanjo Micael - Diários da Descoberta da América - Cristóvão Colombo


CRISTÓVÃO COLOMBO

DIÁRIOS DA
DESCOBERTA
DA AMÉRICA
AS QUATRO VIAGENS E O
TESTAMENTO

Tradução de Milton Persson
Introdução de Marcos Faerman
Notas de Eduardo Bueno

www.lpm.com.br

Para numerosos viajantes, o cenário americano estava
repleto de misteriosas e inegáveis possibilidades. Ali, o
milagre parecia novamente incorporado à natureza: uma
natureza ainda cheia de graça matinal, em perfeita harmonia
e correspondência com o Criador. O próprio Colombo, sem
dissuadir-se de que atingira pelo Ocidente as partes do
Oriente, julgou-se em otro mundo ao avistar as costas
verdejantes da América, onde tudo lhe dizia estar a caminho
do verdadeiro Paraíso Terreal.
As mesmas imagens bíblicas, reafirmadas pelos cosmógrafos
mais acreditados da época, acharia Colombo em seu
desembarque nas Antilhas: terras de fertilidade inaudita,
árvores de copas altíssimas, fragrantes e carregadas de frutas,
a eterna primavera musicada pela alegria dos cantares de
pássaros de mil cores...
SÉRGIO BUARQUE DE HOLANDA em
A Visão do Paraíso

Sumário

INTRODUÇÃO
APRESENTAÇÃO
A PRIMEIRA VIAGEM
A SEGUNDA VIAGEM
A TERCEIRA VIAGEM
A QUARTA VIAGEM
O TESTAMENTO
CRONOLOGIA DA VIDA E DA ÉPOCA DE CRISTÓVÃO COLOMBO

INTRODUÇÃO
Aventuras e Visões de um Velho Marinheiro

"Fundarei um novo céu e uma nova terra, e não mais se
pensará no que era antes."
ISAÍAS

Os marinheiros estavam inquietos com este almirante que os
levava para terras desconhecidas. A certa altura da viagem,
ensaiariam a revolta. Seria este senhor, Cristóvão Colombo,
homem de confiança? Não ouviram dizer que tantos
sacerdotes e homens da corte o tinham como louco? O
almirante era silencioso. Parecia mais interessado em sonhar
com as terras descritas por outro aventureiro, um tal Marco
Pólo. Que promessas de riquezas poderiam confortar os
marujos espanhóis, em tal aventura?
O almirante não apreciava muito a sua embarcação, a Santa
Maria. Ele a tinha por navio pesado; como escaparia num
baixio? Navegador desde criança, Cristóvão Colombo andara
até por mares gelados, acima da Inglaterra, e pelas costas
opostas, na Africa. Preferia estar nas outras caravelas da
expedição, a Niña ou a Pinta. Mas se devia conformar com o
seu próprio barco, de propriedade de Juan de La Cosa,
morador das vizinhanças de Paios, de onde partiam. Os
proprietários de navios de Paios ficaram aborrecidos com as
ordens reais de fornecer embarcações para a estranha
viagem deste almirante ali desconhecido. Era negócio sem
garantias. Temia-se a perda de dinheiro e de vidas. Os ventos
só mudariam quando a família Pinzón aprovou a estranha
expedição. O próprio e honrado Martin Pinzón iria no
comando da Pinta. Ah, se o senhor Pinzón aceitava tal
viagem, era bom sinal - pensavam os moradores de Paios. Os
espertos Pinzón, por sua vez, pensavam em todos os
prêmios mirabolantes propostos por suas altezas católicas.
Dinheiro e glória: por que não apostar?
Os pilotos das três caravelas tinham opiniões diferentes
sobre o lugar em que se achavam, já no quinto dia de viagem
- 8 de agosto de 1492. Mas o almirante era de palavras
fortes. Queria ganhar as ilhas Canárias, para aí deixar a
caravela Pinta, que fazia água. Além do mais, desde o
começo da viagem, percebia que as coisas não iriam bem
com Martin Pinzón. Ele, Cristóvão Colombo, sonhara toda a
vida com a descoberta de um novo mundo em nosso mun-
do. Desenhou mapas para viver, nos seus tempos em
Portugal; leu muitas narrativas de viagens, nas bibliotecas
dos conventos; ouvia nas tavernas os marujos falando dos
mais remotos pontos do mundo - e chegara a ver o mar dos
gelos; e um dia lhe caiu nos olhos, em uma leitura do Livro
Sagrado, uma palavra que mais ouvia do que lia - e era como
se o profeta Isaías com ele estivesse falando: "Eu fundarei
um novo céu e uma nova terra e não mais se pensará no que
era antes". Era o sonho de sua vida esta nova terra, e aquele
Pinzón queria roubar o seu sonho.
Os homens tinham medo. Estes ventos não os estariam
levando aos monstros das lendas do mar? Nem 20 dias de
viagem e uma coisa tão estranha aconteceu. Das montanhas
da ilha de Tenerife, muito elevadas, eles viram surgir o
grande fogo. Isto escreveria depois o almirante em seu
Diário de Bordo. Os homens ficaram espantados. O
almirante falou com calma. Não sabiam que semelhante fogo
existia no monte Etna, na Sicília, e em outras montanhas? Os
marujos silenciaram. Mas viam no vulcão sinais de muito
azar.
Mas, para o almirante, seus planos se cumpriam. Seguindo os
ensinamentos do mapa do célebre Toscanelli, seus navios
desceram pela costa africana, até as ilhas Canárias,
conquistadas a ferro e fogo pela Coroa espanhola, e de lá
saltariam para a ilha de Cipango. Era a viagem pelo
desconhecido, mas - pensava o almirante — o piloto não
devia mais do que conduzir a nave pela mesma latitude,
sempre no rumo Oeste. E se os navios atingissem Cipango,
não mais de que um salto - e era a terra firme do Cathay,
como queriam os relatos de Marco Polo, o viajante. Mais do
que o vulcão de Tenerife o preocupou não encontrar nas
ilhas um bom navio para comprar. Pinta reparada, últimas
provisões a bordo, e depois de alguns dias de tantas
ansiedades e rumores — uma esquadra portuguesa, se dizia,
poderia bloquear a expedição - e o vento Nordeste bateu nas
velas; o pico do Tenerife desapareceu no Este, e só havia
água, agora; os navios e o mar; os homens e o mar.
Era um domingo aquele 7 de setembro e o almirante devia
advertir seus marujos que conduziam mal a embarcação.
Silencioso, apanhou a pena e se pôs diante do Diário de
Bordo. "Neste dia, eles perderam completamente de vista a
terra. Acreditando não revê-la por muito tempo, muitos
choravam e suspiravam. O almirante os reconfortou com
promessas de muitas terras e riquezas, a fim de que
conservassem a esperança e perdessem o medo que eles
tinham de tão longo caminho." A viagem se faz longa; o
almirante decidiu dela falar com brandura aos seus marujos.
Sabia o que o desânimo podia fazer em homens no alto-mar.
A 11 de setembro, avistam o mastro de um grande navio
naufragado. Maus presságios. Um cometa atravessa o céu, a
15 de setembro - e cai no mar. O que diziam os céus?
Chuvas e neblinas neste dia 16. Tudo era razão para dúvidas.
E o que significavam os pássaros vistos da Nina, aquelas
andorinhas do mar? Mas o domingo, 16, era repousante. O
almirante sentia um grande prazer. Sentia falta apenas do
canto de rouxinóis. Disse aos homens: "Parece que estamos
num abril da Andaluzia". E eram os tufos de ervas muito
verdes que davam mais esperança aos marinheiros. Pareciam
destacados há pouco da terra. Estariam perto de uma ilha?
"Porque, para mim, a terra firme é mais adiante", foi o que o
almirante anotou no Diário.
Navegavam para o Oeste, e entre dia e noite faziam 50
léguas e mais. A corrente os ajudava. E era cada vez mais
erva. E ela vinha do poente. Pensavam estar próximos de
terra. Os pilotos tomaram o Norte. Mas achavam que as
agulhas declinavam. "Os marinheiros estão inquietos e
tristes", constatou o almirante. Não diziam por quê. Desde
aquela aurora — era o 17 de setembro -, o almirante
recomeçava a tomar o Norte. Ora, as agulhas estavam certas.
"Por que, então, a estrela Polar parecia mover-se, mas não as
agulhas?", indagava-se o comandante. (O meridiano
magnético não correspondia ao meridiano astronômico:
problema científico impossível de resolver àquela altura
desta história e da História. Mas era a bússola ou os astros
que mentiam? O que fazer nesta extensão de água?)
Era uma segunda-feira esquisita, de emoções conflitantes. Os
marinheiros ficavam atemorizados com os desvãos dos
movimentos da bússola e alegres pelas ervas, que pareciam
fluviais, e pelas águas, cada vez mais quentes.
Os marinheiros estavam alegres, e os navios eram levados
pelo vento célere, e pareciam disputar a glória e o ouro
reservado ao primeiro homem que gritasse: "terra". Os
homens do Niña até caçaram um atum. Cristóvão Colombo
viu um pássaro que jamais dormia no mar e esperava que "o
Muito Alto, aquele que tem nas mãos todas as vitórias, lhes
desse a terra".
Por alguns dias, eram bandos de pássaros, multidões de
pássaros passando sobre as caravelas. Os marinheiros
sonhavam com a terra; o almirante sonhava com algo além.
O tempo era bom; se Deus quisesse, na volta, olhariam estas
ilhas. Cristóvão Colombo há tanto tempo pensava em outra
coisa, se desentendia de todos. Era um homem estranho de
quem mal se sabia onde nascera. Parecia conhecer muitos
pensamentos célebres, livros náuticos e de viagens; mas não
seria de breves passagens por bibliotecas, ou do tempo em
que vendera livros - nascente comércio - para viver? Tudo
era obscuro, e nenhum doutor destes da Universidade de
Salamanca, a mais célebre, apostaria em sua cultura. Mas
tinha nos olhos azuis, sinceridade e a voz podia ter a força
mística que impressionava a rainha Isabel, a quem procurou
na Corte, e para quem falou com paixão de caminhos
marítimos novos e de glórias e riquezas possíveis para a
Espanha que derrotava os mouros, vivia, com os reis
Ferdinando e Isabel, neste delírio, a Inquisição, na qual
todos os considerados ímpios podiam ter a tortura ou a
fogueira como penas. Os homens viviam entre todas as
superstições e terrores e alguns conhecimentos náuticos,
científicos; sempre, aqueles albatrozes que vinham pousar, a
20 de setembro, na caravela do almirante podiam dizer,
apenas, terra próxima, ou alguma outra espécie de notícia,
mística, sinal dos deuses; sorte ou azar.
O almirante ficou feliz quando a Santa Maria vagou pelo
oeste norte-oeste; ventos que sopravam para cá, para lá. Em
seu Diário, anotaria: "Este vento contrário me foi muito
necessário, porque meus homens estavam em grande
fermentação, pensando que nestes mares não sopravam
ventos para voltar à Espanha".

Navegar na direção do poente.
Sempre a oeste.

Os marinheiros entraram em pânico, no dia 24 de setembro,
quando viram muitas procelarias. Os homens do mar sabem
que estas aves prenunciam tempestades e a morte. Quanto
mais os indícios de terra se mostravam vãos, mais os
marinheiros murmuravam. Eles se retiraram para o interior
dos navios. Eles disseram que o almirante, por seus loucos
disparates, Se tinha proposto a se tornar grande senhor, à
custa de riscos e perigos, e de condená-los a uma morte
abandonada. "Porque - e nós estamos lendo, agora, a direta
narrativa do almirante - eles já tinham cumprido sua
obrigação, tentando a fortuna, e se afastando da terra de
todos os socorros mais do que ninguém, nunca; e eles não
deviam mais se fazer autores de sua própria ruína, nem
seguir este caminho até que o arrependimento se tornasse
vão." E a narrativa está cheia de ameaças, vejam, pois os ho-
mens começavam a dizer que ninguém poderia condená-los
por qualquer coisa que fizessem. "O almirante era um
estrangeiro, não gozando de favor algum, tendo sido sempre
desaprovado e sua opinião contradita por tantos homens
doutos e sábios, e ninguém agora o apoiaria ou defenderia."
"E não faltou quem falasse que toda a discussão devia cessar -
isto era o melhor - e que se o almirante não quisesse
renunciar ao seu projeto eles podiam jogá-lo ao mar, e
proclamar em seguida que ele tinha caído por descuido,
querendo olhar as estrelas e seus indícios; que ninguém
poderia verificar a verdade do acontecimento e que este era
o meio mais seguro para seu retorno e sua salvação."
Cristóvão Colombo escreveu estas linhas com a amarga
tranqüilidade de quem conseguira convencer mais uma vez
os seus adversários. Há muito tempo sua vida era marcada
por estes conflitos. Não era fácil para um homem carregar a
sua obstinação. Nos tempos de Portugal, tentou - e não teve
sucesso - convencer a Coroa de seus planos. Mas foi nos
desvãos da corte portuguesa que soube da existência do
mapa de Toscanelli - que parecia dar força à sua idéia do
mundo, e à possibilidade de chegar às índias cruzando os
mares, por onde o homem jamais passara. Cristóvão
Colombo mandou uma carta sugestiva a Toscanelli, que vivia
em Florença. Algumas semanas mais tarde, recebia a
resposta do sábio, que lhe dizia, brevemente, que
considerava "teu nobre e grande desejo de seguir para a terra
das especiarias"... Colombo tinha o mapa de Toscanelli - e
por uma nova carta o sábio reafirmava que a viagem não
seria só possível, mas lhe traria honra, lucros e o
reconhecimento da cristandade. Ao mesmo tempo que
tinha estas alegrias, decidia ir viver na Espanha. Podiam
chamá-lo de louco; o que importava os insultos, se no fim
do ano de 1485 sua fé o levava à própria e magnífica rainha
Isabel, a maior figura da realeza da época? A rainha ele não
falou como aos portugueses, em todos os lucros que
ofereciam as relações diretas com o Oriente. Lembrou-se do
que lhe dissera Toscanelli: os do Oriente esperavam a
unidade com o Ocidente; e o mundo se uniria pela Cruz. A
rainha via neste homem alguma coisa que evocava os
profetas do Antigo Testamento. Eram os olhos ou as
palavras? No Diário, que dirigia principalmente à rainha,
lembraria que "estava à seu serviço há sete anos". Mas, quan-
do caminhava sozinho, evitava as ruas movimentadas. As
ruas solitárias evitavam, para ele, o ar de zombaria dos
cortesões que recriminavam nos cochichos o gosto real por
um aventureiro que só falava sandices.
Havia uma corrida secreta na expedição pelo oceano entre
Cristóvão Colombo e Martin Pinzón - e dos três navios, o
mais rápido era o Pinta. Uma animação nervosa fazia aquela
caravela cada vez mais veloz; desde o dia 18 de setembro,
Martin Pinzón insistia nos sinais de terra, que dariam, pela
vida, 300 francos-ouro, ao descobridor. Os últimos dias de
setembro avançavam, entre a observação minuciosa dos
pássaros, dos tipos de peixes, das ervas no mar e de
anotações em torno das estrelas e seus movimentos.
E veio outubro, enquanto as caravelas avançavam para oeste,
sempre. O mar era bom e nas rezas se agradecia a Deus; no
Diário, só se registravam banalidades. Era um pássaro branco
perto do mastro. Era um rapaz que jogava uma pedra em um
albatroz. Eram peixes voadores que tombavam no convés.
As caravelas corriam: quem teria primeiro os prêmios reais?
Era um domingo, 7 de outubro, e se viu ao poente uma
aparência de terra. Ninguém gritava "terra!, terra!",
lembrando outros equívocos, que haviam irritado de tal
forma ao almirante que ele prescrevera pena de privação da
dádiva real a quem desse o alarme falso e a "alegria falsa".
Seguiram bandos de pássaros, mudando o rumo da viagem.
Estavam ansiosos e céticos. Ouviam o almirante agradecer a
Deus "pelo ar doce como o abril de Sevilha e pelo prazer de
estar ali, enquanto ele está perfumado". O 10 de outubro
tinha os homens confortados pelo almirante, lhes dando a
esperança do lucro, diante da viagem enorme. Mas a 11 de
outubro "os da caravela Niña viram tantos sinais de terra e
um ramo de espinheiro carregado de frutos. Eles respiraram
e todos se rejubilaram". O sol se pôs e o almirante retomou o
caminho para oeste; as caravelas faziam 12 milhas a hora. "E
como a caravela Pinta era o melhor veleiro, foi ela que des-
cobriu a terra e fez os sinais que o almirante havia
ordenado." Quem primeiro viu a terra foi um marinheiro
chamado Rodrigo de Triana. No meio da noite, podiam ver
uma luzinha que aparecia e desaparecia. Na caravela Pinta,
havia um baile de loucos. Soava um tambor basco, os
marinheiros dançavam em torno do grande mastro e
Rodrigo de Triana passava de braço em braço, como uma
donzela. O capitão Martin Pinzón olhava com orgulho e
desprezo para a Santa Maria. Estava certo de ter vencido a
corrida pelo ouro da Coroa. Só mais tarde ficaria aborrecido,
ao saber que da Santa Maria as luzes haviam sido avistadas
horas antes. Na aurora de 12 de outubro, os barcos desciam
ao mar e os marinheiros chegavam a uma areia amarela,
onde os aguardavam pássaros e homens nus. Alguns marujos
estavam vestidos como soldados, com o colete de couro,
mosquetões e arcabuzes. Cristóvão Colombo levava a espada
e o estandarte real; vestia-se como grande senhor da corte
de Espanha. Enfim, todos desceram, beijaram a terra e
oraram. Os índios tinham fugido para uma floresta próxima.
Que surpresa não teriam diante de tais sucessos os inimigos
do almirante? Em novembro de 1486, ele foi submetido a
um verdadeiro suplício pelos sábios religiosos de Salamanca.
Os dominicanos eram o poço do saber da Inquisição e nas
cinco horas em que tiveram pela frente Cristóvão Colombo
o trataram como se trata o grotesco. Mal reconheceram seus
méritos de desenhista de mapas. Quanto ao resto, tinham
este senhor Colombo como um falso Messias da geografia,
negador de milenar verdade teológica, defensor da idéia de
uma terra redonda, à qual a milenar reflexão da Igreja já
tinha reduzido ao mais vil dos absurdos. Ou ele entendia que
podíamos nós, os homens, ter antípodas, que viveriam do
outro lado de uma circunferência, de pernas para o alto e
cabeça para baixo? Que o senhor Colombo poupasse a Coroa
e a Humanidade de tais bobagens; que abandonasse a idéia
de tal viagem - foi isto o que ele ouviu. Mas, para ele, Deus -
dizia - reservava um particular papel; não falava o profeta
Isaías em novos mundos? E o que tinha diante de si, depois
desta viagem pelo mar infinito, não era a terra nova das
profecias? Não era o próprio paraíso em terra - este, com
estes homens nus, mas puros; estas plantas desconhecidas e
estes pássaros desconhecidos? E o seu próprio Diário de
Bordo - documento raro, preservado em parte nos relatos de
seu filho Ferdinando, em parte no relato do padre
Bartolomeu de las Casas - não se tornaria um livro de
encantamentos, acompanhando a primeira de suas quatro
expedições pelo que seria chamado mais tarde América?

Buscava ouro, mas escrevia como poeta.

Os homens da terra lhes traziam água e manjares e lhes
perguntavam se não tinham vindo do céu. "Venham ver os
homens que vieram do céu comer e beber", era o que uns
diziam aos outros. Os índios chamavam esta terra de
Guanahani; o descobridor a chamou de São Salvador; e
Colombo se esmerava nos detalhes na narração a suas
altezas, e dizia das cores com que eles pintavam seus corpos,
de suas alturas e da forma de seus cabelos, e do que comiam
ou bebiam. A viagem se fazia em calma, num mar que os
marinheiros adoram, e eles passavam a outras ilhas próximas.
Descobria que os índios circulavam por elas em suas canoas,
e que não eram agressivos. E os aventureiros não viam
cavalos, bois, só papagaios, mas o mar tinha baleias e os
"peixes são diferentes dos nossos, e maravilhosos". Aos reis,
descrevia peixes coloridos como pássaros: "azuis, amarelos,
vermelhos; de todas as cores do mundo". Colombo circulava
pelas ilhas e em cada uma via a mais bela do mundo. Partia
da ilha Fernandina e entrava no Cabo Belo. "E quando aqui
cheguei, veio da terra um perfume tão bom e tão suave das
flores ou das árvores que era a coisa mais doce do mundo."
Em sua embarcação, levava alguns índios, porque havia um
nome bem certo para que o seu sonho fosse o sonho dos
reis: ouro. A viagem pelas ilhas passa a ser a caça ao tesouro.
Mas sempre tem uma palavra delicada para os cenários que
vai percorrendo. E outubro nas ilhas que descobriu; mas
sente tudo como se estivesse no abril da Andaluzia. "O canto
dos pequenos pássaros é tal que pareceria que jamais passou
um homem aqui."
Colombo busca o ouro, mas escreve como um poeta.
"Bandos de papagaios escondem o sol. Pássaros e pequenos
pássaros de tantas espécies e tão diferentes dos nossos que é
maravilha. Arvores de mil tipos, com frutos diversos, e tal
perfume, que é maravilha. Fico triste de não conhecê-los:
certamente são tão bons." "E ali está uma lagoa, majestade. E
ali matam uma serpente enorme; a pele levarão para a
Espanha, como tantas coisas destas terras. Passou o outubro
e veio o novembro; algum ouro foi achado, muitas cruzes
plantadas."
Deslumbramentos. E ele escreverá:
"Bandos de pássaros escondem o sol." O Colombo desta
viagem é um poeta e uma criança. Tudo o interroga: que
plantas são estas? Que frutos são estes? Numa lagoa, seus
homens matam uma enorme serpente. Colombo sorri. Pensa
no que dirá a rainha Isabel quando olhar sua pele.
Viagem sem rumo pelas ilhas, atrás das mágicas terras
descritas pelo aventureiro Marco Pólo. Está convencido de
que aqui é a Ásia. Pisa em Cuba. Pensa no Japão. Onde está a
índia, dos elefantes suntuosos, dos marajás vestidos em
veludos? Os olhos universais do navegador olham as
montanhas de Cuba; ele evoca a Sicília. Cuba o confunde:
não seria, na verdade, o continente que buscava - a terra do
Grande Cã?
Ele olha tudo com os olhos de Marco Polo e com o mapa de
Toscanelli: como colar a realidade ao sonho ou aquilo que
entendia como Ciência? O outro conflito é que Colombo
também sonha com o ouro e com a cristianização das almas
dos habitantes destes lugares. Pode ser o Paraíso. Mas é um
Paraíso que ele quer tocar e transformar.
Em fins de novembro, Colombo e Martin Pinzón estão cada
vez mais distantes. Pinzón não o obedece como chefe da
expedição. Pinzón ouviu as conversas de índios: desespera-
se pelo ouro que há - certamente há - oculto naquelas
florestas. Pinzón não tinha o sonho de Colombo. O
almirante jamais podia esquecer a busca do Grande Cã, a sua
utopia. Por isso a Pinta desaparece no horizonte este. Os
sinais luminosos da Niña, que era capitaneada pelo irmão de
Martin, Vicente, são inúteis. Mas Colombo continuava
girando em torno da costa de Cuba, através do continente
asiático. Era 6 de dezembro de 1492, quando ele chegou à
ilha de Haiti, que ele chamaria Espanhola. Os índios que
estavam na Santa Maria diziam ser aquele um lugar de terror.
Colombo "conversa" agradavelmente com os índios do lugar
- e tem notícias de ouro, perto. Nesta ilha, ele ganhará um
amigo e viverá uma desgraça.
Este amigo, o cacique Guacanagari, lhe valerá, na desgraça
da noite de Natal. Colombo dormira às 11 da noite, acordou
com os gritos do grumete que, para infelicidade de todos,
tomara o leme e deixara, suavemente, a Santa Maria repousar
num banco de areia. "Todo mundo na ponte", era o grito de
alguns marujos, logo despertos. Os marujos fugiram em
chalupas para a Niña. Colombo, não: ele tentava salvar o na-
vio. Quem sabe, abater o mastro? Quem sabe, lançar
mantimentos ao mar? Mas a Santa Maria estava condenada.
Uma imponente flotilha de pirogas do cacique Guacanagari
flutuou no oceano e transportou tudo o que o almirante
branco quis para um ponto seguro.
O cacique gostou tanto - naquela hora - de Colombo, que o
cobriu de ouro e de esperanças de mais ouro. Ali, os
espanhóis instalariam um forte, com guarnição de 39
homens; partiriam no janeiro, e os homens ali ficariam,
confiados na força de suas armas, na idéia que os índios
deles faziam, como seres vindos dos céus, e na amizade do
cacique branco e do índio. Mas quando Colombo voltou à
Navidad, um ano depois - em outra viagem às terras que
supunha do Oriente -, encontrou estranhos cadáveres de
homens barbudos, que eram eles, os seus marujos. O forte
estava abandonado. O cacique já não era tão seu amigo e não
parecia de todo indiferente àquelas mortes. Uns pobres
marujos viviam no mato, como índios, com muitas índias ao
seu redor. Febres tropicais mataram os marujos; e mais as
lutas entre si, pelas índias ou pelo ouro; e mais as flechas dos
índios. Aquilo arrasou o almirante.
Mas nós estávamos ainda na primeira viagem. O ouro do
Haiti compensava a perda da Santa Maria. E a distância da
Pinta era um mal, mas não irreversível. E ainda janeiro
quando os dois navios se encontram casualmente, numa
quebrada do mar do Haiti. Martin Pinzón protesta
inocência. Fatalidades o afastaram de Colombo, não más
intenções. Colombo é duro. Em seu próprio Diário falará
com raiva e amargura deste Martin Pinzón, pouco a pouco
um derrotado. A Pinta faz água; as avarias do navio e do
comandante tiram o ímpeto de viajar sozinho, neste retorno
que se arrasta pelo janeiro. Sinais luminosos aproximam os
dois barcos no meio do oceano. Terrível tempestade assalta a
Niña, a mais frágil; Colombo fala de homem em homem,
como um místico - aquele que sonhava com guerras por
Jerusalém e que plantara tantas cruzes num mundo
desconhecido. Rezaria, como um alucinado, e atribuiria a
esta fé não ter sido sua embarcação tragada pelo mar. Martin
Pinzón morreria poucos dias depois do retorno à Espanha -
desconsiderado, enfraquecido pelas durezas da viagem. A
própria glória de Cristóvão Colombo era, para ele, um
sofrimento.
Paios recebeu com alegria a Niña, a 14 de março de 1493 -
naquela viagem que começara a 3 de agosto do ano anterior.
Um navio se perdera. Nenhum homem, porém, havia
morrido — só um dos sete índios morreu, nas vicissitudes
do mar. O corpo marrom do índio, o cabelo longo, o
ornamento das plumas dos pássaros, as cores violentas em
sua pele, ornamentos no nariz e nas orelhas; tudo isto não
era incrível, pelo inédito? E havia o ouro, as riquezas e os
relatos infatigáveis que Cristóvão Colombo fazia à rainha ou
ao rei, ao lado do qual cavalgava. A rainha se encantava com
as longas sessões de leituras do seu almirante - e com os
projetos de novas viagens.
Foi a hora mais feliz de Colombo. Pouco importa: eram as
terras de sua utopia, as descobertas? Era a nova rota das
índias? Tudo o que o almirante obstinado apresentava era
real demais para ser discutido ou negado. Pela primeira vez,
a Espanha parecia poder equilibrar a expansão marítima de
Portugal. Colombo ganhou tudo o que seu contrato - que
desesperara alguns padres — previa: era o vice-rei das terras
descobertas, tinha direito a enorme dízimo sobre as ri-
quezas; seus filhos Diego e Ferdinando se faziam herdeiros
de privilégios — e já eram figuras da Corte. Era como se o
gênio de uma lâmpada maravilhosa, das histórias de Marco
Pólo, tivesse eleito um marujo para o destino da maior glória
e fortuna. Era tudo mentira.
Colombo tinha ido longe demais. Os últimos dez anos de sua
vida parecem um destes destinos excessivos, em que os
acontecimentos são todos improváveis e radicais. Teria sido
tudo tão fácil se apenas tivesse cumprido aquele que parecia
ser o seu destino: achar uma nova rota para um mundo
estranho, mas conhecido, ao menos nas lendas. Mas ele
descobrira um mundo, parece, que lhe dava muito mais
poder do que qualquer rei sonhara delegar a qualquer súdito.
Mas quem era este Colombo, nem nobre, nem espanhol?
Era um sábio ou um místico? Era um filho da fortuna ou do
mais terrível fracasso?
Porque ele partiu para novas viagens, em busca do Grande
Cã, sempre na mesma rota. Mas em cada uma destas
jornadas, o mundo e o seu próprio mundo se modificavam
brutalmente. De que adiantava a imponência dos 1.500
homens com que deixa Cádiz, na segunda viagem, a 25 de
setembro de 1493, se deveria sonhar, mais tarde, com as
glórias dos três miseráveis barcos da primeira?
O próprio mistério do mar era menor. Já não era um
universo de fantasmas e abismos. Já era tão claro que a terra
era redonda. Nobres e malfeitores, toda a sorte de
aventureiros se lançava em direção às novas terras da
Espanha. Os primeiros viajantes sentiam na pele a condição
de condenados à morte. Partiram tristes — desesperados -
naquela viagem de 1492. Agora, era a loucura: atrás do
oceano estavam o ouro, as riquezas, as terras férteis.
Talvez o destino de Colombo tenha começado a mudar
quando, na rota pelas ilhas da segunda viagem, descobrem (é
novembro de 1493) atrás de umas moitas, junto a um rio,
dois cadáveres, um deles com espessa barba. O pior dos
pressentimentos se confirmou quando percorreram 12
milhas e descobriram o lugar em que naufragara a. Santa
Maria. Nada restava da aparentemente sólida Navidad. Esta
terra estaria destinada a devorar os aventureiros que a ela
chegavam?

Morreu desamparado.
A glória chegaria séculos mais tarde.

Colombo continuava buscando Cathay; onde estava a terra
de tetos dourados descrita por Marco Pólo? E a residência do
Grande Cã, que escrevia cartas aos reis da Europa? Navegou
pela Jamaica; passou pelo labirinto de rochedos de coral, de
ilhotas e bancos de areia das vastas extensões da costa
meridional de Cuba. E Cathay?
Ele não conseguia separar suas viagens das viagens reais ou
imaginárias de Marco Pólo. O volume real da terra lhe era
desconhecido; e os mapas podem significar pouca coisa. A
perigosa costa cubana lhe impedia a descoberta de que
aquela era uma ilha. As suas obsessões o maltratavam - e o
levavam cada vez mais adiante. Cada um dos seus 80
homens teve de assinar uma declaração, segundo a qual
estavam convencidos de que Cuba era parte do continente
asiático. Era a província de Magon ou Mangir? Só isto não
podiam saber.
Colombo, às vezes, imaginava que descobrira o paraíso em
terra de alguns textos teológicos. Mas já nesta viagem
começa a descobrir que os índios não foram feitos só para a
submissão. Os comandantes das pequenas instalações
espanholas buscam o ouro - e agem como brutos. Surgem
conflitos entre os próprios espanhóis sobre como tratar os
índios; e entre estes espanhóis estão dois irmãos de
Colombo, Bartolomeu e Diego. A hospitalidade generosa dos
índios os faz fornecer muito alimento aos viajantes; mas seus
víveres passam a não mais dar para a sobrevivência de uns
ou de outros. O cenário das fantasias da chegada às novas
terras ganha novos tons. Os filhos dos céus passam a ser
odiados, porque são insaciáveis; querem sempre mais ouro e
desejam a mais absoluta transformação dos nativos. Que
virem operários a seu serviço ou sofram castigos. Nos
primeiros anos da nova era, já se dão as batalhas entre
legiões de índios e espanhóis; a escravidão e a pilhagem
sistemática se repetem. O paraíso não existe mais.
Há uma frase terrível e verdadeira de um dos biógrafos do
descobridor: "Ele se tornou escravo de sua própria empresa".
Só muito ouro poderia compensar o caos que se instala nas
novas terras da Espanha. Os índios são dominados pelo fogo;
mas quem garante a subsistência dos dominadores? Só o
ouro pode subsidiar novas expedições do descobridor. Mas
onde ficava a utopia? Onde estava o paraíso? A Espanha
vivia num ciclo, em que a vida valia pouco (era a Inqui-
sição). De 1481 a 1498, o Grande Inquisidor Torquemada
faz queimar 8.800 pagãos e hereges; Colombo louva, em seu
Diário, a Inquisição. Mas esta era a sua época; e, pela sua
cabeça e pela de tantos espanhóis, é por estas vias que se dá
a evangelização. Não fora o próprio Colombo piloto de
navios negreiros portugueses? Habituado à escravidão dos
negros, como tantos europeus, não podia prever que os
índios sucumbissem e morressem, escravos. Os índios não
são mais recebidos em festas pela Corte. São inimigos,
pagãos, hereges, mão-de-obra. São uma imensa dúvida que
perturba a vida da Corte e da Igreja. Quem são eles, afinal?
Para impedir o tráfico de índios, a rainha Isabel termina, em
1503, permitindo a sua utilização no trabalho forçado das
colônias. Os índios que Colombo tanto admira, que o
fascinam nas narrativas do Diário da primeira viagem, agora
são muito pouco, nada; infelizes que se caçam pelos confins
das ilhas.
Não há entusiasmo no retorno da segunda viagem. Nem os
ornamentos nem o ouro animavam ninguém. Nem os índios
criavam admirações. Nem as narrativas de Colombo tinham
ouvintes. Ele não se veste como um vice-rei; mais parece
um franciscano. Os três navios da terceira viagem levam
uma tripulação de infelizes. São prisioneiros libertados, que
com ele seguem nesta tropa de 350 homens - e não mais
soldados ou artesãos. O seu próprio Diário da terceira
expedição tem um tom delirante. Ele fala como um profeta,
mas é um homem quase desfalecido. Pensa no paraíso, mas
encontra o inferno no estabelecimento de Espanhola, ferido
por um irmão. Nas confusões da colônia, terminará preso,
vivendo entre assassinos sobre um monte de feno, sempre a
escrever cartas à rainha, em que fala de uma voz que sempre
sussurra em seus ouvidos (a voz de Deus). Retornará, desta
vez, no porão de um navio, acorrentado, e era 25 de
novembro de 1500.
Um sentimento de culpa e vergonha pesa sobre a Espanha.
Na intimidade da Coroa, há recriminações. Por que deram
poder absoluto sobre as terras descobertas ao nobre
Bobadilha - através de texto tão obscuro que permitia todos
os desmandos? Era preciso liquidar o incidente que
envergonhava toda a Espanha diante da Europa. Um correio
real seguiu para Cádiz, onde Colombo estava preso nas
dependências do Tribunal. A rainha era piedosa. Manda
2.000 ducados para o seu navegador. E o convida para um
encontro em Sevilha. A 17 de dezembro, ele está
novamente diante dos seus protetores.
Mas não é o Colombo apaixonado pelas narrativas de
viagens. Não é o sonhador do Novo Mundo ou dos mundos
de Marco Pólo. Não é ninguém parecido do Colombo que
tinha 40 anos quando começara estas peripécias; aos 50,
parece tão mal - pensam todos os que o vêem. O rei e a
rainha correram, na hora em que Cristóvão Colombo caiu,
sangrando diante do trono, no ato sagrado da genuflexão - e
o levaram a uma cadeira. A rainha começou a chorar.
Colombo recuperou os sentidos. Contou dos desmandos do
enviado da Coroa, nas terras novas. Recebeu a promessa de
que o imbecil seria destituído de seus poderes. E se retirou
para uma residência de Sevilha. Lá vivia, segundo escreveu a
amigos, "sem dinheiro e sem crédito". E passou a esperar
(não era o que tinha feito a vida inteira). Um dia, ele foi
chamado novamente à presença dos seus senhores. Deveria
voltar às suas terras, além. Para a rainha, Colombo estava de
posse de todas as suas honras. Para o rei, Colombo era um
entrave. No fundo, por documentos intocáveis na teoria, ele
era quase o dono do monopólio das viagens para aquelas
regiões. Mas muitos já tinham para lá seguido. As terras
estavam liberadas. Para que valia, então, Cristóvão Colombo?
Além do mais, era preciso ter paciência para ouvir aquele
homem envelhecido precocemente falar sobre viagens e a
incrível expedição que faria sobre Jerusalém, com o ouro
arrancado das novas regiões. Ganhava-se tempo, então.
Adiava-se a sua nova viagem. Tolerava-se a sua tagarelice
sobre a sombra de Satã prejudicando os seus planos. E ele
estava tão convencido de que o mundo não duraria mais do
que 150 anos!
Começou a escrever um Livro das Profecias em que os
cantos mais sombrios das teologias e das Santas Escrituras
iluminavam a sua teoria do fim do mundo, comprovada
pelas experiências de suas jornadas marítimas. A única tarefa
urgente era unir todo o mundo sob a sombra da Cruz. E é
isto o que escreve em testamento precoce aos seus
herdeiros; cristianizem o mundo, por qualquer tipo de
esforço, ou o fogo os devorará. A Espanha de 1502 precisa
de todos os seus navegantes para manter o controle daquela
parte do mundo. Trinta caravelas são entregues a Ovando;
não restam a Colombo mais do que quatro, miseráveis, de 50
a 70 toneladas. Mas nelas parte com as garantias absolutas de
que segue como o vice-rei.
Não é pela humildade das caravelas que esta viagem deixa de
ser a mais fantástica - pelo que viu e pelo que se deduziu.
Atinge a costa da América Central, no cabo das Honduras,
margeia a Nicarágua e a Costa Rica, ultrapassa a região em
que se encontra hoje o Canal do Panamá, à procura de uma
passagem. Os índios lhe dão notícias de outro mar - e é a
primeira vez que fala do oceano Pacífico. Os índios lhe
falam de uma grande civilização próxima - e, para ele, o que
deve ser um dos impérios de astecas ou maias passa a ser a
comprovação de que iria, enfim, tocar o reinado do Grande
Cã.
Mas foi a mais terrível das viagens, também, as três caravelas
batidas por fortes chuvas, tempestades, "60 dias sem ver o
sol ou as estrelas", ocultos em portos inseguros - Colombo
sofrendo por estar, desta vez, com seu filho Diego, de 13
anos, sentindo-se quase à morte. O mar era mau e os índios
assaltavam a embarcação - e a odisséia passa por um
naufrágio, à espera de um socorro improvável — até que a 7
de novembro de 1504 ele retorna. Mas ninguém o espera. A
sua maior amiga é a rainha - e ela morre três semanas depois.
Era evidente que o grande mundo da Espanha detestava este
"vice-rei" por acaso. A custos, conseguiu autorização da
Igreja para tomar uma mula - privilégio dos sacerdotes - e se
arrastar de Sevilha a Segóvia, onde o rei o recebeu. A
angústia de Colombo era a gota que o imobilizava e o des-
prezo do mundo. Poucas pessoas repararam na sua morte, a
21 de maio de 1506. Tudo era absolutamente obscuro. Era
apenas um marinheiro que desaparecia em Valladolid —
assim como desapareceu quase tudo o que escreveu, menos
seu Diário de Bordo.
Ele morreu, mas continuou viajando: seu corpo passou de
um cemitério de Valladolid a uma igreja de Sevilha; depois
se foi para São Domingos — atravessando os mares, como
ele queria -, e de São Domingos seguiu para Havana, até o
retorno à Espanha, em 1795, onde o imobilizariam na
Catedral de Sevilha, para sempre.
MARCOS FAERMAN

APRESENTAÇÃO
Algo Mais que um Relato de Viagem...

"... descrever cada noite o que suceder durante o dia, e de
dia o que navegar durante a noite, tenho a intenção de traçar
nova carta de navegação...", insere o próprio Colombo no
início de seu Diário, anunciando assim que esse será mais
um dos vários relatos marítimos escritos em plena viagem,
dos quais, entretanto, se destaca pelas extraordinárias e
inesperadas conseqüências que dela se derivaram, lançando
o mundo na Idade Moderna.
Esta obra do almirante genial não esclarece as discussões
suscitadas sobre o local de seu nascimento; nem nos leva a
uma evidência palpável sobre quem estava com a razão nos
turbulentos pleitos levantados em torno de sua figura, de tão
funestos resultados para ele, pois acabaram por arrastá-lo à
humilhação e, finalmente, à morte na pobreza. A única coisa
que este Diário mostra é o talento e a personalidade de um
homem singular, apesar da objetividade premeditada com
que está composto, que induz o autor a anular-se como
participante da ação, aparecendo como mero observador
onipotente dos fatos e referindo-se a si mesmo como a um
personagem a mais.
Não se sabe com exatidão se Cristóvão Colombo foi genovês
nem se a sua imprudente administração nas colônias teria
sido a verdadeira causa daqueles pleitos... Mas que
importância têm esses detalhes tão banais? Por trás do
grande descobrimento do Novo Mundo estava um homem e
é esse homem que vamos encontrar aqui, apesar dos erros e
das maledicências.
As linhas deste Diário foram escritas pelo mesmo homem
que empunhou o leme da Santa Maria. Trata-se de um
documento valiosíssimo, com que gostariam de contar os
biógrafos de tão grandes personagens. Passemos, pois, a
conhecer o homem Cristóvão Colombo, nascido em 1451 e
falecido em 1506, tarimbadíssimo marujo e cartógrafo,
Almirante do Mar Oceano e Vice-Rei das Índias,
severamente julgado por seus contemporâneos e hoje
elevado à eminência dos descobrimentos geográficos; admi-
rado pela vontade férrea, pela coragem na luta contra a
incompreensão, pelo talento e nobre resignação na desgraça:
triste época em que só se preocupou em salvar a dignidade e
o próprio nome.
A Primeira Viagem
(1492-93)

IN NOMINE D. N. JESU CHRISTI

Porque, cristianíssimos e mui augustos, excelentes e
poderosos soberanos, Rei e Rainha das Espanhas e das ilhas
do mar, Nossos Monarcas, neste presente ano de 1492,
depois que Vossas Majestades deram fim à guerra contra os
mouros que dominavam a Europa e por terminados os
combates na mui grande cidade de Granada, onde neste
mesmo ano, aos dois dias do mês de janeiro, por força das
armas, assisti ao hasteamento das bandeiras reais de Vossas
Majestades na torre de Alfambra , fortaleza da referida
cidade, e vi o rei mouro sair pelas portas da cidade e beijar as
mãos reais de Vossas Majestades e do Príncipe, meu
Soberano, e logo naquele mês indicado, pela informação que
eu tinha dado a Vossas Majestades sobre as terras da Índia e
um príncipe, chamado "Grande Cã" , que em nosso idioma
significa Rei dos Reis, como muitas vezes ele e seus
antecessores mandaram pedir que Roma lhes enviasse
doutores versados em nossa santa fé para administrar-lhes os
seus ensinamentos e que nunca o Santo Padre os quis
atender e que se perdiam tantos povos em crenças idólatras
ou acolhendo seitas de perdição, Vossas Majestades, como
católicos cristãos e Soberanos devotos da santa fé cristã, seus
incrementadores e inimigos da seita de Maomé e de todas as
idolatrias e heresias, pensaram em enviar-me, a mim,
Cristóvão Colombo, às mencionadas regiões da Índia para ir
ver os ditos príncipes, os povos, as terras e a disposição delas
e de tudo e a maneira que se pudesse ater-se para a sua
conversão à nossa fé; e ordenaram que eu não fosse por terra
ao Oriente, por onde se costuma ir, mas pelo caminho do
Ocidente, por onde até hoje não sabemos com segurança se
alguém teria passado. Assim que, depois de terem expulso
todos os judeus de vossos reinos e domínios , no mesmo
mês de janeiro mandaram Vossas Majestades que eu me
dirigisse, com suficiente frota, às referidas regiões da Índia; e
para tanto me concederam grandes mercês e me
enobreceram para que daí por diante me intitulasse "Dom" e
fosse Almirante-Mor do Mar Oceano, Vice-Rei e
Governador perpétuo de todas as ilhas e terra firme que
descobrisse e conquistasse, e que doravante se descobrissem
e conquistassem no Mar Oceano, e assim procedesse meu
filho mais velho e, da mesma forma, de grau em grau para
todo o sempre. E saí eu da cidade de Granada aos doze dias
do mês de maio do mesmo ano de 1492, em sábado.



Vim à vila de Paios, que é porto marítimo, onde equipei três
navios bastante aptos para semelhante façanha e parti do
citado porto bem abastecido de muitíssimos mantimentos e
de uma boa tripulação aos três dias do mês de agosto do ano
indicado, numa quinta-feira, meia hora antes de raiar o sol,
tomando o rumo das ilhas Canárias de Vossas Majestades,
situadas no dito Mar Oceano, para dali seguir a rota e
navegar tanto que chegasse às Índias e entregasse a mensa-
gem de Vossas Majestades àqueles príncipes, cumprindo o
que assim ordenaram; e para isso pensei em descrever toda
esta viagem mui pontualmente, dia após dia, relatando tudo
o que fizesse, visse e acontecesse, como adiante se verá.
Também, Senhores Monarcas, além de descrever cada noite
o que suceder durante o dia, e de dia o que navegar durante
a noite, tenho a intenção de traçar nova carta de navegação,
na qual colocarei todo o mar e terras do Mar Oceano em
seus devidos lugares, sob os respectivos ventos, e ainda mais,
de compor um livro e estabelecer toda a analogia em
pintura, por latitude do equinócio e longitude do Ocidente;
e sobretudo cumpre muito que esqueça o sono e me
empenhe em navegar, porque assim é preciso, o que me
dará grande trabalho.

Sexta-feira, 3 de agosto. - Partimos quinta- feira, aos 3
dias de agosto de 1492, da barra de Saltes, às oito horas.
Avançamos umas sessenta milhas, com grande exaltação até
o pôr-do-sol, em direção ao sul, o que vem a dar quinze
léguas; depois a sudoeste e, ao sul, quarta do sudoeste, que
era o caminho para as Canárias.

Sábado, 4 de agosto. - Avançamos, a sudoeste, quarta do
sul.

Domingo, 5 de agosto. — Avançamos, sempre na rota,
entre dia e noite, mais de quarenta léguas.

Segunda-feira, 6 de agosto. - Quebrou-se ou despregou-
se o leme da caravela Pinta, que levava Martin Alonso
Pinzón, o que se acreditou ou desconfiou ter sido obra de
um certo Gomes Rascón e Cristobal Quintero, a quem
pertencia a caravela, porque lhe causava mágoa vê-la seguir
nessa viagem; e diz o almirante que, antes da partida, haviam
achado escondidos, à socapa, como se diz, os ditos cujos.
Viu-se aí o Almirante presa de grande perturbação por não
poder ajudar essa caravela sem expor-se a perigos e disse que
lhe causava pena, pois sabia que Martin Alonso Pinzón era
pessoa esforçada e de grande habilidade. No fim
percorreram, entre dia e noite, vinte e nove léguas.

Terça, 7 de agosto. - Quebrou-se de novo o leme da Pinta
e, depois de consertado, prosseguiram no rumo da ilha
Lanzarote, que é uma das Canárias, e percorreram, entre dia
e noite, vinte e cinco léguas.

Quarta, 8 de agosto. - Houve, entre os pilotos das
caravelas, opiniões divergentes a respeito do lugar onde se
encontravam, e o Almirante chegou mais perto da verdade;
e gostaria de ir até à Grande Canária para deixar a caravela
Pinta, que ia mal provida de leme e vazando água, e também
gostaria de trocá-la por outra, se acaso encontrasse. Mas
naquele dia não foi possível.

Quinta, 9 de agosto. - Até domingo à noite o Almirante
não pôde atracar na Gomera e Martin Alonso ficou naquela
costa da Grande Canária por ordem do Almirante, pois não
podia navegar. Depois o Almirante atracou na Canária (ou na
Tenerife), e consertaram muito bem a Pinta, com grande
trabalho e esforços do Almirante, de Martin Afonso e dos
demais; e por fim vieram para a Gomera. Avistaram as
chamas de um vasto incêndio na serra da ilha de Tenerife,
que impressiona pela imponência e altitude. Fizeram a Pinta
redonda, por ter vela triangular; regressou à Gomera no
domingo, 2 de setembro, com a Pinta consertada.
Finalmente, o Almirante içou velas na referida ilha da
Gomera com suas três caravelas na quinta-feira, aos 6 dias de
setembro.

Quinta, 6 de setembro. - Partiu nesse dia de manhã do
porto da Gomera e descreveu uma volta para prosseguir em
sua viagem. E soube o Almirante, de uma caravela que vinha
da ilha de Ferro, que por ali andavam três outras,
portuguesas, para capturá-lo: a causa provável seria a inveja
de El-Rei por ele ter ido para Castela. E enfrentou calmaria
durante todo o dia e noite, e na manhã seguinte verificou
que estava entre Gomera e Tenerife.
Sexta, 7 de setembro. - Toda a sexta-feira e o sábado, até
às três horas da madrugada, ficou em calmaria.

Sábado, 8 de setembro. — As três da madrugada de
sábado começou a ventar do nordeste, e retomou seu rumo
a caminho do oeste. Encontrou muito mar pela proa, o que
estorvava imensamente a manutenção da rota; e nesse dia
percorreria nove léguas, incluindo a noite.

Domingo, 9 de setembro. - Percorreu, nesse dia,
dezenove léguas, e resolveu contar as que percorria, para
que, se a viagem fosse longa, não se espantasse nem se
estarrecesse ninguém. De noite percorreu cento e vinte
milhas, o que equivale a trinta léguas . Os marinheiros
estavam pilotando mal, desviando-se para a quarta de
nordeste, e ainda em meia partida: por isso o Almirante
muitas vezes chamou-lhes a atenção.

Segunda, 10 de setembro. - Entre o dia e a noite,
percorreu sessenta léguas, a dez milhas por hora, o que vem
a dar duas léguas e meia; mas só registrava quarenta e oito,
para que ninguém se assustasse se a viagem fosse longa .

Terça, 11 de setembro. — Nesse dia se mantiveram na
rota, que era para o oeste, e percorreram mais de vinte
léguas, e viram um grande pedaço do mastro de uma nau, de
cento e vinte tonéis, que não puderam recolher. À noite
percorreram cerca de vinte léguas, mas registrou apenas
dezesseis, pelo motivo já apontado.

Quarta, 12 de setembro. - Neste dia, seguindo a rota,
percorreram, ao todo, inclusive à noite, trinta e três léguas,
registrando menos, pelo motivo já exposto.

Quinta, 13 de setembro. — Entre o dia e a noite,
mantendo-se na rota, que era rumo a oeste, percorreram
trinta e três léguas, e registrou três ou quatro a menos. As
correntes lhes foram contrárias. Neste dia, no começo da
noite, as bússolas indicavam noroeste, o que na manhã
seguinte continuou ainda um pouco a acontecer.

Sexta, 14 de setembro. - Navegaram neste dia, mantendo-
se rumo a oeste, inclusive à noite, e percorreram vinte
léguas; registrou alguma a menos. A essa altura os tripulantes
da caravela Niña disseram que tinham visto uma gralha e um
rabo-de-palha; e essas aves nunca se afastam mais de vinte e
cinco léguas da terra firme.

Sábado, 15 de setembro. - Navegou neste dia, com a noite
incluída, vinte e sete léguas na sua rota para o oeste e
algumas mais. E logo no começo da noite viram cair do céu
um maravilhoso galho de fogo no mar, a uma distância de
quatro ou cinco léguas de onde se encontravam.
Domingo, 16 de setembro. - Navegou dia e noite rumo a
oeste. Teriam percorrido trinta e nove léguas, mas só
registrou trinta e seis. O dia esteve meio nublado: chuviscou.
Segundo o Almirante, daqui por diante, hoje e sempre,
encontrarão clima mui temperado, que dava o maior prazer
acordar de manhã, só faltava ouvir rouxinóis. Diz ele: E o
tempo era igual ao de abril na Andaluzia. Aqui começaram a
ver muitos molhos (manchas?) de algas bem verdes que
havia pouco, conforme lhe pareceu, se tinham despregado
da terra, e por isso todos julgavam estar perto de alguma ilha;
mas não da terra firme, segundo o Almirante, que diz:
Porque a terra firme vamos encontrar mais adiante.

Segunda, 17 de setembro. - Navegou na rota do oeste e
percorreram, entre a noite e o dia, mais de cinqüenta léguas.
Anotou apenas quarenta e sete. A corrente lhes foi
favorável. Viram muitas algas e com freqüência, e eram de
rochedos e provenientes do lado do Poente. Acreditavam
estar próximos da terra. Seguiram os pilotos rumo ao norte,
marcando na bússola, e acharam que os ponteiros indicavam
noroeste numa grande quarta, e os marinheiros começaram
a sentir medo, a ficar melancólicos e sem dizer por quê. O
Almirante entendeu; determinou que voltassem a marcar o
norte ao amanhecer e acharam que os ponteiros estavam
bons. O motivo foi porque a estrela, em vez dos ponteiros,
dá impressão de se deslocar no firmamento. Ao amanhecer,
nesta segunda-feira, viram quantidade bem maior de algas e
que pareciam ser provenientes de rios, nas quais
encontraram um caranguejo vivo, que o Almirante guardou.
Consta que esses são sinais certos de terra, porque não se
acham a menos de oitenta léguas da costa. A água do mar
estava menos salgada desde que partiram das Canárias; o cli-
ma, sempre mais brando. Sentiam-se todos muito contentes
e os navios que mais podiam avançar se esforçavam para
serem os primeiros a avistar terra. Viram muitas toninhas e
os tripulantes da Niña pegaram uma. Diz aqui o Almirante
que são sinais do Poente, "onde confio que esse Deus
supremo, de cujas mãos dependem todas as vitórias, muito
em breve nos dará terra". Hoje de manhã diz que viu uma
ave branca chamada "rabo-de-palha", que não costuma
pernoitar no mar.

Terça, 18 de setembro. - Navegou, entre dia e noite, mais
de cinqüenta e cinco léguas, mas só registrou quarenta e
oito. O mar, durante todos esses dias, esteve muito
tranqüilo, como o rio em Sevilha. Neste dia, Martin Alonso,
com a Pinta, que é muito veloz, não esperou, porque disse
ao Almirante, lá de sua caravela, que tinha visto uma grande
revoada de aves rumando para o Poente e que à noite
esperava avistar terra e por isso queria se apressar.
Apareceu do lado norte uma espessa cerração, o que indica
vizinhança de terra.

Quarta, 19 de setembro. - Navegou na rota, e entre dia e
noite percorreram vinte e cinco léguas, pois encontraram
calmaria. Anotou vinte e duas. Neste dia, às dez horas, um
alcatraz sobrevoou a nau e de tarde avistaram outro, e é
pássaro que não costuma afastar- se vinte léguas da terra.
Surgiram alguns chuvisqueiros sem vento, o que é indício
seguro de terra. O Almirante não quis parar a barlavento
para confirmar essa hipótese; ficou, porém, absolutamente
certo de que, no lado do norte e do sul, havia algumas ilhas,
como mais tarde se comprovou, e de que estava passando
pelo meio delas.
Porque a sua vontade era de agora seguir adiante até as
Índias para aproveitar o bom tempo, e porque isso, se
aprouvesse a Deus, permitiria que na volta vissem tudo:
foram essas as suas palavras... Aqui os pilotos descobriram
suas posições: a Niña achava-se a quatrocentas e quarenta
léguas das Canárias; a Pinta, a quatrocentas e vinte; e a que
levava o Almirante, a quatrocentas justas.

Quinta, 20 de setembro. - Navegou neste dia rumo a
oeste quarta do noroeste e à meia-partida, porque muitos
ventos foram embora com a calmaria que fez. Percorreram
sete ou oito léguas. Dois alcatrazes sobrevoaram a nau,
indício de proximidade de terra; e viram muitas algas,
embora na véspera não tivessem visto nenhuma. Pegaram
um pássaro com a mão, e parecia uma gralha; era pássaro de
rio e não de mar: tinha as patas feito gaivota. Ao amanhecer,
vieram até o navio dois ou três passarinhos de terra
cantando, e depois, antes de raiar o sol, desapareceram. Aí
sobreveio outro alcatraz: vinha do oeste-noroeste, porque
essas aves dormem na terra e de manhã vão para o mar à
cata de alimento, e não se afastam mais de vinte léguas.

Sexta, 21 de setembro. — Hoje encontrou-se quase só
calmaria com, mais tarde, um pouco de vento. Entre o dia e
a noite, avançando a duras penas, percorreram treze léguas.
Ao amanhecer encontraram tantas algas que dir-se-ia que o
mar estava atulhado delas, e vinham do oeste. Viram um
alcatraz. O mar muito liso, como um rio, e o ar mais puro do
mundo. Avistaram uma baleia, o que é sinal de proximidade
de terra, porque elas sempre andam por perto da costa.

Sábado, 22 de setembro. - Navegou mais ou menos a
oeste-noroeste, deslocando-se para um e outro lado.
Percorreram trinta léguas. Quase não viram algas. Surgiram
uns pintarroxos e outra ave.
Diz aqui o Almirante: Muito me ajudou esse vento
contrário, porque a minha tripulação andava bastante
irritada, pensando que estes mares não fossem varridos por
ventos para voltar para a Espanha. Durante uma parte do dia
não apareceram algas; depois, em grande quantidade.

Domingo, 23 de setembro. - Navegou a noroeste, às
vezes à quarta do norte e outras mantendo-se na rota, que
era a oeste, e percorreu vinte e duas léguas. Viram uma rola
e um alcatraz, e um passarinho de rio e outras aves brancas.
Havia algas em profusão, cheias de caranguejos. E, como o
mar estivesse manso e liso, a tripulação murmurava, dizendo
que não havia dúvida de que ali o mar não era grande e que
nunca ventaria o suficiente para voltar para a Espanha; mas
depois o mar encrespou-se muito, e sem vento, o que os
assombrou, e por isso diz aqui o Almirante: De modo que
me foi bem providencial o mar alto, que não aparecia, a não
ser no tempo dos hebreus, quando fugiram do Egito
liderados por Moisés, que os tirou do cativeiro.

Segunda, 24 de setembro. - Navegou dia e noite,
mantendo-se na rota do oeste, e percorreram quatorze
léguas e meia. Registrou doze. Um alcatraz veio até ao navio
e também vieram muitos pintarroxos.

Terça, 25 de setembro. — Hoje reinou grande calmaria e
depois vento; e seguiram na rota do oeste até à noite. O
Almirante ia falando com Martin Alonso Pinzón,
comandante da Pinta, a respeito de um mapa que lhe havia
mandado três dias antes para a caravela, onde, ao que parece,
o Almirante tinha desenhado algumas ilhas naquele mar . E
dizia Martin Alonso que achavam que estavam naquela
região, e o Almirante também concordou; mas que, como
não tinham dado com elas, isso devia ser por causa das
correntes, que sempre levavam os navios para nordeste e
que, portanto, não haviam navegado tanto como os pilotos
pretendiam. E, estando a situação nesse pé, pediu o
Almirante que lhe devolvesse o tal mapa. E, enviado por
uma corda, começou o Almirante a examiná-lo com o piloto
e os marinheiros. Ao pôr-do-sol, Martin Alonso subiu à
popa de seu navio e, com grande alegria, chamou o
Almirante, pedindo-lhe alvíssaras, pois via terra. E, ao ouvir
a confirmação, o Almirante diz que se pôs a render graças a
Nosso Senhor de joelhos, enquanto Martin Alonso
proclamava Gloria in excelsis Deo com a tripulação. No que
foram imitados pela do Almirante; e os da Niña subiram
todos ao mastro e na enxárcia, gritando terra à vista. E assim
também pareceu ao Almirante e que faltavam vinte e cinco
léguas para alcançá-la. Ficaram todos afirmando até à noite
que era terra. O Almirante ordenou que se trocasse a rota,
que seria para o oeste, e que fossem todos para o sudoeste,
onde havia aparecido terra. Teriam percorrido neste dia
quatro léguas e meia a oeste e, de noite, a sudoeste,
dezessete léguas, portanto vinte e uma, embora indicasse
treze à tripulação, pois sempre fingia diante deles que
percorriam pouco caminho, para que não lhes parecesse
longo; e assim descreveu essa viagem de duas maneiras: a
menor foi a falsa, e a maior a verdadeira. O mar estava tão
liso que muitos marinheiros se puseram a nadar. Viram
muitos dourados e outros peixes.

Quarta, 26 de setembro. — Navegou na sua rota para o
oeste até depois do meio-dia. Aí desviaram para sudoeste e
perceberam que o que se dizia que tinha sido terra não era, e
sim céu. Percorreram, entre dia e noite, trinta e uma léguas,
mas contou vinte e quatro para a tripulação. O mar estava
então feito um rio; o ar, doce e suavíssimo.

Quinta, 27 de setembro. — Navegou na sua rota para o
oeste. Percorreu, entre dia e noite, vinte e quatro léguas;
contou vinte para a tripulação. Surgiram vários dourados;
mataram um. Viram um rabo-de-palha.
Sexta, 28 de setembro. - Navegou na sua rota para o oeste,
percorreram dia e noite, com calmaria, quatorze léguas;
contou treze. Acharam poucas algas. Pegaram dois peixes
dourados, mas os outros navios tiveram mais sorte.

Sábado, 29 de setembro. - Navegou na sua rota para o
oeste. Percorreram vinte e quatro léguas; contou vinte e
uma para a tripulação. Devido às calmarias encontradas,
pouca distância percorreram entre dia e noite. Viram uma
ave que se chama pelicano, que só se alimenta com o que os
alcatrazes são forçados por ela a vomitar. É ave do mar, mas
não pousa n'água nem se afasta a mais de vinte léguas da
terra. Há muitas desse tipo na ilha de Cabo Verde. Depois
vieram dois alcatrazes. O ar é muito doce e gostoso, até
parece que só falta ouvir um rouxinol, e o mar liso feito um
rio. Apareceram depois, em três ocasiões, três alcatrazes e
um pelicano. Viram muitas algas.

Domingo, 30 de setembro. - Navegou na sua rota para o
oeste. Percorreu, entre dia e noite, por causa da calmaria,
quatorze léguas; anotou onze. Vieram até o navio quatro
rabos-de-palha, o que é grande sinal de terra, pois tantas
aves da mesma espécie juntas significa que não andam
extraviadas nem perdidas. Viram-se quatro alcatrazes em
duas oportunidades. Algas, muitas.
Repara que as estrelas da constelação da Ursa Menor,
quando anoitece, estão junto ao braço do lado do poente e,
quando amanhece, passam para a linha abaixo do braço a
nordeste, dando impressão de que, durante toda a noite,
percorrem apenas três linhas, o que equivale a nove horas, e
isso a cada noite: é o que diz aqui o Almirante. Também ao
anoitecer os ponteiros da bússola indicam uma quarta a
noroeste e, ao amanhecer, estão em linha reta com a estrela;
ao que parece, a estrela se desloca como as outras; e os
ponteiros revelam sempre a verdade.

Segunda, 1º de outubro. - Navegou na sua rota para o
oeste. Percorreram vinte e cinco léguas; contou vinte para a
tripulação. Enfrentaram forte chuvarada. O piloto do
Almirante estava hoje, ao amanhecer, com medo de já
terem percorrido, desde a ilha de Ferro até aqui, quinhentas
e sessenta e oito léguas para o oeste. A conta menor que o
Almirante mostrava à tripulação era de quinhentas e oitenta
e quatro léguas; mas a verdadeira, que o Almirante calculava
e escondia, era de setecentas e sete.

Terça, 2 de outubro. - Navegou na sua rota para o oeste,
noite e dia, trinta e nove léguas; contou cerca de trinta para
a população. O mar, sempre liso e bom.
À Deus muitas graças sejam louvadas, disse aqui o
Almirante.
As algas, ao contrário do costume, vinham de leste para
oeste. Surgiram muitos peixes; matou-se um. Viram uma ave
branca que parecia uma gaivota.

Quarta, 3 de outubro. - Navegou na sua rota de sempre.
Percorreram quarenta e sete léguas; contou quarenta para a
tripulação. Apareceram pintarroxos, muitas algas, algumas já
velhas e outras bem novas, trazendo uma espécie de fruta; e
não viram ave nenhuma.
O Almirante achava que atrás ficavam as ilhas que trazia
desenhadas no mapa. Diz aqui o Almirante que não quis
parar a barlavento na semana passada e nesses dias em que
havia tantos indícios de terra, mesmo tendo conhecimento
de ilhas nessa região, para não perder tempo, pois o seu
objetivo era chegar às índias; e, se parasse, diz que não seria
prudente.

Quinta, 4 de outubro. — Navegou na sua rota para o
oeste. Percorreram, entre dia e noite, sessenta e três léguas;
contou quarenta e seis para a tripulação. Vieram mais de
quarenta pintarroxos juntos e dois alcatrazes até ao navio,
sendo que um recebeu uma pedrada de um marinheiro da
caravela. Sobrevoaram a nau um joão-grande e uma ave
branca que nem gaivota.

Sexta, 5 de outubro. - Navegou na sua rota. Percorreram
onze milhas por hora. Entre a noite e o dia percorreram
cinqüenta e sete léguas, porque o vento diminuiu um pouco
durante a noite; contou quarenta e cinco para a tripulação. O
mar em bonança e liso.
À Deus - diz — muitas graças sejam dadas.
O ar, muito doce e temperado; algas, nenhuma; pintarroxos,
muitos; várias andorinhas-do-mar passaram voando sobre a
nau.

Sábado, 6 de outubro. - Navegou na sua rota para sueste
ou oeste, que dá no mesmo. Percorreram quarenta léguas
entre dia e noite; contou trinta e três para a tripulação. Nesta
noite Martin Alonso disse que seria bom navegar à quarta do
oeste, para o lado do sudoeste; e pareceu ao Almirante que
Martin Alonso não dizia isso por causa da ilha de Cipango, e
o Almirante achava que se se enganassem não poderiam tão
cedo encontrar terra e que era preferível primeiro procurar
terra firme e depois as ilhas.

Domingo, 7 de outubro. - Navegou rumo a oeste;
percorreram doze milhas por hora durante duas horas,
depois oito, fazendo, até à uma hora da tarde, vinte e três
léguas. Contou dezoito para a tripulação. Neste dia, ao nascer
do sol, a caravela Niña, que ia na frente por ser mais veloz, e
se apressava ao máximo para ser a primeira a ver terra, a fim
de gozar dos favores prometidos pelos monarcas aos
primeiros que a vissem, içou uma bandeira no alto do mastro
e disparou uma bombarda como sinal de que a tinham en-
xergado por fim, porque assim determinara o Almirante.
Havia também determinado que ao nascer e ao pôr do sol se
juntassem todos os navios com o dele, porque essas duas
ocasiões são mais propícias para que os humores se
disponham a ver mais longe. Como à tarde não enxergassem
a terra que os da caravela Niña julgavam ter visto e porque
passava uma grande revoada de aves do lado do norte para o
sudoeste (levando a crer que iam dormir em terra ou talvez
fugissem do inverno, que nas terras de onde vinham decerto
estava por chegar, pois o Almirante sabia que a maioria das
ilhas pertencentes aos portugueses foram descobertas pelas
aves), o Almirante, por isso, concordou em deixar a rota do
oeste e virar a proa para sudoeste, com a determinação de
viajar dois dias naquele rumo. Isso começou uma hora antes
do pôr-do-sol. Percorreram, em toda a noite, cerca de cinco
léguas, e vinte e três durante o dia. Foram, ao todo, vinte e
oito léguas.

Segunda, 8 de outubro. - Navegou a oés-sudoeste e
fizeram entre dia e noite onze léguas e meia ou doze, e às
vezes parece que percorreram durante a noite quinze milhas
por hora, se a letra não mente. Encontraram o mar feito o
rio de Sevilha; graças a Deus, diz o Almirante. O ar,
dulcíssimo, como em abril em Sevilha, que dá prazer
respirá-lo, de tão perfumado que é. As algas pareciam bem
novas; muitos passarinhos como os do campo; e
conseguiram pegar um que ia fugindo para o sudoeste,
gralhas e gansos, e um alcatraz.

Terça, 9 de outubro. - Navegou para o sudoeste.
Percorreu cinco léguas; o vento mudou e soprou para o
oeste quarta a noroeste, e fez quatro léguas. Depois, ao todo,
onze léguas de dia e as da noite, vinte léguas e meia. Contou
dezessete para a tripulação. A noite inteira escutaram
revoadas de pássaros.

Quarta, 10 de outubro. - Navegou para oés-sudoeste.
Percorreram, a dez milhas por hora e às vezes doze e até
sete, e entre dia e noite, cinqüenta e nove léguas. Contou
apenas quarenta e quatro para a tripulação. Aqui os
marinheiros já não agüentavam mais; queixavam-se da longa
viagem . O Almirante, porém, incentivou-os o quanto pôde,
dando-lhes boa esperança das vantagens que poderiam ob-
ter. E acrescentou que não adiantava se queixarem, pois que
ele tinha vindo para as índias e que assim haveria de
prosseguir até encontrá-las com a ajuda segura de Nosso
Senhor.

Quinta, 11 de outubro. — Navegou para oés-sudoeste.
Enfrentaram muito mar e mais do que em toda a viagem
haviam enfrentado. Viram pintarroxos e um junco verde
junto à nau. Os tripulantes da caravela Pinta viram um talo
de cana-de-açúcar e um pedaço de pau, e apanharam outro
pauzinho lavrado semelhante a uma barra de ferro, e um talo
de cana e outra erva que brota em terra e uma tabuinha. Os
da caravela Niña também viram outros indícios de terra e
um pauzinho coberto de caramujos. Diante desses sinais,
todos respiraram e se alegraram. Percorreram neste dia, até o
pôr-do-sol, vinte e sete léguas. Depois que anoiteceu voltou
a navegar na sua primeira rota para o oeste; fizeram doze
milhas por hora; e até às duas da madrugada percorreriam
mais noventa, o que equivale a vinte e duas léguas e meia. E
por ser a caravela Pinta a mais veloz e ir na frente do
Almirante, achou terra e fez os sinais pedidos pelo
Almirante. Quem primeiro enxergou foi um marinheiro que
se dizia chamar Rodrigo de Triana; aí então o Almirante, às
dez da noite, estando no castelo da popa, distinguiu luz,
embora fosse tão débil que não quis afirmar que fosse terra;
mas chamou Pedro Gutiérrez, incumbido de armar estrados
para El-Rei, e disse-lhe que parecia luz, e que olhasse, o que
ele fez e viu; disse também a Rodrigo Sánchez de Segovia,
que El-Rei e a Rainha enviavam na armada como inspetor,
que nada viu porque não estava em posição de poder ver.
Depois que o Almirante lhe disse, vislumbrou, uma ou duas
vezes, o que mais parecia uma velinha de cera que se
levantava e sacudia, e que bem poucos interpretaram como
sinais de terra. O Almirante, porém, tinha certeza de que
era. Por isso, quando rezaram a Salve, que todos os
marinheiros costumavam dizer e cantar à sua maneira, e
estavam todos reunidos, o Almirante pediu e aconselhou a
que montassem guarda no castelo de proa, e olhassem bem à
procura de terra, e que ao primeiro que lhe dissesse que
enxergava, lhe daria prontamente um gibão de seda, sem os
outros favores que os monarcas tinham prometido, que
eram dez mil maravedis de juro ao primeiro que enxergasse.
Às duas horas da madrugada surgiu terra, da qual estariam a
apenas duas léguas de distância. Arriaram todas as velas e
ficaram só com a da popa, que é a grande sem
suplementares, e puseram- se à capa, contemporizando até a
sexta-feira, quando chegaram a uma ilhota dos Lucaios , que
em língua de índios se chamava "Guanahani" . Logo
apareceu gente nua, e o Almirante saiu rumo à terra no
barco armado, com Martin Alonso Pinzón e Vicente Anés
(Vicente Yánez), seu irmão, e comandante da Niña. O
Almirante empunhou a bandeira real e os comandantes as
duas bandeiras da Cruz Verde, que o Almirante levava como
emblema em todos os navios, com um F e um Y: por cima
de cada letra, a respectiva coroa, a primeira feita de um cabo
da cruz e a segunda do outro. Ao desembarcar viram árvores
muito verdes, muitas águas e frutas de várias espécies. O
Almirante chamou os dois comandantes e demais
acompanhantes, e Rodrigo de Escovedo, escrivão de toda a
armada, e Rodrigo Sánchez de Segovia, e pediu que lhe
dessem por fé e testemunho como ele, diante de todos,
tomava, como de fato tomou, posse da dita ilha em nome de
El-Rei e da Rainha, seus soberanos, fazendo os protestos que
se requeriam, como mais extensamente se descreve nos
testemunhos que ali se procederam por escrito. Logo viram-
se cercados por vários habitantes da ilha. O que se segue são
palavras textuais do Almirante, em seu livro sobre a primeira
viagem e descobrimento dessas índias:
"Eu - diz ele porque nos demonstraram grande amizade, pois
percebi que eram pessoas que melhor se entregariam e
converteriam à nossa fé pelo amor e não pela força, dei a
algumas delas uns gorros coloridos e umas miçangas que
puseram no pescoço, além de outras coisas de pouco valor, o
que lhes causou grande prazer e ficaram tão nossos amigos
que era uma maravilha. Depois vieram nadando até os
barcos dos navios onde estávamos, trazendo papagaios e fio
de algodão em novelos e lanças e muitas outras coisas, que
trocamos por coisas que tínhamos conosco, como miçangas
e guizos. Enfim, tudo aceitavam e davam do que tinham
com a maior boa vontade. Mas me pareceu que era gente
que não possuía praticamente nada. Andavam nus como a
mãe lhes deu à luz; inclusive as mulheres, embora só tenha
visto uma robusta rapariga. E todos os que vi eram jovens,
nenhum com mais de trinta anos de idade: muito bem-
feitos, de corpos muito bonitos e cara muito boa; os cabelos
grossos, quase como o pêlo do rabo de cavalos, e curtos,
caem por cima das sobrancelhas, menos uns fios na nuca
que mantêm longos, sem nunca cortar. Eles se pintam de
preto, e são da cor dos canários, nem negros nem brancos, e
se pintam de branco, e de encarnado, e do que bem
entendem, e pintam a cara, o corpo todo, e alguns somente
os olhos ou o nariz. Não andam com armas, que nem
conhecem, pois lhes mostrei espadas, que pegaram pelo fio e
se cortaram por ignorância. Não têm nenhum ferro: as suas
lanças são varas sem ferro, sendo que algumas têm no cabo
um dente de peixe e outras uma variedade de coisas. Todos,
sem exceção, são de boa estatura, e fazem gesto bonito,
elegantes. Vi alguns com marcas de ferida no corpo e, por
gestos, perguntei o que era aquilo e eles, da mesma maneira,
demonstraram que ali aparecia gente de outras ilhas das
imediações com a intenção de capturá-los e então se
defendiam. E eu achei e acho que aqui vêm procedentes da
terra firme para levá-los para o cativeiro. Devem ser bons
serviçais e habilidosos, pois noto que repetem logo o que a
gente diz e creio que depressa se fariam cristãos; me pareceu
que não tinham nenhuma religião. Eu, comprazendo a
Nosso Senhor, levarei daqui, por ocasião de minha partida,
seis deles para Vossas Majestades, para que aprendam a falar.
Não vi nesta ilha nenhum animal de espécie alguma, a não
ser papagaios".
Todas as palavras que acabo de transcrever são do Almirante
e nelas se refletem as impressões que colheu no primeiro
contato com os índios.
Sábado, 13 de outubro. - Assim que amanheceu, veio até
à praia uma porção desses homens, todos jovens, como já
disse, e todos de boa estatura. E gente muito bonita: os
cabelos não são crespos, mas lisos e grossos, como cerdas de
cavalo, e todos de rosto e cabeça bem mais largos que
qualquer geração que tenha visto até agora, com olhos muito
bonitos e nada pequenos, e entre eles não há nenhum
negro, a não ser da cor dos canários; nem se deve esperar
outra coisa, pois esta terra está a lés-oeste da ilha do Ferro,
na Canária, em linha reta. Todos, sem exceção, têm pernas
bem torneadas, e nenhum tem barriga, a não ser muito bem-
feita. Vieram até a nau em pirogas, feitas do tronco de uma
árvore, como um barco comprido e de um só pedaço, e
lavradas que eram uma maravilha, segundo o costume local,
e tão grandes que algumas continham quarenta ou quarenta
e cinco homens, e outras, menores, onde inclusive cabia
apenas uma pessoa. Remavam com uma pá semelhante às de
forno e correm que dá gosto; e quando emborcam, todos
logo se põem a nadar para endireitá-las, esvaziando-as com
cabaças que levam junto com eles. Traziam novelos de
algodão desfiado, papagaios, lanças e outras ninharias que
seria cansativo enumerar, querendo trocar por qualquer
coisa que a gente desse. E eu estava atento, me esforçando
para saber se havia ouro, e vi que alguns traziam um
pedacinho pendurado num furo que têm no nariz e, por
sinais, consegui entender que indo para o sul ou
contornando a ilha naquela direção, encontraria um rei que
tinha grandes taças disso e em vasta quantidade. Sugeri que
fossem buscar e depois vi que não compreendiam a minha
idéia. Resolvi esperar até amanhã de tarde e então partir
rumo ao sudoeste, pois, segundo muitos indicaram, havia
terras ao sul e ao sudoeste, e que essas do noroeste eram
muitas vezes atacadas por forasteiros, e desse modo ir ao
sudoeste à procura de ouro e pedras preciosas naqueles
lugares.
Esta ilha é imensa e muito plana, de árvores verdíssimas e
muitas águas, com uma vasta lagoa no meio, sem nenhuma
montanha, e tão verde que dá prazer só em olhá-la; e os
habitantes são tão sossegados e com tanta vontade de ganhar
nossas coisas que, temendo não receber nada se não derem
algo em troca, quando não têm, pegam o que podem e se
põem logo a nadar; mas tudo o que possuem trocam por
qualquer coisa que se lhes dê, e pegavam até os cacos de
gamelas e das taças quebradas; inclusive vi trocarem
dezesseis novelos de algodão por três ceotis portugueses,
que valem uma branca de Castela, e neles haveria mais de
uma arroba de algodão desfiado. Isso eu preservaria, sem
deixar que ninguém se aproveitasse, a não ser que mandasse
recolher tudo para V. M., se houvesse em grande
quantidade. Aqui, nasce nesta ilha, mas pelo pouco tempo
de que disponho não pude dar assim fé de tudo, e aqui
também nasce o ouro que trazem pendurado no nariz;
mas, para não perder tempo, quero ir ver se consigo en-
contrar a ilha de Cipango . Agora, como já é noite, todos
voltaram para a terra em suas canoas.

Domingo, 14 de outubro. - Ao amanhecer, mandei
enfeitar o batel da nau e os barcos das caravelas e percorri a
ilha pelo comprido, na direção do nordeste, para ver o outro
lado, que ficava a leste, e também para ver os povoados e
avistei logo dois ou três, e as pessoas que vinham todas à
praia, chamando por nós e rendendo graças a Deus. Uns nos
traziam água; outros, coisas de comer, outros ainda, quando
viam que ninguém pretendia se aproximar da terra,
lançavam-se ao mar e vinham nadando, e entendíamos que
nos perguntavam se tínhamos vindo do céu. E também
apareceu um velho na parte inferior do batel e outros, em
altos brados, chamavam todos os homens e mulheres:
— Venham ver os homens que chegaram do céu; e tragam-
lhes de comer e beber.
Veio uma porção, com muitas mulheres, cada um trazendo
algo, rendendo louvores a Deus, jogando-se ao chão e
levantando as mãos para o céu e depois gritando para que
fôssemos até à terra. Mas fiquei com medo ao deparar com
uma grande restinga de pedras que cerca toda a costa dessa
ilha e no meio o porto parece tão fundo que deve dar para
quantas naus existirem em toda a Cristandade, com entrada
muito estreita. É verdade que dentro dessa faixa há alguns
baixios, mas o mar não se mexe mais que dentro de um
poço. E para ver tudo isso me abalei esta manhã, para que
pudesse fazer relação de tudo a Vossas Majestades, e
também onde pudesse construir uma fortificação e vi um
pedaço de terra que se assemelha a uma ilha, embora não
seja, em que havia seis casas, que se poderia explorarem dois
dias; embora não veja necessidade, porque essa gente é
muito simples em matéria de armas, como verão Vossas
Majestades pelos sete que mandei capturar para levar à vossa
presença, aprender a nossa língua, e trazê-los de volta, a
menos que Vossas Majestades prefiram mantê-los em
Castela ou conservá-los cativos na própria ilha , porque
bastam cinqüenta homens para subjugar todos e mandá-los
fazer tudo o que se quiser.
Além disso, junto à referida ilhota existem hortas de árvores
das mais bonitas que já vi, tão verdes que as folhas lembram
as de Castela nos meses de abril e maio, e muita água. Olhei
para todo aquele porto e depois voltei à nau e levantei vela,
e vi tantas ilhas que nem sabia determinar à qual iria
primeiro. E aqueles homens que tinha capturado faziam
sinais, dizendo que eram tantas e tantas, que não havia nú-
mero, e nomearam pelo nome mais de cem. Por isso, olhei
para a maior e para ela resolvi me dirigir e assim faço, e deve
estar a uma distância de cinco léguas desta de San Salvador e
de umas mais e de outras menos. São todas muito planas,
sem montanhas, muito férteis e todas povoadas e entram em
guerra entre si, embora sejam bem simples e os corpos dos
homens muito lindos.

Segunda, 15 de outubro. - Havia contemporizado esta
noite com receio de não chegar em terra para ancorar antes
do amanhecer e por não saber se a costa estava livre de
baixios e, com o nascer do sol, começar a navegar. E como a
ilha ficasse a uma distância de mais de cinco léguas, talvez
até sete, e a maré me deteve, seria meio-dia quando lá
cheguei. E como dali avistei outra maior a oeste, soltei as
velas para viajar todo aquele dia até à noite, porque ainda
não tinha conseguido chegar ao cabo do oeste, a cuja ilha dei
o nome de "Santa Maria de la Conception". E quase ao pôr-
do-sol me aproximei do referido cabo para saber se ali tinha
ouro, porque esses que mandei capturar na ilha de San
Salvador me diziam que aí andavam com argolas de ouro
muito grandes nas pernas e nos braços. Já estava achando
que tudo o que diziam era puro pretexto para fugirem.
Contudo, a minha vontade era a de não passar por nenhuma
ilha sem tomar posse. E aqui cheguei e estou até hoje, terça-
feira, pois ao amanhecer fui à terra com os barcos armados e
desci; e eles, que eram vários e estavam nus, nas mesmas
condições de San Salvador, nos deixavam andar pela ilha e
nos davam o que se lhes pedia. E como o vento soprava na
travessia sudeste, não quis me deter e parti para a nau,
levando uma canoa abandonada a bordo da caravela Niña,
onde já de outro cabo vinha uma pequena canoa com um
homem que viera buscar um novelo de algodão, e alguns
marinheiros se lançaram ao mar, porque ele não queria
entrar na caravela, e o capturaram. E eu, que estava na popa
da nau, e a tudo assisti, mandei chamá-lo e lhe dei um gorro
vermelho e umas miçangas verdes que lhe coloquei no
braço e dois guizos que lhe coloquei nas orelhas e mandei
que voltasse para a canoa, que também vinha no barco, e o
enviei à terra. E logo soltei velas para ir à ilha grande que
avistava a oeste e mandei largar também a outra canoa que a
caravela Niña trazia à popa. E assim parti, mais ou menos às
dez horas, com vento sudeste, e ia de sul para essa outra ilha,
vastíssima, e onde todos esses homens que trago de San
Salvador indicam que há verdadeiro esbanjamento de ouro,
ostentando-o em feitio de argolas nos braços e pernas e nas
orelhas, nariz e pescoço. São ilhas verdejantes, férteis e de
clima mui brando, e podem conter uma porção de coisas
que ignoro, pois não quero perder tempo com escalas des-
tinadas a percorrer tantas ilhas a fim de achar ouro. E, no
entanto, estas dão assim indícios pelo que trazem nos braços
e nas pernas, e é ouro, porque lhes mostrei alguns pedaços
do que tenho. Não posso errar e com a ajuda de Nosso
Senhor hei de encontrá-lo onde nasce.
E estando a meio golfo dessas duas ilhas - isto é, daquela de
Santa Maria e desta grande, à qual dou o nome de
"Fernandina" , achei um homem sozinho dentro de uma
canoa que se dirigia da ilha de Santa Maria para a
Fernandina, e trazia um pedaço de pão, que seria do
tamanho de um punho, uma cabaça de água, um naco de
terra vermelha reduzida a pó e depois amassada, e folhas
secas, que devem ser coisa muito apreciada por eles . Pedi
que entrasse na nau, que era o que ele queria, e mandei
colocar a canoa no navio e guardar tudo o que trazia; e que
lhe trouxessem pão com mel e bebida. E assim vou levá-lo
até a Fernandina e lhe devolver tudo o que é seu, para que
dê boas novas de nós e assim, se Nosso Senhor quiser,
quando Vossas Majestades enviem para cá emissários, que
aqueles que vierem recebam honrarias e lhes dêem de tudo
o que houver.

Terça, 16 de outubro. - Parti das ilhas de Santa Maria de la
Conception para a Fernandina, que parece ser vastíssima a
oeste, e naveguei o dia inteiro com calmaria. Contemporizei
a noite toda até o amanhecer para chegar a um povoado,
onde ancorei e onde já havia chegado aquele homem que
encontrei na canoa a meio golfo. Tinha dado tantas boas
notícias nossas que durante a noite não faltaram canoas a
bordo da nau, trazendo-nos água e o que tinham. Eu mandei
dar algo a cada um; por exemplo, dez ou doze miçangas
presas por um fio, e soalhas de latão, dessas que em Castela
custam um maravedi cada uma, e alguns cordões com
agulhetas, e por tudo expressavam altíssimo apreço, e
também lhes mandei dar, para que comessem, mel
açucarado. E depois, às três da tarde, enviei o batel da nau à
terra para buscar água, e eles, com a maior boa vontade,
mostraram a meus tripulantes onde encontrá-la, e se encar-
regaram de trazê-la pessoalmente em barris cheios ao batel,
alegrando-se muito em nos comprazer.
Agora, escrevendo isto, soltei a vela com o vento sul para
rodear toda a ilha e me empenhar para encontrar Samoet,
que é a ilha ou cidade onde está o ouro, segundo dizem
todos os que vêm até à nau e também diziam os habitantes
da ilha de San Salvador e de Santa Maria. Essa gente é
semelhante às das referidas ilhas, tanto na língua como nos
costumes, só que os daqui me parecem um pouco mais
domésticos, de trato, e mais perspicazes, pois vejo que
trouxeram algodão aqui para a nau. E ainda nesta ilha vi
panos de algodão feito mantilhas e as pessoas mais gentis, e
as mulheres trazem na frente do corpo um pedacinho de
tecido de algodão que mal lhes cobre as partes pudendas.
Não me consta que professem alguma religião e acho que
bem depressa se converteriam em cristãos, pois têm muito
boa compreensão. Aqui os peixes são tão maiores do que os
nossos que é uma verdadeira maravilha. Há também baleias.
Não vi nenhum bicho, de espécie alguma, em terra, só
papagaios e lagartos. Outro dia um marinheiro me disse que
viu uma cobra grande.

Quarta, 17 de outubro. - Ao meio-dia parti do povoado
onde estava ancorado e onde peguei água para ir rodear a
Fernandina e, por essa rota, ir à ilha que os índios chamam
de Samoet, onde está o ouro. Martin Alonso Pinzón,
comandante da caravela Pinta, à qual mandei três desses
índios, veio até a mim dizendo que um deles lhe havia dado
a entender, sem possibilidade de engano, que pelo lado do
nor-noroeste bem mais rapidamente circundaria a ilha; vi
que o vento não me ajudava pelo caminho que queria seguir
e que era bom pelo outro. Soltei a vela para nor-noroeste e
quando cheguei perto do cabo da ilha, a duas léguas de
distância, encontrei um porto simplesmente maravilhoso,
com uma foz, até duas, pode-se dizer, pois tem um ilhéu no
meio e as duas são bem estreitas e, no interior, tão amplas
que caberiam cem navios, se o fundo fosse limpo e profundo
na entrada. E por ter imaginado, quando vi, que era a foz de
algum rio, mandei levar barris para buscar água e em terra
encontrei cerca de oito ou dez homens que logo se
aproximaram de nós e nos mostraram ali perto o povoado,
onde pedi que os tripulantes fossem pegar água, um grupo
com armas e os outros com os barris. E assim fizeram; e
como ficava bastante longe, esperei quase duas horas. Nesse
meio tempo perambulei entre as árvores, contemplando
todo aquele verdor e em tal grau como no mês de maio em
Andaluzia. Os habitantes se assemelhavam aos que já
tínhamos encontrado, nas mesmas condições, também nus e
com idêntica estatura. E ali encontraram um que usava no
nariz um pedaço de ouro que lembrava a metade de um
castelhano , e que trazia uns dizeres. Insisti para que não
regateassem e dessem o que pedia, para ver o que era e que
moeda seria essa; e me responderam que nunca ousariam
regatear.
Hoje choveu muito forte desde a meia-noite até quase
amanhecer e o dia ainda continua nublado como se fosse
chover. E assim, desde que estou nestas Índias, não há dia
que não chova, pouco ou muito. Creiam-me, Vossas
Majestades, que esta terra é a melhor e mais fértil,
temperada, plana e boa que tem no mundo.

Quinta, 18 de outubro. - Depois que clareou segui o
vento e andei ao redor da ilha o quanto pude e só ancorei na
hora que não era mais de navegar; mas não fui até à terra e
ao amanhecer soltei as velas.

Sexta, 19 de outubro. - Ao amanhecer levantei âncora,
enviei a caravela Pinta para leste e sudeste, a Niña para
sudoeste, e fui com a nau para sudeste. Dei ordem para que
efetuassem aquela volta até o meio- dia, e que depois ambas
mudassem de rumo e se recolhessem junto a mim. Não
demorou muito, antes que navegássemos três horas, para
avistarmos uma ilha ao leste, para onde nos dirigimos. E
chegamos a ela, todos os três navios, antes do meio-dia, na
ponta do norte; esses homens de San Salvador que trago
comigo disseram que é a ilha Samoet, a qual denominei de
"Isabela" . A costa corria a oeste até um cabo, que chamei
de "Cabo Hermoso", redondo e bem fundo. E ali ancorei
hoje à noite, sexta-feira, até amanhã. Esta costa tem muitas
árvores, bem verdes e muito grandes, e a terra é mais alta do
que as outras ilhas já descobertas. E veio um cheiro tão bom
e tão suave das flores e árvores, que era a coisa mais doce do
mundo.

Sábado, 20 de outubro. — Hoje, ao nascer do sol, levantei
âncora de onde estava com a nau parada nesta ilha de
Samoet no cabo do sudeste, onde dei o nome de "Cabo de la
Laguna", e à ilha de Isabela, para navegar para nordeste e
leste do lado do sudeste e do sul, onde ouvi falar, por esses
homens que trago junto comigo, que fica o povoado e o
respectivo rei. E por ser perigoso ancorar nestas ilhas, a não
ser de dia, quando se enxerga direito o lugar em que se lança
a âncora, pois são tudo manchas, às vezes limpas, outras não,
me pus a contemporizar à vela toda esta noite de domingo.

Domingo, 21 de outubro. - Às dez horas cheguei aqui,
neste cabo do ilhéu, e ancorei, e o mesmo fizeram as
caravelas. E, depois de ter comido, fui até à terra, onde não
havia por povoado mais que uma casa, na qual não achei
ninguém. Creio que fugiram de medo, porque todos os
objetos estavam em seus devidos lugares. Não deixei que se
tocasse em nada, só saí com os dois comandantes e a
tripulação para ver a ilha; que se as outras já vistas são muito
bonitas, verdejantes e férteis, esta é ainda mais, com arvo-
redos grandes e bem verdes. Aqui tem grandes lagunas e,
dentro delas e em volta, o arvoredo é uma maravilha, e aqui
em toda a ilha está tudo verde e as folhagens lembram o mês
de abril em Andaluzia; - e o canto dos passarinhos dá
vontade de nunca mais ir embora, e os bandos de papagaios
chegam a escurecer o sol; e há tantas espécies de aves e
passarinhos, e tão diferentes dos nossos, que deslumbra a
vista.
Também à procura de água boa fomos parar num povoado
perto daqui; e os habitantes, assim que notaram a nossa
presença, saíram todos fugindo, deixando as casas, e
escondendo a roupa e o que tinham no mato. Não deixei
que meus homens pegassem em nada, por insignificante que
fosse.
Depois alguns deles se aproximaram de nós, sendo que um
se manteve bem próximo. Eu lhe dei guizos e miçangas e ele
ficou muito contente e alegre. E para que a amizade
aumentasse e pudesse solicitar favores, mandei pedir água, e
eles, quando voltei para a nau, vieram logo à praia com as
cabaças cheias, demonstrando grande prazer em trazê-la
para nós.
Se o tempo permitir, logo partirei a circundar esta ilha até
conseguir falar com o cacique e ver se posso obter dele o
ouro que ouço dizer que usam, e depois partir para outra ilha
vastíssima, que acho que deve ser Cipango, segundo os
sinais que fazem esses índios que viajam comigo, à qual
chamam de "Coíba" , e de uma outra a que dão o nome de
"Bosio" . E as que ficam no meio verei logo assim, de
passagem, e conforme descubra vestígio de ouro ou
especiarias, resolverei o que hei de fazer.
Agora, porém, já me determinei a ir à terra firme, e também
à cidade de Quisay, para entregar as cartas de Vossas
Majestades ao Grande Cã, pedir resposta e regressar com ela.

Segunda, 22 de outubro. - A noite inteira e todo o dia de
hoje estive aqui aguardando para ver se o cacique local ou
outras pessoas trariam ouro ou qualquer coisa de valor, e
vieram muitos habitantes, parecidos com os que
encontramos nas outras ilhas. Alguns usavam pedaços de
ouro pendurados no nariz, que de bom grado trocavam por
miçangas; mas é tão pouco, que nem vale a pena; e é
verdade que se contentam com tudo o que se lhes dê, e
consideram a nossa chegada como uma verdadeira
maravilha, achando que viemos do céu.

Terça, 23 de outubro. — Hoje queria partir para a ilha de
Cuba, que acho que deve ser Cipango. E, no entanto, não
soltei nem solto vela, pois não tem vento, só a mais absoluta
calmaria, e chove muito.
Quarta, 24 de outubro. - Ontem à meia-noite levantei
âncora do cabo da ilha Isabela, pois assim a chamei, onde
estava descansando, para ir à ilha de Cuba, pois ouvi essa
gente dizer que é muito grande e movimentada, contendo
ouro e especiarias, naus grandes e mercadores. Naveguei até
o romper do dia a oés-sudoeste, e ao amanhecer o vento
diminuiu e choveu, e assim quase toda a noite. E como já
estava ventando forte e eu não sabia a distância que ainda
faltava para chegar à referida ilha de Cuba, e para não ter que
procurá-la no escuro, mandei arriar o traquete e não
percorremos esta noite nem duas léguas.

Quinta, 25 de outubro. - Navegou depois do nascer do sol
a oés-sudoeste até às nove horas. Depois mudou de direção
para o oeste. Fizeram oito milhas por hora até à uma da
tarde, e daí até às três, percorrendo ao todo quarenta e
quatro milhas. Então viram terra, e eram sete ou oito ilhas,
todas pelo comprido, de norte a sul; distavam delas cinco
léguas etc.

Sexta, 26 de outubro. — Os índios que levava disseram
que havia entre estas ilhas e Cuba um dia e meio de percurso
em suas pirogas, que são barquinhos de madeira e sem vela,
que chamam de canoas. Partiu de lá para Cuba, pois, pelos
sinais que os índios lhe davam de sua extensão e do ouro e
das pérolas que encontraria por lá, julgava que fosse ela; ou,
convém que se saiba, Cipango.

Sábado, 27 de outubro. - Ao nascer do sol levantou
âncora dessas ilhas, que denominou de "Arena", por causa
do fundo raso que tinham do lado do sul até a uma distância
de seis léguas. Fez oito milhas por hora até à uma da tarde a
sul-sudoeste, e percorreram quarenta milhas, e até à noite
percorreram mais vinte e oito milhas na mesma direção; e
antes de escurecer viram terra. Ficaram consertando os
navios até o pôr-do-sol, a dezessete léguas a sul-sudoeste.

Domingo, 28 de outubro. - Saiu dali em busca da ilha de
Cuba a sul-sudoeste e entrou num rio belíssimo e sem o
menor risco de baixios ou outros obstáculos. Diz o
Almirante que nunca viu coisa mais bonita: cheio de
árvores, cobrindo as margens de ponta a ponta, lindas e
verdes, e diferentes das nossas, com flores e com seus frutos.
Muitas aves e passarinhos, a cantar com a maior doçura. O
Almirante saltou no barco e foi até à terra, chegando a duas
casas que julgou ser de pescadores e que teriam fugido de
medo. Numa delas achou um cachorro que nem sequer latiu
e em ambas havia redes de fibra de palmeira e cordões, e
anzol de chifre, arpões de osso e outros apetrechos de pesca.
Deu ordens para que ninguém tocasse em nada e assim
fizeram. Voltou ao barco e percorreu rio acima um bom
pedaço, e diz que foi um grande prazer contemplar todo
aquele verdor e arvoredos.
Diziam os índios que nessa ilha havia minas de ouro e
pérolas, e o Almirante viu um local propício para elas e
amêijoas, que é indício delas, e entendia o Almirante que ali
acorriam naves do Grande Cã, e de grande porte, e que de lá
até à terra firme a jornada seria de dez dias. E chamou aquele
rio e porto, o Almirante, de "San Salvador".
Segunda, 29 de outubro. - Levantou âncora desse porto e
navegou ao poente para ir, segundo diz, à cidade onde lhe
parecia que os índios diziam que estava o cacique. Viu um
rio, cuja foz não era tão grande e ao qual deu o nome de "la
Luna". Viu outro, bem maior que os demais, em cujas
cercanias havia bons povoados de casas: chamou-o de "rio
de Mares". Enviou dois barcos a um povoado para pedir
informações, e a um deles um dos índios dos que trazia. To-
dos os homens, mulheres e crianças fugiram, esvaziando as
casas de tudo o que tinham; e o Almirante ordenou que não
se tocasse em nada. As casas estavam construídas em feitio
de pavilhão, eram espaçosas e todas de belíssimos ramos de
palmeiras. Encontraram várias estátuas em forma de
mulheres e várias cabeças, muito bem esculpidas, em moldes
de carrancas. Havia cachorros, mas nem latiram. A água na
foz daqueles rios era salgada: não ficaram sabendo onde os
índios buscavam a que bebiam, embora em suas casas hou-
vesse água doce. Achou caracóis bem grandes, mas sem
nenhum sabor; não eram como os da Espanha.
Marcou a posição do rio e do porto, dando-lhes o nome de
"San Salvador".

Terça, 30 de outubro. - Saiu do rio de Mares a noroeste e
viu um cabo cheio de palmeiras, que chamou de "Cabo de
Palmas". Os índios que iam na caravela Pinta disseram que
atrás desse cabo existia um rio e que entre ele e Cuba havia
quatro jornadas; e disse o comandante da Pinta que tinha
impressão de que essa Cuba era uma cidade situada em
vastíssima terra firme que se estendia muito para o norte, e
que o cacique local estava em guerra com o Grande Cã, a
quem chamavam de "Cami", e, à terra ou cidade, de "Fava",
e muitos outros nomes. O Almirante decidiu chegar naquele
rio e mandar um presente ao cacique, entregando-lhe a carta
dos Monarcas. Para isso dispunha de um marinheiro que já
tinha estado na Guiné, e certos índios de Guanahani que
queriam ir junto com ele, e que depois, como recompensa,
seriam levados de volta para a sua terra.

Quarta, 31 de outubro. - Ficaram toda a noite de terça-
feira a barlavento, e viu um rio onde não pôde entrar por ser
rasa a foz; e os índios pensaram que os navios pudessem
passar como faziam com as suas canoas. Por isso e como o
céu indicava que iam ter ventos fortes, preferiu regressar ao
rio de Mares.

Quinta, 1º de novembro. - Ao nascer do sol, o Almirante
enviou os barcos para a terra até às casas que ali havia e
descobriram que todos os habitantes tinham fugido. Não
demorou muito e apareceu um homem, e o Almirante
ordenou que o deixassem em paz e regressassem aos barcos.
E depois de comer tornou a enviar para a terra um dos
índios que levava , e que de longe gritou que não
precisavam ter medo porque eram boas pessoas e não faziam
mal a ninguém, nem pertenciam ao Grande Cã, antes pelo
contrário, davam do que era seu em muitas ilhas em que
haviam estado; e o índio lançou-se a nadar e foi até à terra, e
dois dos que estavam lá o pegaram pelo braço e o levaram a
uma casa para ser interrogado. E quando ficaram certos de
que ninguém lhes queria fazer mal, se tranqüilizaram e
vieram logo até os navios em mais de dezesseis pirogas, ou
canoas, trazendo algodão desfiado e outras insignificâncias,
das quais o Almirante ordenou que não se tomasse nada,
para que soubessem que ele só procurava ouro, que chamam
de "nucay". E assim passaram o dia inteiro indo e vindo
entre a terra e os navios, enquanto os cristãos faziam o
mesmo. O Almirante não viu ouro em nenhum deles, mas
diz que tinha um com um pedaço de prata lavrada
pendurado no nariz, o que indica a existência de prata.
Disseram, por sinais, que dentro de menos de três dias
viriam muitos mercadores do interior para comprar as coisas
trazidas pelos cristãos e dariam notícias do cacique dessa
terra, que, segundo se pôde entender pelos sinais que
faziam, distava quatro jornadas dali, pois tinham enviado
vários emissários pela região toda a fim de anunciar a
chegada do Almirante.

Sexta, 2 de novembro. - Resolveu o Almirante enviar dois
espanhóis: o primeiro, chamado Rodrigo de Jerez, morava
em Ayamonte, e o segundo, Luis de Torres, tinha morado
com o Adiantado de Murcia, havia sido judeu e sabia,
segundo diz, o hebraico, o caldeu e também um pouco de
árabe; e junto com eles mandou dois índios, um dos que
trazia consigo desde Guanahani e o outro proveniente
daquelas casas dos povoados à beira-rio. Deu-lhes cartas de
contas para comprar comida, se lhes faltasse, e seis dias de
prazo para voltarem. E amostras de especiarias para com-
parar com as que por acaso encontrassem. Ensinou-lhes a
maneira de indagar pelo cacique local e como lhe tinham
que falar da parte dos Reis de Castela, que enviavam o
Almirante para entregar-lhe suas cartas e um presente, saber
como estava passando, pedir sua amizade e favorecê-lo em
tudo o que fosse preciso etc.

Sábado, 3 de novembro. - De manhã, o Almirante entrou
no barco e seguiu rio acima até encontrar água doce, o que
ocorria a cerca de duas léguas de distância da foz, e subiu um
pequeno morro para examinar melhor a terra, mas não pôde
ver nada por causa dos grandes arvoredos. Diz que tudo o
que viu era tão bonito que não se cansava de admirar tanta
beleza somada ao canto das aves e dos passarinhos. Neste dia
muitas pirogas, ou canoas, vieram até os navios oferecer
trabalhos de algodão desfiado e redes de dormir, que são
para pendurar.

Domingo, 4 de novembro. - Logo ao amanhecer o
Almirante entrou no barco e foi à terra caçar as aves vistas
na véspera. Depois de voltar, o contramestre da Pinta lhe
disse que havia encontrado pés de canela. O Almirante
imediatamente foi lá e achou que não eram. Mostrou canela
e pimenta aos índios locais, que lhe disseram, por meio de
gestos, que perto dali havia muito daquilo, no lado sudeste.
Mostrou-lhes ouro e pérolas e alguns velhos responderam
que num lugar chamado "Bohio" tinha em grande
quantidade, que usavam no pescoço, orelhas, braços e
pernas, além de pérolas. Entendeu mais: que diziam que
havia naus grandes e mercadorias, e tudo isso no sudeste.
Entendeu também que longe dali havia homens de um olho
só e outros com cara de cachorro, que eram antropófagos e
que, quando capturavam alguém, degolavam, bebendo-lhe o
sangue e decepando as partes pudendas. O Almirante resol-
veu voltar à nau para aguardar o regresso dos dois emissários
espanhóis e só então determinar-se a sair em busca daquelas
terras, caso não lhe trouxessem boas notícias a respeito do
que queria.

Segunda, 5 de novembro. - Ao amanhecer, mandou pôr a
nau e os demais navios em prontidão; mas não todos
simultaneamente, apenas que ficassem sempre dois no lugar
onde estavam, por questão de segurança, embora ele insista
que essa tripulação é de toda a confiança.
E, estando assim, veio o contramestre da Niña pedir
alvíssaras ao Almirante por haver encontrado aroeira, só que
não trazia muda porque tinha perdido no caminho.
Prometeu-a ao Almirante e enviou Rodrigo Sánchez e
Mestre Diego até às árvores, e eles voltaram com algumas,
que o Almirante guardou para levar aos monarcas, junto
com um pedaço de tronco. Diz que encontrou muito
daquela madeira que lhe pareceu ser aloés. E que um índio
falou, por meio de gestos, que a aroeira é boa para dores de
estômago.

Terça, 6 de novembro. - Ontem à noite, diz o Almirante,
chegaram os dois espanhóis que tinha mandado para ver o
interior da terra, e lhe contaram que depois de andar doze
léguas chegaram a um povoado de cinqüenta casas, onde
havia mil vizinhos porque moram muitos debaixo do mesmo
teto. E que tinham sido recebidos da maneira mais solene,
segundo o costume local; queriam tocar neles e lhes
beijavam as mãos e os pés, maravilhando-se e acreditando
que vinham do céu. Mostraram canela, pimenta e outras
especiarias que o Almirante lhes havia dado, e lhes disseram,
através de gestos, que dava muito perto dali, no sudeste.
Veio com eles um dos chefes do povoado, com um filho e
um de seus homens. O Almirante falou com eles, tratou-os
com muita consideração, e indicando as várias terras e ilhas
que existiam por aqueles lados, pensou em levá-los aos
monarcas, mas diz que não sabe o que passou pela cabeça do
chefe; parece que teve medo, e já noite fechada, quis voltar
para terra. E o Almirante diz que, como a nau havia ficado
encalhada perto da praia, e não querendo contrariá-lo,
deixou que se fosse, depois que prometeu que voltaria ao
amanhecer; mas nunca mais voltou. Os dois emissários
acharam aves de muitas espécies e diferentes das espanholas,
a não ser perdizes e rouxinóis que cantavam, e gansos, que
ali tem em grande número. A terra muito fértil e bem
lavrada, com abricoteiros, feijões e favas em nada
semelhantes aos nossos; esse mesmo painço e uma vasta
quantidade de algodão colhido, desfiado e trabalhado, e que
numa só casa tinham visto mais de quinhentas e tantas
arrobas.
"Tenho certeza, sereníssimas Majestades - diz o Almirante -,
que sabendo a língua e orientados com boa disposição por
pessoas devotas e religiosas, logo todos se converteriam em
cristãos; e assim confio em Nosso Senhor que Vossas
Majestades se determinarão a isso com muita diligência para
trazer para a Igreja tão grandes povos, e os converterão, as-
sim como já destroçaram aqueles que se recusaram a
professar a fé no Pai e no Filho e no Espírito Santo."
São palavras do próprio Almirante, que tencionava partir na
quinta-feira; mas como sopraram ventos contrários, não
pôde levantar ancora antes do dia doze de novembro.

Segunda, 12 de novembro. — Partiu do porto e rio de
Mares ao render do quarto da aurora para dirigir-se a uma
ilha que os índios que traz consigo insistem que se chama
"Babeque" , onde, segundo indicam por gestos, a população
descobre ouro de noite na praia com o auxílio de candeias e
depois, com martelo, parece que faz varas com ele. Toda a
costa é habitada, principalmente perto do rio que encontrou,
ao qual denominou de "Sol". Disse que ontem, 11 de
novembro, lhe havia parecido aconselhável capturar
algumas pessoas que moram nessas margens para levá-las à
presença dos monarcas a fim de aprenderem a nossa língua,
saber o que contém essa terra e, ao regressar, falarem língua
de cristãos, tendo adotado nossos costumes e as coisas da fé.
"De maneira que ontem veio até à nau - diz o Almirante —
uma piroga com seis jovens, que mandei prender e levo
comigo. Depois enviei um grupo a uma casa que fica do lado
poente do rio, e me trouxeram sete mulheres, entre
adolescentes e adultas, com três crianças. Fiz isso porque os
homens se comportarão melhor na Espanha ao lado de suas
conterrâneas. Por conseguinte, tendo-as consigo, mostrarão
boa vontade para negociar o que se lhes pedir, e essas
mulheres também poderão ensinar a língua deles aos
espanhóis. Hoje de noite veio até à nau, numa piroga, o
marido de uma dessas criaturas, pai de três filhos, um rapaz e
duas moças, e pediu que o deixasse acompanhá-los, o que
muito me agradou, pois agora ficam todos consolados, uma
vez que são todos parentes e ele já é homem de quarenta e
cinco anos, no mínimo."
Todas essas palavras do Almirante são textuais. Também diz
que fazia um pouco de frio e por isso não seria aconselhável,
no inverno, seguir para o norte com o intuito de descobrir.
Navegou nesta segunda-feira, até o pôr-do-sol, dezoito
léguas ao leste quarta de sudeste até chegar a um cabo, a que
deu o nome de "Cabo de Cuba".

Terça, 13 de novembro. - Passou a noite inteira à capa,
como dizem os marinheiros, que é ficar a barlavento e não
navegar nada. Quando o dia clareou, soltou as velas para
terra e alcançou uma ponta que de noite lhe pareceu distar
duas léguas, e entrou num grande golfo. E como queria
chegar à ilha que chamam de "Babeque", resolveu fazer-se
ao mar e andar para o leste com o vento que era norte; e
andou oito milhas por hora, e desde as dez do dia que tomou
esse rumo, até o pôr-do-sol, percorreu cinqüenta e seis
milhas.

Quarta, 14 de novembro. - Passou a noite inteira parado e
a barlavento, porque ontem, terça-feira, os índios que iam
junto lhe disseram que havia três dias desde o rio de Mares
até a ilha de Babeque, o que se deve entender como tempo
levado por suas pirogas, que podem andar sete léguas; e o
vento também diminuiu, e por causa de outros percalços,
teve que esperar que amanhecesse.
Ao raiar do dia resolveu ir procurar porto, porque o vento
mudara para nordeste e, se não achasse refúgio, ser-lhe-ia
necessário retroceder ao que tinha deixado na ilha de Cuba.
Chegou em terra depois de percorrer, nessa noite, vinte e
quatro milhas, quando viu várias fozes, ilhotas e portos, e
como ventava muito e o mar estivesse agitado, não se
atreveu a encostar; em vez disso, andou pela costa a
noroeste quarta do oeste, olhando para ver se encontrava
abrigo; e viu que havia muitos, mas pouco claros. Depois de
ter feito sessenta e quatro milhas assim, achou uma foz bem
funda, com largura de quarto de milha, com bom porto e
rio, onde entrou, colocando a proa a sul-sudoeste e depois a
sul até chegar a sudeste, quando enxergou tantas ilhas que
nem dava para contar todas; e diz que acredita que sejam
aquela infinidade que nos mapa-múndi se situam nos
confins do oriente. E disse que achava que continham vastas
riquezas, pedras preciosas e especiarias. Chamou-as de "mar
de Nuestra Senora", e ao porto situado na sua foz deu o
nome de "Puerto del Príncipe". Fala tantas e tais coisas da
fertilidade, beleza e excelência dessas ilhas, que diz para os
soberanos não se surpreenderem de encarecê-las assim, pois
lhes garante que julga que não exprime nem sequer a
centésima parte.

Quinta, 15 de novembro. — Resolveu percorrer essas
ilhas com os barcos dos navios, e conta maravilhas a respeito
delas: que encontrou aroeira e uma quantidade infinita de
aloés, sendo que alguns pés tinham raízes lavradas, de onde
os índios fazem pão . Agua doce não viu; habitantes tinha
alguns, mas fugiram.

Sexta, 16 de novembro. - Como em tudo quanto é lugar,
ilhas e terras por onde passa sempre deixa fincada uma cruz,
entrou no barco e foi até à foz daqueles portos. E numa
ponta de terra encontrou dois enormes pedaços de madeira,
um maior do que o outro, e, colocando-os um sobre o outro,
fez uma cruz tão proporcional que diz que nenhum
carpinteiro seria capaz de fazer semelhante. E, adorada essa
cruz, mandou fazer da mesma madeira outra igual, ainda
maior e mais alta.
Foi até a uma enseada no interior da foz do porto. Ali havia
uma encosta de pedras e penhascos feito cabo, sendo que ao
pé era muito fundo, e tinha um lugar ou recanto onde
caberiam seis navios sem âncoras que nem numa sala.
Pareceu-lhe que ali se poderia construir uma fortaleza que
não custaria caro, se futuramente, nesse mar de ilhas,
surgisse alguma mina de grande valor.
Voltando à nave, encontrou os índios que levava consigo
pescando caracóis imensos que tem naqueles mares, e fez a
tripulação mergulhar para ver se achavam madrepérolas, que
são as ostras onde se criam pérolas, e acharam várias, mas
não pérolas, e atribuiu isso ao fato de ainda não ser tempo, o
que, segundo ele, acontecia por volta de maio e junho.
Acharam um animal que parecia cágado ou tartaruga.
Pescaram também com redes e encontraram um peixe,
entre outros, que se assemelhava a um verdadeiro porco,
não como a toninha, que diz que era todo concha bem dura
e não tinha partes moles, a não ser o rabo e os olhos, e por
baixo um buraco para expelir seus excessos. Mandou salgá-lo
para levar e mostrar aos soberanos.

Sábado, 17 de novembro. - De manhã entrou no barco e
foi ver as ilhas que ainda desconhecia no sudoeste. Viu
várias, muito férteis e bonitas. Achou nozes grandes, iguais
às da índia, creio que foi o que disse, e enormes ratões,
também como os da Índia, e caranguejos imensos. Dos seis
índios capturados no rio de Mares, hoje fugiram os dois mais
velhos.

Domingo, 18 de novembro. - Saiu outra vez nos barcos
com muita gente dos navios e foi colocar a grande cruz que
havia mandado fazer com os pedaços de madeira na foz do
dito porto do Príncipe, num lugar bem à vista, não coberto
por árvores. E só não partiu por ser domingo.

Segunda, 19 de novembro. - Partiu antes do sol nascer e
com calmaria; depois ventou um pouco ao leste e navegou a
nor-nordeste. E se manteve a noite toda nessa direção;
percorreu sessenta milhas e outras doze até às dez horas da
manhã de terça-feira, o que equivale, ao todo, a dezoito
léguas.

Terça, 20 de novembro. - Vendo que o vento não
mudava e que o mar se encapelava, decidiu regressar ao
porto do Príncipe, de onde tinha saído. Não quis ir à ilhota
que chamou de Isabela por dois motivos. Primeiro, porque
avistou duas ilhas ao sul; queria vê-las; segundo, para que os
índios que levava, capturados em Guanahani, que chamou
de San Salvador, não escapassem. Diz que precisa deles, para
levá-los a Castela etc. E que tinham entendido que, se
achassem ouro, o Almirante havia de deixá-los voltar para
suas terras. Chegou ao local do porto do Príncipe; mas não
pôde encostar por já ser noite e porque as correntes
desviaram-se para noroeste. Tornou a fazer a volta e colocou
a proa a nordeste.

Quarta, 21 de novembro. - Ao nascer do sol navegou para
leste com vento sul. Percorreu vinte e quatro milhas até à
hora de vésperas. Depois o vento mudou para leste e
percorreu ao sul quarta do sudeste. Aí o Almirante se
encontrou a quarenta e dois graus da linha equinocial do
lado norte.
Hoje Martin Alonso Pinzón afastou-se com a caravela Pinta,
sem licença nem determinação do Almirante, por cobiça,
diz que pensando que um índio que o Almirante tinha
mandado recolher a essa caravela lhe havia de dar muito
ouro, e assim se foi sem esperar, sem sequer a desculpa de
mau tempo, apenas porque quis. E aqui diz o Almirante: "Já
me fez e disse muitas outras".

Quinta, 22 de novembro. - Insistiu em ir para o sul para
ver aquela terra que ficava por lá, e quando saiu se
encontrou tão longe como na véspera, por causa das
correntes contrárias, e a terra estava a quarenta milhas de
distância.
Hoje à noite Martin Alonso tomou o rumo do leste para ir à
ilha de Babeque, onde os índios dizem que há muito ouro, e
o Almirante, mantendo o percurso, não o perdeu de vista.

Sexta, 23 de novembro. - O Almirante navegou todo o
dia para a terra, sempre ao sul. Sobre esse cabo se sobrepõe
outra terra ou cabo, que também vai para leste, e que aqueles
índios que levava chamavam de "Bohio". Diziam que era
muito grande e que lá havia uma gente que tinha um olho
na testa, e outros que chamavam de canibais, de quem
demonstravam ter muito medo. O Almirante diz que
acredita que há um pouco de verdade em tudo isso, mas que
o mais provável é que tivessem capturado alguns e, como
não voltassem, diziam que tinham sido comidos. O mesmo
acreditavam dos cristãos e do Almirante, no início, logo que
os viram.

Sábado, 24 de novembro. - Navegou a noite toda e por
fim chegou ao mar de Nossa Senhora, onde havia várias
ilhas, e entrou no porto que fica junto à sua foz, que está
repleto de palmeiras e muito arvoredo.

Domingo, 25 de novembro. - Antes do sol nascer entrou
no barco, e na foz do cabo do lado do sudeste viu que havia
um grande arroio de água lindíssima que serpenteava pela
montanha abaixo fazendo muito barulho. Foi até ao rio e viu
nele umas pedras brilhando, com manchas douradas, e
lembrou-se do rio Tejo, a cujas margens próximas ao mar
encontrou-se ouro, e mandou recolher algumas para levar
para os Reis.
Nesse instante alguns grumetes gritaram, dizendo que
estavam vendo pinheirais. Olhou para a serra e viu tantos,
imensos e maravilhosos, que não seria capaz de calcular-lhes
a altura e a retidão, feito fusos grossos e finos, que logo
percebeu que daria para fazer navios e uma infinidade de
tábuas e mastros para as maiores naus espanholas. Avistou na
praia várias pedras cor de ferro, e outras que alguns diziam
que eram de minas de prata, todas trazidas pelo rio. Ali
pegou uma antena e mastro para a mezena da caravela Niña.

Segunda, 26 de novembro. - Ao nascer do sol levantou
âncora do porto de Santa Catalina e chegou tarde ao Cabo
del Pico, porque o vento se acalmou, e, ao chegar, avistou
outro cabo a sudeste quarta de leste, e de lá enxergou mais
um, ao qual deu o nome de "Cabo de Campana". Toda aquela
terra tem montanhas altíssimas, muito bonitas, com vales
deslumbrantes. Ao longo dessa costa inteira não viu ne-
nhum povoado do lado do mar. Calculou que a terra
encontrada hoje fosse a ilha que os índios chamavam de
"Bohío". Toda a gente que encontrou até hoje diz que sente
o maior medo dos "caniba" ou "canima" que vivem nessa
ilha de "Bohío". Não queriam falar, por receio de serem
comidos, e não podia tirar-lhes o medo, pois diziam que só
tinham um olho e cara de cachorro. O Almirante achava
que era mentira, tendo impressão que deviam ser do
domínio do Grande Cã, que os reduzia ao cativeiro.

Terça, 27 de novembro. - Ontem, à hora do pôr-do-sol,
chegou perto de um cabo, que denominou "Campana". E viu
logo, ao pé desse cabo, um porto maravilhoso e um grande
rio, e, a um quarto de légua adiante, outro rio, e daí a meia
légua mais um, e daí a outra meia légua mais outro, e a outra
mais outro, e daí a um quarto mais outro, e daí a uma légua
outro, também grande, do qual, até o cabo de Campana,
distavam vinte milhas, que ficam a sudeste. Desse lado do
último rio encontrou um grande povoado, o maior visto até
agora, e viu se aproximar uma vasta quantidade de pessoas da
beira do mar, em altos brados, todas nuas, com lanças na
mão. Quis falar com elas e arriou as velas; ancorou e enviou
os barcos da nau e da caravela com ordens para que não se
fizesse nenhum dano aos índios nem se aproveitassem deles,
mandando que lhes dessem algumas coisinhas daquelas
permutas. Os índios indicaram, por gestos, que não
pretendiam deixá-los saltar em terra e iriam resistir. E vendo
que os barcos, sem se intimidar, se aproximavam cada vez
mais da margem, afastaram-se do mar. E, pensando que
saindo apenas dois ou três homens dos barcos não lhes
meteriam medo, foi o que fizeram dois cristãos, dizendo, na
língua deles, que não tivessem receio, pois sabiam alguma
coisa dela pelas conversas com os que trazem consigo. No
fim, todos correram, fugindo. Os três cristãos foram até às
casas, que são de palha e do feitio das outras que já tinham
visto, e não encontraram ninguém nem coisa alguma no in-
terior delas. Regressaram aos navios e içaram velas ao meio-
dia para ir a um cabo lindo que fica a leste. Tendo percorrido
meia légua pela mesma baía, avistou o Almirante do lado do
sul um porto interessantíssimo e, do lado do sudeste, umas
planícies simplesmente maravilhosas, feito várzea
montanhosa dentro dessa serra, de onde saíam grandes
fumaças e povoados, com terras bem lavradas; e por isso
decidiu desembarcar nesse porto. Foi uma coisa deslum-
brante ver o arvoredo, o frescor das folhagens, a água
cristalina, as aves e a amenidade do clima. Diz ele que lhe
dava vontade de nunca mais sair dali. Ia falando aos homens
que levava em sua companhia que, para descrever aos Reis
as coisas que viam, não bastariam mil línguas para referi-lo
nem sua mão para escrever, pois parecia-lhe estar
encantado.
Diz ainda mais o Almirante aqui, com estas palavras: "Eu não
saberia exprimir de quanto será o benefício que se pode tirar
daqui. O que é certo, senhores Soberanos, é que onde
existem tais terras devem existir infinidades de coisas
proveitosas. E asseguro a Vossas Majestades que não me
parece que sob a luz do sol possa haver melhores em matéria
de fertilidade, de temperança de frio e calor, de abundância
de águas boas e sãs, ao contrário dos rios da Guiné, que são
todos pestilentos, porque, louvado seja Nosso Senhor, até
hoje em toda a minha tripulação não teve ninguém que
passasse mal da cabeça ou ficasse de cama por doença. E
digo que Vossas Majestades não devem consentir que aqui
venha ou ponha pé nenhum estrangeiro, salvo católicos
cristãos, pois esse foi o objetivo e a origem do propósito, que
esta viagem servisse para engrandecer e glorificar a religião
cristã, não se permitindo a vinda a estas paragens a ninguém
que não seja bom cristão".

Quarta, 28 de novembro. - Hoje ficou-se neste porto
porque choveu e fez muita cerração. Os tripulantes dos
navios foram até à terra e alguns embrenharam-se um pouco
no território para lavar a roupa. Encontraram grandes
povoados, mas com as casas vazias, pois todos tinham
fugido. Voltaram por outro rio abaixo.

Quinta, 29 de novembro. — Como estava chovendo e
por isso o céu ficou fechado, não se partiu. Alguns cristãos
chegaram a outro povoado perto do lado noroeste e nas
casas não encontraram nada nem ninguém. E no caminho se
depararam com um velho que não lhes pôde fugir;
capturaram-no e disseram-lhe que não queriam fazer-lhe
mal e deram-lhe algumas coisinhas de presente e depois
deixaram que fosse embora.
Numa das casas acharam um pão de mel; que vou levar aos
Soberanos, pois onde há mel também deve haver mil outras
coisas boas.

Sexta, 30 de novembro. - Não se pôde partir porque o
vento era Levante, bem contrário à sua rota. Enviou oito
homens bem armados, junto com dois índios dos que
levava, para verem aqueles povoados no interior. Chegaram
a muitas casas e não acharam nada nem ninguém, pois todos
tinham fugido. Viram quatro índios que estavam lavrando
suas plantações, e que, quando enxergaram os cristãos,
saíram correndo e não puderam alcançá-los. Perto de um
ribeirão viram uma piroga, ou canoa, de noventa e cinco
palmos de extensão, feita de um só bloco de madeira, muito
bonita; nela caberiam e navegariam cento e cinqüenta
pessoas.

Sábado, 1º de dezembro. - Não se partiu, pelo mesmo
motivo do vento contrário e porque chovia muito. Colocou
uma grande cruz na entrada desse porto, que acho que
chamou de "Puerto Santo", em cima de escarpas íngremes.

Domingo, 2 de dezembro. - O vento ainda continuou
contrário e não pôde partir. Diz que um grumete achou na
foz desse rio certas pedras que parecem conter ouro; levou-
as para mostrar aos Reis. Diz que existem por lá, a tiro de
bombarda , grandes rios.

Segunda, 3 de dezembro. - Como continuava fazendo
mau tempo, não partia desse porto, e então resolveu ir ver
um cabo muito bonito que ficava a um quarto de légua dali.
Foi com os barcos e alguns tripulantes armados. Rumou para
o sudeste e achou uma angra, onde viu cinco pirogas muito
grandes, que os índios chamam de canoas, e notou que o
sopé do morro estava todo lavrado. Caminharam sob árvores
frondosas. Subiu ao alto de uma montanha e encontrou-a
toda plantada e semeada de tantas coisas da terra e cabaças
que era uma glória contemplar; e no meio havia um grande
povoado. Apareceram de repente para os habitantes do
lugar, que, quando os viram, homens e mulheres fugiram
correndo. O índio que o acompanhava, um dos que levava
consigo, procurou tranqüilizá-los, dizendo que não
precisavam ter medo, que eram gente boa. O Almirante
mandou que lhes dessem guizos, anéis de latão e miçangas
verdes e amarelas, e eles se mostraram satisfeitíssimos, visto
que não tinham ouro nem qualquer pedra preciosa e que
bastava deixá-los em paz e que toda a região estava povoada
e os demais haviam fugido de medo (e o Almirante assegura
aos Reis que dez homens são suficientes para afugentar dez
mil), e depois resolveu voltar. Regressando ao lugar em que
haviam ficado os barcos, enviou alguns cristãos ao morro
por onde subiram, porque lhe parecia ter visto um grande
colmeal. Antes que chegassem os emissários, reuniram-se
vários índios e vieram até aos barcos onde o Almirante já se
tinha recolhido com toda a tripulação; um deles se adiantou
rio adentro, encostando-se à popa do barco, e começou a
falar uma porção de coisas que o Almirante não entendeu.
Pensou que estivessem contentes com sua vinda. Viu,
porém, que o índio que trazia consigo mudou de expressão e
ficou pálido feito cera, tremendo muito, dizendo por meio
de gestos que o Almirante devia ir para longe daquele rio,
que queriam matá-los e, aproximando-se de um cristão que
estava com uma balestra armada na mão, mostrou-a aos ín-
dios, e o Almirante entendeu então que estava lhes dizendo
que ia matar todos eles, porque aquela balestra atirava longe
e sempre acertava. Pegou também uma espada e sacou-a da
bainha, mostrando-a e também dizendo a mesma coisa; ao
ouvir isso, saíram fugindo, ficando, porém, ainda tremendo,
o dito índio, de pura covardia e falta de coração.

Terça, 4 de dezembro. - Fez-se à vela com pouco vento e
saiu desse porto, que denominou "Puerto Santo", passando
por vários rios.
Quarta, 5 de dezembro. — Navegou a noite inteira, à
capa, em torno do Cabo Lindo, onde anoiteceu, para ver a
terra que ia a leste. Pretendia ir à ilha de Babeque, mas não
pôde, porque o vento que soprava era nordeste. Indo nessa
direção, olhou para sudeste e avistou terra. Era uma ilha
muito grande, da qual diz que já estava informado pelos
índios, que a denominavam de "Bohío", e era habitada. Diz
que os que vivem em Cuba ou Juana e todas as outras ilhas
têm muito medo dessa gente, pois parece que são
antropófagos. Depois fez dez milhas por hora; e até o pôr-
do-sol ainda andaria oitenta e oito. E, como já estava
escurecendo, determinou que a caravela Niña, por ser mais
rápida, se adiantasse para examinar o porto ainda de dia, e
ela, chegando à foz, que era do tamanho da baía de Cádiz, e
como não dava para ver mais nada, enviou o seu barco com
lume de candeia para sondar a margem; e, antes que o Almi-
rante chegasse onde a caravela ficara a barlavento, à espera
dos sinais que o barco lhe faria, o lume que haviam levado se
apagou. Não o avistando mais, a caravela aproveitou o vento
favorável e, apressando-se, levou outro ao Almirante que, ao
chegar à Niña, ficou sabendo o que tinha acontecido.
Enquanto isso, acenderam novo lume no barco; a caravela
aproximou-se, mas o Almirante não conseguiu e passou a
noite inteira a barlavento.

Quinta, 6 de dezembro. - Quando amanheceu, achou-se a
quatro léguas do porto; deu-lhe o nome de "Puerto Maria", e
viu um bonito cabo ao sul, ao qual denominou "Cabo de la
Estrella". Restava-lhe outro cabo belíssimo e bem-feito, que
recebeu o nome de "Cabo del Elefante", ao leste. E outro
ainda a lés-sudeste, que denominou de "Cabo de Cinquín".
Pareceu-lhe que entre o Cabo do Elefante e o de Cinquín
havia uma foz imensa, e alguns marinheiros disseram que
era separação de ilha; e lhe pôs o nome de "Ilha da
Tartaruga" . Na hora de vésperas, entrou no referido porto e
denominou-o de "Puerto de San Nicolás", porque era dia do
santo, e logo à entrada maravilhou-se com sua beleza e
excelência. Havia em frente uma várzea bonita e (diz) na
região deve ter grandes povoados, segundo se percebia pelas
pirogas que usam. Todos os índios que ainda não tinham
fugido fugiram ao avistar os navios. De modo que, para
querer falar com os habitantes desse porto, lhe seria
necessário passar alguns dias ali, o que não fez por ter ainda
muitas terras para visitar e por não acreditar que o tempo
fosse suficiente.

Sexta, 7 de dezembro. - Ao faltar um quarto para o
amanhecer, soltou velas e saiu do porto de San Nicolás. Toda
essa terra era muito alta e não de árvores grandes, mas de
azinheiras e medronheiros, igual, diz, à terra de Castela.
Mais adiante encontrou um abrigo bem amplo e fundo, e
resolveu entrar nele, batizando-o de "Puerto de la
Concepción", e desembarcou em terra por um rio de pouca
extensão. Levou redes para pescar e antes que chegasse à
margem saltou para dentro do barco uma liça, igual às da
Espanha. Até então não tinham visto peixe parecido com os
de Castela. Os marinheiros pescaram e mataram ostras,
linguados e outros peixes como os de lá. Caminhou um
pouco pela terra, que é toda lavrada, e ouviu cantarem o
rouxinol e outros passarinhos como os de Castela.
Viram cerca de cinco homens, mas que não quiseram
esperar por eles e saíram fugindo.
Encontrou murta e outras árvores e ervas iguais às de
Castela, assim como são a terra e as montanhas.

Sábado, 8 de dezembro. — Aqui neste porto choveu
muito, com vento norte muito forte. Depois da meia-noite,
o vento mudou para nordeste e depois para leste, mas este
porto é bem abrigado desses ventos pela ilha da Tartaruga,
que lhe faz fronteira numa extensão de trinta e seis milhas.

Domingo, 9 de dezembro. - Hoje choveu e fez o mesmo
tempo de inverno que faz em Castela por volta de outubro.
A ilha é grande e muito bem lavrada.
O Almirante acha que os povoados devem ser longe do mar,
de onde vêem a chegada das caravelas, e por isso todos
fugiam espavoridos, levando consigo tudo o que tinham e
fazendo sinais de fumaça como gente em guerra. Em frente
ao porto há várzeas, das mais lindas do mundo e quase
semelhantes às terras de Castela; aliás, estas levam vantagem,
e por isso denominou-se de "Ilha Espanhola" .

Segunda, 10 de dezembro. - Ventou muito do nordeste e
fez arrastar as âncoras a meio cabo. E, como o vento era
contrário para ir aonde pretendia, enviou seis homens
fortemente armados em terra para ver se podiam falar com
alguém. Foram e voltaram sem ter achado casas nem gente;
em compensação encontraram umas cabanas e trilhas bem
largas e lugares onde haviam feito muito fogo; viram as
melhores terras do mundo e depararam com muitos pés de
aroeira, dos quais trouxeram mudas, dizendo que havia em
grande quantidade, só que agora não é tempo de colher,
porque não pega.

Terça, 11 de dezembro. - Não partiu por causa do vento,
que ainda era leste e nordeste. Cada dia (diz o Almirante)
entendemos mais esses índios e eles a nós. Pescaram muitos
peixes como os de Castela, carpas, salmões, merluzas,
dourados, salpas, lissas, corvinas, camarões, e viram
sardinhas; encontraram muito aloé.

Quarta, 12 de dezembro. - Não partiu hoje, pelo mesmo
motivo já indicado do vento contrário. Pôs uma grande cruz
na entrada do porto do lado oeste, numa saliência bem à
vista, "em sinal (diz) de que Vossas Majestades têm a terra
como sua, e principalmente como sinal de Jesus Cristo
Nosso Senhor e em honra da Cristandade". Uma vez
colocada, três marinheiros embrenharam-se pelo morro para
ver as árvores e as ervas, e ouviram ruídos causados por uma
multidão de gente, a quem chamaram e foram atrás, mas os
índios preferiam fugir. E finalmente capturaram uma
mulher, muito jovem e bonita, e a trouxeram para a nau,
onde falou com aqueles índios, porque todos tinham a
mesma língua. O Almirante deu-lhe roupas, miçangas,
guizos e anéis de latão, e tornou a devolvê- la à terra, com
toda a dignidade, como é seu costume; enviou junto alguns
tripulantes da nau e três dos índios que levava consigo, para
que falassem com aquela gente. Os marinheiros que iam no
barco, quando a conduziam de volta, contaram para o
Almirante que ela não queria mais sair da nau e sim ficar
com as outras índias. Trazia um pedacinho de ouro no nariz,
sinal de que havia ouro na ilha.

Quinta, 13 de dezembro. - Os três homens que o
Almirante tinha mandado acompanhar a mulher voltaram às
três da madrugada sem ter ido com ela até ao povoado, ou
porque lhes pareceu longe ou então tiveram medo. O
Almirante decidiu mandá- los de novo, confiando nas
notícias que a índia teria levado, dizendo que os cristãos
eram gente boa. Para isso escolheu nove homens bem
armados e aptos para semelhante tarefa, com os quais foi um
dos índios que trazia. Encontraram o povoado vazio; era de
mil casas e mais de mil habitantes. O índio que os cristãos
levavam correu atrás deles, aos brados, pedindo que não
tivessem medo, que os cristãos não eram Caraíbas, antes,
pelo contrário, vinham do céu, e que davam muitas coisas
bonitas a todos os que encontravam. Tanto os convenceu do
que dizia que se tranqüilizaram e vieram em mais de dois
mil, e todos se aproximavam dos cristãos e lhes punham a
mão na cabeça, sinal de grande reverência e amizade.
Disseram os cristãos que, depois que perderam o medo, iam
todos às suas casas e cada um lhes trazia do que tinha para
comer, que é pão de inhame, que são umas raízes que
parecem rabanetes graúdos e que nascem, e que eles
semeiam, e brotam e plantam em todas as suas terras, e é do
que vivem, e com elas fazem pão, cozinham, assam, e têm o
mesmo gosto das castanhas.
Viram aproximar-se uma verdadeira multidão, chefiada pelo
marido da mulher que o Almirante tinha respeitado e
devolvido, que traziam a cavaleiro sobre os ombros; queriam
agradecer aos cristãos pela honra que o Almirante lhes havia
feito e pelos presentes que tinha dado.

Sexta, 14 de dezembro. - Saiu desse porto de la
Concepción com vento terral. Depois o vento passou para
levante e com ele chegou à ilha da Tartaruga: viu nela uma
ponta que denominou "Punta Pierna" e lá descobriu outra, a
que deu o nome de "Punta Lanzada". Esta ilha da Tartaruga é
terra bem alta, mas não montanhosa, muito bonita e com
grande número de habitantes. Visto que o vento era con-
trário e não podia ir à ilha de Baneque (ou Babeque),
resolveu voltar ao porto de la Concepción.

Sábado, 15 de dezembro. - Saiu do porto de la
Concepción outra vez no rumo pretendido, mas, na hora da
partida, ventou leste forte contrário, e mudou de rota até
chegar à Tartaruga. Entrou com os barcos por um grande rio,
e viu algumas casas e a várzea grande onde estavam os
povoados, e disse que nunca tinha visto coisa mais linda. E
mais, que essa gente deve ser muito perseguida, pois vive
morta de medo. Denominou a várzea de "Valle dei Paraíso"
e o rio de "Guadalquivir", porque diz que aqui é tão largo
como o Guadalquivir quando passa por Córdoba.
Domingo, 16 de dezembro. - A meia-noite, com a brisa
terrestre, soltou velas para sair desse golfo, e a meio
caminho dele achou uma canoa ocupada por um só índio. O
Almirante maravilhou-se da sua habilidade em mantê-la
sobre a superfície da água com um vento tão forte. Fez
entrar na nau tanto ele como a canoa, e, encantado, deu-lhe
miçangas, guizos e argolas de latão, levando-o junto para a
terra. Lá, foi na frente para dar notícias do Almirante e dos
cristãos, por serem boa gente, e logo vieram mais de
quinhentos homens, e não demorou muito surgiu o rei. E
um por um, e também em grandes grupos, vinham até à nau
sem trazer nada junto, embora alguns usassem alguns bagos
de ouro finíssimo nas orelhas e no nariz, que se
prontificavam a dar de boa vontade. Viu também que o rei,
que estava na praia, era por todos tratado com respeito. O
Almirante enviou-lhe um presente, que diz que recebeu
com muito agrado e que seria moço de, no máximo, vinte e
um anos, e que tinha um velho preceptor e outros
conselheiros que o aconselhavam e lhe respondiam, e que
ele falava pouco. Deram-lhe de comer coisas de Castela e ele
comia um pedaço e depois dava o resto aos conselheiros.
"Creiam Vossas Majestades - diz o Almirante - que estas
terras são tão boas e férteis, sobretudo as desta ilha
Espanhola, que não há ninguém capaz de exprimir em
palavras e que só pode acreditar quem já viu. E estes índios
são dóceis e bons para receber ordens e fazê-los trabalhar,
semear e tudo o mais que for preciso, e para construir
povoados, e aprender a andar vestidos e a seguir nossos
costumes."

Segunda, 17 de dezembro. - Ventou muito forte esta
noite. Por isso passou todo o dia aqui. Mandou que os
marinheiros pescassem com redes; os índios se alegraram
muito com os cristãos e lhes trouxeram algumas flechas das
usadas pelos canibas ou canibais, feitas de talos de cana-de-
açúcar. Dois homens mostraram que lhes faltavam alguns
pedaços de carne no corpo e deram a entender que os cani-
bais os tinham comido a dentadas - o Almirante não
acreditou.
Viram num índio, que o Almirante tomou por governador
daquela província, e a quem chamavam de "cacique", um
pedaço de ouro do tamanho de uma mão; e ele fazia partir
em pedaços aquela peça, e, trazendo cada vez um
pedacinho, vendia. Disseram ao Almirante que na Tartaruga
havia mais ouro que na ilha Espanhola, porque fica mais
perto de Baneque. O Almirante retrucou que não acreditava
que na ilha Espanhola nem na da Tartaruga existissem minas
de ouro e sim que eles traziam de Baneque, e em pequenas
quantidades, por não terem nada para dar em troca.

Terça, 18 de dezembro. - Passou o dia de hoje ancorado
na praia porque não tinha vento e também porque o cacique
havia dito que ia trazer ouro. Logo ao amanhecer mandou
enfeitar a nau e a caravela com armas e bandeiras por ser
festa de Santa Maria de la Ó, ou comemoração da
Anunciação. Deram muitos tiros de bombarda. Hoje,
estando o Almirante comendo embaixo do castelo, o rei
dessa ilha chegou à nau acompanhado de toda a sua gente .
E diz o Almirante aos Soberanos: "Sem dúvida Vossas
Majestades sentiriam prazer em ver o agrado e respeito que
todos lhes demonstram, pois andam nus. Ele, assim que
entrou na nau, veio sentar-se a meu lado e não quis dar
passagem para que eu saísse ou me levantasse da mesa, a não
ser para comer. E das comidas que lhe pus na frente, pegava
a mesma quantidade que se pega para encher uma bandeja, e
depois jogava o resto para os seus acompanhantes, e todos
comiam. No final da refeição, um escudeiro trazia um cinto
de feitio igual aos de Castela, que ele pegou e me deu, junto
com dois pedaços de ouro lavrado. Notei que tinha gostado
de uma arandela que havia sobre a minha cama; eu lhe dei,
com umas miçangas de âmbar muito boas que usava no
pescoço, uns sapatos vermelhos e uma jarra de água de
cidreira, que o deixou tão contente que dava gosto ver; e ele,
o preceptor e os conselheiros ficaram muito pesarosos
porque não entendiam o que eu dizia e nem eu a eles".
Quando já era tarde e ele manifestou desejo de ir embora, o
Almirante lhe cedeu um barco com todas as honrarias e
mandou disparar muitos tiros de bombarda. Uma vez posto
em terra, subiu em seus andores e se foi com seus mais de
duzentos homens.
Neste dia se trocou diz que pouco ouro; mas o Almirante
ficou sabendo, por intermédio de um velho, que havia uma
porção de ilhas circunvizinhas, a cem léguas ou mais,
segundo pôde entender, nas quais nasce muito ouro, e em
outras, até dizer-lhe que tinha ilha que era puro ouro, e
ainda noutras, que têm em tal quantidade, que o recolhem e
o passam por uma espécie de peneira e depois fundem,
fazem barras e mil lavores. Esse velho indicou ao Almirante
a rota e o lugar onde estava; o Almirante resolveu ir até lá, e
disse que, se não fosse o tal velho pessoa tão importante
naquele reino, o prenderia para levá-lo consigo. Mas que,
por já ter tantas pessoas para trazer aos Reis de Castela e
porque não convinha causar-lhes agravo, resolveu deixá-lo.

Quarta, 19 de dezembro. - Hoje à noite fez- se à vela para
sair deste golfo que forma ali a ilha da Tartaruga com a
Espanhola, e sendo de dia voltou o vento levante, com o
qual todo este dia não pôde sair do meio daquelas duas ilhas.
Viu por lá uma ilha pequena, que denominou de "São
Tomás", por ser amanhã véspera de sua festa. Antes da ilha
tem um cabo que se adentra muito no mar alto e baixo e por
isso lhe deu o nome de "Cabo Alto y Bajo". A sessenta
milhas dali tem uma montanha mais alta que outra que entra
no mar; lhe pôs o nome de "Monte Caribata", porque essa
província se chama Caribata.

Quinta, 20 de dezembro. - Hoje, ao pôr-do-sol, entrou
num porto entre a ilha de São Tomás e o cabo de Caribata, e
ancorou. Existem ali montanhas altíssimas que parecem
encostar no céu, e belíssimas, cobertas por árvores verdes;
não resta dúvida que são mais altas do que a ilha de Tenerife,
nas Canárias, que é considerada das mais altas que se pode
encontrar. E viu também vários povoados e as fumaças que
faziam.

Sexta, 21 de dezembro. - Hoje foi com os barcos dos
navios visitar esse porto; e se impressionou tanto com o que
viu que afirma que nenhum se lhe compara, entre todos os
que encontrou até hoje. Mandou que dois homens
desembarcassem e fossem até a uma elevação para verificar
se existia algum povoado. Voltaram e disseram onde haviam
visto um, muito grande. O Almirante determinou que se
remasse até lá e avistou uns índios que vinham até à beira do
mar, e pareciam estar com medo; por isso mandou parar os
barcos e pediu aos índios que levava na caravela que
falassem com eles, dizendo que ninguém lhes queria fazer
mal. Então aproximaram-se mais do mar, e o Almirante mais
da terra; e, depois que perderam o medo por completo,
vieram em tal quantidade que cobriam a terra, rendendo mil
graças, tanto homens como mulheres e crianças; corriam de
um lado para outro, a nos trazer pão feito de inhame, água
em cabaças e em cântaros de barro de feitio igual aos de
Castela, e nos davam de tudo o que tinham e sabiam que o
Almirante queria, e com um coração tão grande e tão feliz
que era uma maravilha.
Em toda a região há montanhas altíssimas, todas verdes, e no
meio delas existem várzeas muito bonitas, e ao pé do porto,
ao sul, existe uma, tão grande, que a vista não consegue
enxergar até o cabo. De modo que esse porto é ótimo para
todos os ventos que possam soprar, fechado, fundo e todo
habitado por gente muito boa, mansa e sem armas, boas ou
más. Do lado noroeste há três ilhas e um grande rio; é o
melhor do mundo; pus-lhe o nome de "Puerto de la Mar de
Santo Tomás", porque hoje era seu dia: e disse que é mar por
causa da amplidão.

Sábado, 22 de dezembro. - Ao amanhecer, soltou as velas
para seguir sua rota em busca das ilhas que os índios diziam
que continham muito ouro e de outras, com mais ouro que
terra; o tempo não permitiu e viu-se forçado a ancorar de
novo, e enviou o barco para pescar com a rede. O cacique
dessa terra , que morava perto, mandou-lhe, numa canoa
grande cheia de gente, um vassalo importante, para rogar
que o Almirante fosse com os navios até à sua terra,
prometendo dar-lhe tudo o que tivesse. Hoje, antes de
partir, enviou seis homens a um povoado bem grande,
porque o cacique veio ontem até ao Almirante e disse-lhe
que tinha alguns pedaços de ouro. Quando os cristãos
chegaram lá, o cacique pegou a mão do escrivão, enviado
especialmente pelo Almirante para impedir que se fizessem
coisas indevidas com os índios, que são tão francos, ao
contrário dos espanhóis, tão gananciosos e desmedidos, que
não se satisfazem com o fato de conseguirem, em troca de
uma simples agulha ou um pedaço de vidro, tigela e outras
coisas insignificantes, tudo o que quiserem; o pior é quando,
sem dar nada aos índios, ainda querem pegar e ficar com
tudo, o que o Almirante sempre proíbe. De modo que o
cacique pegou a mão do escrivão e o levou até à sua casa em
companhia de toda a população, que era muito numerosa, e
pediu que comessem, enquanto os índios lhes traziam mui-
tas coisas feitas de algodão e em novelo desfiado. Quando já
era tarde, presenteou-os com três gansas bem gordas e uns
pedacinhos de ouro e os trouxeram de volta com grande
acompanhamento. O Almirante mandou dar-lhe algumas
coisas e ele e toda a população ficaram extremamente
contentes, acreditando de fato que tinham vindo do céu; e,
só de ver os cristãos, consideravam-se bem-aventurados.

Domingo, 23 de dezembro. - Por causa da falta de vento,
não pôde partir com os navios para a terra desse cacique que
o havia mandado convidar; porém enviou, junto com os três
emissários que ali esperavam, os barcos com a tripulação e o
escrivão. Enquanto isso, enviou dois dos índios que levava
consigo aos povoados que têm por ali perto da paragem dos
navios, e ambos voltaram para a nau com outro cacique,
trazendo notícias de que nessa ilha Espanhola havia ouro em
tal quantidade, a ponto de nela virem comprar de outros
lugares. Diz que acha que na mesma hora chegaram à
caravela mais de mil pessoas, todas com alguma coisa que
possuíam; e que, antes de encostar no navio, a uma distância
de meio tiro de balestra, põem-se em pé nas canoas e,
mostrando o que trazem, dizem: "Peguem, peguem". Acha
também que mais de quinhentas vieram a nado por falta de
canoas; e a nau estava ancorada a cerca de uma légua da
terra.
De noite os barcos voltaram, dizendo que tinham estado
num lugar muito longe dali e que no monte de Caribata
haviam encontrado várias canoas cheias de gente que vinha
ver o Almirante e os cristãos, e que morava no lugar para
onde eles iam. E então todos regressaram com os cristãos
para o povoado, que diz que afirmavam ser o maior e mais
bem organizado em matéria de ruas que os anteriores
descobertos até aqui. Finalmente o cacique surgiu no meio
deles e se reuniram na praça, que estava muito bem varrida,
como toda a aldeia, e havia mais de dois mil homens. Esse
rei prestou muitas homenagens à tripulação dos navios e deu
a cada um uns tecidos de algodão que as mulheres locais
usam à guisa de roupa e, para o Almirante, papagaios e pe-
daços de ouro. Já de tarde, quando quiseram despedir-se, o
rei implorou que esperassem até ao dia seguinte; no que foi
imitado pelo povo. Mas, visto estarem os cristãos decididos,
os acompanharam em grande parte do trajeto, trazendo nas
costas, até aos barcos, o que o cacique e os outros lhes
tinham dado.

Segunda, 24 de dezembro. - Antes de sair do sol,
levantou âncora com o vento terral. Entre os diversos índios
que ontem haviam vindo à nau, notou um que parecia mais
disposto e amigo ou que com mais alegria lhe falava, e
adulou-o, pedindo-lhe que fosse embora com ele para
mostrar-lhe as minas de ouro. Esse trouxe outro
companheiro ou parente consigo, e os dois, entre os demais
lugares que indicavam onde se colhia ouro, mencionaram
Cipango, a que chamam de "Civao", afirmando que lá existe
em grande quantidade.

Terça, 25 de dezembro, dia de Natal. - Navegando
ontem com pouco vento a partir do mar de São Tomás até
Punta Santa, da qual se manteve a uma légua de distância,
esperando que passasse o primeiro quarto, que seria às onze
horas da noite, resolveu dormir, pois fazia dois dias e uma
noite que ficava o tempo todo em claro. Como reinasse
calmaria, o marinheiro que pilotava a nau resolveu ir se
deitar, entregando o leme a um grumete, coisa que o
Almirante sempre tinha proibido . Quis Nosso Senhor que à
meia-noite, tendo eles visto o Almirante se recolher para
descansar e a calmaria sendo absoluta e o mar mais
parecendo um espelho, todos se deitaram para dormir,
ficando o leme nas mãos daquele rapaz, e as águas que
corriam levaram a nau por cima de um dos bancos de areia .
O grumete, que sentiu pelo leme e pelo barulho do mar,
começou a gritar, sendo acudido pelo Almirante, que agiu
tão depressa que ninguém teve tempo de perceber que
estavam encalhados. Logo o mestre a quem fora confiada a
guarda da nave apareceu; e o Almirante determinou a ele e
aos outros que içassem o batel que traziam à popa e
pegassem uma âncora e a lançassem também ali, e o mestre,
acompanhado por vários marinheiros, saltou no batel,
enquanto o Almirante pensava que cumpriam ordens. Mas
eles, ao invés, só trataram de fugir para a caravela a
barlavento a meia légua de distância. Lá, por questão de
lealdade, não quiseram acolhê-los, e por isso voltaram à nau;
mas o barco enviado pela caravela chegou primeiro. Quando
o Almirante soube que fugiam e que eram da sua tripulação,
e que as águas estavam rasas e a nau já imóvel, atravessada
sobre o mar, não tendo outro remédio, mandou cortar o
mastro e retirar de bordo tudo o que se pudesse, para ver se
conseguia desprendê-la; e corno as águas ainda con-
tinuassem rasas, nada pôde fazer, ficando enviesado sobre o
mar. O Almirante foi para a outra caravela buscar refúgio
para a tripulação. E como já estivesse soprando uma brisa da
terra e também ainda faltasse muito para terminar a noite e
não soubessem quanto tempo permaneceriam encalhados,
contemporizou à capa até que raiasse o dia e só então voltou
à nau pelo interior da restinga do banco. Antes enviou o
batel à terra com Diego de Arana, de Córdoba, meirinho da
armada, e Pedro Gutiérrez, resposteiro da Casa Real, para
comunicar ao cacique que o tinha mandado convidar e pedir
que fosse sábado com os navios até o seu porto, cuja aldeia
distava cerca de uma légua e meia do referido banco; o qual,
quando soube, dizem que chorou e enviou toda a população
da aldeia com muitas canoas bem grandes para descarregar
tudo o que ainda estivesse na nau. E assim se fez,
descarregando-se o que ficara nos tombadilhos em
brevíssimo espaço de tempo, tamanho foi o auxílio e a
diligência prestados pelo cacique. E ele mesmo, em pessoa,
acompanhado de irmãos e parentes, se encarregou de cuidar
da nau e do que era levado para a terra, a fim de que tudo
ficasse em segurança. De vez em quando mandava um
parente consolar o Almirante, que chorava, dizendo que não
se sentisse triste nem aborrecido, que lhe daria de tudo o
que tivesse. E também mandou pôr homens armados ao
redor da carga, para que velassem a noite inteira.

Quarta, 26 de dezembro. - Hoje, ao nascer do sol, o
cacique veio à caravela Niña, onde se encontrava o
Almirante, e lhe disse quase chorando que não ficasse triste,
que lhe daria o que tinha. Enquanto o Almirante falava com
ele, surgiu outra canoa de outro lugar, trazendo alguns
pedaços de ouro, que queriam trocar por um guizo, que era
o que mais cobiçavam. A canoa ainda nem estava a bordo
quando chamaram e mostraram os pedaços de ouro, di-
zendo: "chuque, chuque", imitando os guizos, que estão a
ponto de enlouquecer por causa deles. Depois de ter visto
isso, e indo embora as canoas que vieram de outros lugares,
chamaram o Almirante e lhe imploraram que guardasse um
guizo até o dia seguinte, porque lhe trariam quatro pedaços
de ouro, cada um do tamanho de uma mão. Ao ouvir isso, o
Almirante alegrou-se, e depois um marinheiro que voltou da
costa lhe disse que era uma maravilha a quantidade de peças
de ouro que os cristãos que estavam em terra trocavam por
ninharias.
Quando acabaram de comer, o cacique acompanhou até à
praia o Almirante, que mandou buscar um arco turco e um
punhado de flechas, e pediu que um homem de seu séquito
atirasse com ele; e o cacique, que não sabe manejar armas,
porque não conhece nem usa, se mostrou assombrado;
embora diga que no inicio falaram a respeito dos habitantes
de Caniba, que chamam de "caribes", que vêm capturá-los,
com arcos e flechas sem ferro, que todas essas terras não se
lembram de ter visto, nem de aço ou de qualquer outro
metal, a não ser ouro e cobre, embora de cobre o Almirante
pouco tenha visto. Por meio de gestos, o Almirante disse-
lhe que os Reis de Castela mandariam aniquilar os caribes e
que dariam ordens para serem presos, de mãos atadas. Fez
disparar uma bombarda e uma espingarda, e vendo o efeito
causado pelo estrondo e pelo que penetravam, ficou
maravilhado. E, quando a população ouviu os tiros, caiu toda
no chão. Trouxeram para o Almirante uma grande máscara
com bons pedaços de ouro nas orelhas, nos olhos e noutras
partes, que ele juntou às outras jóias de ouro que o cacique
lhe havia posto na cabeça e no pescoço; e também deu
muitas aos demais cristãos que o acompanhavam. O
Almirante encontrou muito prazer e consolo nas coisas que
estava vendo e sentiu diminuir a angústia e o pesar que tinha
com a perda da nau, percebendo que Nosso Senhor a havia
feito encalhar ali a fim de que pudesse conhecer esse lugar.
"E para isso - diz o Almirante - sobrevieram tantas coisas ao
mesmo tempo, que aquilo não foi propriamente um
desastre, mas uma grande sorte. Porque não há dúvida que,
se não encalhasse, teria passado ao largo sem ancorar neste
lugar, que está metido aqui dentro de uma grande baía, com
duas ou três restingas de baixios. Nem esta viagem deixaria
gente aqui, mesmo que eu quisesse, nem lhes poderia deixar
tão bom auxílio, com tantos apetrechos, mantimentos e
utensílios de defesa. E é bem verdade que grande parte da
tripulação que viaja comigo me havia pedido e implorado
para dar-lhes permissão de ficar aqui. Agora determinei que
se construísse uma torre e fortaleza , tudo muito bem-feito,
e uma grande vala, não por acreditar que essa gente precise
disso, mas há motivo para sc levantar essa torre e se fique
como se há de ficar, estando tão longe de Vossas
Majestades."

Quinta, 27 de dezembro. - Ao nascer do sol, o cacique
veio à caravela e disse ao Almirante que tinha mandado
buscar mais ouro e que queria cobri-lo todo com ele antes
que se fosse embora, e até pedia que ficasse; e comeram em
companhia do Almirante o cacique, um irmão seu e outro
parente muito intimo, sendo que esses dois últimos disseram
que queriam ir junto com ele para Castela.

Sexta, 28 de dezembro. - Para dar ordens e pressa de
acabar de fazer a fortaleza à tripulação que iria ocupá-la, o
Almirante desembarcou em terra e pareceu-lhe que o
cacique o tinha visto ainda no barco, apressando-se a entrar
disfarçadamente em casa e enviando um irmão para receber
o Almirante e levá-lo a uma das habitações que havia
reservado aos marinheiros, a maior e melhor da aldeia. No
interior tinham montado um estrado recoberto de palmeiras,
onde o fizeram sentar. Depois o irmão enviou um escudeiro
avisar ao cacique que o Almirante já estava ali, como se o
cacique não soubesse de sua vinda, embora o Almirante
achasse que essa dissimulação servia para prestar-lhe muito
mais honrarias. Mal o escudeiro avisou, diz que o cacique
veio correndo aonde estava o Almirante para lhe pôr no
pescoço uma grande placa de ouro que trazia na mão. Ficou
ali com ele até tarde, deliberando sobre o que tinham que
fazer.

Sábado, 29 de dezembro. - Quando raiou o dia, apareceu
na caravela um sobrinho bem jovem do cacique, de muito
bom entendimento e bons bofes (como diz o Almirante), e
lhe disse que a quatro jornadas daqui há uma ilha ao leste
chamada "Guarinoex", além de outras, chamadas "Mocorix",
"Mayonic", "Fuma", "Cibao" e "Carcay", onde existe fartura
de ouro. O Almirante anotou os nomes, e quando o cacique
soube, por um irmão, que o sobrinho lhe tinha contado isso,
brigou com ele, segundo pôde entender o Almirante. E
também entendeu que o rei se empenhava para que
continuasse a ignorar onde nascia e era colhido o ouro, para
que não fosse buscá-lo.

Domingo, 30 de dezembro. - O Almirante saiu para
comer em terra e chegou a tempo de assistir à chegada de
cinco caciques subordinados ao local, que se chamava
Guacanagari, todos com seus penachos. Ao descer em terra,
o cacique veio receber o Almirante e levou-o de braço para
a mesma casa de ontem, onde tinha um estrado e cadeiras
para o Almirante sentar; e logo tirou o cocar da cabeça e
colocou-o na do Almirante, que arrancou do pescoço um
colar de boas comalinas e miçangas muito bonitas, de cores
lindíssimas, e pôs no pescoço dele, e se desfez de um fino
manto escarlate que havia vestido neste dia, e colocou nos
ombros do chefe, e aí mandou buscar umas botinas de cor
que mandou que calçasse, enfiando-lhe no dedo um grande
anel de prata. Ficou todo alegre, e contentíssimo, e dois
daqueles caciques que estavam com ele vieram até ao
Almirante e lhe entregaram duas grandes placas de ouro que
traziam consigo.

Segunda, 31 de dezembro. - Hoje se ocupou em mandar
buscar água e lenha para a partida para a Espanha, para logo
pedir aos Reis que enviassem navios que descobrissem o que
faltava; pois como tivesse ficado com um só navio, não lhe
parecia razoável expor-se aos perigos que lhe poderiam
sobrevir durante a descoberta. E queixou-se, dizendo que
todo aquele mal e inconveniente se devia a ter-se afastado
da caravela Pinta.

Terça, 1º de janeiro de 1493. - À meia-noite despachou
um barco para que fosse à ilhota Amiga buscar ruibarbo, de
que lhe haviam falado, que lança uns raminhos para fora da
terra e uns frutos que parecem amoras verdes quase secas, e
dentro da terra cria uma raiz que nem uma grande pêra. Re-
gressou à hora de vésperas com um alforje cheio: levou-o
para mostrar aos soberanos. A canoa do marinheiro que
tinha ido à procura da Pinta voltou sem ter encontrado nada.
O marinheiro contou que a vinte léguas dali tinha visto um
chefe que usava na cabeça duas grandes placas de ouro e que
mal os índios que iam na canoa falaram com ele, tirou-as, e
que também viu muito ouro em outras pessoas. O Almirante
achou que o cacique Guacanagari decerto tinha proibido a
venda de ouro aos cristãos para que tudo passasse por suas
mãos.

Quarta, 2 de janeiro. - Saiu de manhã para a terra a fim de
se despedir do cacique Guacanagari e partir em nome do
Senhor. Deu-lhe de presente uma túnica sua e mostrou-lhe a
força e o efeito que causavam as bombardas. Provocou
também uma escaramuça entre a tripulação armada dos
navios, pedindo ao cacique para que não tivesse medo dos
caribes, mesmo que viessem. Diz o Almirante que fez tudo
isso para que sentisse amizade pelos cristãos que deixava e
para lhe infundir medo e temor. E levou-o para comer,
junto com os outros que o acompanhavam, na casa onde
estava instalado. E da tripulação que ficaria ali, recomendou-
o muito a Diego de Arana, Pedro Gutiérrez e Rodrigo
Escovedo, que seriam seus representantes. Tomou o barco
com a intenção de partir imediatamente, mas o vento não
permitiu.
Nessa ilha Espanhola, que os índios dizem que se chama
"Bohio", deixou trinta e nove homens na fortaleza, muito
amigos do cacique Guacanagari e, tendo autoridade sobre
eles, como seus representantes, Diego de Arana, natural de
Córdoba, Pedro Gutiérrez, incumbido de armar estrados para
El-Rei, criado do dispenseiro-mor, e Rodrigo de Escovedo,
natural de Segóvia, sobrinho de frei Rodrigo Pérez, com
todos os poderes que os Soberanos lhe tinham delegado.
Deixou-lhes todas as mercadorias que os Reis mandaram
comprar para as trocas, e que eram muitas, para que as
negociassem por ouro, com tudo o que trazia a nau. Deixou-
lhes também pão de biscoito para um ano, vinho e muita
munição, e o barco da nau para que eles, na maioria
marinheiros, fossem, quando vissem que lhes convinha,
descobrir as minas de ouro, e um lugar onde se fundasse
uma aldeia, porque aquilo ali não era porto de seu agrado.
Deixou-lhes também sementes para plantar, e seus oficiais,
escrivão e meirinho, e um carpinteiro de naus e calafate, e
um bom bombardeiro, que entende bem de máquinas, e um
tanoeiro, um físico e um alfaiate, e diz que todos são bons
conhecedores do mar.

Quinta, 3 de janeiro. - Não partiu hoje porque diz que
ontem à noite vieram índios das ilhas querendo ir junto,
avisando que outros chegariam com suas mulheres ao raiar
do dia. O mar também estava meio agitado e o barco não
pôde ficar na margem; decidiu partir amanhã, com a graça
de Deus. Disse que, se tivesse consigo a caravela Pinta, com
certeza levaria um tonel de ouro, porque então ousaria
seguir pelas costas dessas ilhas, o que não se arriscava a fazer
sozinho, para que não lhe sucedesse alguma inconveniência
que impedisse sua volta a Castela e o relatório que devia
entregar aos Soberanos sobre todas as coisas que tinha
descoberto. E, se fosse verdade que a caravela Pinta tivesse
chegado em segurança na Espanha com Martin Alonso
Pinzón, disse que não deixaria de fazer o que pretendia; mas
como não sabia notícias dele, e porque se estiver lá poderá
contar mentiras aos Soberanos, para que não lhe imponham
a pena que merecia por tantos males que cometera e
cometia ao afastar-se sem licença, prejudicando o transporte
de bens que se poderiam levar e descobrir desta vez, diz o
Almirante, confiava que, se Nosso Senhor lhe desse bom
tempo, se poderia arrumar tudo.

Sexta, 4 de janeiro. - Ao raiar do dia, levantou âncora com
pouco vento e o barco à proa. Navegou assim a leste, rumo a
um morro bem alto que dava impressão de ser ilha, mas não
era, porque tem uma parte de terra muito baixa, em forma
de belíssimo pavilhão de campanha, que denominou de
"Monte Cristi". Neste dia, por causa da escassez de vento,
não conseguiu fazer seis léguas e chegar ao Monte Cristi.
Deu a volta ao mar para afastar-se dos vários baixios e
restingas que tem por lá, onde ficou a noite inteira. O
Almirante avisa a quem quiser ir até à Aldeia de la Navidad,
ou conhecer Monte Cristi, para se manter no mar a uma
distância de duas léguas.

Sábado, 5 de janeiro. - Quando o sol já queria sair, soltou
velas com o terral. Depois de Monte Cristi, ao leste, viu um
cabo a vinte e quatro milhas, que chamou de "Cabo del
Becerro". Depois avistou, a leste, uma terra que parecia
outro morro, regulando com o Cristi em tamanho e beleza.
E dali, à quarta do leste a nordeste, não se diria tão alta, e
distaria mais ou menos cem milhas.

Domingo, 6 de janeiro. - Depois do meio-dia ventou forte
do leste. Mandou um marinheiro subir no alto do mastro
para olhar os baixios, e viu aproximar-se a caravela Pinta
com a popa a leste, e chegou até ao Almirante; e como não
tinha onde ancorar nas águas rasas, voltou a Monte Cristi,
retrocedendo as dez léguas que percorrera, e a Pinta com
ele. Veio Martin Alonso Pinzón à caravela Niña, onde
viajava o Almirante, para se desculpar, dizendo que tinha se
afastado dele sem sua determinação, oferecendo razões para
isso; mas o Almirante afirma que eram todas falsas, e que
havia desaparecido naquela noite em que se afastara dele
com muita presunção e cobiça, e que não sabia (diz o
Almirante) de onde lhe tinham vindo as arrogâncias e a
desonestidade que usara com ele nessa viagem, as quais o
Almirante quis dissimular, para não dar ensejo às más obras
de Satanás, que desejava impedir essa viagem como até
então fizera, mas que um índio, dos que o Almirante lhe
havia encomendado, lhe informara que numa ilha chamada
"Baneque" existia muito ouro, e como tinha o navio leve e
veloz, quis se afastar e ir sozinho, abandonando o
Almirante. Depois que Martin Alonso foi até à ilha Baneque,
diz que não encontrou ouro nenhum, e que se veio até à
costa da Espanhola foi por informação de outros índios, que
lhe afirmaram que nessa ilha, que chamam de "Bohio",
existiam grande quantidade de ouro e muitas minas, e por
esse motivo chegou muito perto da Aldeia de la Navidad.

Segunda, 7 de janeiro. - Hoje fez tirar a água que estava
entrando na caravela e os marinheiros foram buscar lenha, e
diz que encontraram muitas aroeiras e aloés.

Terça, 8 de janeiro. - Por causa do vento leste e sudeste,
que soprava hoje muito forte, não partiu e por isso mandou
que se guarnecesse a caravela de água e lenha e de tudo o
que fosse necessário para o resto da viagem, embora tivesse
vontade de costear todo o contorno dessa ilha Espanhola,
percorrendo a rota que pudesse. Convém, porém, saber que
os comandantes que colocou nas caravelas eram irmãos,
Martin Alonso Pinzón e Vicente Yánez. E muitos outros
que o seguiam com arrogância e cobiça, julgando que tudo
lhes pertencia, sem levar em conta a honra que o Almirante
lhes havia feito e dado, não haviam obedecido e não
obedeciam as suas ordens; pelo contrário, faziam e diziam
muitas coisas que não deviam contra ele, sendo que Martin
Alonso desapareceu desde o dia 21 de novembro até 6 de
janeiro sem nenhuma causa ou motivo, apenas por
desobediência. E tudo isso o Almirante havia sofrido em
silêncio para levar a viagem a bom termo. Assim que, para se
afastar de tão má companhia, com quem diz que cumpria
disfarçar, embora fosse gente desregrada (e afirma que leva
consigo muitos homens de bem, mas que não era hora de
tratar de castigo), resolveu voltar e não parar mais, com a
maior pressa que lhe fosse possível. Entrou no barco e foi
até ao rio, que fica ali ao lado, para o sul-sudoeste do Monte
Cristi uma grande légua, aonde os marinheiros iam buscar
água para o navio, e descobriu que a areia da foz do rio era
diz que toda cheia de ouro e em tal quantidade que a gente
se maravilhava. Deu ao rio o nome de "Rio dei Oro". Diz
mais o Almirante: que não quis pegar a dita areia que
continha tanto ouro, pois Suas Majestades já tinham tudo em
casa e às portas de sua Aldeia de la Navidad, e sim apressar-
se a levar-lhes as notícias e livrar-se da má companhia que
tinha e que, como sempre havia dito, era gente desregrada.

Quarta, 9 de janeiro. - À meia-noite levantou as velas com
o vento sudeste e navegou para o lés- nordeste; chegou a
uma ponta que chamou de "Punta Roja". E a seu abrigo
ancorou à tarde, que seriam umas três horas antes do
anoitecer. Nessa terra toda há muitas tartarugas, que os
marinheiros capturaram em Monte Cristi, quando vinham
desovar em terra, e eram enormes, feito grandes escudos de
madeira. Ontem, quando o Almirante ia ao Rio del Oro, diz
que viu três sereias que saltaram bem alto, acima do mar,
mas não eram tão bonitas como pintam, e que, de certo
modo, tinham cara de homem.
Quinta, 10 de janeiro. — Saiu de onde havia ancorado, e
ao pôr-do-sol chegou a um rio, que denominou de "Rio de
Gracia". No seu interior é bom porto fechado, só que com
muita neblina, e dali tinha partido a caravela Pinta,
comandada por Martin Alonso, muito maltratada, porque diz
que passou aí dezesseis dias, quando trocaram muito ouro,
que era o que Martin Alonso queria. O qual, depois que
soube pelos índios que o Almirante estava na costa da
mesma ilha Espanhola e que não podia errar de direção, veio
ao seu encontro. E diz que queria que toda a tripulação do
navio jurasse que não haviam ficado ali mais que seis dias.
Mas diz que a sua maldade era tão notória que não dava para
disfarçar.

Sexta, 11 de janeiro. - À meia-noite saiu do Rio de Gracia
com o terral; navegou quatro léguas a leste, até chegar a um
cabo que chamou de "Belprado"; e de lá a sudeste está o
morro que denominou "del Plata". Logo avistou o cabo que
cognominou "del Angel". Esse cabo dista quatro léguas de
uma ponta que chamou "del Hierro", e na mesma rota, a
quatro léguas, existe outra que recebeu o nome de "Punta
Seca"; e dali, pela mesma rota, a seis léguas mais além, fica o
cabo que chamou de "Redondo"; e de lá, para o leste, se
encontra o cabo "Francês". A uma légua dali fica o "Cabo del
Buen Tiempo"; desse, ao sul quarta do sudeste, há um cabo
que chamou de "Talhado". Hoje fez um grande percurso,
porque o vento e as correntes lhe foram favoráveis.

Sábado, 12 de janeiro. - Faltando um quarto para
amanhecer, navegou ao leste e andou assim até o raiar do
dia. Dali avistou terra ao sul e dirigiu-se para lá; viu um cabo
que chamou de "do Pai e do Filho", porque na ponta do lado
leste tem dois promontórios, um maior do que o outro.
Prosseguiu em sua rota até deparar com o cabo bem alto e
muito bonito, todo talhado de pedra, ao qual deu o nome de
"Apaixonado", o qual se situava a leste de um porto muito
amplo, que denominou de "Sagrado", e logo descobriu outro,
belíssimo.

Domingo, 13 de janeiro. — Não conseguiu sair desse
porto por falta de terral que lhe permitisse sair. Enviou o
barco à terra, numa bonita praia, para que buscassem alhos
para comer, e encontraram alguns homens com arcos e
flechas, com os quais se pararam a conversar, e lhes
compraram dois arcos e várias flechas, pedindo a um deles
que fosse falar com o Almirante na caravela; e ele veio, e diz
que era bem disforme de semblante, mais que os outros até
agora vistos. Tinha o rosto todo tisnado de carvão, ao passo
que em todos os lugares costumam pintar-se de várias cores.
Usava os cabelos bem compridos, apertados e amarrados na
nuca, e depois presos por uma redinha de penas de papagaio,
e andava nu como os demais. O Almirante achou que
deviam ser um dos caribes, que são antropófagos . Mandou
dar-lhe comida e o presenteou com pedaços de pano verde e
vermelhos e miçangas, de que gostam muito, e tornou a
enviá-lo à terra, pedindo-lhe que trouxesse ouro, se
houvesse, no que acreditava, a julgar por algumas coisas que
usava. Ao chegar o barco à terra, cerca de cinqüenta e cinco
homens nus estavam atrás das árvores, com os cabelos bem
compridos, tal como as mulheres usam em Castela. Presos à
nuca traziam penachos de penas de papagaio e de outros
pássaros e cada um empunhava o seu arco. O índio mal-
encarado desembarcou e fez com que os outros largassem
arcos e flechas, e um pedaço de pau que parece um (...) ,
bem pesado, que utilizam no lugar da espada. Depois
aproximaram-se do barco e a tripulação saltou em terra e
começou a comprar-lhes os arcos, as flechas e as outras
armas, tal como o Almirante tinha recomendado. Vendidos
dois arcos, não quiseram trocar mais nada; em vez disso, se
prepararam para investir contra os cristãos e prendê-los.
Foram correndo pegar seus arcos e flechas onde os tinham
guardados e voltaram com cordas nas mãos para, segundo
parece, amarrar os cristãos. Vendo que vinham em sua
direção, estando já os cristãos prevenidos, porque o
Almirante sempre alertava sobre esse risco, investiram
contra eles, desfechando uma grande punhalada nas nádegas
de um índio, e abrindo no peito de outro uma espécie de
flechada, quando os agressores que tinham poucas
possibilidades de sair vencedores, embora os cristãos fossem
apenas sete e eles cinqüenta e tantos, saíram fugindo até não
restar mais nenhum, deixando as flechas e os arcos caídos
por tudo quanto é lado . Diz que os cristãos teriam matado
uma porção, se o piloto que os chefiava não impedisse.
Regressaram logo à caravela com seu barco e, informado o
Almirante do ocorrido, disse que por um lado lhe causava dó
e por outro não, pois é bom que sintam medo dos cristãos,
porque sem dúvida (diz ele) consta que o povo desse lugar é
malfeitor. E acreditava que fossem do Caribe e antropófagos,
de modo que, se aparecesse por ali o barco que deixou com
os trinta e nove homens na fortaleza e Aldeia de la Navidad,
ficassem com medo de lhes fazer mal.

Segunda, 14 de janeiro. - Esta noite queria enviar
emissários para revistar as casas e capturar alguns daqueles
índios, crendo que fossem caribes, e para aproveitar o forte
leste e nordeste que soprava e as ondas grandes levantadas
pelo mar; mas, já de dia, viram muitos índios na praia, e por
isso o Almirante mandou que o barco fosse até lá levando
tripulantes bem armados; e logo todos se aproximaram da
popa do barco, tendo à frente o índio que na véspera tinha
vindo à caravela e o Almirante lhe havia dado presentes.
Com ele diz que estava um cacique, que havia dado ao
mesmo índio umas miçangas para que oferecesse aos do
barco em sinal de confiança e de paz. Esse cacique, com três
vassalos, entrou no barco e os quatro se dirigiram à caravela.
O Almirante mandou dar-lhes biscoito com mel e
presenteou o cacique com um gorro vermelho e miçangas,
dando aos outros também pedaços de pano. O cacique então
disse que amanhã vai trazer uma máscara de ouro, afirmando
que ali existia muito, assim como no Caribe e em Matinino .
Depois voltaram bem contentes para a terra. Diz mais o
Almirante: que as caravelas vazam muita água pela quilha e
queixa-se muito dos calafates que em Palos as calafetaram
muito mal e que, quando viram que o Almirante havia
percebido o defeito de sua obra e quis obrigá-los a consertá-
la, fugiram; mas, não obstante a grande quantidade de água
que entrava nas caravelas, confia em Nosso Senhor, que o
trouxe até aqui e com sua piedade e misericórdia há de levá-
lo de volta, que bem sabia Sua Augusta Majestade quanta
controvérsia teve que enfrentar antes que pudesse partir de
Castela, que ninguém foi mais a seu favor do que Ele, porque
Ele conhecia o seu coração, e, depois de Deus, Suas
Majestades; todos os demais se mostraram contrários sem o
menor motivo. E ainda diz mais, assim: "... e foram a causa
da Coroa Real de Vossas Majestades não ter cem contos de
renda a mais do que a que tem depois que vim servir-vos,
que agora farão sete anos nos vinte dias de janeiro deste
mesmo mês, e mais o que será doravante acrescentado. Mas
Deus poderoso certamente haverá de remediar tudo isso".
Foram essas as suas palavras.

Terça, 15 de janeiro. - Diz que quer partir porque já não
vê nenhuma vantagem em se demorar, por terem passado
aqueles transtornos (deve estar referindo-se ao escândalo
dos índios). Diz também que hoje ficou sabendo que toda a
força do ouro se concentra na região da Aldeia de la
Navidade, pertencente a Suas Majestades, e que na ilha de
Caribe e em Matinino há muito cobre, apesar que será difícil
em Caribe, pois consta que a população é antropófaga. Dali
podia-se avistar a ilha deles e estava decidido a ir até lá, pois
fica no caminho, e à de Matinino (que aquele índio lhe disse
que era uma ilha toda povoada por mulheres sem homens),
e ver tanto uma como outra, para capturar, diz, alguns deles.
O Almirante enviou o barco à terra, mas o cacique local não
havia aparecido, porque diz que o povoado fica longe; mas
enviou sua coroa de ouro, como tinha prometido, e
apareceram muitos outros homens com algodão e com pão
de alho, todos de arco e flecha em punho. Depois que troca-
ram tudo, vieram quatro jovens à caravela; e pareceu ao
Almirante que conheciam perfeitamente todas as ilhas que
ficavam ao leste, no mesmo caminho que pretendia seguir, a
tal ponto que resolveu levá-los consigo para Castela. Ali diz
que não havia ferro nem qualquer outro metal que se tivesse
visto, embora não se possa conhecer direito uma terra em
poucos dias, tanto pela dificuldade da língua, que o
Almirante não entendia, comunicando-se com eles por
gestos, como também porque não sabiam o que ele
pretendia em tão pouco tempo. Diz que os arcos dessa gente
eram do tamanho dos da França e Inglaterra; as flechas são
iguais às lanças dos outros habitantes que encontrara até
então, feitas dos talos de cana-de-açúcar quando estão
germinando, que ficam bem retos e do comprimento de
uma vara e meia ou duas, e depois põem no cabo um pedaço
de pau pontiagudo de um palmo e meio, e em cima desse
pauzinho alguns engastam um dente de peixe e outros um
pouco de erva, e não atiram como em outros lugares, a não
ser de uma certa maneira que não pode provocar ferimentos
graves. Ali havia algodão em quantidade, bem fino e longo,
e muitas aroeiras, além de ouro e cobre. Tem também muito
pimentão, que é a pimenta local, superior à nossa, e todo
inundo só come com ele, que acham muito saudável: daria
para se carregar cinqüenta caravelas por ano só nessa
Espanhola. Diz que encontrou muita erva nessa baía, igual à
que acharam no Golfo quando vinha para o descobrimento,
e por isso acredita que existam ilhas ao leste até em linha
reta a partir do lugar onde começou a achá-las; pois tem
certeza de que essa erva nasce em águas rasas junto à terra, e
diz que, se for assim, estas índias estão muito próximas das
Canárias, e por esse motivo acredita que não distem mais de
quatrocentas léguas.

Quarta, 16 de janeiro. - Partiu três horas antes de
amanhecer do Golfo que denominou "das Flechas", primeiro
com vento terral, depois com vento oeste, levando a proa ao
leste quarta do nordeste para ir diz que à ilha de Caribe,
onde se encontra a população de quem todas essas ilhas e
terra tanto medo demonstram, pois consta que com
inúmeras canoas percorrem todos estes mares, comendo os
homens que conseguem capturar. A rota diz que lhe havia
sido mostrada por uns índios, daqueles quatro que pegou
ontem no Porto das Flechas. Depois de ter percorrido, a seu
ver, setenta e quatro milhas, os índios indicaram que a ilha
ficava a sudeste: quis seguir por esse caminho e mandou
temperar as velas; e, depois de ter percorrido duas léguas, o
vento refrescou, ficando muito bom para ir para a Espanha.
Notou que a tripulação começou a entristecer por desviar-se
do caminho em linha reta, por causa da quantidade de água
que entrava em ambas caravelas, e por não terem nenhum
remédio, a não ser o da Providência Divina. Teve que deixar
a rota que achava que conduzia à ilha e voltou ao rumo em
linha reta para a Espanha, e assim andou até o pôr-do-sol
quarenta e oito milhas, o que vem a dar doze léguas. Os
índios lhe disseram que por essa via acharia a ilha de
Matinino, e o Almirante bem que gostaria para levar diz que
cinco ou seis dessas mulheres aos Reis; mas duvidava que os
índios conhecessem direito a rota, e não podia demorar-se,
pelo perigo da água que entrava nas caravelas; mas diz que
era certo que existiam, e que a determinada altura do ano
apareciam por ali homens da ilha de Caribe, e assim, se elas
pariam filhos, mandavam para a ilha dos homens, e se
fossem meninas, deixavam para se criarem por lá mesmo.
Depois de perder de vista o cabo que chamou de "São
Téramo", na ilha Espanhola, percorreu doze léguas a oeste
quarta do nordeste. Fazia então muito bom tempo.

Quinta, 17 de janeiro. - Ontem, ao pôr-do-sol, o vento
diminuiu bastante; deve ter andado quatorze ampulhetas,
cada uma tendo meia hora ou pouco menos, até ao render
do primeiro quarto; e deve ter percorrido quatro milhas por
hora, o que eqüivale a vinte e oito. Depois o vento
aumentou e andou assim todo aquele quarto, que deu dez
ampulhetas; e depois mais seis, até o nascer do sol, a oito
milhas por hora; assim deve ter percorrido oitenta e quatro
milhas ao todo, o que equivale a vinte e uma léguas a
nordeste quarta de leste, e até ao pôr-do-sol percorreria mais
de quarenta e quatro milhas, o que vem a dar onze léguas a
leste. Aí apareceu um alcatraz na caravela e depois outro, e
viu muitas algas, do tipo que surge no mar.
Sexta, 18 de janeiro. - Navegou com pouco vento esta
noite, acontecendo o mesmo depois do nascer do dia.
Apareceram algas esparsas na superfície do mar; diz, porém,
que ontem e hoje as águas estiveram apinhadas de atum, e o
Almirante achou que dali decerto iam parar nas almadrabas
do Duque de Conil e de Cádiz. Por uma ave que se chama
rabiforcada, que andava em volta da caravela e depois
desapareceu rumo ao sudeste, o Almirante achou que havia
ilhas por lá. E a lés-oeste da ilha Espanhola disse que ficavam
as ilhas de Caribe e de Matinino, além de muitas outras mais.

Sábado, 19 de janeiro. - Hoje de noite percorreu
cinqüenta e seis milhas ao norte quarta do nordeste e
sessenta e quatro ao nordeste quarta do norte. Depois que o
sol raiou, navegou a nordeste, devendo ter percorrido
oitenta e quatro milhas. Viu o mar coalhado de pequenos
atuns; houve pelicanos, rabos-de-palha e alcatrazes.

Domingo, 20 de janeiro. - O vento se acalmou esta noite,
de vez em quando soprava ainda de leve, permitindo que
percorresse ao todo vinte milhas a nordeste. Viu uma
infinidade de pequenos atuns; diz que o ar é muito doce e
suave, como em Sevilha por volta de abril ou maio, e o mar,
segundo ele, sempre bem liso, graças a Deus. Alcatrazes,
pintarroxos e muitas outras aves apareceram.

Segunda, 21 de janeiro. - Ontem, já com o sol posto, deve
ter feito oito milhas por hora até à meia-noite, o que daria
cinqüenta e seis milhas. Depois andou a nor-nordeste a oito
milhas por hora, completando assim, em toda a noite, cento
e quatro milhas. Ao amanhecer, navegou a nor-nordeste,
com o mesmo vento leste, e andou oitenta e oito milhas em
onze horas que tinha o dia, o que equivale a vinte e uma
léguas, descontando uma que perdeu porque encostou na
caravela Pinta para falar com o comandante. Achou o ar
mais frio e pensa, segundo diz, que vai tornar-se cada vez
mais frio à medida que se aproximarem do norte, e também
por serem as noites mais longas devido ao estreitamento da
esfera. Apareceram vários rabos de palha, pintarroxos e
outras aves; mas não tantos peixes, diz que por ser a água
mais fria. Viu uma porção de algas.

Terça, 22 de janeiro. - Ontem, já com o sol posto,
navegou a nor-nordeste com vento leste, impelido de
sudeste; fez oito milhas por hora até se passarem cinco
ampulhetas, e três antes que se iniciasse a guarda, o que
equivalia a oito ampulhetas. De modo que percorreram
setenta e duas milhas, o que vem a dar dezoito léguas.
Depois andou à quarta do nordeste a norte seis ampulhetas,
o que daria outras dezoito milhas. E quatro ampulhetas da
segunda guarda a nordeste, seis milhas por hora, o que
equivale a três léguas a nordeste. E, até o raiar do dia, a lés-
nordeste onze ampulhetas, seis milhas por hora. Depois a
lés-nordeste, até às onze horas da manhã, trinta e duas
milhas. E assim diminuiu o vento e não navegou mais. Os
índios nadaram. Viram rabos-de-palha e muitas algas.

Quarta, 23 de janeiro. - Esta noite houve muitas
mudanças nos ventos; considerando tudo e levando em
conta as precauções que os bons marinheiros costumam e
devem tomar, diz que percorreu durante a noite oitenta e
quatro milhas, o que vem a dar vinte e uma léguas. Muitas
vezes tinham que esperar pela caravela Pinta, que andava
mal de bolina, recorria pouco à mezena, porque o mastro
não prestava; e diz que se o seu comandante, Martin Alonso
Pinzón, tivesse tido o cuidado de se munir de um bom
mastro nas Índias, onde havia tantos de tudo quanto era es-
pécie, com a mesma cobiça com que se afastara dele,
pensando em abarrotar de ouro o navio, estaria em melhor
situação.
Surgiram vários rabos-de-palha e muitas algas; o céu esteve
completamente nublado todos estes dias; mas não havia
chovido e o mar mantinha-se sempre bem liso, feito um rio,
graças a Deus. Depois que o sol saiu, percorreu, sem
impedimento, a nordeste boa parte do dia, trinta milhas, o
que vem a dar sete léguas e meia, e depois o resto andou a
lés-nordeste outras trinta, o que equivale a sete léguas e
meia.

Quinta, 24 de janeiro. — Navegou esta noite toda,
considerando as diversas mudanças de vento a nordeste,
quarenta e quatro milhas, o que equivale a onze léguas. Do
raiar do dia até o pôr-do-sol, percorreu quatorze léguas a lés-
nordeste.

Sexta, 25 de janeiro. - Navegou hoje, a lés-nordeste, uma
parte da noite, que representou treze ampulhetas, nove
léguas e meia; depois, andou a nor-nordeste outras seis
milhas.
Tendo feito sol o dia todo, porque diminuiu o vento, andou
vinte e oito milhas a lés-nordeste. Os marinheiros mataram
uma toninha e um enorme tubarão, e diz que foi mesmo
preciso, porque as únicas coisas que ainda tinham para se
alimentar eram pão e vinho e alhos das índias.

Sábado, 26 de janeiro. - Hoje à noite andou cinqüenta e
seis milhas a leste. Depois que amanheceu, navegou às vezes
a lés-oeste e às vezes a sudeste; percorreu quarenta milhas
até às onze horas da manhã. Depois andou à relinga vinte e
quatro milhas a norte.

Domingo, 27 de janeiro. — Ontem, depois do pôr-do-sol,
fez cinco milhas por hora e, em treze horas, andou sessenta
e cinco. Depois que amanheceu, percorreu vinte e quatro
milhas a nordeste e daí até o pôr-do-sol andou três léguas a
lés-nordeste.

Segunda, 28 de janeiro. - Navegou a noite inteira a lés-
nordeste e percorreu trinta e seis milhas. Depois de raiar o
dia, andou até à hora do pôr-do-sol vinte milhas a lés-
nordeste. Achou o clima temperado e brando. Viu rabos-de-
palha, pintarroxos e algas em profusão.

Terça, 29 de janeiro. - Navegou a lés-nordeste e
percorreu à noite, com o sul e sudeste, trinta e nove milhas.
No dia todo andou oito léguas. Os ares muito temperados,
como em abril em Castela; o mar muito liso; peixes que
chamam de "dourados" vieram a bordo.
Quarta, 30 de janeiro. - Durante a noite toda percorreu
sete léguas a lés-nordeste. De dia navegou treze léguas e
meia ao sul. Viu rabos-de-palha, muitas algas e toninhas.

Quinta, 31 de janeiro. — Hoje de noite navegou trinta
milhas ao norte e depois trinta e cinco ao nordeste. Ao
amanhecer, percorreu treze léguas e meia ao lés-nordeste.
Viram rabos-de-palha e pintarroxos.

Sexta, 1º de fevereiro. - Esta noite percorreu dezesseis
léguas e meia ao lés-nordeste. De dia andou vinte e nove
léguas e um quarto na mesma direção; o mar estava bem
liso, graças a Deus.

Sábado, 2 de fevereiro. — Andou quarenta milhas ao lés-
nordeste nesta noite. De dia, com o mesmo vento pela popa,
fez sete milhas por hora; de maneira que, em onze horas,
andou setenta e sete milhas; o mar continuou bem liso,
graças a Deus, e os ares muito suaves. Viram as águas tão
atulhadas de algas que, se não tivessem visto, temeriam que
fossem baixios. Avistaram pintarroxos.

Domingo, 3 de fevereiro. - Nesta noite, indo a popa com
o mar bem liso, graças a Deus, navegaram vinte e nove
léguas. Apareceu-lhe a estrela do Norte, muito alta, como no
Cabo de São Vicente. Não pôde calcular a altura com o
astrolábio nem com o quadrante, porque a onda não
permitia. De dia se manteve na rota, ao lés-nordeste, e fez
dez milhas por hora, e assim, em onze horas, andou umas
vinte e sete léguas.
Segunda, 4 de fevereiro. - Esta noite navegou ao leste
quarta do nordeste; uma parte fez doze milhas por hora e
outra dez, e assim percorreu cento e trinta milhas, o que
vem a dar trinta e duas léguas e meia. O céu esteve muito
nublado e chuvoso e fez bastante frio, e por isso diz que
percebeu que não tinha chegado à ilha dos Açores. Com o
sol já alto, mudou de rumo e dirigiu-se para o leste. Andou,
durante o dia inteiro, setenta e sete milhas, o que equivale a
dezenove léguas e um quarto.

Terça, 5 de fevereiro. - Esta noite navegou ao leste; andou
ao todo cinqüenta e quatro milhas. Durante o dia fez dez
milhas por hora, e assim, em onze horas, completou cento e
dez milhas. Viram pintarroxos e gravetos, sinal de que
estavam perto de terra.

Quarta, 6 de fevereiro. - Navegou ao leste durante a
noite; fez onze milhas por hora. Em treze horas noturnas
percorreu cento e quarenta e três milhas. De dia fez
quatorze milhas por hora e assim, ao todo, navegou cento e
cinqüenta e quatro milhas; de maneira que foram, entre dia
e noite, setenta e quatro léguas, mais ou menos. Vicente
Yánez disse hoje de manhã que a ilha das Flores ficava ao
norte e a da Madeira a leste. Roldán opinou que a ilha do
Faial ou a de São Gregório estava ao nor-nordeste e o Porto
Santo a leste. Apareceu uma porção de algas.

Quinta, 7 de fevereiro. — Navegou esta noite a leste; fez
dez milhas por hora e assim, em treze horas, percorreu
cento e trinta milhas. De dia, oito milhas por hora; em onze
horas, oitenta e oito milhas. Hoje de manhã o Almirante
estava a sessenta e cinco léguas de distância ao sul da ilha das
Flores, e o piloto Pedro Alonso, indo para o norte, passava
entre a Terceira e a de Santa Maria, e a leste passava a
barlavento da ilha da Madeira, a doze léguas do lado norte.
Os marinheiros viram um tipo de alga diferente da anterior,
da qual existe muito na ilha dos Açores. Depois apareceu
outra vez da anterior.

Sexta, 8 de fevereiro. - Esta noite fez, durante certo
tempo, três milhas por hora rumo a leste, e depois andou à
quarta de sudeste; percorreu a noite inteira doze léguas ao
todo. Ao amanhecer, andou vinte e sete milhas até o meio-
dia; depois, até o pôr-do-sol, outras tantas.

Sábado, 9 de fevereiro. - Uma parte desta noite andou
três léguas ao sul-sudeste: depois ao sul quarta do sudeste;
depois ao nordeste, até às dez horas da manhã, outras cinco
léguas, e depois, até à noite, andou nove léguas ao leste.

Domingo, 10 de fevereiro. — Depois do pôr- do-sol
navegou cento e trinta milhas ao leste a noite inteira; de dia,
até escurecer, fez nove milhas por hora, e assim percorreu,
em onze horas, cerca de noventa e nove milhas.
Na caravela do Almirante, Vicente Yánez e os pilotos
Sancho Ruiz, Pedro Alonso Nino e Roldán marcavam a
posição nos mapas e todos, segundo suas cartas geográficas,
se localizavam muito adiante das ilhas dos Açores ao leste, e,
navegando ao norte, nenhum chegava à ilha de Santa Maria,
a última do arquipélago dos Açores. Pelo contrário, estariam
cinco léguas à frente, ou se encontrariam na região da ilha
da Madeira ou no Porto Santo. Mas o Almirante tinha-se
desviado muito do rumo, achando-se bem mais atrás do que
eles, porque esta noite a ilha das Flores lhe ficava ao norte, e
a leste ia à procura de Nefe, na África, passando a barlavento
da ilha da Madeira do lado norte. De forma que estavam
cento e cinqüenta léguas mais perto de Castela do que o
Almirante. Diz que, com a graça de Deus, assim que
avistarem terra se saberá quem tem razão. Diz aqui também
que antes havia percorrido duzentas e sessenta e três léguas,
a partir da ilha do Ferro, antes de aparecerem as primeiras
algas etc.

Segunda, 11 de fevereiro. — Durante a noite fez doze
milhas por hora, mantendo-se na rota, e assim, ao todo,
contou trinta e nove léguas e, durante o dia, navegou
dezesseis léguas e meia. Viu muitas aves, deduzindo daí estar
próximo à terra.

Terça, 12 de fevereiro. — Navegou a leste a seis milhas
por hora a noite inteira e percorreu, até o amanhecer,
setenta e três milhas. Aqui o mar começou a se agitar muito
e a se formar um temporal; e se a caravela, segundo ele, não
fosse muito boa e bem aparelhada, teria medo de se perder.
De dia andou onze ou doze léguas, a caro custo e perigo.

Quarta, 13 de fevereiro. - Depois do pôr-do-sol até
clarear o dia, teve grande trabalho com o vento, o mar mui
revolto e o temporal; relampejou três vezes a nor-nordeste;
disse que era sinal de grande tempestade que teria que vir
daquele lado ou do seu contrário. Andou a mastro pelado
durante a maior parte da noite; depois soltou um pouco as
velas e percorreu cinqüenta e duas milhas. De dia o vento
diminuiu bastante; mas logo aumentou de novo e o mar
ficou terrível e se entrecruzavam as ondas que atormentam
os navios. Percorreu cinqüenta e cinco milhas.

Quinta, 14 de fevereiro. — À noite o vento aumentou e
as ondas eram espantosas, umas de encontro às outras, que
se entrecruzavam e dificultavam o avanço do navio, que não
podia seguir adiante nem sair do meio delas, para que ao
menos conseguisse fugir; andou assim três horas e percorreu
vinte milhas. O mar e o vento se intensificavam; e, vendo o
perigo grande, começou a navegar à popa, para onde o vento
o levasse, pois não havia alternativa. A caravela Pinta, onde
viajava Martin Alonso, começou então também a navegar, e
desapareceu, embora o Almirante tivesse passado a noite
inteira a colocar lampiões, sem que o outro respondesse; até
que parece que não pôde mais por causa da força do
temporal e porque essa caravela se achava muito fora da rota
do Almirante.
Andou esta noite cinqüenta e quatro milhas ao nordeste,
quarta de leste. Com o raiar do dia o vento aumentou e o
entrecruzar das ondas ficou mais terrível ainda; o papafigo ia
sozinho e baixo para que o navio saísse do ponto em que se
entrecruzavam, para que não o afundassem. Andava no
rumo do lés-nordeste e depois à quarta para o nordeste;
navegou seis horas assim e fez nelas sete léguas e meia. O
Almirante determinou que se sorteasse um romeiro para ir à
Santa Maria de Guadalupe levando um círio de cinco libras
de cera e que todos fizessem um voto para que o
contemplado cumprisse a promessa; para isso mandou trazer
uma quantidade de grãos-de-bico igual ao número de
pessoas que viajava no navio, fez com a faca uma cruz num
deles, e depois todos misturou dentro de um boné. O
primeiro a enfiar a mão foi o próprio Almirante, a quem
coube o grão-de-bico marcado, recaindo-lhe assim o
compromisso de ir, como romeiro, cumprir a promessa.
Tirou-se outra vez a sorte para escolher um romeiro que
fosse à Santa Maria de Loreto, situada na marina de Ancona,
terra do Papa, e que é casa onde Nossa Senhora fez e faz
muitos e grandes milagres; e ela recaiu sobre um marinheiro
de Porto de Santa Maria chamado Pedro de Villa, a quem o
Almirante prometeu custear as despesas. Ficou resolvido que
se mandaria outro romeiro para velar uma noite em Santa
Clara de Moguer, a fim de mandar rezar uma missa. Para isso
tornaram a sortear os grãos-de-bico com aquele marcado
pela cruz, e a sorte recaiu, mais uma vez, sobre o Almirante.
Depois disso, o Almirante e toda a tripulação fizeram
promessa de, ao chegar à primeira terra, irem todos de
camisola, em procissão, rezar numa igreja dedicada a Nossa
Senhora.
Além das promessas gerais ou comuns, cada um fazia outra
em particular, pois ninguém contava escapar com vida,
considerando-se todos já como perdidos, por causa da
terrível tempestade que enfrentavam. Ajudava a aumentar o
perigo o fato de o navio viajar com falta de lastro, por ter-se
aliviado da carga, os mantimentos tendo sido consumidos, a
água e o vinho bebidos; e o Almirante, por causa do tempo
favorável encontrado entre as ilhas, não se lembrou de
supri-lo, adiando para mandá-lo lastrar na ilha das Mulheres,
aonde pretendia ir. A solução que achou para o problema,
quando puderam usá-la, foi a de encher os barris de água e
vinho, que traziam vazios, com água do mar; e desse modo
salvaram a situação.
Escreve aqui o Almirante as causas que lhe davam receio de
que Nosso Senhor não quisesse se fazer sentir e outras que
lhe infundiam a esperança de que Deus havia de levá-lo são
e salvo para que não perecessem as noticias que queria
transmitir aos Soberanos. Parecia-lhe que o grande desejo
que tinha de levar essas boas novas, e mostrar que tinha
acertado no que havia dito e se comprometido a descobrir, o
deixava com o medo enorme de não consegui-lo, e diz que
até um mosquito conseguia perturbar e impedir. Atribui isso
à sua pouca fé e falta de confiança na Divina Providência.
Confortavam-no, em compensação, as graças que Deus lhe
concedera ao proporcionar-lhe tantas vitórias, descobrindo
o que descobrira e atendendo a todos os seus desejos, depois
de ter passado muitas adversidades e aborrecimentos nas
antecâmaras administrativas de Castela. E, como antes já
tivesse posto o seu objetivo e entregue todo o seu
empreendimento nas mãos de Deus, que soubera escutar e
ter dado tudo o que lhe pedira, devia acreditar que cumpriria
o que tinha começado, levando-o até à salvação. Ainda mais
que, depois de tê-lo socorrido na ida, quando maior era o
motivo para temer o trabalho de enfrentar os marinheiros e
a tripulação que levava, os quais, sem exceção, estavam
dispostos a se rebelar e insurgir contra ele, fazendo
protestos, e o eterno Deus lhe deu força e valor para
enfrentá-los, e outras coisas verdadeiramente maravilhosas
que Deus lhe mostrara nesta viagem, além daquelas que Suas
Majestades sabiam por pessoas de sua casa; de modo que diz
que não deveria temer a dita tormenta. Mas a fraqueza e
angústia — diz ele — não me deixavam acalmar a alma. Diz
mais, que também sentia muita pena dos dois filhos que
estudavam em Córdoba, pois ficariam órfãos de pai e mãe
em terra estranha, e os Reis, ignorando os serviços que lhes
prestara nessa viagem e as notícias tão auspiciosas que lhes
levava, não se disporiam a socorrê-los. Por isso e para que
Suas Majestades soubessem como Nosso Senhor lhe
concedera vitória em tudo o que desejava nas Índias e,
também, que naquelas paragens não existia nenhuma tor-
menta, o que diz que se pode perceber pelas algas e árvores
que nasceram e cresceram até dentro do próprio mar, e para
que, se se perdesse com aquela tempestade, os Reis tivessem
conhecimento de sua viagem, pegou um pergaminho e nele
escreveu tudo o que pôde do que havia encontrado, rogando
muito a quem o achasse para entregá-lo aos Reis. Enrolou o
pergaminho em pano encerado, muito bem amarrado,
mandou buscar um grande barril de madeira e guardou-o ali,
sem que ninguém soubesse o que era, só que todos
pensaram que fosse alguma devoção; e assim deu ordens
para que o jogassem no mar. Depois, com a chuvarada e os
trovões, o vento mudou para oeste e andou cinco horas só
com o traquete por um mar muito revolto; e duas léguas e
meia ao nordeste. Tinha tirado o papafigo da vela maior, de
medo que alguma onda do mar o levasse inteiro.

Sexta, 15 de fevereiro. - Ontem, depois do pôr-do-sol,
começou a clarear o céu no lado do oeste, mostrando que a
partir daí queria fazer vento. Deu o cutelo à vela maior; as
ondas continuavam altíssimas, embora começassem a
diminuir. Fez a lés-nordeste quatro milhas por hora e em
treze horas noturnas navegaram treze léguas. Depois que
amanheceu avistaram terra; apareceu-lhes pela proa, a lés-
nordeste; alguns diziam que era a ilha da Madeira, outros
pretendiam que fosse a Rocha de Cintra em Portugal, perto
de Lisboa. Irrompeu logo o vento lés-nordeste, pela proa, e
as ondas vinham muito altas, do oeste; entre a caravela e a
terra teria umas cinco léguas. O Almirante, a julgar pela sua
navegação, achava que estava no arquipélago dos Açores e
que aquela era uma das ilhas; os pilotos e marinheiros
opinavam que já era terra de Castela.

Sábado, 16 de fevereiro. - Passou a noite inteira
procurando um bom ancoradouro nesta terra que já se
reconheceu que é uma ilha. Às vezes ia a nordeste, outras a
nor-nordeste, até que saiu o sol, quando fez a volta pelo sul
para chegar à ilha, que já não enxergavam por causa da densa
cerração, e viu pela popa uma outra, a cerca de oito léguas
de distância. Ficou da manhã até à noite dando voltas para
conseguir aproximar-se da terra com o vento forte e as
ondas altas que faziam. Ao rezar a Salve, que é na boca da
noite, alguns avistaram luz a sotavento, parecendo vir da ilha
que ontem avistaram primeiro; e passou a noite inteira a
barlavento, aproximando-se o máximo possível para ver se
divisava, ao amanhecer, alguma das ilhas. Esta noite o
Almirante descansou um pouco, porque desde quarta-feira
não podia dormir e ficava com as pernas dormentes por
estar sempre desabrigado diante do frio, da água e da má
alimentação. Com o raiar do dia, navegou ao sul-sudeste e de
noite chegou à ilha. Por causa da grande cerração reinante,
não pôde verificar qual era.

Segunda, 18 de fevereiro. - Ontem, depois do pôr-do-sol,
andou rodeando a ilha para ver onde poderia ancorar e falar
com alguém. Ancorou com urna âncora que logo perdeu.
Tornou a dar vela e permaneceu a barlavento a noite inteira.
Ao amanhecer, chegou de novo ao lado norte da ilha e
então ficaram sabendo que era Santa Maria, no arquipélago
dos Açores, e lhes mostraram o porto onde tinham que pôr
a caravela; e a população da ilha afirmou que nunca tinha
visto tempestade igual à de quinze dias atrás e que se
admiravam que houvessem escapado; e diz que renderam
muitas graças a Deus e demonstraram muita alegria ante as
notícias de que o Almirante havia descoberto as Índias. Diz
o Almirante que aquela sua navegação tinha sido muito
acertada e que havia se orientado muito bem; que fossem
dadas muitas graças a Nosso Senhor, embora um pouco
prematuras. Mas tinha certeza de que se achava na região
dos Açores e de que aquela era uma das suas ilhas. E diz que
fingiu ter percorrido uma distância maior para desorientar os
pilotos e marinheiros que carteavam, a fim de manter-se
senhor da rota para as Índias, como de fato conseguiu,
porque nenhum deles trazia um rumo certo, motivo pelo
qual ninguém pôde ter absoluta certeza dessa rota para as
Índias.

Terça, 19 de fevereiro. - Depois do pôr-do-sol
apareceram três homens na margem e chamaram. Enviou-
lhes o barco, no qual vieram, com galinha e pão fresco; era
dia de Carnaval, e trouxeram outras coisas mandadas pelo
comandante da ilha, que se chamava João de Castanheda,
dizendo que o conhecia muito e que só por ser de noite não
vinha vê-lo; mas que assim que amanhecesse viria com mais
doces e bebidas, junto com três homens da caravela que
tinham ficado por lá, e que não os enviava por causa do
grande prazer que estava tendo em ouvir as coisas acon-
tecidas durante a viagem. O Almirante ordenou que se
prestassem várias homenagens aos mensageiros e que lhes
aprontassem camas para dormir essa noite, pois já era tarde e
o povoado ficava longe. E como na quinta-feira anterior,
quando se viu angustiado com o temporal, haviam feito as
promessas citadas, de que na primeira terra onde existisse
igreja dedicada à Nossa Senhora saíssem de camisola etc.,
determinou que metade da tripulação fosse cumpri-la numa
capelinha situada à beira-mar feito ermida, e que depois ele
iria com os restantes. Constatando que era terra segura e
confiando na solicitude do comandante e na paz existente
entre Portugal e a Espanha, pediu aos três homens que se
dirigissem ao povoado e mandassem vir um clérigo para lhes
rezar uma missa. Indo os três de camisola, no cumprimento
de sua penitência, e estando em oração, sobreveio sobre eles
todo o povoado, a pé e a cavalo, chefiado pelo comandante,
que prendeu o grupo. Depois, estando o Almirante, sem de
nada desconfiar, à espera do barco para também ir cumprir
sua promessa com o resto da tripulação, quando já eram
onze horas da manhã e, vendo que não voltavam, suspeitou
que tivessem ficado retidos ou que o barco houvesse
quebrado, pois toda a ilha era cercada por penhascos muito
altos. E o Almirante não podia enxergar porque a ermida se
achava atrás de uma ponta. Levantou âncora e deu à vela em
linha reta até ali, onde avistou vários homens a cavalo, que
apearam e entraram armados no barco e vieram até a cara-
vela a fim de prender o Almirante. O comandante levantou-
se no barco e pediu garantias ao Almirante: disse que lhe
dava; mas que novidade era essa, que não enxergava
ninguém de sua tripulação no barco? E acrescentou que
viesse e entrasse na caravela, que faria tudo o que quisesse.
O Almirante pretendia atraí-lo com boas palavras para
depois prendê-lo e recuperar a tripulação, julgando que não
incorria em quebra da palavra espanhola, pois o outro, tendo
lhe oferecido paz e garantias, não havia cumprido a
promessa. O comandante, que diz que vinha com más
intenções, não se fiou em entrar. Vendo que não se
aproximava da caravela, o Almirante pediu-lhe que lhe
explicasse o motivo por que retinha a tripulação, pois que
isso causaria pesar ao Rei de Portugal, e que em terra dos
Reis de Castela os portugueses eram recebidos com muitas
honras e entravam e se sentiam seguros como em Lisboa, e
que os Reis lhe haviam dado carta de recomendação para
todos os soberanos, senhores e homens do mundo, e que
poderia mostrar-lhe se quisesse aproximar-se; e que ele era
Almirante do Oceano e Vice-Rei das Índias, agora
pertencentes a Suas Majestades, como comprovaria pelas
provisões assinadas por eles e lacradas com seus timbres, os
quais lhe mostrou de longe, e que os Reis devotavam muito
amor e amizade ao Rei de Portugal e o haviam ordenado a
prestar todas as homenagens que pudesse aos navios
portugueses que encontrasse, e que, uma vez que se
recusava a devolver-lhe a tripulação, nem por isso deixaria
de seguir viagem para Castela, pois dispunha de número
suficiente para navegar até Sevilha, e seriam ele e sua gente
bem castigados, fazendo-lhes tal injúria. Então o
comandante e os demais responderam que não se conhecia
ali nenhum Rei ou Rainha de Castela, nem suas cartas, e que
não lhes metiam medo, antes, pelo contrário, iam mostrar-
lhes o que era Portugal, isso já em tom ameaçador. Ao ouvir
tais palavras, o Almirante ficou muito penalizado, e diz que
até pensou que tivesse ocorrido algum incidente entre
ambos os reinos depois de sua partida, e não pôde se
conformar que não atendessem ao apelo da razão. Aí, então,
diz que o comandante tornou a levantar-se, de longe, e
exigindo que o Almirante fosse para o porto com a caravela,
e que tudo o que ele estava fazendo ou já havia feito era por
ordens de El-Rei, seu soberano; disso o Almirante tomou
por testemunhas os que estavam na caravela, voltando a
chamar o comandante, e a todos eles deu fé e prometeu que,
sendo quem era, não desceria nem sairia da caravela
enquanto não levasse uma centena de portugueses para
Castela, despovoando toda aquela ilha. E assim tornou a
ancorar no porto onde estivera antes, porque o tempo e o
vento eram muito ruins para fazer outra coisa.
Quarta, 20 de fevereiro. - Mandou aprontar o navio e
encher os barris com a água do mar para fazer lastro, pois
achava-se em péssimo porto e receava que lhe cortassem as
amarras, e assim foi; por isso deu às velas para a ilha de São
Miguel, apesar que nenhuma das dos Açores ofereça bom
porto para o tempo que então fazia, e não lhe restava
alternativa senão fugir do mar.

Quinta, 21 de fevereiro. - Partiu ontem da ilha de Santa
Maria para a de São Miguel, a fim de procurar ancoradouro
para poder suportar tamanho mau tempo como o que fazia,
com muita ventania e grandes ondas, e andou até à noite
sem conseguir avistar terra alguma por causa da espessa
neblina e escuridão causados pelo vento e pelo mar. Diz o
Almirante que estava bastante aborrecido, pois dispunha
apenas de três marinheiros que conheciam o oceano, porque
os demais não entendiam absolutamente nada de navegação.
Manteve-se à capa a noite inteira de muitíssimas tormentas,
grande perigo e trabalho, mas Nosso Senhor lhe concedeu a
graça de virem as ondas ou o mar somente de um lado,
porque, se se entrecruzassem como as precedentes, sofreria
muito mais ainda. Depois de raiar o dia, como não enxer-
gasse a ilha de São Miguel, decidiu retomar à de Santa Maria
para ver se podia resgatar a tripulação, o barco, as amarras e
âncoras que por lá haviam ficado.
Diz que estava assombrado com todo esse mau tempo que
fazia nessas ilhas e paragens, porque nas índias andou meses
a fio sem necessidade de ancorar, e sempre encontrava
tempo bom e que em nenhuma ocasião se deparou com um
mar que não se pudesse navegar, e que nessas ilhas havia
passado por tão grave temporal, o mesmo tendo lhe
acontecido, durante a ida, até às ilhas Canárias; mas que,
além delas, sempre encontrou clima e mar de grande
temperança. Concluindo, diz o Almirante, bem disseram os
sagrados teólogos e os sábios filósofos ao afirmar que o Paraí-
so terrestre está nos confins do Oriente, porque é um lugar
temperadíssimo. De modo que as terras, agora descobertas,
são os confins do Oriente.

Sexta, 22 de fevereiro. - Ontem ancorou na ilha de Santa
Maria no mesmo lugar ou porto precedente, e logo surgiu
um homem chamando do alto de uns penhascos que
ficavam bem em frente, pedindo para que não fossem
embora dali. Em seguida apareceu o barco com cinco
marinheiros, dois clérigos e um escrivão; pediram garantias,
e, dadas pelo Almirante, subiram à caravela; e como já era
noite dormiram a bordo, e o Almirante lhes rendeu as
honrarias que pôde. De manhã, solicitaram que lhes
mostrasse o mandato dos Reis de Castela e lhes contasse
como, com a autorização deles, havia empreendido tal via-
gem. O Almirante sentiu que faziam isso só para demonstrar
que não haviam procedido mal, mas que tinham tido razão,
porque não haviam podido prender a pessoa do Almirante,
que com certeza deviam pretender capturar, pois surgiram
com o barco armado; mas ao perceberem que a manobra
poderia acabar mal, e com temor do que o Almirante dissera
e ameaçara, que tinha propósito de levar a cabo e acreditou
que sairia dali com isso. Finalmente, para recuperar a tri-
pulação retida, teve que mostrar-lhes a carta geral dos Reis,
para todos os soberanos e senhores, de recomendação e
outras provisões; e deu-lhes do que tinha e eles se foram
para terra contentes, e logo soltaram toda a tripulação junto
com o barco, e por ela soube então o Almirante que, se o
tivessem capturado, nunca mais o poriam em liberdade,
pois, segundo dizia o comandante, El-Rei, seu Senhor, assim
lhe havia ordenado.

Sábado, 23 de fevereiro. - Ontem o tempo começou a
querer entrar em bonança; levantou âncora e foi contornar a
ilha em busca de bom ancoradouro para conseguir lenha e
pedra para o lastro, e só pôde encontrar à hora das
completas .

Domingo, 24 de fevereiro. - Ancorou ontem à tarde para
buscar lenha e pedra, mas, como as ondas estavam muito
altas, o barco não conseguiu chegar em terra, e ao render da
primeira guarda da noite, começou a ventar a oeste e
sudoeste. Mandou levantar as velas por causa do grande
risco que se corre nestas ilhas de esperar pelo vento sul
sobre a âncora, e ao ventar a sudoeste, logo sobrevêm o ven-
to sul. E, visto que fazia bom tempo para ir para Castela,
parou de recolher lenha e pedra e pediu que pilotassem a
leste; e andou até o amanhecer, o que daria seis horas e
meia, a sete milhas por hora, o que equivale a quarenta e
cinco milhas e meia. Depois de raiar o dia até o pôr-do-sol,
fez seis milhas por hora, o que em onze horas dá sessenta e
seis milhas; somadas às quarenta e cinco e meia noturnas,
foram cento e onze e meia, e, por conseguinte, vinte e oito
léguas.

Segunda, 25 de fevereiro. - Ontem, depois que
escureceu, navegou ao leste, mantendo-se na rota, a cinco
milhas por hora; em treze horas desta noite percorreu
sessenta e cinco milhas, o equivalente a dezesseis léguas e
um quarto. Entre o amanhecer e o pôr-do-sol percorreu
outras dezesseis léguas e meia com o mar calmo, graças a
Deus. Sobrevoou a caravela um pássaro enorme que parecia
uma águia.

Terça, 26 de fevereiro. - Ontem, depois do pôr-do-sol,
navegou ao leste, mantendo-se na rota, com mar calmo,
graças a Deus; o resto da noite fez oito milhas por hora;
percorreu cem milhas, o que vem a dar vinte e cinco léguas.
Depois que amanheceu, com pouco vento, choveu bastante;
navegou cerca de oito léguas a lés-nordeste.

Quarta, 27 de fevereiro. - Hoje, entre a noite e o dia,
andou fora da rota por causa dos ventos contrários e das
grandes ondas do mar e achava-se a cento e vinte e cinco
léguas do Cabo de São Vicente, a oitenta da ilha da Madeira
e cento e seis de Santa Maria. Estava muito aborrecido com
tanto temporal, agora que faltava tão pouco para chegar em
casa.

Quinta, 28 de fevereiro. - Andou da mesma maneira esta
noite, fora de rota, com diversos ventos ao sul e ao sudeste,
e de um lado e de outro, e ao nordeste e ao lés-nordeste, e
desse modo e também com grandes ondas durante o dia
inteiro.
Sexta, 1º de março. - Andou esta noite doze léguas a leste
quarta de nordeste; de dia correu vinte e três e meia a leste
quarta de nordeste.

Sábado, 2 de março. - Andou esta noite, mantendo-se na
rota, vinte e oito léguas a leste quarta de nordeste; e navegou
vinte léguas de dia.

Domingo, 3 de março. - Depois do pôr-do-sol navegou a
leste mantendo-se na rota. Sobreveio-lhe uma chuvarada
que lhe rasgou todas as velas e viu-se em grande perigo, mas
Deus quis que se salvassem. Tiraram a sorte para enviar um
peregrino diz que à Santa Maria de La Cinta em Huelva, que
fosse de camisola, e a escolha recaiu sobre o Almirante.
Todos fizeram também promessa de jejuar a pão e água no
primeiro sábado depois da chegada. Percorreu sessenta
milhas até que as velas se rasgassem; depois andaram a
mastro seco, por causa da grande tempestade de vento e das
ondas que queriam tragá-los por ambos os lados. Viram
indícios de terra próxima. Achavam-se bem perto de Lisboa.

Segunda, 4 de março. - À noite passaram por horrível
tempestade e até pensaram que estivessem perdidos por
causa das ondas que investiam por ambos os lados, dos
ventos que pareciam erguer a caravela no ar, da chuva e dos
relâmpagos de tudo quanto era lado; implorou a Deus para
socorrê-los e assim andou até à primeira guarda, quando
Nosso Senhor lhe mostrou terra, também vista pelos
marinheiros. E então, para não se aproximar sem saber qual
era, para ver se achava algum porto ou lugar onde se abrigar,
deu o papafigo por não ter outro remédio e para andar um
pouco, embora com grande risco, fazendo-se ao mar; e
assim Deus os protegeu até raiar o dia, que diz que foi com
infinito trabalho e espanto. Ao amanhecer, reconheceu a
terra, que era a Rocha de Cintra, situada bem ao lado do rio
de Lisboa, onde resolveu entrar, já que não podia fazer outra
coisa; tão terrível era a tormenta que fazia na vila de Cascais,
localizada na foz. Os habitantes, diz que passaram a manhã
inteira rezando por eles e, depois de já estar ancorado, vinha
gente vê-los, assombrados com o modo como haviam
escapado; e assim, a uma hora da tarde passou por Restelo,
dentro do rio de Lisboa, onde soube pelos marinheiros locais
que nunca tinha feito inverno de tantos temporais e que se
haviam perdido vinte e cinco naus em Flandres e que outras
estavam retidas há quatro meses sem poder sair. O
Almirante escreveu imediatamente ao Rei de Portugal, que
se encontrava a nove léguas dali, dizendo que os soberanos
de Castela tinham lhe dado ordens para que não deixasse de
entrar nos portos de Sua Majestade a fim de pedir o que
fosse preciso em troca de pagamento, e que El-Rei lhe
concedesse permissão para ir com a caravela à cidade de
Lisboa, porque alguns malvados, pensando que trazia muito
ouro, encontrando-se em porto despovoado, seriam capazes
de cometer alguma perversidade, e também para que
soubesse que não voltava de uma viagem a Guiné e sim às
Índias.

Terça, 5 de março. - Hoje, depois que o comandante da
nau grande do Rei de Portugal, também ancorada em
Restelo e a mais bem aparelhada de artilharia e armas que já
foi vista, que se chamava Bartolomeu Dias de Lisboa, veio
com o batel armado até à caravela, e pediu para o Almirante
embarcar a fim de ir prestar contas aos administradores do
Rei ou ao Capitão da dita nau. O Almirante respondeu que,
como Almirante dos Reis de Castela, não se sentia obrigado
a prestar contas a tais pessoas, tampouco a sair das naus ou
navios em que estivesse, a não ser que fosse obrigado pela
força das armas. O comandante retrucou que enviasse então
o mestre da caravela. O Almirante disse que nem o mestre
nem qualquer outra pessoa, a não ser à força, porque tanto
fazia entregar alguém como ir pessoalmente, e que esse era o
costume dos almirantes dos Reis de Castela, de preferir
morrer a se entregar ou entregar alguém de sua tripulação. O
comandante se moderou e disse que, já que estava com
aquela determinação, que fosse como ele quisesse; mas que
lhe mandasse mostrar as cartas dos Reis de Castela, se as
tinha. O Almirante prometeu mostrá-las e outro
imediatamente voltou à nau e comunicou isso ao capitão,
que se chamava Álvaro Dama, o qual, com muita pompa,
tambores, clarins e anafis, em meio a grande festa, veio até à
caravela e falou com o Almirante, prontificando-se a fazer
tudo o que lhe pedisse a fim de contentá-lo e ajudá-lo no
que precisasse.

Quarta, 6 de março. - Sabendo como o Almirante vinha
das índias, veio hoje tanta gente da cidade de Lisboa para vê-
lo e ver os índios que chegava a ser surpreendente, e as
demonstrações de assombro que todos davam, rendendo
graças a Nosso Senhor e dizendo que, pela grande fé que os
Reis de Castela tinham e pelo desejo de servir a Deus, era
que Sua Augusta Majestade lhes dava tudo isso.

Quinta, 7 de março. - Hoje veio uma verdadeira multidão
até à caravela, e muitos cavaleiros, entre eles os
administradores de El-Rei, e todos rendiam infinitíssimas
graças a Nosso Senhor por tanto bem e engrandecimento da
Cristandade que Nosso Senhor havia concedido aos Reis de
Castela, e que diz que atribuíam ao fato de Suas Majestades
trabalharem e se exercitarem tanto em prol do engrandeci-
mento da religião de Cristo.

Sexta, 8 de março. - Hoje o Almirante recebeu uma carta
do Rei de Portugal através de Dom Martim de Noronha, na
qual pedia-lhe que fosse a seu encontro, pois o tempo não
estava propício a partir com a caravela; e assim fez, para
evitar desconfianças, embora não tivesse vontade de ir, e foi
dormir em Sacavém. El-Rei ordenou a seus administradores
para que dessem, sem cobrar nada, tudo o que o Almirante,
a tripulação e a caravela precisassem e para que fizessem
tudo como o Almirante quisesse.

Sábado, 9 de março. - Hoje saiu de Sacavém para dirigir-se
ao local onde se encontrava El-Rei, que era o vale do
Paraíso, a nove léguas de Lisboa; como chovia, não pôde
chegar antes que anoitecesse. O soberano mandou recebê-lo
com todas as honras pelas figuras mais importantes da Casa
Real e ele próprio também os acolheu com muitas honras,
prestando-lhe uma série de cortesias, convidando-o a sentar-
se e falando com a maior consideração, oferecendo-se para
mandar fazer tudo o que agradasse aos Reis de Castela e a seu
serviço e o que mais aprouvesse; e mostrou-se muito
satisfeito com o feliz desfecho da viagem, e também de que
tivesse sido empreendida, mas que, no seu modo de
entender, pelo pacto existente entre os Reis e ele, aquela
conquista lhe pertencia. Ao que o Almirante respondeu que
desconhecia a existência de semelhante pacto e não sabia de
outra coisa além de terem os Reis mandado que não fosse à
mina nem à toda a Guiné, e que assim se tinha feito apregoar
em todos os portos de Andaluzia antes de partir para a
viagem. El-Rei respondeu graciosamente que tinha certeza
de que não haveria necessidade de terceiros.
Confiou-o aos cuidados do prior do Crato, na ocasião a
personalidade mais importante ali presente, e de quem o
Almirante recebeu, em todas as circunstâncias, muitíssimas
honrarias e favores.

Domingo, 10 de março. - Hoje, depois da missa, El-Rei
tornou a declarar que, se tivesse necessidade de algo,
prontamente lhe daria; e conversou muito com o Almirante,
sempre convidando-o a sentar-se, prestando-lhe todas as
homenagens.

Segunda, 11 de março. - Hoje despediu-se do rei, que lhe
disse algumas coisas que gostaria que transmitisse aos
Soberanos, demonstrando-lhe sempre muita afeição. Partiu
depois de comer, acompanhado por Dom Martim de
Noronha e por todos aqueles dignitários, que ficaram
bastante tempo prestando-lhe homenagens. Depois dirigiu-
se ao mosteiro de Santo Antônio, situado nas proximidades
de um lugar chamado Vila Franca, onde se encontrava a
Rainha; e foi-lhe fazer reverência e beijar-lhe as mãos, pois
um emissário recomendara que não partisse sem visitá-la, e
ela estava com o Duque e o Marquês, tendo recebido o
Almirante com a máxima consideração. O Almirante
despediu-se ao entardecer e foi dormir em Landra.

Terça, 12 de março. - Hoje, estando para partir de Landra
para a caravela, chegou um escudeiro de El-Rei, oferecendo-
se da parte do monarca, se preferisse ir a Castela por terra, a
hospedá-lo e mandar-lhe dar montarias e tudo o mais que
precisasse. Quando o Almirante se despediu, deu-lhe uma
mula e outra para o piloto, que levava consigo, e consta que
a este último pediu que fizesse o favor de aceitar vinte
espadins , segundo soube o Almirante. E diz que declarou
que fazia tudo isso para que chegasse ao conhecimento dos
Reis de Castela. Já era noite quando chegaram à caravela.

Quarta, 13 de março. - Hoje, às oito horas, com maré
muito alta e vento nor-noroeste, levantou âncora e soltou
velas para ir para Sevilha.

Quinta, 14 de março. - Ontem, depois do pôr-do-sol,
seguiu na sua rota rumo ao sul, e antes do amanhecer
encontrou-se nas proximidades do Cabo de São Vicente, que
fica em Portugal. Depois navegou ao leste para ir a Saltes, e
andou o dia todo com muito pouco vento até agora, que está
perto de Furón.

Sexta, 15 de março. - Ontem, depois do pôr-do-sol,
navegou na sua rota até o amanhecer com pouco vento e, ao
raiar do dia, achou-se nas proximidades de Saltes e, ao meio-
dia, com a maré montante, entrou pela barra de Saltes até o
interior do porto, de onde havia partido em 3 de agosto do
ano passado. E assim diz ele que termina agora este relato, só
que estava com a intenção de ir a Barcelona por mar, pois
ficara sabendo que ali se encontravam Suas Majestades, e
isso para lhes dar notícia de toda a viagem, que Nosso
Senhor havia permitido que fizesse, querendo deslumbrá-lo
com ela. Porque certamente, além do que já sabia e tinha a
certeza inabalável de que Sua Augusta Majestade só faz
coisas boas e que tudo é bom, salvo o pecado, e que não se
pode avalizar nem pensar coisa alguma sem o seu consen-
timento, fiquei conhecendo tudo desta viagem - diz o
Almirante — que milagrosamente assim o demonstrou,
como se pode compreender por este relato e pelos muitos
milagres indicados que nela ocorreram, e de mim, que há
tanto tempo estou na Corte de Vossas Majestades com a
oposição e contra a vontade de tantas personalidades ilustres
de vossa casa, as quais estavam todas contra mim, alegando
ser embuste essa façanha. E que, espero em Nosso Senhor,
haverá de ser a maior honra da Cristandade que assim, com
tanta rapidez, tenha jamais aparecido.
Estas são as palavras finais do Almirante sobre a sua primeira
viagem às Índias e sobre o seu descobrimento.



A Segunda Viagem
(1493-96)

Nomeado Vice-Rei e Governador Geral das Índias, Colombo
foi autorizado pelos reis da Espanha a iniciar os preparativos
para sua segunda viagem. Em Sevilha, dezessete navios
foram abastecidos para uma viagem de seis meses e 1.200
marinheiros, colonos e soldados alistados para o embarque.
O porto de Paios tornara-se pequeno para a frota gloriosa de
Colombo. Por isso, em 25 de setembro de 1493, ele partiu
de Cádiz, na nau capitânea Marigalante. Trinta e nove dias
depois, a expedição avistou terra. Era um domingo. Por isso,
a ilha montanhosa e luxuriante que atingiram foi batizada
Dominica — e até hoje mantém o nome.
Esta segunda expedição tornou conhecidas as Antilhas,
região na qual seria estabelecida a base da futura penetração
espanhola. Depois de descobrir a Jamaica, Colombo
retornou à Espanha, em julho de 1496. Novas terras haviam
sido anexadas ao emergente império espanhol, mas as
riquezas incalculáveis descritas por Marco Pólo em seu Livro
das Maravilhas permaneciam inatingidas.
Memorial que o Almirante deu para Dom Antonio de Torres
entregar aos Reis Católicos.
O que vós, Antonio de Torres, comandante da nau
Marigalante e prefeito da cidade Isabela, haveis de dizer e
suplicar de minha parte a El-Rei e à Rainha, Nossos
Soberanos, é o seguinte:
Primeiramente, uma vez entregues as cartas de credenciais
que de mim levais para Suas Majestades, beijareis, em meu
nome, seus reais pés e mãos, e me recomendareis a Suas
Majestades como Rei e Rainha, meus senhores naturais, a
cujo serviço desejo consagrar o resto de meus dias, e coisas
semelhantes a essas podereis dizer com mais vagar a Suas
Majestades, segundo o que em mim vistes e soubestes.
Outrossim: Como se pode ver pelas cartas que escrevo a Suas
Majestades e também ao padre frei Buil e ao Tesoureiro, será
fácil compreender tudo o que se fez aqui desde a nossa
chegada, e isso com riqueza de pormenores e extensamente;
contudo, direis de minha parte a Suas Majestades que
aprouve a Deus conceder-me tal graça em seu serviço, que
até agora não acho eu menos nem se achou em coisa alguma
do que escrevi, declarei e afirmei a Suas Majestades
anteriormente, antes, pelo contrário, por graça de Deus,
espero que ainda bem mais claramente e muito em breve
por meio de atos aparecerá, porque as coisas de especiarias
estão só nas margens do mar, sem ter-se adentrado pela
terra, se encontram tais rastros e princípios dela, que é razão
para que se esperem bem melhores fins, e o mesmo se aplica
às minas de ouro, porque com apenas dois que se puseram a
descobrir, cada um pelo seu lado, sem se demorarem lá por
serem poucos, descobriram-se tantos rios repletos de ouro,
que qualquer um dos que o viram extrair somente com as
mãos como amostra, chegaram tão contentes e falam tantas
coisas da abundância que por lá existe que me sinto
acanhado para repeti-las por escrito a Suas Majestades;
porém, como para aí vai Corbalán, que foi um dos
descobridores, ele próprio contará o que viu, embora aqui
fique outro, que chamam de Hojeda, criado do duque de
Medinaceli, rapaz discretíssimo e de muito bom recado, que
sem dúvida e também sem comparação descobriu muito
mais, segundo o memorial dos rios que trouxe, dizendo que
em cada um deles há coisas inacreditáveis: motivo pelo qual
Suas Majestades podem dar graças a Deus, pois tão
favoravelmente se saíram em todas as suas coisas.
Outrossim: Direis a Suas Majestades, como se pode ver pelo
que lhes escrevo, que eu desejava muito poder-lhes enviar,
nesta armada, maior quantidade de ouro do que se espera
extrair, se a nossa tripulação que aqui se encontra não caísse
subitamente, na maior parte, doente; mas, como esta armada
não podia mais esperar, seja pela costa grande que faz, seja
porque o tempo está propício para ir e voltar com os que
hão de trazer as coisas que aqui fazem muita falta, pois se
demorassem para partir não poderiam regressar em maio
aqueles que voltarão, e, além disso, se com os que gozam de
saúde, que cá se encontram, tanto no mar como em terra,
no povoado, eu quisesse me empenhar em ir agora às minas
ou aos rios, enfrentaria uma série de dificuldades e perigos,
porque daqui até vinte e três ou vinte e quatro léguas, onde
existem portos e rios para atravessar e para tão longa viagem
e para passar lá o tempo suficiente para extrair o ouro, seria
preciso levar muitos mantimentos, que não poderiam ser
carregados nas costas, nem os quadrúpedes que para isso se
prestassem, nem as estradas ou trilhas estão assim tão
prontas, pois mal começaram a arrumá-los para que se possa
utilizá-los; e também seria muito inconveniente deixar aqui
os doentes expostos ao ar livre e em choças, e as provisões e
mantimentos que estão em terra, que, por mais que esses
índios se hajam mostrado aos descobridores e se mostram
cada dia muito simples e sem malícia, contudo, como cada
dia aparecem aqui entre nós, não pareceu aconselhável
correr o risco de se aventurar a perder essa gente os
mantimentos, o que um índio munido de tição poderia
fazer, ateando fogo às choças, pois sempre vão e vêm de dia
e de noite; por causa disso mantemos guardas no
acampamento enquanto o povoado estiver aberto e sem
defesas.
Outrossim: Como já vimos que os que foram descobrir por
terra ficaram, na maioria, doentes depois que voltaram e
alguns ainda tiveram que desistir no meio do caminho, havia
também razão para temer que o mesmo acontecesse aos que
agora iriam, desses são que aqui se encontram, decorrendo
daí dois perigos: primeiro, de adoecerem por lá, na mesma
obra onde não existe casa nem defesa alguma contra aquele
cacique que chamam de Caonabó, que, segundo todos
dizem, é homem muito ruim e ainda mais atrevido; o qual,
vendo-nos ali alquebrados e doentes, poderia empreender o
que não ousaria se estivéssemos sãos: e com isso mesmo se
acrescenta outra dificuldade, a de trazer o que obtivéssemos
em ouro, porque ou haveríamos de trazer pouco cada dia e
correr o risco de doenças, ou se haveria de enviá-lo com
parte da tripulação, correndo o risco de perdê-lo.
Assim, pois, direis a Suas Majestades que esses são os
motivos por que por enquanto não se deteve a armada, nem
se lhes envia mais ouro além das amostras; porém,
confiando na misericórdia de Deus, que em tudo e por tudo
nos guiou até aqui, esta tripulação em breve convalescerá,
como já está acontecendo, porque basta a terra cicatrizar
alguns cortes e logo se levantam, e é certo que, se tivessem
um pouco de carne fresca para se restabelecer, bem depressa
estariam todos de pé, com a ajuda de Deus, e a maioria
também já estaria completamente boa a essa altura; seja
como for, hão de convalescer. Esses poucos sãos que ainda
nos restam, diariamente se preocupam em fechar o
povoado, dar-lhe alguma defesa e colocar os mantimentos
em segurança, o que será feito dentro de breves dias, porque
não vão ser mais que muros de barro, já que os índios não
são gente capaz de fazer alguma coisa, mesmo premeditada,
se nos encontrarem dormindo; pois assim procederam com
os outros que ficaram aqui sem tomar precaução, os quais,
por poucos que fossem e por melhores ocasiões que deram
aos índios de conseguir e de fazer o que fizeram, nunca
teriam ousado tratar de prejudicá-los se os vissem tomar
precauções . E, feito isso, logo se combinará para ir aos
ditos rios, ou daqui, tomando o caminho e buscando os
melhores expedientes possíveis, ou por mar, rodeando a ilha
até aquele lado de onde se diz que não deve haver mais de
seis ou sete léguas até os referidos rios, de modo que, com
segurança, se possa extrair o ouro e pô-lo sob a guarda de
alguma fortaleza ou torre que ali prontamente se erga, para
tê-lo à disposição quando as duas caravelas para cá
regressarem, e para que logo, com o primeiro tempo que
sirva para navegar nessa rota, seja enviado com segurança.
Outrossim: Direis a Suas Majestades, como já foi dito, que as
causas das doenças tão comuns a todos vêm da mudança de
águas e ares, porque vemos que se estende a toda equipagem
e poucos correm perigo; por conseguinte, a conservação da
saúde, depois de Deus, depende de que essa gente esteja
provida dos mantimentos a que estava acostumada na
Espanha, pois Suas Majestades não se poderão servir deles
nem de outros que para aqui vierem, se não estiverem sãos.
E essa provisão tem que durar até que se haja sedimentado o
que for semeado ou plantado, isto é, trigos, cevadas e
vinhedos, do qual para este ano pouco se fez, porque não se
pôde providenciar com antecedência e logo que se
providenciou adoeceram os raros lavradores que cá estavam,
os quais, mesmo que gozassem de saúde, dispunham de
poucos animais, tão magros e esquálidos, que quase nada
puderam fazer. Contudo, alguma coisa semearam, mais para
experimentar a terra, que parece maravilhosa, e para que daí
se possa esperar alguma solução para nossas necessidades.
Temos absoluta certeza, pelo que já se pôde ver, de que
nessa terra tanto o trigo como o vinho se desenvolverão
muito bem , mas cumpre esperar o fruto, que, se for igual à
rapidez com que nasce o trigo e a algumas raras vides que se
plantaram, é certo que não farão falta, os da Andaluzia nem
os da Sicília, como tampouco as canas-de-açúcar, a julgar por
algumas mudas que, tão logo foram plantadas, pegaram;
porque é certo que a beleza da terra destas ilhas, repletas de
morros, serras e águas, e de várzeas por onde passam rios
caudalosos, é tão evidente, que nenhuma outra, aquecida
pelo sol, pode ser melhor ou parecer tão bela.
Outrossim: Direis que, em virtude de se ter derramado
muito vinho na rota seguida por essa armada, o que, segundo
a maioria, se atribui ao mau trabalho dos toneleiros em
Sevilha, a maior falta que agora sofremos ou esperamos
sofrer por causa disso é a de vinhos, e muito embora
tenhamos para mais tempo tanto biscoito como trigo, é, no
entanto, preciso que também se envie uma quantidade
razoável, pois a viagem é longa e não se pode prover todos
os dias, e do mesmo modo algumas carnes, digo, toucinhos,
e outras defumadas, que sejam melhores que os que trouxe-
mos desta vez. Necessita-se, ainda, de carneiros vivos, ou
antes, cordeiros e cabritinhas, fêmeas de preferência a
machos, e alguns bezerros e bezerras pequenos, que
venham toda vez que uma caravela parta nesta direção, e
mulas, asnos e éguas para trabalho e sêmen, pois aqui não
existe nenhum desses bichos de que se possa amparar e
valer. E, como receio que Suas Majestades não se encontrem
em Sevilha, e que os seus oficiais ou ministros não nos
atendessem sem a sua ordem expressa, porque é necessário
que venha agora, nesta próxima viagem, pois entre a
consulta e a resposta se passaria a estação da partida dos
navios, e até o mês de maio é preciso que estejam aqui,
direis a Suas Majestades como vos incumbi e mandei que do
ouro que para lá levais, empenhando-o ou entregando-o a
algum mercador em Sevilha, o qual se distraia e ponha os
maravedis que forem necessários para carregar duas
caravelas de vinho, trigo e outras coisas de que levais a
relação, o qual mercador leve ou envie o dito ouro a Suas
Majestades, para que o vejam, recebam e façam pagar o que
se tiver distraído e posto para o despacho e carregamento
das duas referidas caravelas, as quais, para consolar e
incentivar esta gente que fica aqui, cumpre que ponham o
máximo empenho em estar de volta aqui até fins do mês de
maio, para que a tripulação antes de começar o verão
enxergue e tire algum conforto dessas coisas, sobretudo para
as doenças; coisas de que aqui já estamos em grande falta,
tais como passas, açúcar, amêndoas, mel e arroz, que deveria
ter vindo em muita quantidade e veio pouquíssimo e mesmo
assim já está consumido e gasto, e ainda a maior parte dos
medicamentos que de lá trouxeram, por causa da verdadeira
multidão de doentes: das quais, como já disse, levais relação
tanto para os sãos como para os doentes, assinada por meu
próprio punho, e que deve vir integralmente, se o dinheiro
for suficiente ou, ao menos, o que mais indispensável seja
para despachar agora, para que possam logo trazer as duas
referidas caravelas; e o que restar procurareis com Suas
Majestades para que venham com outros navios o mais
depressa possível.
Outrossim: Direis a Suas Majestades que, como aqui não
existe língua por meio da qual se possa administrar a essa
gente os ensinamentos da nossa santa fé, conforme o desejo
manifestado por Suas Majestades, e também pelos que aqui
se encontram, apesar de que tudo faremos nesse sentido, se
enviam de presente com estes navios os canibais, homens,
mulheres e crianças que Suas Majestades podem mandar
entregar a pessoas que lhes possam ensinar melhor a língua,
exercitando-os em coisas de serviço e aos poucos mandando
dispensar-lhes mais cuidados do que a outros escravos, para
que aprendam uns com os outros; mas que não se falem
nem se vejam senão bem mais tarde, que aprenderão aí mais
depressa do que aqui, e serão melhores intérpretes, muito
embora aqui não se deixará de fazer o que se puder. É
verdade que, como essa gente pouco se comunica entre uma
ilha e outra, existe alguma diferença entre suas línguas, de-
pendendo da distância, e porque entre as outras ilhas as dos
canibais são muito maiores e bem mais povoadas, pareceria
aqui que capturar, tanto eles como elas, e enviá-los aí para
Castela só poderia fazer bem, porque se livrariam, de uma
vez por todas, desse costume desumano que têm de comer
gente, e aí em Castela, entendendo a língua, receberiam
bem mais rápido o batismo, com grande proveito para suas
almas. Ainda entre esses povos que não mantêm tais hábitos,
só teríamos a lucrar, vendo que prendemos e sujeitamos ao
cativeiro aqueles de quem costumam sofrer danos e sentem
tanto medo que se espantam só em vê-los; acreditem Suas
Majestades que a vinda e a presença da frota nesta terra,
assim reunida e bonita, contribuiu para imprimir grande
autoridade ao fato e garantir ampla segurança para o porvir,
pois toda a população desta grande ilha e das demais, vendo
o bom tratamento dispensado aos bons e o castigo aplicado
aos maus, terminará obedecendo prontamente,
comportando-se como vassalos reais. E preciso também
ressaltar que eles agora, onde quer que se esteja, não só
cumprem de bom grado o que se lhes pede que façam, como
ainda, por espontânea vontade, se dispõem a fazer tudo o
que entendem que nos possa agradar, e podem ter Suas
Majestades ainda certeza de que não será menos aí, entre os
soberanos cristãos, pela grande reputação granjeada com a
vinda desta armada, em vários sentidos, atuais como
vindouros, sobre os quais Suas Majestades poderão meditar e
entender melhor do que eu saberia exprimir.
Outrossim: Direis a Suas Majestades que o proveito das almas
dos referidos canibais e também dos que aqui se encontram
inspirou a idéia de que quanto maior o número dos que
fossem levados para aí, tanto melhor, e nisso Suas
Majestades poderiam ser servidas da seguinte maneira: que,
visto como são indispensáveis as cabeças de gados e as bestas
de carga para o sustento da gente que aqui vai ficar e para o
bem de todas estas ilhas, Suas Majestades poderiam dar li-
cença e permissão a um número de caravelas suficiente que
para cá se dirija a cada ano, trazendo o referido gado e outros
mantimentos e coisas para povoar o campo e aproveitar a
terra, e isso a preços razoáveis, à custa dos transportadores,
cujas mercadorias lhes poderiam ser pagas em escravos
destes canibais, gente tão feroz, disposta, bem
proporcionada e de muito bom entendimento, e que,
libertos dessa desumanidade, acreditamos que se mostrarão
superiores a quaisquer outros servos, desumanidade que logo
perderão quando estiverem longe de sua terra ; e desses
poderá haver muitos, usando-se o chicote que fazem e usam
como remo por aqui; isso vai depender, porém, do
pressuposto de que cada uma das caravelas enviadas por Suas
Majestades seja comandada por pessoa de confiança, que as
impeça de parar, em qualquer outro lugar ou ilha, a não ser
aqui, onde terá que ser procedida a carga e descarga de toda
a mercadoria; e Suas Majestades ainda poderiam fazer valer
seus direitos sobre os escravos levados para aí. E a esse
respeito trareis ou enviareis resposta, para que se tomem
aqui, com maior segurança, as providências cabíveis, se Suas
Majestades concederem aprovação.
Outrossim: Também direis a Suas Majestades que vale mais a
pena e custa menos fretar os navios como fazem os
mercadores para Flandres, por toneladas, e não de outra
maneira; daí que eu vos encarreguei de fretar desse modo as
duas caravelas que logo haveis de mandar; e assim se poderá
fazer com todas as outras que Suas Majestades enviarem, se
em tal forma aprovarem os serviços. Mas isso que estou
dizendo não se aplica às que hão de vir com licença de Suas
Majestades para o transporte de escravos.
Outrossim: Direis a Suas Majestades que, no intuito de evitar
maiores despesas, comprei estas caravelas, cuja relação
levais, ora para retê-las aqui com as duas naus, isto é: a
Galega e essa outra Capitã, que comprei igualmente do piloto
de ambas os três oitavos pelo preço que na referida relação
destas cópias levais assinado de meu próprio punho; esses
navios não só darão autoridade e grande segurança à
tripulação que ficar dentro e conviver com os índios para
extrair o ouro, mas ainda para qualquer outro perigo que
possa provir dessa gente estranha, além de serem as
caravelas necessárias para o descobrimento de terra firme e
outras ilhas que se situem entre aqui e aí. E suplicareis a Suas
Majestades que os maravedis que esses navios custam sejam
pagos no prazo prometido, porque não há dúvida de que se
ressarcirão do preço que custaram, segundo creio e confio
na misericórdia de Deus.
Outrossim: Direis a Suas Majestades e suplicareis de minha
parte, da maneira mais humilde possível, que se lhes
compraza muito considerar o que pelas cartas e outros
manuscritos verão mais detidamente no que diz respeito à
paz, ao sossego e à concórdia dos que aqui se encontram, e
que para as coisas do serviço de Suas Majestades escolham
pessoas de tal índole que não se tenha delas receio e que
levem mais em conta os motivos de sua vinda, que são para
atender aos interesses reais. E nisso, posto que tudo vistes e
soubestes, falareis e direis a Suas Majestades a verdade sobre
todas as coisas, tais como as compreendestes; e que a
provisão do que Suas Majestades decidirem venha, se
possível, com os primeiros navios, a fim de que aqui não se
crie nenhum tumulto em torno de um assunto que tanto
interessa ao bom proveito de Suas Majestades.
Outrossim: Direis a Suas Majestades a localização desta
cidade4 e a beleza da província circundante, tais como as
vistes e compreendestes, e como vos nomeei dela prefeito
pelos poderes que me foram conferidos por Suas Majestades,
às quais humildemente rogo que, como parte da satisfação
pelos vossos serviços, tenham por bem conceder a referida
provisão, como espero de Suas Majestades.
Idem: Porque mossém Pedro Margarite, súdito de Suas
Majestades, bem serviu e espero que assim continuará
fazendo no que lhe for pedido doravante, tive muito prazer
em acolhê-lo aqui, o mesmo ocorrendo com Gaspar e
Beltrán, que por serem conhecidos súditos de Suas
Majestades, pude confiar-lhes cargos de confiança.
Suplicareis a Suas Majestades, que, sobretudo ao citado
mossém Pedro, que é casado e tem filhos, seja conferida
alguma comenda na Ordem de Santiago, da qual veste o
hábito, para que sua mulher e filhos tenham recursos para
viver. De maneira idêntica procedereis em relação a Juan
Aguado, outro súdito de Suas Majestades, que serviu bem e
diligentemente em tudo o que lhe foi solicitado; que suplico
a Suas Majestades, por ele e pelos já mencionados, os te-
nham por bem recomendados e presentes.
Outrossim: Direis a Suas Majestades o trabalho que o doutor
Chanca vem enfrentando para atender a tantos doentes,
bem como a situação dos mantimentos, e como, apesar de
tudo isso, cumpre com a sua obrigação. E para que Suas
Majestades me remetam o salário a que faz jus, porque
estando aqui é certo que não recebe nem pode ganhar nada
de ninguém em troca de seus serviços como ganhava ou
poderia estar ganhando em Castela, sem se incomodar e
vivendo com um conforto que aqui não tem condições de
ter; e assim que, apesar de ele jurar que o que ganhava era
mais do que o salário que Suas Majestades lhe dão e não me
querer expandir mais do que cinqüenta mil maravedis pelo
trabalho que cada ano faz enquanto aqui estiver, suplico à
Suas Majestades lhe mandem franquear com os honorários
daqui, e assim mesmo porque diz e afirma que todos os
médicos envolvidos em coisas da realeza ou semelhantes a
essas costumam ter direito a um dia de estipêndio em cada
ano de toda a gente; contudo, fui informado e ouvi dizer
que, mesmo que assim seja, o costume consiste em dar-lhes
determinada quantia estipulada pela vontade e ordem de
Suas Majestades como recompensa por aquele dia de
estipêndio. Suplicareis à Suas Majestades que o mandem
prover disso, tanto no que diz respeito ao salário como a
esse costume, de modo que o referido doutor encontre
motivos para ficar satisfeito.
Outrossim: Falareis do Coronel para Suas Majestades,
explicando o quanto é homem para servir em muitas coisas e
quanto serviu até aqui em tudo o que foi mais necessário e a
falta que dele sentimos agora que está doente; e que,
servindo dessa maneira, há motivo para colher os frutos de
seu trabalho, não só nas graças futuras como também em seu
salário atual, de modo que tanto ele como os demais que
aqui se encontram percebam que o trabalho é compensador,
pois, segundo o esforço que aqui se há de fazer para extrair
esse ouro, não podem ser pouco consideradas as pessoas que
tanto empenho demonstram; e porque ganhou, graças à sua
habilidade, o cargo de meirinhomor destas Índias, conce-
dido por mim, mas em cuja provisão o salário está em
branco, suplico a Suas Majestades que o mandem preencher
como o que mais seja seu serviço, levando em conta a sua
folha de serviços, confirmando-lhe a provisão que aqui lhe
foi concedida e proporcionando-lhe o que faz jus.
Da mesma forma direis a Suas Majestades como para cá veio
o bacharel Gil Garcia como prefeito-mor, sem que lhe fosse
consignado nem indicado nenhum salário, e é pessoa de
bem, de boas letras e diligente, e muito necessário aqui; que
suplico à Suas Majestades que mandem nomeá-lo,
consignando-lhe o salário, de modo que se possa manter, e
lhe seja franqueado o dinheiro dos honorários daqui.
Outrossim: Direis a Suas Majestades, como, aliás, já escrevi
por carta, que não julgo possível sair para descobrimentos
este ano antes que fiquem devidamente situados os rios
onde foi encontrado ouro a serviço de Suas Majestades, pois
depois se poderá fazer muito melhor, já que não é coisa que
alguém possa empreender sem a minha presença, o meu
consentimento, nem o serviço de Suas Majestades, por bem
que o fizesse, visto que sempre se fica em dúvida sobre o
que não se enxerga com os nossos próprios olhos.
Outrossim: Contareis a Suas Majestades como os escudeiros
a cavalo que vieram de Granada, com o alarde que fizeram
em Sevilha, mostraram boas montarias, e depois, ao
embarcar, que não pude ver, porque andava adoentado,
foram substituídas de tal maneira que a melhor delas não
parece valer dois mil maravedis, porque venderam as outras
e compraram estas, o mesmo tendo acontecido com boa
parte da tripulação que lá, nos alardes de Sevilha, vi que era
muito boa. Parece que Juan de Soria, depois de ter sido
entregue o dinheiro do soldo, por algum interesse pessoal,
colocou outros no lugar daqueles que pensei encontrar aqui,
e achei gente que nunca tinha visto. Nisso houve grande
maldade, de tal maneira que nem sei se devo queixar-me
somente dele; por isso, visto que a esses escudeiros se
confiou as despesas até aqui, além de seus soldos, e também
a de seus cavalos, e atualmente se manifestam e são pessoas
que quando estão doentes, ou não têm vontade, não querem
que seus cavalos sirvam sem eles mesmos; Suas Majestades
não querem que se lhes comprem esses cavalos, mas que
sirvam a Suas Majestades, e é exatamente o que não lhes
parece que devam servir nem coisa nenhuma senão a
cavalo, o que agora de momento não vem muito ao caso, e
por isso parece que seria preferível comprar-lhes as
montarias, já que valem tão pouco, e não ficar cada dia a
discutir com eles por causa disso. Que Suas Majestades, por
conseguinte, determinem isso como melhor lhes aprouver.
Outrossim: Direis a Suas Majestades que para cá vieram mais
de duzentas pessoas sem soldo, havendo algumas que
trabalham direito e também outras que, à força do exemplo,
assim se comportam, e para que durante estes três primeiros
anos será da maior conveniência que aqui estejam três mil
homens para localizar e pôr em extrema segurança esta ilha
e rios de ouro, e ainda que houvesse uma centena a cavalo
não se perderia nada, antes, pelo contrário, parece ne-
cessário; embora nesses a cavalo, até que se remeta o ouro,
Suas Majestades poderiam suspender. Contudo, para essas
duzentas pessoas que vieram sem soldo, Suas Majestades
devem mandar dizer se se lhes pagará estipêndio como aos
outros trabalhando bem, porque é certo que são necessários,
como já disse, durante este começo.
Outrossim: Porque de certo modo se pode aliviar as despesas
com essa gente por meio de engenho e formas que outros
soberanos costumam usar, e aqui esses gastos encontrariam
melhor pretexto, parece que seria aconselhável mandar
trazer nos navios que vierem, além de coisas destinadas aos
mantimentos comuns e à farmácia, sapatos e couros para
mandar fazê-los, camisas comuns e de outras qualidades,
gibões, lenços, saias, calças, panos para vestir por preços
razoáveis e outras coisas, como, por exemplo, conservas,
que não se incluem na ração e servem para manter a saúde,
que são coisas que a gente daqui receberia de bom grado
descontadas do soldo; e se aí isso fosse comprado por
ministros leais e que visassem bem servir Suas Majestades,
muito se economizaria. Portanto, consultareis a vontade de
Suas Majestades a respeito disso, e, se lhes aprouver,
imediatamente se deve pôr em prática.
Outrossim: Também direis a Suas Majestades que, durante o
alarde que se criou ontem, verificou- se grande falta de
armas, o que penso que em parte se deve atribuir àquela
troca efetuada em Sevilha, ou no porto, quando lá ficaram os
que se mostraram armados e embarcaram outros, que
pagavam alguma coisa a quem efetuava a troca; parece,
então, que seria conveniente mandar trazer duzentas
couraças, cem espingardas, cem trabucos e munição, que é
do que mais precisamos.
Outrossim: Quanto a alguns operários que vieram para cá,
por serem pedreiros e de outros ofícios, e que são casados e
deixaram suas mulheres aí e gostariam que elas recebessem o
que se lhes deve de soldo ou que esse fosse entregue às
pessoas que indicassem, para que lhes comprem as coisas de
que aqui precisam, suplico à Suas Majestades para franquear-
lhes isso, porque é de seu interesse que estejam providos
aqui.
Outrossim: Para que, além das outras coisas que aí se
mandam pedir através das relações que levais assinadas de
meu próprio punho, tanto para a manutenção dos sãos como
para a dos doentes, seria aconselhável que se remetessem da
ilha da Madeira cinqüenta barris de mel açucarado, que é o
melhor alimento do mundo e também o mais saudável e não
costuma custar cada barril mais de dois ducados sem o casco;
e se Suas Majestades determinarem que, na volta, passe por
ali alguma caravela, que poderá trazê-los, e também dez
caixas de açúcar que são muito necessárias, e esta é a melhor
época do ano', quer dizer, daqui até o mês de abril, para
achar e comprar com bom motivo, e poder-se-ia dar ordem,
bastando Suas Majestades assim determinarem e que aí não
se soubesse para onde se destinam.
Outrossim: Direis a Suas Majestades que, embora os rios o
possuam na quantidade que se diz pelos que já viram, mas
que o certo a esse respeito é que o ouro não se origina nos
rios, mas na terra, que a água deparando com as minas o traz
misturado à areia, e como foram feitas descobertas nesses
tantos rios, muito embora haja alguns bem grandes, existem
outros tão pequenos, que podem ser tudo menos rios, pois
não têm mais que dois dedos de água e logo se acha a
nascente, para os quais não só seria proveitoso dispor de
garimpeiros para colhê-lo na areia como também de outros
para extraí-lo do solo, que será o mais especial e em maior
quantidade. E por isso seria bom que Suas Majestades
enviassem garimpeiros ou dos que trabalham nas minas lá
em Almadén, para que, de uma maneira ou doutra, faça-se o
trabalho, muito embora não se pretenda esperar por eles,
pois com os que temos aqui confiamos, com a graça de
Deus, tão logo a tripulação esteja curada, chegar a uma
grande porção de ouro para as primeiras caravelas que
partirem.
Outrossim: Suplicareis à Suas Majestades, de minha parte e
mui humildemente, que queiram considerar como muito
bem recomendado Villacorta, que, como Suas Majestades
sabem, muito trabalhou nestas negociações e com muito boa
vontade, sendo, segundo meu conhecimento, pessoa
diligente e afeiçoada ao serviço. Receberei como favor que
se lhe dê algum cargo de confiança para o qual seja
suficiente e possa demonstrar diligência e desejo de servir; e
disso tratareis de forma que Villacorta saiba que, em virtude
do que fez por mim em tudo o que precisei, mostro meu
reconhecimento.
Outrossim: Que os mencionados mossén Pedro, Gaspar,
Beltrán e outros que aqui ficaram, vieram no comando de
caravelas, que agora já não têm, e nem gozam de soldo; mas,
por serem tais pessoas que se hão de colocar à frente de
coisas importantes e de confiança, não lhes foi determinado
soldo diferenciado dos demais, suplicareis de minha parte a
Suas Majestades para que fique determinado o que se há de
dar por ano ou por mês, como melhor lhes aprouver.
Redigido na cidade de Isabela aos 30 dias de janeiro do ano
de 1494.


A Terceira Viagem
(1498-1500)

A terceira viagem de Colombo foi preparada
cuidadosamente durante dois anos. Em guerra contra a Itália,
os reis encontraram dificuldades para financiar a expedição e
Colombo teve problemas para recrutar ci tripulação: o
massacre do Forte Navidad e o contágio da sífilis afastaram
os marinheiros do famoso Almirante. Superados os impasses,
Colombo partiu do porto de San Lucas em 30 de maio de
1498, comandando uma frota de seis barcos, dividida em
dois grupos de três navios que tomaram rotas diferentes. Em
31 de julho, o grupo no qual viajava Colombo avistou a ilha
de Trinidad, localizada quase na foz do rio Orinoco - os
europeus desembarcaram pela primeira vez em terras da
América do Sul. Dali, Colombo rumou até a cidade de Santo
Domingo, na ilha Espanhola, onde chegou em 20 de agosto,
deparando-se com uma situação conturbadíssima: a guerra
civil entre os colonos era iminente. As notícias do conflito
chegaram à Espanha e Colombo perdeu o título de
Governador Geral das índias. O novo ocupante do cargo,
Francisco de Bobadilla, enviou-o de volta para a Espanha:
acorrentado! Em outubro de 1500, o Almirante
desembarcou prisioneiro em Cádiz e só foi liberado seis
semanas mais tarde.

Carta do Almirante aos Reis Católicos

Sereníssimos e mui augustos e poderosos soberanos, Rei e
Rainha, nossos Monarcas: A Santíssima Trindade moveu
Vossas Majestades a esse empreendimento das índias e por
infinita bondade me elegeu seu mensageiro, para o qual vim
com a missão de seu real conspecto, movido também como
os mais augustos soberanos cristãos, que tanto se empenham
pelo engrandecimento da fé. As pessoas que opinaram a
respeito consideraram a empresa impossível, baseando suas
estimativas em despesas incalculáveis, onde concentraram-
se as críticas. Dediquei a isso seis ou sete anos de grandes
dissabores, demonstrando da melhor maneira a meu alcance
quanto serviço se poderia fazer por Nosso Senhor no sentido
de levar seu santo nome e fé a tantos povos, e como tudo
era obra de excelente qualidade, boa fama e glória para
grandes soberanos. Foi também preciso frisar os valores
temporais, quando se lhes demonstrou os manuscritos de
tantos sábios dignos de fé, e que escreveram histórias em
que contavam como nesses lugares existiam vastas riquezas,
e mesmo assim foi necessário invocar o conceito e a opinião
daqueles que descreveram e situaram o mundo . Por fim,
Vossas Majestades determinaram que se pusesse isso em
prática. Aqui mostraram o grande coração que sempre
tiveram em tudo que fosse relacionado à grandeza, pois
todos os que emitiam opiniões sobre o assunto e tomavam
conhecimento das gestões foram unânimes em considerá-lo
como embuste, à exceção de dois frades , que sempre nos
apoiaram. Eu, apesar de cansado, estava e ainda estou
absolutamente convencido de que isso não representava
obstáculo, porque a verdade é que tudo passa, menos a
palavra de Deus, e se cumprirá exatamente o que disse; e Ele
falou tão claro pela boca de Isaías em tantos trechos das
Escrituras, afirmando que da Espanha lhes seria elevado o
seu santo nome. E parti em nome da Santíssima Trindade, e
voltei com a maior rapidez, trazendo em mãos a prova de
tudo o que tinha afirmado. Vossas Majestades tornaram a
enviar-me e, em curto espaço de tempo, afirmo, descobri,
por mérito divino, trezentas e trinta e três léguas de terra
firme, nos confins do Oriente, e setecentas ilhas com
nome , além do que já havia sido descoberto na primeira
viagem, e conquistei a ilha Espanhola, cujo território é mais
extenso que a Espanha, onde os habitantes são inúmeros e
todos pagarão tributo. Aí teve início a maledicência e o
menosprezo pelo empreendimento recém-começado,
porque não enviei imediatamente os navios carregados de
ouro, sem que se levasse em conta a exigüidade do tempo,
além dos múltiplos obstáculos que relatei; e isso, para mal
dos meus pecados ou, como creio que será, para a minha
salvação, causou contrariedades e provocou o embargo de
tudo o que eu dizia ou solicitava. Pelo que resolvi vir à
presença de Vossas Majestades e de tudo assombrar-me,
mostrando-lhes a razão que me levou a agir como agi, e lhes
falei dos povos que tinha visto, em que ou de que modo se
poderiam salvar muitas almas, e lhes trouxe os tributos da
população da ilha Espanhola, de como se obrigavam a pagá-
los e os tinham por seus Reis e Soberanos, além de bastantes
amostras de ouro, de que há minas e pepitas muito grandes,
e também de cobre; e várias qualidades de especiarias, que
ficaria excessivamente longo enumerar, e lhes mencionei a
vasta quantidade de pau-brasil e de uma infinidade de outras
coisas. Nada disso adiantou junto a pessoas que nutriam ódio
e começavam a falar mal do empreendimento, muito menos
explicar que se salvariam tantas almas para o serviço de
Nosso Senhor, nem dizer que contribuiria para a grandeza
de Vossas Majestades, da melhor qualidade usada até hoje
por qualquer soberano, pois a atividade e as despesas
destinavam-se ao espiritual e temporal e seria impossível
que, com o correr do tempo, a Espanha não tirasse daqui
grandes proveitos; já se viam os sinais que se escreveram so-
bre essas viagens tão manifestas e também se chegaria a ver
o cumprimento de todo o resto, sem falar nas coisas que
usaram os grandes soberanos do mundo para aumentar sua
fama, como Salomão, que mandou emissários de Jerusalém
aos confins do Oriente para vero monte Sopora, em que os
navios se demoraram três anos, e que hoje pertence a Vossas
Majestades na Ilha Espanhola; e Alexandre, que enviou regi-
mento para a ilha de Trapobana na Índia, e Nero César, para
verificar nas nascentes do Nilo o motivo de recrudescerem
no verão, quando as chuvas são raras; e tantas outras
grandezas praticadas por soberanos, a quem são dadas fazer
essas coisas; nem valia a pena dizer que eu nunca havia lido
que os soberanos de Castela tivessem, algum dia, ganho terra
fora dela, e que esta daqui é outro mundo, em que se
empenharam romanos, Alexandre e os gregos, para
conquistá-la com grandes campanhas; nem falar nos dias
atuais, em que os Reis de Portugal encontraram ânimo para
apoiar a Guiné e o seu descobrimento, e que gastaram ouro e
tanta gente que quem contasse toda a população do reino
verificaria que parte equivalente à metade pereceu na Guiné,
e mesmo assim continuaram, até que disso resultou o que se
sabe, que teve início há tanto tempo e há bem pouco que
lhes dá renda; os quais também ousaram conquistar na
África, apoiando a campanha a Ceuta, Tânger, Arcilla e
Alcázar, e em seguida declarando guerra aos mouros; e tudo
isso com grandes despesas, só para fazer coisa de príncipe,
servir a Deus Nosso Senhor e ampliar seus domínios.
Quanto mais eu falava, tanto mais se esmeravam a pôr isso
em vitupério, demonstrando aborrecimento, sem considerar
a repercussão favorável no mundo inteiro e o elogio
unânime dos cristãos a Vossas Majestades por terem se
lançado a esse empreendimento; e não houve grandes nem
pequenos que não solicitassem carta a respeito. Vossas
Majestades responderam-me achando graça e dizendo que
não me preocupasse com nada, porque não autorizavam
nem davam crédito a quem os maldizia por causa desse
empreendimento.
Parti em nome da Santíssima Trindade, na quarta-feira, 30
de maio, da Vila de San Lúcar, ainda cansado de minha
viagem, pois onde esperava descansar, quando parti destas
Índias, me foi duplicada a pena; e naveguei até à ilha da
Madeira por rota a que não estava afeito, com o intuito de
evitar o tumulto que poderia ocorrer se encontrasse uma
esquadra da França, que me aguardava no Cabo de San
Vicente, e de lá para as Canárias, de onde parti com uma nau
e duas caravelas, tendo enviado o resto dos navios em rota
direta para a Espanhola nas índias. E naveguei com o vento
sul, no propósito de chegar à linha equinocial e de lá seguir
para o poente até que a Espanhola me ficasse a Setentrião; e,
ao alcançar o arquipélago Cabo Verde, nome inexato, pois
nada verde vi nelas de tão secas que são, encontrei a
população tão doente, que nem ousei fazer escala, e
naveguei quatrocentas e oitenta milhas a sudoeste, o que
equivale a cento e vinte léguas, onde, ao anoitecer, tinha a
estrela do Norte a cinco graus. Aí o vento me deixou ao
desamparo e enfrentei calor tão intenso que o julguei capaz
de incendiar os navios e toda a tripulação; e tudo de repente
e nem tão desordenado que não houvesse pessoa que se
atrevesse a descer do tombadilho para se aliviar nas vasilhas
e nos mantimentos. Oito dias durou esse calor; no primeiro,
o tempo se manteve claro, mas nos sete restantes choveu e
ficou nublado; e, mesmo assim, não encontramos alívio; mas
não há dúvida que, se tivesse feito sol como no primeiro,
creio que não conseguiríamos escapar de maneira alguma.
Lembrei-me de que, navegando para as índias, sempre que
passo a cem léguas ao poente dos Açores, ali encontro
mudança na temperatura e isso desde Setentrião até Austro;
e determinei que, se aprouvesse a Nosso Senhor me dar
vento e bom tempo, e pudesse sair de onde estava, deixaria
de ir mais ao Austro, ou tampouco voltar atrás, a não ser
para navegar ao Poente, a tal ponto que chegasse a me
encontrar sobre essa linha, com a esperança de ali achar a
sua temperatura, como já havia acontecido quando navegava
no paralelo das Canárias. E que, se assim fosse, poderia então
ir mais ao Austro. E quis Nosso Senhor que, ao cabo desses
oito dias, me concedesse bom vento Levante; segui, então,
ao Poente, mas não me atrevi a rumar mais para o sul porque
me deparei com enorme mudança no céu e nas estrelas,
sem, todavia ocorrer alteração na temperatura. Por isso
resolvi continuar sempre ao Poente, sem me desviar do
rumo da Serra Leoa, com o propósito de não mudar de rota
até onde havia pensado encontrar terra e ali consertar os
navios e renovar, se pudesse, os mantimentos e buscar a
água que não tinha. E ao cabo de dezessete dias, nos quais
Nosso Senhor concedeu-me vento propício, na terça-feira,
dia 31 de julho, ao meio-dia, avistamos terra, que eu já
esperava na véspera, pois até então sempre me mantive
naquele rumo; ao raiar do dia, por culpa da água que me
faltava, resolvi ir para as Índias dos canibais, e fiz essa volta.
E, como Sua Augusta Majestade sempre usou de
misericórdia para comigo, por acaso subiu um marinheiro à
gávea e viu, ao Poente, um conjunto de três montanhas.
Dissemos a Salve Rainha e outras orações e rendemos, todos,
muitas graças a Nosso Senhor; depois abandonei a rota do
Setentrião e voltei para a terra, aonde cheguei na hora das
completas a um cabo que denominei da "Galea", depois de
ter chamado a ilha de "Trinidad"; e ali haveria ótimo porto,
se fosse fundo, e viam-se casas, gente, e terras lindíssimas,
tão bonitas e verdejantes como as hortas de Valência em
março. Penalizou-me não poder entrar no porto e percorri a
costa até o Poente, e, depois de cinco léguas, achei um
fundo ótimo e ancorei. No dia seguinte soltei a vela nessa
mesma rota, à procura de um porto para consertar os navios,
buscar água, renovar o trigo e as provisões que restavam. Ali
peguei um barril de água e com ele andei até chegar ao cabo,
onde fiquei ao abrigo do Levante e achei bom fundo; e assim
mandei ancorar, consertar as vasilhas, buscar água e lenha e
desembarcar a tripulação para descansar de tanto tempo que
andava penando.
A essa ponta chamei de "Arsenal" e ali se encontrou o solo
todo marcado pelo rastro de animais que teriam pata igual às
cabras, e, embora pareça existir muitas no local, viu-se
apenas uma e morta. No dia seguinte, veio do Oriente uma
grande canoa com vinte e quatro homens, todos jovens e
bem aparelhados em matéria de armas, arcos, flechas e
escudos de madeira, sendo todos, como já disse, jovens, de
boa disposição e não negros, a não ser mais claros que outros
que vi nas índias, e de gestos muito harmoniosos, corpos
bonitos e cabelo comprido e liso, cortado à maneira de
Castela, com a cabeça amarrada por um pano de algodão,
tecido com bordados e cores, a meu ver servindo de
toucado. Traziam outro desses panos na cintura, cobrindo-se
com ele, no lugar de tangas. Quando a canoa chegou,
falaram de muito longe. Nem eu nem ninguém entendeu o
que diziam, limitando-me a lhes fazer sinal para que se
aproximassem; nisso gastou-se mais de duas horas, e quando
se aproximavam, em seguida se desviavam. Eu mandava
mostrar-lhes bacias e outras coisas brilhantes, para atraí-los
para o nosso lado, e ao cabo de algum tempo foram se
aproximando um pouco mais; eu queria muito conversar
com eles e não dispunha de mais nada que me parecesse que
serviria para atraí-los; então mandei subir um tamborim ao
castelo da popa para que tocassem e alguns marinheiros
dançassem, acreditando que se aproximariam para ver a festa
mais perto. E, logo que viram que estavam tocando e
dançando, todos largaram os remos, pegaram os arcos e,
protegendo-se cada um com o seu escudo de madeira,
começaram a nos atirar flechas. Imediatamente
interrompeu-se a música e a dança e eu mandei logo sacar
uns trabucos até que desistiram, dirigiram-se para outra
caravela e de repente passaram por baixo da popa; o piloto
entrou na canoa e deu um saio e um gorro para o índio que
lhe pareceu o mais importante do grupo, combinando que
iria conversar com ele na praia, para onde logo foram com a
canoa, a fim de esperá-lo. E o piloto, como não quisesse ir
sem a minha permissão, ao ser visto por eles vindo de barco
para a nau, fez com que tornassem a embarcar na canoa e
partissem; e nunca mais os vi, nem a quaisquer outros, nessa
ilha.
Quando cheguei a esta ponta do Arsenal, verifiquei que ali
se abre uma foz de duas léguas de largura, do Poente ao
Levante, entre a ilha de Trinidad e a terra de Gracia5, e que
para poder entrar e passar ao Setentrião era preciso enfrentar
correntezas que atravessavam aquela foz e faziam um
barulho enorme. E imaginei que houvesse um recife de
baixios e penhascos, que impediriam a nossa passagem; e por
trás dessa primeira haveria outra correnteza e mais outra,
todas fazendo um estrondo tão grande como a onda do mar
quando quebra e bate de encontro a rochedos. Ancorei ali,
na referida ponta do Arsenal, fora da mencionada foz, e
achei que as águas vinham do Oriente para o Poente com o
mesmo ímpeto que ocorre em Guadalquivir em tempo de
enchente e isso sem parar, noite e dia, e até expus que não
poderia retroceder por causa da correnteza, nem seguir
adiante por causa dos baixios. E de noite, já bem tarde,
estando a bordo da nau, escutei um barulhão tremendo,
proveniente do lado do Austro, e me parei a olhar e vi
levantando o mar de Poente a Levante, na forma de uma
elevação da altura da nau, mas que se aproximava aos
poucos, e, por cima dela, uma correnteza fazendo tal
estrondo, com a mesma fúria daquele rumor das outras
correntezas que disse que me pareciam ondas do mar
batendo de encontro a rochas, que até agora ainda sinto no
corpo o medo de que fossem me emborcar a nau quando
passassem por baixo dela; e passou e chegou à foz, onde se
deteve durante muito tempo. No dia seguinte enviei os
barcos para proceder sondagens, e descobri que na parte
mais baixa da foz havia seis ou sete braças de profundidade,
enquanto as correntezas não paravam de entrar e sair; e quis
o Nosso Senhor conceder-me bom vento, e atravessei pela
foz adentro e logo encontrei tranqüilidade, e por acaso se
tirou água do mar, que achei doce. Naveguei a Setentrião até
chegar a uma serra muito alta, que dista cerca de vinte e seis
léguas dessa ponta do Arsenal, e ali encontrei dois cabos de
terra bem alta, um do lado do Oriente, pertencente à mesma
ilha de Trinidad, e outro do Ocidente, da terra que
denominei de Gracia, onde se abre numa foz bastante
estreita, menor que a da ponta do Arsenal; e lá havia as
mesmas correntezas e um estrondo de águas idêntico ao da
ponta do Arsenal, e mesmo assim o mar era de água doce.
Até então eu ainda não tinha falado com nenhum habitante
dessas regiões, o que muito me agradaria; por isso naveguei
ao longo da costa na direção do Poente; e, quanto mais
andava, mais achava a água do mar doce e gostosa, e, depois
de muito navegar, cheguei a um lugar onde as terras me
pareceram lavradas. Ancorei, enviei os barcos à margem , e
descobriram que fazia pouco tempo que a população tinha-
se ido embora dali e que o morro era completamente
coberto por gatunhas pantanosas. Voltaram e, como a região
fosse serrana, tive a impressão de que as terras mais para o
lado do Poente deveriam ser planas e, por isso, povoadas. E
mandei levantar âncora e percorri a costa até o cabo dessa
serra, e ali ancorei num rio; em seguida apareceu muita
gente, dizendo que o lugar chamava-se "Pária" e que dali
para o Poente era mais povoado Peguei quatro deles e depois
naveguei na direção indicada, e, percorridas mais oito léguas
além de uma ponta que denominei de "Agulha", encontrei
terras dignas de figurar entre as mais bonitas do mundo e
muito povoadas. Cheguei de manhã, à hora de terça,7 e ao
ver tanta vegetação e beleza, resolvi ancorar e conhecer
aquela gente, da qual logo vieram em canoas até à nau para
pedir, da parte do cacique, que eu desembarcasse. E, quando
viram que eu não pretendia atendê-los, insistiram com uma
infinidade de canoas; vários usavam peças de ouro no
pescoço, enquanto outros traziam pérolas amarradas nos
braços; muito me alegrei quando as vi e tratei de saber onde
as encontravam, e me responderam que era do lado norte.
Gostaria de ter ficado mais, porém as provisões que trazia,
trigo, vinho e carne para toda esta gente que está aqui, iam
acabar estragando, depois do trabalho que passei para
consegui-las, e por isso só queria seguir viagem até deixá-las
em lugar seguro e não parar para coisa alguma. Tratei de
guardar as pérolas e enviei os barcos à terra: esses habitantes
são em grande número e todos parecem de boa índole, da
mesma cor dos anteriores e muito afáveis. A parte da
tripulação que desembarcou em terra achou que eram bem
razoáveis, os tendo recebido com todas as honras: dizem
que, logo que os barcos chegaram à margem, vieram duas
pessoas importantes acompanhadas por todo o povoado;
acreditam que uma fosse o pai e a outra o filho, e os
conduziram a uma casa enorme, construída a duas léguas
dali, e não redonda como tenda de acampamento, como
costumamos encontrar, e onde havia muitas cadeiras.
Fizeram com que sentassem, ocupando as restantes; e
mandaram trazer pão e muitas variedades de fruta e de
vinho, branco e tinto, mas que não é feito de uvas; deve ser
de diversos tipos de fruta, e mesmo assim deve ser de milho,
que é uma semente de onde brota uma espiga igual à ma-
çaroca, que levei para aí e já tem muito em Castela, e parece
que aquele que bebesse melhor era considerado com maior
apreço. Os homens estavam todos juntos a uma extremidade
da casa, e as mulheres na outra.
De ambas as partes ficaram penalizados, pois não se
entendiam, eles para perguntar sobre a nossa pátria e nós
para saber da sua. E, depois de terem feito uma refeição leve
na casa do mais velho, o mais moço levou-os à dele, onde
fez o mesmo, e aí então entraram nos barcos e voltaram para
a nau; e logo levantei âncora, pois estava com muita pressa
de entregar os mantimentos que corriam risco de estragar e
que me haviam custado tanto trabalho; e também para poder
descansar, que adoeci de tanto manter os olhos abertos.
Nem na viagem em que descobri a terra firme , quando
passei trinta e três dias sem conseguir dormir e permaneci
tanto tempo sem enxergar, os olhos me incomodaram tanto,
ficando injetados de sangue, e com tantas dores, como
agora.
Esta gente, como já disse, é toda de estatura imponente,
altos de corpo e de gestos muito harmoniosos, cabelo bem
comprido e liso, e trazem as cabeças cingidas por panos
bordados, como já expliquei, lindíssimos, que de longe
parecem de seda e gaze; usam outro, maior, atado à cintura,
cobrindo-se com ele em lugar de tangas, tanto os homens
como as mulheres. A cor desta gente é mais branca que
qualquer outra que eu tenha visto nas Índias; todos usavam
no pescoço e nos braços alguma coisa à maneira destas
regiões e muitos traziam peças de ouro penduradas ao pesco-
ço. As suas canoas são grandes e mais bem-feitas do que as
outras, e também mais leves, e no meio de cada uma tem
uma repartição feito câmara, onde notei que andavam as
pessoas importantes com as suas mulheres. Dei a esse lugar o
nome de "Jardins", por ser o que lhe convém. Muito me
esforcei para descobrir de onde tiram o ouro, e todos me
indicaram uma terra que lhes fica fronteiriça do lado do
Poente, bem montanhosa, mas não distante; me
aconselharam, porém, a não ir até lá, porque é um lugar
onde comem gente, e então entendi que queriam dizer que
havia canibais, como outros que já encontramos, e depois
lembrei que poderia ser que dissessem isso porque ali
existiriam feras. Também perguntei de onde vinham as
pérolas e também responderam que era do lado do Poente e
do norte, por trás dessa terra em que se encontravam. Não
pude ir verificar por causa da preocupação com os
mantimentos, da inflamação dos meus olhos e dessa nau tão
grande que trouxe e que não serve para esse tipo de façanha.
E, como não dispúnhamos de muito tempo, gasto quase todo
em perguntas, voltamos para os navios, pois já estava na
hora de vésperas, como disse.
Logo levantei âncora e naveguei para o Poente; e fiz o
mesmo no dia seguinte, até que vi que contava com apenas
três braças de profundidade; crendo, contudo, que devia ser
uma ilha e que poderia sair pelo lado norte, mandei na
frente uma caravela mais veloz, para ver se existia saída ou
se estava fechado, e assim percorri um grande trecho, até
chegar a um golfo muito grande, no qual parecia haver
outros quatro de tamanho médio, sendo que de um deles
saía um rio larguíssimo; acharam sempre cinco braças de
profundidade e a água muito doce, em quantidade tão
grande que bebi como nunca. Fiquei muito contrariado
quando percebi que não podia sair pelo norte nem recuar ao
Austro ou ao Poente, porque estava cercado de terra por
todos os lados, e assim levantei âncora e voltei para trás, para
sair ao norte pela foz que mencionei acima, e não pude
refazer o caminho passando pelo povoado onde estivemos
antes, por causa das correntes que nos desviaram dele. E
sempre, em todo cabo, achava a água doce, transparente e
que me levava para o Oriente com muito ímpeto para as
duas fozes que já citei; e então cheguei ã conclusão de que as
correntes e aquelas elevações que saíam e entravam por
essas fozes, com tal estrondo, resultavam do choque entre a
água doce com a salgada. A doce empurrava a outra para que
não entrasse, e a salgada para que a outra não saísse; e deduzi
que ali, na confluência dessas duas fozes, já existiu terra
ininterrupta da ilha de Trinidad com a de Gracia, como
poderão ver Vossas Majestades pelo desenho que mando
junto. Saí por essa foz do norte e achei que a água doce
sempre vencia, e quando passei, o que consegui com a força
do vento, encontrando-me numa daquelas elevações, notei
que na parte interna da corrente a água era doce e, na
externa, salgada.
Quando naveguei da Espanha para as índias logo verifiquei,
ao passar cem léguas a Poente dos Açores, uma enorme
diferença no céu e nas estrelas, e na temperatura do ar e nas
águas do mar, e de muito me valeu a experiência.
Acho que, de Setentrião em Austro, passando as ditas cem
léguas das referidas ilhas, as bússolas de navegação, que até
então nordeste iam, imediatamente noroeste iam uma quarta
de vento por completo; e isso ao chegar ali, naquela linha,
como quem transpõe uma costa, e ainda assim encontra o
mar todo cheio de algas, de uma qualidade que lembra
raminhos de pinheiro, e muito carregadas de uma fruta que
parece aroeira, e tão espessas que na primeira viagem pensei
que fossem baixios e que os navios iam encalhar, e até
chegar a essa linha não se acha um só raminho. Vejo
também, ao chegar ali, que o mar é muito suave e liso, e
mesmo que vente com força, nunca se agita. Da mesma
forma, no âmbito da referida linha, do lado do Poente, noto
que a temperatura do céu é bem suave e sem grandes dis-
crepâncias, tanto no inverno como no verão. Quando passo
por lá, vejo que a estrela do Norte descreve um círculo, que
tem cinco graus de diâmetro, e estando a constelação da
Ursa Menor no braço direito, a estrela então fica mais baixa,
e se vai levantando até chegar ao braço esquerdo, e aí fica a
cinco graus; e dali vai descendo até chegar de novo ao braço
direito.
Procedente da Espanha, cheguei agora à ilha da Madeira, dali
seguindo para as Canárias e depois para as ilhas de Cabo
Verde, de onde parti para navegar ao Austro até abaixo da
linha equinocial, como já disse. Chegando a ficar em linha
reta com o paralelo que passa pela Serra Leoa na Guiné,
encontrei um calor tão forte e raios de sol tão ardentes que
pensei que fossem me queimar, e por mais que chovesse e o
céu estivesse muito nublado, sempre me sentia cansado, até
que Nosso Senhor nos concedeu bons ventos e me deu
ânimo para navegar para o Ocidente com esse denodo, que,
ao chegar à linha que mencionei, ali me depararia com uma
grande mudança na temperatura. Depois que me coloquei de
modo a manter-me em linha reta com essa linha, logo senti
que a temperatura do céu estava muito branda e, quanto
mais avançava, mais amena ficava; mas também notei que
isso não se aplicava às estrelas.
Sempre li que o mundo, formado por terra e água, era
esférico, e as autoridades e experiências de Ptolomeu e
tantos outros, que descreveram essa região, comprovavam
isso, quer pelos eclipses da lua e outras demonstrações que
fazem de Oriente para Ocidente, como da elevação do pólo
em Setentrião em Austro. Agora vi tanta desconformidade,
como já disse, que passei a considerar o mundo de maneira
diversa, achando que não é redondo do jeito que dizem, mas
do feitio de uma pêra que fosse toda redonda, menos na
parte do pedículo, que ali é mais alto, e que essa parte do
pedículo seja mais elevada e mais próxima do céu, e se
localize abaixo da linha equinocial, neste mar Oceano, nos
confins do Oriente. Eu chamo de confins do Oriente o
ponto onde acabam toda a terra e as ilhas, e para isso
acrescento todas as razões já descritas sobre a linha que passa
ao Ocidente das ilhas dos Açores a cem léguas de Setentrião
em Austro, que, ao passar dali ao Poente, já vão os navios
erguendo-se suavemente para o céu, e então se goza da
temperatura mais branda e se muda a bússola de navegação
por causa da brandura dessa quarta de vento; e quanto mais
se avança e se ergue, mais noroeste ia, e essa altura causa a
alteração do círculo que a estrela do Norte descreve com a
constelação da Ursa Menor; e, quanto mais eu me aproximar
da linha equinocial, mais alto subirão e maior será a diferen-
ça entre as referidas estrelas e seus respectivos círculos. E
Ptolomeu e os outros sábios que descreveram este mundo
acreditaram que fosse esférico, supondo que este hemisfério
também seria redondo, tal como aquele onde estavam, que
tem por centro a ilha de Arin, situada sob a linha equinocial
entre o signo árabe e o da Pérsia, sendo que o círculo passa
sobre o Cabo de São Vicente em Portugal pelo Poente, e
passa no Oriente por Cangara e pelas Serás , em cujo
hemisfério não me consta que exista alguma dificuldade, a
não ser que seja esférico redondo, como pretendem. De
modo que desta metade não houve notícia. Por ser bem
desconhecido, Ptolomeu e os outros que descreveram o
mundo só se concentraram no hemisfério onde estavam,
que é redondo esférico, como disse acima. E, agora que
Vossas Majestades determinaram que fosse navegado,
vasculhado e descoberto, fica evidentíssimo, pois,
encontrando-me eu nesta viagem a vinte graus a Setentrião
da linha equinocial, ali localizava-se em linha reta a Hargin e
àquelas terras: e ali a população é negra e a terra muito
queimada e, depois que fui às ilhas de Cabo Verde, em cujas
terras o povo é bem mais negro, e quanto mais se desce em
direção ao Austro tanto mais chegam ao extremo, de
maneira que de lá, em linha reta de onde eu estava, que é a
Serra Leoa, onde ao anoitecer se erguia a estrela do Norte a
cinco graus, ali a população é negra na maioria, e depois que
naveguei a partir daí para o Ocidente, passando por calores
tão excessivos e pela linha mencionada, verifiquei um
grande aumento na temperatura, passando a navegar tão de-
pressa que, quando cheguei à ilha da Trinidad, onde ao
anoitecer a estrela do Norte também se erguia a cinco graus,
lá e na terra de Gracia encontrei temperatura extremamente
amena, e terras e árvores muito verdes e tão bonitas como as
hortas de Valência em abril; e o povo de lá é de estatura
muito imponente e mais branco do que outros que vi nas
índias, e com cabelo bem comprido e liso, sendo gente mais
astuta, de maior engenho e nada covarde.
A Sagrada Escritura atesta que Nosso Senhor criou o paraíso
terrestre, nele colocando a árvore da vida, e de onde brota
uma fonte de que resultam os quatro maiores rios deste
mundo: o Ganges na Índia; o Tigre e o Eufrates, que separam
a serra, dividem a Mesopotâmia e vão desembocar na Pérsia,
e o Nilo, que nasce na Etiópia e acaba no mar, em
Alexandria.
E não encontro nem jamais encontrei nenhuma escritura de
latinos ou gregos que indique, com segurança, o lugar em
que se situa neste mundo o Paraíso terrestre; nem tampouco
vi em nenhum mapa-múndi, a não ser localizado com
autoridade de argumento. Alguns o colocavam ali onde
ficam as fontes do Nilo, na Etiópia; mas outros percorreram
todas essas terras e não encontraram nenhuma
correspondência na temperatura do ar, na altura até o céu,
pela qual se pudesse compreender que era ali, nem que as
águas do dilúvio houvessem chegado até lá, as quais tudo
cobriram etc. Alguns infiéis tentaram provar, com
argumentos, que ficava nas ilhas Fortunatas, ou seja, as
Canárias.
Santo Isidro, Beda, Strabo, o mestre da história escolástica,
Santo Ambrósio, Scoto e todos os teólogos concordam que o
Paraíso terrestre se encontra no Oriente etc.
Creio que, se eu passasse abaixo da linha equinocial, ao
chegar lá, na parte mais alta, encontraria temperatura muito
maior e diferença nas estrelas e nas águas; não porque creia
que ali onde a altura seja máxima seja também navegável ou
haja água, nem que se possa subir até lá, mas porque creio
que ali é o Paraíso terrestre, aonde ninguém consegue
chegar, a não ser pela vontade divina". E creio ainda que esta
terra que Vossas Majestades agora mandaram descobrir seja
imensa e tenha muitas outras no Austro, de que jamais se
ouviu falar.
Sei perfeitamente que as águas do mar levam seu curso do
Oriente para o Ocidente, junto com os céus, e que ali, nessa
região, quando passam, fazem rota mais rápida, e por isso
devoraram tanta parte da terra. Porque por isso existem aqui
tantas ilhas e elas mesmas prestam testemunho disso, porque
todas, sem exceção, são largas de Poente a Levante e de
Noroeste a Sudeste, que é um pouco mais alto e mais abaixo;
e aqui, em todas elas, nascem coisas maravilhosas, por causa
da amena temperatura que lhes emana do céu, por estar na
parte mais alta do mundo.
Plínio escreve que o mar e a terra constituem uma única
esfera, e atribui a este mar Oceano a maior quantidade de
água, que está perto do céu, e que a terra fica por baixo e o
sustenta, sendo um ligado ao outro feito o âmago da noz
com a camada grossa que vem colada nele. O mestre da
história eclesiástica sobre o Gênesis diz que as águas são bem
poucas, que, embora quando foram criadas cobrissem toda a
terra, eram evaporáveis em forma de neblina e que, depois
que ficaram sólidas e ajuntadas, ocuparam pouquíssimo
lugar, no que concorda Nicolau de Lira. Aristóteles diz que
este mundo é pequeno e a água muito escassa e que
facilmente se pode passar da Espanha às Índias, o que é
confirmado por Avenruíz e aduzido pelo cardeal Pedro de
Aliaco, autorizando a afirmar isso; e Sêneca, que concorda
com eles, diz que Aristóteles pôde saber muitos segredos do
mundo por causa de Alexandre Magno, Sêneca por causa de
Nero, e Plínio com relação aos romanos, que gastaram
dinheiro e gente, empenhando-se em conhecer os segredos
do mundo e divulgá-los aos povos; o mesmo cardeal lhes dá
grande crédito, mais que Ptolomeu a outros gregos e árabes,
e confirma, dizendo que a água é pouca, sendo pequena
também a parte do mundo coberta por ela, a respeito do que
se dizia para ratificar Ptolomeu e seus adeptos: quanto a isso,
basta citar Esdras em seu terceiro livro, onde declara que das
sete partes do mundo, seis são descobertas, e a sétima está
imersa em água, citação aprovada por santos, que também
citam o terceiro e quarto livro de Esdras, assim como Santo
Agostinho e Santo Ambrósio, em seu "Exameron", onde
acrescenta: ali virá meu filho Jesus e morrerá meu filho
Cristo; e dizem que Esdras foi profeta, da mesma forma que
Zacarias, pai de São João, e o eremita Simão, autoridades
também citadas por Francisco de Mairones: no que diz
respeito à parte enxuta da terra, muito se tentou, bem mais
do que o vulgo supõe; e não há por que se admirar, porque,
quanto mais se anda, mais se aprende.
Volto ao meu assunto da terra de Gracia, do rio e do lago
que ali encontrei, tão grande que seria mais justo considerá-
lo mar, pois "lago" é lugar de água e, sendo grande, se diz
"mar", como se chamou ao mar da Galiléia e ao mar Morto, e
eu afirmo que esse rio emana do Paraíso terrestre e de terra
infinita, pois do Austro até agora não se teve notícia, mas a
minha convicção é bem forte de que ali, onde indiquei, fica
o Paraíso terrestre, e em meus ditos e afirmações me apoio
nas razões e autoridades supracitadas.
E agora o Adiantado, com três navios bem aparelhados, irá
investigar mais adiante, e descobrirão tudo o que puderem
por aqueles lados. Enquanto isso, enviarei a Vossas
Majestades este relatório e o desenho da terra , para
decidirem sobre o que se deve fazer e me enviarem as
ordens, que se cumprirão com a ajuda da Santíssima
Trindade com o máximo empenho, de modo que Vossas
Majestades sejam atendidas e fiquem satisfeitas. - Deo
gratias.


A Quarta Viagem
(1502-04)

A quarta e última viagem de Colombo às índias teve início
em maio de 1502. Com 51 anos, o Almirante era um
homem fatigado, obscurecido pela sombra do fracasso. Seu
título de Vice-Rei Geral era mera etiqueta. Mesmo assim,
conseguiu reunir quatro embarcações, leves e de menor
preço, que demonstram a diminuição de seu prestígio e a
intenção exploratória da expedição, que Colombo batizou de
"Alto Viaje" devido ao sonho de encontrar uma passagem
para o Oriente. A miragem persistia...
O Atlântico foi cruzado em 21 dias apenas. Depois de
explorar novamente as Antilhas, Colombo atingiu a costa do
Panamá sem, é claro, encontrar a passagem para a China. De
volta à Espanha, em 1504, não passava de um marinheiro
entre outros. Com a morte de sua protetora, a Rainha Isabel,
seu prestígio caiu ainda mais. Em breve, o Almirante não
mais sonharia.

Carta do Almirante aos Reis Católicos

Sereníssimos, mui augustos e poderosos monarcas, Rei e
Rainha, nossos Soberanos: De Cádiz fui às Canárias em
quatro dias, e dali às índias em dezesseis, de onde escrevo .
A minha intenção era apressar a minha viagem enquanto
tinha navios , tripulação e provisões em bom estado, e
minha rota passava pela ilha de Jamaica; e na Dominica
escrevi isso. Até então não me sobrou tempo para nada. Na
noite em que ali cheguei caiu grande temporal, que me
perseguiu sempre.
Quando aportei na Espanhola mandei o pacote de cartas,
pedindo o favor de receber um navio, pois um dos que
trouxe estava inutilizável e não agüentava as velas . As
cartas foram enviadas e confio que tenham merecido
resposta. Para mim. bastou sair daí para não saber se
suportaria a travessia ou chegaria ao destino. A tripulação
que me acompanhava perdeu o ânimo, de medo que os
levasse longe demais, afirmando que, se corressem algum
risco, ali é que não teriam salvação: pelo contrário,
contavam como certa alguma grande desgraça. Também a
quem rogo diz que só o comendador haveria de abastecer
todas as terras que eu conquistasse.
A tempestade foi terrível, e naquela noite me despedaçou os
navios: cada um chegou ao destino sem esperanças, a não
ser a de morrer; e todos tinham certeza de que os demais
estavam perdidos. Quem, à exceção de Job, nasceu sem
morrer desesperado? Como, pela minha salvação e a de meu
filho, de meus irmãos e amigos, seria com semelhante tem-
po defendida a terra e os portos que, pela vontade de Deus,
conquistei para a Espanha suando sangue?
E volto aos navios, que a tempestade me arrebatou, e me
deixou sozinho. Nosso Senhor os coloca à minha frente
quando lhe imploro. O navio Ressabiado lançou-se mar
afora, para escapar, até à ilha Galega: perdeu o barco e boa
parte dos mantimentos; o que eu navegava,
extraordinariamente cheio de carga, Nosso Senhor poupou,
pois nem uma palha sofreu dano. No Ressabiado ia meu
irmão; e ele, depois de Deus, foi a sua salvação. E com esse
vendaval, assim às cegas, cheguei à Jamaica; ali, o mar passou
de agitado à calmaria; e uma grande corrente me levou ao
Jardim da Rainha sem ver costa alguma. De lá, quando pude,
naveguei para terra firme, onde irrompeu o vento e uma ter-
rível corrente contrária; lutei sessenta dias contra ambos e
no fim não pude avançar mais de setenta léguas.
Durante esse tempo todo não encontrei guarida, pois não
pude nem me deixaram as tormentas do céu, da água,
trovões e relâmpagos inacabáveis: mais parecia o fim do
mundo . Cheguei ao cabo de "Graças a Deus" e ali Nosso
Senhor me concedeu vento e corrente propícios. Isso foi a
12 de setembro. Fazia oitenta e oito dias que essa espantosa
tempestade não me dava trégua, a ponto de não ver o sol
nem as estrelas pelo mar; os navios já estavam com rombos,
as velas rasgadas, as âncoras, enxárcias, cabos, tudo perdido,
junto com os barcos e muitas provisões, e a tripulação toda
doente e contrita, vários com promessas religiosas e não
poucos com outros votos e romarias, até terminar o mau
tempo.
Cheguei à terra de Cariay , onde parei para recuperar os
navios e as provisões, e dar alento à tripulação, que estava
muito doente. Eu que, como disse, por várias vezes me vi às
portas da morte, soube ali das minas de ouro da província de
Ciamba , que tanto procurava. Dois índios me levaram a
Carambaru, onde a população anda nua e usa no pescoço um
espelho de ouro; mas não quiseram vender nem fazer
permuta. Indicaram vários lugares na costa marítima, onde
diziam que havia ouro e minas; o mais próximo era
Veragua , que distava cerca de vinte e cinco léguas dali.
Parti com a intenção de tentar todos, e, chegando já na
metade do caminho, soube que havia minas a dois dias de
percurso. Nessa noite o mar e o vento se agitaram de tal
forma que foi preciso correr para onde nos levaram; e o
chefe dos índios das minas sempre ao meu lado.
Num abrigo descontei dez dias de grande sorte com o mar e
com o céu; ali decidi não voltar atrás para procurar as minas
e considerei-as já conquistadas. Parti, para prosseguir minha
viagem, debaixo de chuva; cheguei ao porto de Provisões,
onde entrei e não de bom grado. A tempestade e uma
grande corrente me fizeram perder ali quatorze dias; depois
fui embora, mas não com bom tempo. Quando já tinha
andado certamente quinze léguas, o vento e a corrente me
impeliram com fúria para trás. Regressando ao porto de onde
havia saído, encontrei no caminho o Retiro, para onde me
recolhi com muito risco e aborrecimento, e bem cansado,
tanto eu como os navios e a tripulação. Ali mudei de decisão
e resolvi voltar às minas e para ter alguma coisa para fazer
até que o tempo se mostrasse mais favorável para prosseguir
viagem por mar. E, percorridas quatro léguas, recomeçou a
tempestade e me cansou tanto, que já não atinava com mais
nada. Ali senti alívio das dores da doença — mas passei nove
dias em desalento, sem esperança de viver; ninguém jamais
viu o mar tão agitado, feroz e coberto de espuma. Ali fiquei,
naquele mar feito sangue, fervendo que nem chaleira a todo
vapor. Nunca se viu céu mais aterrador: um dia, ardeu feito
forno até de noite; e assim os raios do sol queimavam como
chamas, a ponto de eu olhar para ver se não me havia levado
os mastros e as velas. A tripulação estava tão alquebrada que
sonhava até com a morte para se livrar de tantos
padecimentos.
Quando aprouve a Nosso Senhor, voltei a Porto Gordo, onde
me refiz da melhor maneira que pude. Recuei de novo para
Verágua, embora a idéia não me seduzisse. Cheguei quase ao
ponto em que estive antes, e aí então o vento e a corrente
me foram outra vez adversos. E retornei novamente ao
porto, pois não me atrevi a esperar a oposição de Saturno
com mares tão desvairados em costa bravia. Isso foi no dia
de Natal, na hora da missa. Voltei mais uma vez, já exausto,
para o lugar de onde tinha saído, e, passado o Ano Novo,
tornei a insistir. Aí Nosso Senhor colocou diante de mim
um rio com porto seguro. Consegui entrar a duras penas e
no dia seguinte foi que me dei conta da sorte que tive: se
estivesse do lado de fora, não poderia entrar por causa do
banco que havia na foz. Choveu sem parar até o dia 14 de
fevereiro, e estando já a salvo à 24 de janeiro, de repente o
rio irrompeu muito alto e caudaloso: quebraram-se-me as
amarras e remos, e tive que levar os navios. Não resta dúvida
que os vi em maior perigo do que nunca. Nosso Senhor,
como sempre, nos socorreu. A 6 de fevereiro, chovendo,
enviei setenta homens para explorarem a região; e a cinco
léguas da costa descobriram várias minas: os índios que os
acompanhavam os levaram a um morro muito alto e de lá
lhes mostraram até onde se podia ver, dizendo que em toda
parte havia ouro e que para o lado do Poente se demorava
vinte dias para chegar às minas, e enumeraram as vilas e
lugarejos mais pródigos nesse sentido. Depois fiquei sabendo
que o Quibian, que tinha emprestado esses índios, lhes havia
ordenado que mostrassem as minas mais distantes e difíceis,
e que dentro de sua povoação, um homem, se quisesse,
extraía uma infinidade de ouro em poucos dias. Os índios,
seus súditos, são testemunhas que levo comigo. Os barcos
chegam onde ele tem a povoação. O meu irmão voltou junto
com essa gente, todos trazendo o ouro extraído em quatro
horas que passaram lá na mina. Fundei uma povoação e dei
muitos presentes ao Quibian, que é como chamam o cacique
dessa terra. E bem sabia que a concórdia não podia durar:
eles são muito simples e nossa gente é importuna; no fim, eu
seria preso. Depois que viu tudo pronto e o tráfico tão
intenso, resolveu botar fogo e matar todos nós. Mas o tiro
lhe saiu pela culatra: quem ficou preso foi ele, com as
mulheres e os filhos já grandes; se bem que sua prisão durou
pouco. O Quibian fugiu da guarda de um homem honrado, a
quem se rendera; e os filhos foram entregues a um piloto de
navio, que os prendeu em lugar seguro.
Em janeiro a foz do rio ficou obstruída. Em abril os navios
estavam todos corroídos pelas bromas e nem se podia mais
mantê-los à superfície da água. A essa altura formou-se um
canal no leito do rio, por onde retirei três caravelas vazias
com grande dificuldade. Os barcos voltaram lá dentro para
buscar sal e água. O mar ficou agitado e feroz e não permitiu
que ninguém mais saísse; os índios, inúmeros, juntaram-se e
mostraram-se hostis; tiveram que combatê-los e por fim
matá-los. Meu irmão e todo o resto da tripulação estavam
em um navio que ficou lá dentro: eu, muito só, do lado de
fora, numa costa tão bravia, com febre alta e tanto cansaço; a
esperança de sobreviver era nula. Exausto, adormeci
gemendo. Escutei então uma voz piedosa, dizendo: "Ah,
estulto e lerdo em crer e servir a teu Deus, ao Deus de todos!
Que foi que Ele fez mais por Moisés ou por Davi, seu súdito?
Desde que nasceste, sempre demonstrou por ti muito cari-
nho. Quando te viu em idade de contentá-1'O, fez teu nome
ressoar maravilhosamente pela terra toda. As índias, que
constituem partes tão ricas do mundo, deu para que fossem
tuas. Tudo o que Ele promete, cumpre e dá em dobro. Agora
mostra o prêmio por esses trabalhos e perigos que passaste
servindo a outros". Eu, assim entorpecido, a tudo escutei;
mas não encontrei resposta para palavras tão certas, a não ser
chorar pelos meus erros. Acabou Ele, quem quer que fosse,
de falar, dizendo: "Não tenhas medo; confia; todas estas
atribulações estão escritas em pedra mármore e não sem
motivo".
Levantei-me quando pude; e ao fim de nove dias fez
calmaria. Parti em nome da Santíssima Trindade na noite de
Páscoa, com os navios apodrecidos, comidos pela broma,
todos cheios de buracos. Em Belém deixei um, com uma
porção de coisas. Em Belpuerto fiz o mesmo. Só me
restaram dois, no estado dos demais, sem barcos e sem
provisões, para ter que passar sete mil milhas de mar e água
ou morrer no meio do caminho com filho, irmão e tanta
gente.
Cheguei a 13 de maio na província de Mago e de lá parti
para a Espanhola. O mar bravio me foi adverso e tive que
retroceder, sem velas. Ancorei em uma ilha, onde de saída
perdi três âncoras e à meia-noite se romperam as amarras do
outro navio, que veio por cima do meu de tal maneira que é
de admirar que não tenhamos rachado ao meio: a âncora, do
jeito que ficou, foi ela, depois de Nosso Senhor, que me
salvou. No fim de seis dias, quando lá fazia bom tempo,
voltei para a minha rota. Assim, já tendo perdido por
completo os aparelhos e com os navios mais esburacados por
vermes do que uma colméia e a tripulação tão atemorizada e
perdida, passei um pouco adiante do lugar onde tinha
chegado anteriormente. Parei na mesma ilha em porto mais
seguro. No fim de oito dias retomei a rota e cheguei à
Jamaica em fins de junho. Quem acreditaria no que descrevo
aqui? De cem partes acontecidas, afirmo que não contei
sequer metade. Os que acompanharam o Almirante são
testemunhas.
Quando descobri as Índias, disse que era o maior repositório
de riquezas do mundo. Falei de ouro, pérolas, pedras
preciosas, especiarias, com os comércios e as feiras, e, como
tudo não apareceu com a rapidez esperada, fui alvo de
insultos. Essa lição me ensinou agora a falar só no que ouço
dos nativos da terra. Mas uma coisa ouso afirmar, porque há
muitos testemunhos, e é que vi nesta terra de Verágua
maiores indícios de ouro nos dois primeiros dias do que na
Espanhola em quatro anos, e que as terras da região não
podem ser mais bonitas nem mais bem lavradas, nem a
população mais respeitosa, com bom porto, rio lindo e
protegido do mundo. Tudo isso é garantido dos cristãos e
certeza de domínio, com grande esperança da honra e
engrandecimento da nossa religião. Tão soberanos são
Vossas Majestades disso como de Jerez ou Toledo: os navios
que forem até lá vão à sua própria casa. Dali, extrairão ouro;
em outras regiões, para extrair o que há nelas, é melhor levar
junto, senão voltarão vazios; e na terra é necessário que
confiem sua pessoa a um selvagem. Genoveses, venezianos e
toda gente que tenha pérolas, pedras preciosas e outras
coisas de valor levam tudo até o fim do mundo para trocá-
las, converter em ouro: o ouro é excelso; do ouro se faz
tesouro, e com ele, quem o tem, faz tudo o que quer neste
mundo, a ponto de levar as almas ao Paraíso. Os caciques
daquelas terras da região de Verágua, quando morrem, são
enterrados junto com o ouro que têm; pelo menos é o que
dizem. Para Salomão, levaram de uma só vez seiscentos e
sessenta e seis quintais de ouro, além do que lhe deram os
mercadores marinheiros e do que se lhe pagou na Arábia.
Desse ouro fez duzentas lanças, trezentos escudos e o
tablado onde ficariam guardados, enfeitado ainda com pedras
preciosas, várias outras coisas de ouro e uma profusão de
vasos, muito grandes e ricos de pedras preciosas. Josefo, em
sua crônica das Antigüidades Judaicas, descreve tudo isso.
No Paralipomênon e no Livro dos Reis há também refe-
rências. Josefo pretende que esse ouro tenha sido extraído
na Áurea. Sendo assim, digo que as minas da Áurea são as
mesmas e coincidem com estas de Verágua. Salomão teve
que comprar tudo aquilo: ouro, pedras e prata; ali, em
compensação, se quiserem, podem mandar extrair à
vontade. Davi deixou três mil quintais de ouro das índias de
herança para Salomão ajudar a construir o templo e, segundo
Josefo, provinham dessas mesmas terras. Jerusalém e o
Monte Sion hão de ser reconstruídos por mãos cristãs.
Quem há de ser, é Deus, pela boca do profeta no décimo
quarto salmo, quem diz. O abade Joaquim achou que teria
que sair da Espanha. São Jerônimo ensinou o caminho à
santa mulher. O imperador de Catai há tempos pediu aos
sábios que lhe ensinem a fé de Cristo. Quem se prontificará
a fazer isso? Se Nosso Senhor me reconduzir à Espanha, eu
me comprometo a levá-lo, com o nome de Deus sempre em
segurança.
Essa gente que veio comigo enfrentou incríveis perigos e
trabalhos. E, como são pobres, suplico que Vossas
Majestades lhes mandem pagar logo, concedendo mercês a
cada um segundo a qualidade da pessoa, pois lhes garanto
que, a meu ver, são porta-vozes das melhores notícias que
jamais chegaram à Espanha.
Tenho em maior conta essa negociação e essas minas, nesta
proporção e domínio, do que tudo o mais que foi feito nas
índias. Não há motivo para que quem se mostrou tão
contrário a esta negociação tire dela proveito; muito menos
seus filhos. Os que se foram das índias, fugindo aos trabalhos
e falando mal delas e de mim, voltaram com cargos; assim se
determinava agora em Verágua: um mau exemplo e sem
nenhum proveito para o negócio e a justiça do mundo. Esse
temor, junto com muitos outros casos que via com clareza,
me fez suplicar a Vossas Majestades, antes que viesse a
descobrir estas ilhas e terra firme, que me deixassem
governá-las em seu nome real. Peço-lhes: foi por privilégio e
capacidade, e com sinete e juramento, que me deram o
título de Vice-Rei, Almirante e Governador Geral de tudo, e
indicaram o termo a cem léguas das ilhas dos Açores, e
aquelas de Cabo Verde pela linha que passa de pólo a pólo; e
sobre isso, e tudo o mais que se descobrisse, me deram
amplos poderes. A escritura o confirma com maiores
pormenores.
O outro assunto, já célebre, está clamando de braços abertos:
fui estrangeiro até hoje. Sete anos estive em sua Corte Real,
e a quantos se mencionou esse empreendimento todos
foram unânimes em dizer que era embuste. Hoje, até os
alfaiates imploram para descobrir. Bom é dar a Deus o que é
seu e aceitar o que nos pertence. As terras que aqui
obedecem a Vossas Majestades são mais ricas e maiores que
todos os outros domínios cristãos. Depois que eu, por
vontade divina, as coloquei sob o seu real e augusto poder e
em condições de fornecer imensa renda, de repente,
enquanto aguardava navios para ir receber sua excelsa
aprovação pela vitória e grandes notícias do ouro, muito
seguro e contente, me vi preso e lançado, com dois irmãos,
ao porão de uma nau, a ferros, com o corpo nu, recebendo
maus-tratos, sem o menor julgamento ou sentença de tribu-
nal de justiça. Quem acreditará que um pobre estrangeiro
haveria de se sublevar em semelhante lugar contra Vossas
Majestades, sem motivo algum nem apoio de outro
monarca, encontrando-se só, no meio de vassalos e nativos,
e tendo todos os meus filhos em sua Corte Real? Comecei a
servir com vinte e oito anos e hoje não existe em mim
cabelo que não esteja grisalho; sinto o corpo doente, nada
me resta do que ganhei, eu e meus irmãos nos vimos priva-
dos de tudo o que possuíamos, até do próprio saio, sem que
ninguém quisesse escutar ou ver, com grande desonra para
mim. Não é possível acreditar que isso tenha sido feito por
ordens reais. A restituição de minha honra e prejuízos e o
castigo dos responsáveis haverá de propalar a nobreza da
coroa real; e o mesmo acontecerá a quem me roubou as
pérolas e causou dano a este Almirantado. As virtudes serão
imensas e a fama servirá de exemplo, se tal fizerem; e da
Espanha ficará uma lembrança gloriosa, com a de Vossas
Majestades, de agradecidos e justos monarcas. A intenção
tão honesta que sempre tive ao serviço de Vossas Majestades
e a afronta tão desproporcional não permitem que a alma se
cale, por mais que eu quisesse. Suplico a Vossas Majestades
que me perdoem.
Estou tão perdido quanto disse. Até agora chorei na frente
dos outros: que o céu seja misericordioso e chore por mim a
terra. No plano secular, não disponho sequer de uma branca
para oferecer; no espiritual, fiquei reduzido aqui nas Índias
ao estado que expliquei. Isolado nesta provação, doente,
esperando a morte dia a dia, rodeado por um bando de
inimigos selvagens e cheios de crueldade, e tão afastado dos
Santos Sacramentos da Santa Igreja que esta alma será
esquecida se aqui se separar do corpo. Que chore por mim
quem ama a caridade, a verdade e a justiça. Não fiz esta
viagem para obter honrarias e riquezas porque a minha
esperança já estava completamente morta. Dirijo-me a
Vossas Majestades com a melhor das intenções e desvelos.
Suplico-vos humildemente que, se a Deus aprouver tirar-me
daqui, que haja por bem abençoar a minha ida a Roma e a
outras romarias. Cuja vida e augusto estado guarde e
engrandeça a Santíssima Trindade. Escrito nas índias, na ilha
de Jamaica, a 7 de julho de 1503.

O Testamento

Em nome da Santíssima Trindade, que guardei na lembrança
e depois me deu a certeza absoluta de que poderia navegar a
partir da Espanha até chegar às Índias, atravessando o mar
Oceano em sentido ao Poente, como notifiquei ao Rei Dom
Fernando e à Rainha Dona Isabel, Nossos Soberanos, e lhes
aprouve conceder-me os meios e recursos de tripulação e
navios, e nomear-me seu Almirante no referido Oceano,
para além de uma linha imaginária que mandaram traçar
sobre as ilhas de Cabo Verde e o arquipélago dos Açores,
cem léguas que vão de pólo a pólo; e que dali em diante, no
sentido do Poente, fosse seu Almirante e que na terra firme
e nas ilhas que a partir de lá achasse e descobrisse, dessas
terras fosse eu Vice-Rei e Governador e que meu filho mais
velho me sucedesse nesses cargos, e assim por diante, de
grau em grau, para todo o sempre, e que recebesse o dízimo
de tudo o que no referido Almirantado se achasse, colhesse
e arrendasse, e da mesma maneira a oitava parte das terras e
de todas as outras coisas, além do salário correspondente aos
ofícios de Almirante, Vice-Rei e Governador, e com todos
os demais direitos pertinentes a tais ofícios, bem como tudo
o que mais amplamente se contém neste meu privilégio e
pacto firmado com Suas Majestades.
E quis Nosso Senhor Todo-Poderoso que no ano de noventa
e dois descobrisse a terra firme das Índias e muitas ilhas,
entre as quais a Espanhola, que os índios chamam de Ayte
(Haiti) e os parvos de Cipango. Depois regressei a Castela,
perante Suas Majestades, que voltaram a apoiar o
empreendimento, para povoar e descobrir mais, e assim me
deu Nosso Senhor vitória, com que conquistei e submeti a
tributos a população da Espanhola, e descobri várias ilhas
com canibais e setecentas ao Poente da Espanhola, entre as
quais a de Jamaica, que chamamos de Santiago, a trezentas e
trinta e três léguas da terra firme do lado do Austro ao
Poente, além de cento e sete ao lado do Setentrião, que
tinha descoberto na primeira viagem com muitas ilhas,
como mais minuciosamente se verá pelos meus relatos,
memoriais e cartas de navegação.
Em primeiro lugar, que a mim há de suceder Dom Diego,
meu filho, e se dele dispuser Nosso Senhor antes que tenha
filhos, que então suceda Dom Fernando, também meu filho;
e se dele dispuser Nosso Senhor antes que tenha filhos, ou
que eu tenha outro filho, que suceda Dom Bartolomeu, meu
irmão, ou então seu filho mais velho; e se dele dispuser Nos-
so Senhor sem que deixe herdeiro, que suceda Dom Diego,
meu irmão, sendo casado ou para poder casar, e que a ele
suceda seu filho mais velho; e assim de grau em grau,
perpetuamente, para todo o sempre, começando por Dom
Diego, meu filho, e sucedendo seus filhos, de um para outro,
perpetuamente, ou falecendo-lhe o filho, suceda Dom
Fernando, meu filho, como ficou estabelecido, e assim seu
filho e, prosseguindo, de filho em filho, para sempre ele e os
supracitados Dom Bartolomeu, se a ele chegar, e a Dom
Diego, meus irmãos. E assim queira Nosso Senhor que, de-
pois de haver passado algum tempo este morgado nas mãos
dos referidos sucessores, viesse a prescrever herdeiros
legítimos, haja o dito morgado e lhe suceda e herde o
parente mais próximo da pessoa que o tenha herdado, em
cujo poder prescreveu, sendo legítimo e que se chame e
sempre se tenha chamado de seu pai, e antecessores,
Colombo. E que de modo algum esse morgado seja herdado
por mulher, a menos que aqui ou em qualquer outra parte
do mundo não se encontre homem de minha linhagem
verdadeira que se tivesse chamado, a ele e a seus
antecessores, de Colombo. E que se isso acontecesse (e
queira Deus que não), em tal hipótese o faça a mulher mais
chegada em parentesco e em sangue legítimo à pessoa que
assim tenha obtido o referido morgado; e suplico ao Santo
Padre, ao atual e ao que a ele suceda na Santa Igreja, agora
ou quando acontecer que este meu compromisso e testa-
mento tenha necessidade para se cumprir de sua santa
ordem e mandamentos, que em virtude de obediência e sob
pena de excomunhão papal o ordene, e que de nenhum
modo jamais se deturpe; e da mesma forma imploro ao Rei e
à Rainha, Nossos Soberanos, e ao príncipe Dom João, seu
primogênito, Nosso Soberano, e aos que lhes sucederem,
pelos serviços que lhes prestei; que, sendo eu nascido em
Gênova, lhes vim a servir aqui em Castela e lhes descobri ao
Poente de terra firme as Índias e as referidas ilhas
supracitadas.
Em primeiro lugar, trará Dom Diego, meu filho, e todos os
que a mim sucederem e descenderem, bem como meus
irmãos Dom Bartolomeu e Dom Diego, as minhas armas,
que deixarei depois de meus dias, sem misturar outra coisa
além delas, e selará com sua chancela. Dom Diego, meu
filho, ou qualquer outro que vier a herdar este morgado,
depois de haver herdado e entrado na posse dele, assine com
a minha assinatura, tal como hoje faço, que consiste num X
com um S em cima e num M com um A romano com um S
em cima, como agora assino, e se parecerá com as minhas
assinaturas, e em cima delas um S e depois um Y se
encontrarão muitas e com esta se parecerá.
E não se intitulará mais que "Almirante", embora o Rei lhe
dê ou ganhe outros títulos; isso, bem entendido, na
assinatura e não em seu ditado, onde poderá incluir todos os
títulos que lhe agradar. Somente na assinatura escreverá "o
Almirante".
O referido Dom Diego, ou qualquer outro que herdar este
morgado, terá o meu cargo de Almirante do mar Oceano,
que consiste numa linha imaginária que Sua Majestade
mandou traçar, do lado do Poente, a cem léguas das ilhas dos
Açores e outro tanto das de Cabo Verde, que se estende de
pólo a pólo, a partir da qual ordenaram e me fizeram seu
Almirante no mar, com todos os privilégios que tem o
Almirante Dom Henrique no Almirantado de Castela, e me
nomearam seu Vice-Rei e Governador perpétuo, para
sempre, e em todas as ilhas e terra firme, descobertas ou por
descobrir, para mim e para os meus herdeiros, como mais
minuciosamente se observa por meus privilégios, os quais
tenho, e por meus pactos, como acima referi.
Outrossim: Que o mencionado Dom Diego ou qualquer
outro que venha a herdar o referido morgado dividirá a
renda, que a Nosso Senhor lhe aprouver dar, da seguinte
maneira, sob a referida pena.
Em primeiro lugar, dará de tudo o que esse morgado render,
agora e sempre, e dele e por ele se colher e arrecadar, a
quarta parte, cada ano, a Dom Bartolomeu Colombo,
Adiantado das índias, meu irmão; e isso até que receba,
como renda, um conto de maravedis para a sua manutenção,
e pelo trabalho que teve e tem em servir nesse morgado; e o
referido conto receberá, como já foi dito, cada ano, se a dita
quarta parte a tanto montar, se ele não tiver outra coisa; mas,
tendo algo ou tudo de renda, que daí em diante não receba o
referido conto nem parte dele, a menos que desde já receba,
na referida quarta parte, até a mencionada quantia de um
conto, se ali chegar; e tanto que tenha de renda, fora dessa
quarta parte, qualquer soma de maravedis de renda
conhecida de bens que possa arrendar, ou cargos perpétuos,
se lhe descontará a referida quantidade que assim receber de
renda ou poderia receber dos referidos bens e cargos
perpétuos; e do referido conto será reservado qualquer dote
ou casamento que com a mulher com quem casar tiver; de
modo que tudo o que receber com a referida esposa não se
entenderá, por isso, que se lhe há de descontar nada do
referido conto, a não ser do que ganhar ou receber além do
dito casamento de sua esposa, e depois que queira Deus que
ele ou seus herdeiros ou quem dele descender receba um
conto de renda de bens e cargos, se os quiser arrendar,
como já foi dito, não receberá ele nem seus herdeiros mais
nada da quarta parte do referido morgado, passando a
receber o mencionado Dom Diego ou quem venha a herdar.
Outrossim: Dom Fernando, meu filho, receberá da referida
renda do referido morgado, ou de outra quarta parte dela,
um conto por ano, se a referida quarta parte montar a tanto,
até que tenha dois contos de renda pela mesma forma e
maneira que já foi dito de Dom Bartolomeu, meu irmão, ele
e seus herdeiros, assim como Dom Bartolomeu, meu irmão,
e os herdeiros do qual assim terão o referido conto ou a
parte que faltar para isso.
Outrossim: O referido Dom Diego e Dom Bartolomeu
ordenarão que Dom Diego, meu irmão, tenha da renda do
referido morgado o suficiente para que se possa manter
honestamente, como meu irmão que é, ao qual não deixo
nada determinado porque ele quer entrar para a Igreja, e lhe
darão o que for razoável, e que isso seja de maior acervo,
antes que se dê alguma coisa a Dom Fernando, meu filho, ou
a Dom Bartolomeu, meu irmão, ou a seus herdeiros, e
também de acordo com a quantidade que render o referido
morgado; e se nisso houver discórdia, que em tal caso se
confie a decisão a dois parentes nossos ou a outras pessoas
de bem, para que examinem ambos os lados da questão; e, se
não puderem conciliar os interesses, que os referidos dois
compromissos escolham outra pessoa de bem que não seja
suspeita a nenhuma das partes.
Outrossim: Que essa renda que mando dar a Dom
Bartolomeu e a Dom Fernando e a Dom Diego, meu irmão,
eles a recebam e lhes seja dada, como disse acima, contanto
que se mantenham leais e fiéis a Dom Diego, meu filho, ou a
quem herdar, eles e seus herdeiros; e, se se achar que fossem
contra ele em coisa que toque ou atente contra sua honra e
engrandecimento de minha linhagem ou do referido
morgado, por palavras ou ações, pelo qual aparecesse e
houvesse escândalo e consternação para a minha linhagem e
menoscabo do referido morgado ou qualquer um deles, que
essa pessoa não receba daí por diante coisa alguma; de modo
que se conservem sempre fiéis e leais a Dom Diego ou a
quem herdar.
Outrossim: Porque pelo princípio com que ordenei esse
morgado tinha pensado em distribuir, e que Dom Diego,
meu filho, ou qualquer outra pessoa que o herdasse,
distribuam dele a décima parte da renda em dízimo e
comemoração do Eterno Deus Todo-Poderoso para pessoas
necessitadas; para isso agora digo que por ir e que vá adiante
minha intenção e para que Sua Augusta Majestade ajude a
mim e aos que isso herdarem, aqui ou no outro mundo, que
todavia se haja de pagar o referido dízimo da seguinte
maneira:
Em primeiro lugar, da quarta parte da renda desse morgado,
da qual determino e mando que se dê a Dom Bartolomeu até
completar um conto de renda, que se entenda que nesse
conto está incluído o referido dízimo de toda a renda do
referido morgado; e que, assim que aumentar a renda do
mencionado Bartolomeu, meu irmão, para que se tenha que
descontar da renda da quarta parte do morgado alguma coisa
ou tudo, que se veja e conte toda a renda supracitada para
saber a quanto monta o respectivo dízimo, e a parte que não
couber ou sobrar ao que tiver de receber o referido Dom
Bartolomeu para completar o conto, que essa parte seja dada
a pessoas de minha linhagem como desconto do referido
dízimo, as que mais necessitadas forem e mais carência tive-
rem, cuidando de dá-la à pessoa que não tiver cinqüenta mil
maravedis de renda; e se, a que menos tiver, chegar até à
quantia de cinqüenta mil maravedis, receba a parte a que
parecer às duas pessoas que sobre isso aqui escolherem com
Dom Diego ou quem herdar: de modo que se entenda que o
conto que mando dar a Dom Bartolomeu contém a parte
supracitada do dízimo do referido morgado, e que toda a
renda do morgado quero ou determino que se distribua
entre os meus parentes mais próximos ao dito morgado e
que mais necessitados forem; e depois que o referido Dom
Bartolomeu tiver seu conto de renda e que não se lhe deva
nada da referida quarta parte, então e antes se verá e veja o
referido Dom Diego, meu filho, ou a pessoa que tiver o
referido morgado com as outras duas pessoas que aqui
indicarei, de tal maneira que o dízimo de toda essa renda
ainda se dê a pessoas de minha linhagem que estiverem aqui
ou em qualquer outra parte do mundo, aonde as mandem
buscar com empenho; e seja da referida quarta parte da qual
o referido Dom Bartolomeu há de receber o conto: os quais
eu conto e dou com desconto do referido dízimo, com razão
de conta, que se o dízimo supracitado for maior, que esse
excesso também saia da quarta parte e a recebam os mais
necessitados, como já disse; e, se não bastar, que Dom
Bartolomeu o receba até que vá saindo do seu, e dessa
maneira deixando em parte ou por completo o referido
conto.
Outrossim: Que o referido Dom Diego, meu filho, ou a
pessoa que herdar, escolham duas pessoas de minha
linhagem, as mais próximas e que tenham ânimo e
autoridade, para examinar e dar conta da referida renda, tudo
com empenho, e a efetuar o pagamento do referido dízimo
da referida quarta parte de que se dá o referido conto a Dom
Bartolomeu, aos mais necessitados de minha linhagem que
estiverem aqui ou em qualquer outro lugar; e pesquisarão
nesse sentido com muito empenho e grande disposição de
ânimo. E porque poderia suceder que o referido Dom Diego
ou a pessoa que herdar não queiram, por algum motivo,
revelar o total de seus bens e a honra e manutenção do
referido morgado, determino que mesmo assim se lhe dê a
referida renda por encargo de sua alma, e a eles ordeno, por
encargo de suas consciências e de suas almas, que não o
denunciem nem divulguem, a não ser quando for por von-
tade do referido Dom Diego ou da pessoa que herdar;
somente procure que o referido dízimo seja pago da mesma
forma acima indicada.
Outrossim: Para que não ocorram divergências na escolha
desses dois parentes mais próximos que hão de entrar com
Dom Diego ou com a pessoa que herdar, prefiro desde já
designar Dom Bartolomeu, meu irmão, como uma, e Dom
Fernando, meu filho, como outra; e eles, logo que
começarem a tratar disso, fiquem obrigados a indicar outras
duas pessoas que sejam das mais próximas à minha linhagem
e de maior confiança, e a escolher outras duas na época em
que tiverem que começar a tratar dessa questão. E assim irá
passando de uns para outros com muito empenho, tanto
nesse sentido como em qualquer outro que se relacione com
o governo, o bem, a honra e serviço de Deus e do referido
morgado, para todo o sempre.
Outrossim: Determino ao referido Dom Diego, meu filho,
ou à pessoa que herdar o referido morgado, que mantenha e
sustente sempre na cidade de Gênova uma pessoa de nossa
linhagem que tenha ali casa e esposa, e lhe proporcione
renda que lhe permita viver honestamente como pessoa tão
próxima de nossa linhagem e que esteja radicada na referida
cidade como natural dela, pois poderá receber da referida
cidade auxílio e favor nas coisas de que precisa, pois dela saí
e nela nasci.
Outrossim: Que o referido Dom Diego, ou quem herdar o
morgado, envie, por meio de câmbios ou qualquer outra
maneira que puder, todo o dinheiro da renda que arrecadar
do referido morgado e mande comprar em seu nome e de
seu herdeiro umas ações chamadas "logos", que existe no
ofício de São Jorge, que atualmente rendem seis por cento, e
são aplicações muito seguras, e que isso seja pelo que
explicarei aqui.
Outrossim: Porque a pessoa de posição e de renda convém,
para servir a Deus e para o bem de sua honra, que se previna
de fazer por si e de se poder valer com suas propriedades, ali
em São Jorge qualquer dinheiro está muito seguro, e Gênova
é cidade nobre e não poderosa só por causa do mar; e
porque na época em que me dispus a ir descobrir as Índias
foi com a intenção de suplicar ao Rei e à Rainha, Nossos
Soberanos, que da renda que Suas Majestades obtivessem das
Índias, se determinasse empregá-la na conquista de
Jerusalém, e assim procedi. E se fizerem isso, seja em boa
ocasião, caso contrário, que mesmo assim mostre-se o
referido Dom Diego, ou a pessoa que herdar, com o
propósito de juntar a maior quantidade de dinheiro possível
para acompanhar El-Rei, Nosso Soberano, se for a Jerusalém
para conquistá-la, ou a ir sozinho com o máximo de poder
que tiver; que agradará a Nosso Soberano que, se tal
intenção tem ou tiver, lhe concederá tais recursos, que
poderá empreender a conquista, e que a empreenda; e, se
não tiver para conquistar tudo, dar-lhe-ão ao menos para
uma parte dela. E assim que junte e faça caudal de seu
tesouro nos lugares de São Jorge de Gênova, e ali o multipli-
que até obter tal quantidade que lhe pareça suficiente e saiba
que poderá praticar uma boa obra em relação a Jerusalém,
pois creio que depois que El-Rei e a Rainha, Nossos
Soberanos, e seus sucessores virem que a isso se
determinam, Suas Majestades serão movidas a fazê-lo ou lhe
fornecerão ajuda e recursos como a súdito e vassalo que o
fará em seus nomes.
Outrossim: Determino a Dom Diego, meu filho, e a todos os
que de mim descenderem, sobretudo à pessoa que herdar
esse morgado - que é, como disse, o dízimo de tudo o que se
achar e extrair nas índias e a oitava parte da renda de outra
extremidade das terras, equivalente, com os meus direitos
dos cargos de Almirante, Vice-Rei e Governador, a vinte e
cinco por cento - , digo: que toda a renda disso e as pessoas
e quanto poder tiverem, se obriguem e se disponham a bem
e fielmente sustentar e servir Suas Majestades ou seus
herdeiros, mesmo ao preço da perda e sacrifício de suas
vidas e propriedades, porque Suas Majestades me
propiciaram o início dos recursos para poder conquistar e
dominar, depois de Deus Nosso Senhor, esse morgado; se
bem que vim a seus reinos para convidá-los a esse
empreendimento e passaram muito tempo sem me dar os
recursos para pô-lo em prática; se bem que não há por que
se admirar, pois todo mundo ignorava tal empreendimento e
não havia quem acreditasse em seu êxito, motivo pelo qual
lhes sou ainda mais grato e porque depois sempre me
engrandeceram e concederam muitas mercês.
Outrossim: Determino ao referido Dom Diego, ou a quem
possuir o referido morgado, que, se na Igreja de Deus, pelos
nossos pecados, surgir alguma dissidência ou que, por
tirania, alguma pessoa, de qualquer grau ou posição que
tenha ou ocupe, quiser despojá-lo de sua honra ou bens,
que, sob a pena supracitada, se ponha aos pés do Santo
Padre, a menos que seja herético (queira Deus que não), a
pessoa ou pessoas se ponham ou determinem por obra de
servir com toda a sua força, renda e propriedades e em
querer terminar com a referida dissidência e defender para
que não se veja a Igreja despojada de sua honra e bens.
Outrossim: Determino ao referido Dom Diego, ou a quem
possuir o referido morgado, que procure preservar e
trabalhar sempre pela honra, pelo bem e pelo
engrandecimento da cidade de Gênova, empregando todas
as suas forças e recursos na defesa e ampliação do bem e
honra de sua república, não se insurgindo contra o serviço
da Igreja de Deus e augusta posição do Rei ou da Rainha,
Nossos Soberanos, e todos os seus sucessores.
Outrossim: Que o referido Dom Diego, ou a pessoa que
herdar ou estiver na posse do referido morgado, que da
quarta parte mencionada acima que se há de distribuir o
dízimo de toda a renda, que na época em que Dom
Bartolomeu e seus herdeiros tiverem arrecadado os dois
contos ou parte deles e que se tiver que distribuir um pouco
do dízimo entre nossos parentes, que ele e as duas pessoas
que com ele forem nossas parentes, devem distribuir e gastar
esse dízimo para casar moças de nossa linhagem que dele
necessitarem, e fazer o maior número de favores possível.
Outrossim: Que na época em que encontrar disposição,
mande construir uma igreja a que dê o nome de Santa Maria
da Conceição, na ilha Espanhola, em lugar conveniente, e
tenha o hospital mais bem organizado que seja possível,
assim como outros em Castela e na Itália, e se levante uma
capela em que, com muita devoção, rezem missas pela
minha alma e a de nossos antecessores e descendentes: que
agradará a Nosso Senhor de nos dar tanta gente que tudo
poderá se cumprir de acordo com o que declarei acima.
Outrossim: Determino que o referido Dom Diego, meu
filho, ou a quem herdar o referido morgado, trabalhe para
manter na ilha Espanhola quatro mestres versados na Santa
Teologia, com a intenção de trabalhar e se empenhar pela
conversão à nossa santa fé de todos os povos das índias, e
quando quiser Nosso Senhor que a renda do referido
morgado aumente, que do mesmo modo aumente o número
de mestres e pessoas devotas para tornar cristãs essas gentes
e que para isso não tenham medo de gastar o que for preci-
so; e para comemorar o que digo e escrevo colocará um
busto de mármore na referida igreja da Conceição para que
se lembre disso que digo o referido Dom Diego e as outras
pessoas que o virem, colocando-se também dizeres alusivos.
Outrossim: Determino a Dom Diego, meu filho, ou a quem
herdar o referido morgado, que cada vez que tiver que se
confessar, que primeiro mostre este compromisso ou o
respectivo traslado a seu confessor, e lhe peço que o leia
integralmente, porque tenho razão para examiná-lo sobre o
cumprimento dele, e seja causa de bem e descanso de sua
alma.
- Quinta-feira, 22 de fevereiro de 1498.
- O Almirante.

Na nobre cidade de Valladolid, aos 19 dias do mês de maio,
no ano do Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de
1506, perante mim, Pedro de Hinojedo, escrivão da câmara
real e de província da Corte e Chancelaria de Suas
Majestades, e escrivão e notário público em todos os seus
reinos e domínios, e das testemunhas de seu relato, o Sr.
Dom Cristóvão Colombo, Almirante, Vice-Rei e
Governador Geral das ilhas e terra firme das Índias
descobertas e por descobrir, que disse que era; estando
fisicamente enfermo, declarou que, porquanto tivesse feito
seu testamento perante escrivão público, que agora retificava
e retifica o referido testamento, e o aprovava e o aprovou
por estar correto, e se necessário, o outorgava e outorgou
novamente. E agora, aduzindo ao referido testamento, tinha
escrito do próprio punho e letra um documento que perante
mim, escrivão, mostrou e apresentou, que declarou que
estava escrito de seu próprio punho e letra e assinado com o
seu nome, que outorgava e outorgou tudo o estava contido
no referido documento, perante mim, escrivão, em
conformidade e pelo meio e forma que no referido
documento se continha, e todas as determinações nele
expressas, para que se cumpram e valham como sua última e
derradeira vontade. E, para a execução do referido testa-
mento, que tinha e tem feito e outorgado, e tudo o que está
nele contido, cada coisa e parte dele, nomeava e nomeou
como inventariantes e executores da sua vontade o Sr. Dom
Diego Colombo, seu filho, e Dom Bartolomeu Colombo, seu
irmão, e Juan de Porras, tesoureiro de Biscaia, para que os
três cumpram sua vontade e tudo o que se contém no
referido documento, bem como todas as determinações,
legados e doações nele contidos. Para o qual declarou que
dava, e deu, toda a sua autorização e outorgava, como
outorgou, perante a mim, escrivão, tudo o que está contido
no referido documento, e aos presentes disse que solicitava
e solicitou que prestassem testemunho. Testemunhas que
estiveram presentes, convocados e solicitados para tudo o
que foi declarado acima, o bacharel Andrés Miruena e
Gaspar de la Misericórdia, vizinhos desta vila de Valladolid,
e Bartolomeu de Fresco, Álvaro Pérez, Juan Despinosa,
Andrea e Hernando de Vargas, Francisco Manuel e Fernán
Martinez, criados do referido senhor Almirante. O teor da
referida escritura, que estava redigida com letra de próprio
punho do referido Almirante e assinada com o seu nome, de
verbo ad verbum, é o seguinte:

Quando parti da Espanha no ano de mil e quinhentos e dois,
fiz uma disposição e morgado de meus bens e do que então
me pareceu que cumpria à minha alma e ao serviço de Deus
Eterno, e minha reputação e de meus sucessores: deixei
documento esse no Mosteiro de Las Cuevas em Sevilha, em
mãos de frei Dom Gaspar, junto com outros documentos e
meus privilégios e cartas recebidas do Rei e da Rainha,
Nossos Soberanos. Aprovo e confirmo, por meio do
presente instrumento, tais disposições, que reitero para o
mais perfeito cumprimento e declaração de minhas
intenções. Que determino que se cumpra assim como fica
expresso aqui em todo o seu teor, e do que por este se
cumprir, nada se faça pelo outro, para que não haja
repetição.
Constituí meu querido filho Dom Diego herdeiro universal
de todos os bens e cargos que tenho de juro e herdade , de
que deixei morgado, e não tendo ele filho herdeiro varão,
que herde meu filho Dom Fernando da mesma maneira, e
não tendo ele, por sua vez, filho varão herdeiro, que herde
Dom Bartolomeu, meu irmão, da mesma maneira, e de igual
modo, se não tiver filho herdeiro varão, que herde outro
irmão meu; que assim se entenda, de um a outro parente
mais próximo à minha estirpe, e que isso seja para todo o
sempre. E nunca herde mulher, a menos que faltem
homens; e, se tal acontecer, que seja a mais próxima à minha
estirpe. Afirmo que é minha vontade que o referido Dom
Diego, meu filho, receba o referido morgado com todos os
bens e cargos, do modo e maneira como foi declarado e que
os tenho. E declaro que a renda integral que arrecadar em
virtude da referida herança, que proceda anualmente sua
divisão em dez partes iguais, sendo que uma deve ser
dividida entre os nossos parentes que parecerem mais
necessitados, outras pessoas carentes e demais obras de
caridade. E depois, das nove partes restantes, tome duas e as
reparta em trinta e cinco, e que delas recebam Dom
Fernando, meu filho, vinte e sete, Dom Bartolomeu, cinco,
e Dom Diego, meu irmão, três. E porque, como acima disse,
o meu desejo seria que Dom Fernando, meu filho, recebesse
um conto e meio, Dom Bartolomeu cento e cinqüenta mil
maravedis e Dom Diego cem, e não sei como isso se há de
fazer, pois até agora a renda do referido morgado, além de
desconhecida, não foi numericamente determinada, peço
que se siga essa ordem que acima declarei até que aprouver a
Nosso Senhor que as duas partes das referidas nove sejam
suficientes e aumentem de tal forma que contenham o
referido conto e meio para Dom Fernando, cento e
cinqüenta mil maravedis para Dom Bartolomeu e cem mil
para Dom Diego. E quando Deus quiser que assim seja ou
que, se as referidas duas partes, das nove mencionadas
acima, bem entendido, chegarem à quantia de um conto e
setecentos e cinqüenta mil maravedis, que todo o excesso
seja entregue a Dom Diego, meu filho, ou a quem herdar; e
declaro e rogo ao referido Dom Diego, meu filho, ou a quem
herdar, que, se a renda desse morgado aumentar muito, terei
prazer em acrescentar a Dom Fernando e a meus irmãos a
parte que aqui fica especificada.
Digo que essa parte que mando dar a Dom Fernando, meu
filho, que dela lhe faço morgado, e que lhe suceda seu filho
mais velho, e assim, de um para outro perpetuamente, sem
que a possa vender nem trocar nem dar nem alienar de
forma alguma, e seja pelo modo e maneira que está
declarado no outro morgado que fiz para Dom Diego, meu
filho.
Digo a Dom Diego, meu filho, e ordeno que, enquanto tiver
renda do referido morgado e herança, que possa manter em
uma capela, que mandará construir, três capelães que rezem
três missas por dia, uma em louvor da Santíssima Trindade,
outra da Conceição de Nossa Senhora e a terceira pela alma
de todos os fiéis defuntos, e pela minha, de meu pai, de
minha mãe e de minha mulher. E que, se os recursos forem
suficientes, faça a referida capela decorosa e acrescente as
orações e preces em louvor da Santíssima Trindade, e se isso
puder ser na ilha Espanhola, que Deus milagrosamente me
deu, gostaria que fosse ali onde a invoquei, que é na várzea
denominada Conceição.
Declaro e determino a Dom Diego, meu filho, ou a quem
herdar, que pague todas as dívidas de que deixo aqui relação,
da maneira ali especificada, além de outras cuja liquidação
pareça justa. E lhe determino também que tome as
providências cabíveis para que Beatriz Enriquez, mãe de
Dom Fernando, meu filho, possa viver decentemente, como
pessoa a quem tanto devo. E que isso se faça para descargo
de minha consciência, porque muito pesa em minha alma.
por motivos que não seria lícito explicar aqui. Redigida a 25
de agosto de 1505. Segue-se: Christo ferens.
Testemunhas que estiveram presentes e assistiram à redação
e outorga de tudo o que acima foi dito pelo referido Sr.
Almirante, segundo as declarações precedentes: os referidos
bacharéis Miruena e Gaspar de la Misericórdia, vizinhos na
vila de Valladolid, e Bartolomeu de Fresco, Alvar Pérez,
Juan Despinosa, Andrea e Fernando de Vargas, Francisco
Manuel e Fernán Martinez, servos do referido Sr. Almirante.
E eu, o referido Pedro de Hinojedo, escrivão e notário
público supracitado, em conformidade com as referidas
testemunhas, estive presente a tudo que foi mencionado. E,
por conseguinte, aponho aqui a minha assinatura. Em
testemunho da verdade, Pedro de Hinojedo, escrivão.
Relação de determinadas pessoas a quem quero que seja dada
uma parte relativa aos bens que constituem o objeto desta
relação, rigorosamente como fica aqui expresso. E que seja
procedida de tal forma que não se saiba quem foi o doador.
Em primeiro lugar, aos herdeiros de Jerônimo del Puerto,
pai de Benito del Puerto, chanceler de Gênova, vinte
ducados ou soma equivalente.
A Antônio Vazo, mercador genovês, que costumava morar
em Lisboa, dois mil e quinhentos réis portugueses, o que
equivale a pouco mais de sete ducados, à razão de trezentos
e sessenta e cinco réis o ducado.
A um judeu que morava às portas do gueto de Lisboa, o
valor de meio marco de prata.
Aos herdeiros de Luis Centurion Escoto, mercador genovês,
trinta mil réis portugueses.
A esses mesmos herdeiros e aos herdeiros de Paolo de
Negro, genovês, cem ducados ou soma equivalente.
A Baptista Espíndola ou a seus herdeiros, se estiver morto,
vinte ducados. Esse Baptista Espíndola é genro do
supracitado Luis Centurion e filho de Micér Nicolau
Espíndola de Locoli de Ronca, e, segundo tudo indica, foi
estante" em Lisboa no ano de 1482.
E da referida memória e descargo supracitado, eu, escrivão,
dou fé de que estava escrita com a mesma letra do referido
testamento do referido Dom Cristóvão, de cujo testemunho
assino o meu nome.
— Pedro de Azcoitia.
Cronologia da Vida e da Época de Cristóvão
Colombo

1333 Des Dieppois descobre as Canárias.
1419 Descoberta da ilha da Madeira.
1439 Descoberta dos Açores.
1446 Descoberta do Cabo Verde, marcando os primeiros
avanços dos portugueses ao longo da costa africana.
1451 (entre agosto e outubro) - Nascimento de Cristóvão
Colombo, em Gênova. Essa data foi estabelecida a partir de
um documento genovês de outubro de 1470 que lhe dá uma
idade de mais de 19 anos e outro, de agosto de 1479, que
assegura que Colombo ainda não atingiu os 28 anos.
1473 Colombo comanda um navio a serviço de Renato de
Anjos, nobre francês que disputava com a dinastia espanhola
de Aragão a posse do reino de Nápoles.
1474 Colombo começa a ler autores antigos, como Ptolomeu,
Aristóteles e Estrabão, em cujas obras, geografia,
cosmografia e fábulas se misturam.
1477 (fevereiro) - Colombo vai a Islândia (Thulé) e navega
100 léguas em torno da ilha.
1478 Colombo navega até a ilha da Madeira.
1479 Casa-se com Filipa Moniz Perestello, filha de
Bartolomeu Perestello, grande navegador português e
donatário da ilha de Porto Santo. A sogra põe à sua
disposição todas as cartas náuticas deixadas pelo marido.
1480-81 O casal se transfere para Porto Santo, ilha próxima à
Madeira que havia sido descoberta pelo sogro de Colombo.
Nasce seu primeiro filho, Diego, em Lisboa ou Porto Santo.
1482 Data provável da viagem de Colombo ao longo da costa
ocidental da África.
1483 De volta a Portugal, Colombo inicia sua campanha para
atingir a Ásia pela rota do Ocidente. Apresenta o projeto ao
rei João II, de Portugal. Seu irmão, Bartolomeu, trabalha em
Lisboa como cartógrafo, e Colombo tem a oportunidade de
entrar em contato com os geógrafos e cartógrafos
portugueses, os melhores do mundo na época. Morre sua
esposa. Parte para a Espanha com o filho de apenas cinco
anos.
1484 Bartolomeu vai à Inglaterra tentar convencer a corte
inglesa da viabilidade do projeto de Cristóvão.
1486 Colombo circula entre Sevilha e Paios. Seu projeto é
submetido ao Colégio Dominicano, em Salamanca, e a
comissão é presidida pelo confessor da rainha. Depois de
quatro anos de estudos, o projeto é rejeitado. Teólogos e
representantes das mais afamadas Universidades citam Santo
Agostinho e os doutores da Igreja para afirmarem que a
Terra é plana.
1487 Mesmo com o veto ao projeto, Colombo recebe três mil
maravedis da Coroa Espanhola.
Casa com Beatriz de Arana, que será mãe de Fernando, seu
futuro biógrafo.
1488 Colombo viaja para Portugal e é recebido várias vezes
pelo rei Dom João II. Quando as negociações pareciam bem
encaminhadas, retorna a Lisboa Bartolomeu Dias, após ter
dobrado o Cabo das Tormentas, rebatizado de Cabo da Boa
Esperança. Estava aberto o caminho para as Índias pela rota
do Oriente. Colombo deixa Lisboa.
1492 Capitulação de Granada. Os mouros são finalmente
expulsos da Espanha. Entusiasmada, a rainha dá sinal verde
para a primeira expedição de Colombo, que parte de Paios
no dia 3 de agosto e atinge as Bahamas em 12 de outubro.
1493 Em janeiro parte da ilha Espanhola para retornar à
Espanha, onde chega em março. Recebido euforicamente,
obtém a confirmação dos títulos de Vice-Rei e Governador
das Terras Firmes e Ilhas Descobertas e por Descobrir. E o
momento de maior glória de Colombo. Em agosto, torna a
partir para as "Índias", onde chega em novembro,
encontrando destruído o forte que construíra e mortos os
colonos que lá deixara.
1496 Colombo retorna de sua segunda viagem, em julho.
1498 Em 30 de maio, parte para a terceira viagem. Chega à
ilha de Trinidad em agosto.
1499 Os reis da Espanha enviam Francisco de Bobadilla para
assumir o posto de governador de Espanhola. Por ordem
dele, Colombo retorna acorrentado para a Espanha.
1500 Em novembro, Colombo desembarca acorrentado em
Cádiz. Seis semanas depois, os reis mandam libertá-lo.
1501 Nicolas de Ovando é nomeado novo governador das
"índias".
1502 Colombo escreve ao Papa Alexandre IV pedindo a
restauração de seus direitos. Em maio, parte de Cádiz
iniciando sua quarta e última viagem à América, que durará
dois anos.
1503 Américo Vespúcio lança seu Mundus Novus,
defendendo a idéia de que as terras descobertas fazem parte
de um novo continente.
1504 Colombo parte de Espanhola em agosto e chega à
Espanha em novembro. Poucos dias depois, sua última
aliada, a Rainha Isabel, morre. O desamparo de Colombo é
total, sua aura de pioneiro já se dissolveu.
1506 Em 20 de maio, em Valladolid, pobre e esquecido,
Cristóvão Colombo morre, recusando-se a aceitar a
evidência de que descobrira um novo mundo nos trópicos.

Essa cronologia baseou-se na Chronologie colombienne
abrégée, que aparece no livro La Découverte de l'Amérique
(Paris, Maspero, 1981) e na biografia Cristóvão Colombo,
fascículo 77 da coleção Grandes Personagens da História
Universal (Abril Cultural, 1970).

Trata-se do imenso castelo mourisco construído sobre uma elevação que domina a cidade, hoje
chamado Alhambra. (N. do E.)
Ao regressarem à Europa, Nicolas e Marco Pólo informaram ao Papa que o imperador da Tartária,
conhecido como o Grande Cã, pedia que lhe fossem enviados cem teólogos para que assim se inicias-
se a conversão dos mongóis. (N. do E.)
3 Os judeus foram expulsos da Espanha por decreto assinado em 30 de março de 1492. O prazo para
que abandonassem a Espanha se esgotou em 3 de agosto do mesmo ano. (N. do E.)
Os três navios eram duas caravelas e uma nau. A nau Santa Maria, também chamada La Gallega,
pertencia ao mestre Juan de la Cosa que acompanhava a viagem, e conduzia o Almirante Colombo. A
caravela Pinta tinha como capitão Martin Alonso Pinzón, co-proprietário do barco junto com
Cristobal Quintero. E a Niña era capitaneada por Vicente Yánez Pinzón, irmão de Martin. (N. do E.)
Os Diários de Colombo fazem uso indistinto entre léguas e milhas. E importante ressaltar que a
légua empregada por Colombo é aquela que era utilizada pelos marinheiros italianos e equivale a 4
milhas. Por convenção, a milha náutica vale 1.852 metros. (N. do E.)
A tripulação se angustiava com a viagem para Oeste, pois quase todos acreditavam que a terra era
plana e que tal jornada poderia conduzi-los ao abismo da beira do mundo. (N. do E.)
Estavam navegando pelo Mar dos Sargaços. (N. do E.)
Para fazer esse mapa, Colombo baseou-se noutro feito pelo famoso cartógrafo Toscanelli. (N. do
E.)
A ameaça de um motim - em função dos temores e angústias da tripulação - era constante, e
Colombo sabia disto. (N. do E.)
Talvez "lucaios" não passe de uma corruptela de "lecuios" (ou "lequios"), habitantes de ilhas
mitológicas que a tradição situava entre a Europa e a Ásia. (N. do E.)
Colombo chegou nas Bahamas, na ilha que hoje se chama Watlings. (N. do E.)
Até o século XVII, acreditava-se que o ouro "nascia" nas minas que, portanto, seriam
inesgotáveis. (N. do E.)
Cipango, o Japão de Marco Pólo. (N. do E.)
Nenhum desses índios retornou à terra natal. Morreram na travessia ou na própria Espanha, de
doenças comuns como gripe e varíola. (N. Do E.)
É a ilha chamada hoje de Cayo Rum. (N. do E.)
Fernandina hoje se chama Long Island. (N. do E.)
É a primeira referência ao tabaco na literatura ocidental. (N. do E.)
Castelhano, antiga moeda de ouro. (N. do T.)
É a ilha que hoje se chama Crooked Island, a leste das Bahamas. (N. do E.)
É Cuba, foi um erro do copista ou do próprio Colombo, que talvez tenha entendido mal aos
índios. (N. do E.)
Deve ser lido "Bóhio", como os índios chamavam o atual Haiti (que Colombo batizou de La
Espanhola). (N. do E.)
Nome que Marco Pólo (cujo relato foi publicado pela L&PM Editores na coleção
L&PM/História) deu à cidade de King-See, que figurava no mapa que Toscanelli fez. (N. do E.)
Trata-se de Diego Colombo. (N. do E.)
Adiantado, antigo governador de província. (N. do T.)
É a ilha chamada hoje de Grande Inagua. (N. do E.)
Pão de mandioca, comum aos índios do Caribe, que provavelmente migraram da Amazônia
brasileira até as ilhas. (N. do E.)
Bombarda, antiga máquina de guerra. (N. do T.)
Parte do arquipélago hoje chamado Ilhas Associação. (N. do E.)
Hoje, Santo Domingo. (N. do E.)
Logicamente não havia reis em Espanhola, que era governada por quatro caciques: Guatiguna,
Guarionex, Guanaoconel, Guacanagari. (N. do E.)
Era o cacique Guacanagari. (N. do E.)
Era o mestre Juan de la Cosa, dono da Santa Maria. (N. do E.)
O encalhe deu-se na ilha Espanhola, no local hoje conhecido por baía do Caracol. (N. do E.)
Trata-se do Forte Navidad, que meses mais tarde seria inteiramente destruído pelos índios, que
mataram os 39 colonos deixados por Colombo. (N. do E.)
Tonel, antiga medida de capacidade, maior que a tonelada. (N. do T.)
Não eram canibais, como julgou Colombo. Tratava-se de índios Ciguaios, que habitam as serras da
ilha Espanhola. (N. do E.)
Em branco, no original. (N. do E.)
O primeiro confronto entre brancos e índios na América. Um ano mais tarde, ocorreria o massacre
dos 39 colonos que Colombo deixara no Forte Navidad. Em 1552, segundo frei Bartolomé de Las
Casas - cujo relato foi publicado pela L&PM -, praticamente toda a população indígena de Espanhola
já fora exterminada pelos espanhóis. (N. do E.)
Matinino é a atual ilha Martinica. (N. do E.)
Completas, as últimas horas canônicas dos ofícios divinos. (N. do T.)
Espadim, antiga moeda portuguesa. (N. do T.)
Colombo refere-se ao massacre do Forte Navidad, que nunca chegou a ser bem explicado, já que
não sobraram testemunhas entre os espanhóis. (N. do E.)
O trigo jamais vingou na ilha Espanhola, que seria praticamente tomada pela cana-de-açúcar. (N.
do E.)
A rainha Isabela indignou-se com a proposta da escravização de Colombo. Chegou a proibir que o
Almirante, ou qualquer outro navegador, levasse novos indígenas para Castela. Com sua morte, em 26
de novembro de 1504, a escravização se generalizou, estendendo-se a todas as tribos e não apenas aos
"canibais". (N. do E.)
Trata-se da foz do Orinoco. (N. do E.)
Mossém, título dos clérigos e nobres de segunda ordem na antiga coroa de Aragão. (N. do T.)
Colombo refere-se a Marco Pólo e Pedro d'Ailly. (N. do E.)
Refere-se a Juan Pérez e Antonio de Marchena. (N. do E.)
Trata-se de um exagero, provavelmente proposital, de Colombo. (N. do E.)
Novo equívoco de Colombo. (N. do E.)
É a primeira vez que o homem branco chega à América do Sul. O lugar exato ainda é
desconhecido. (N, do E.)
Refere-se a Cuba. (N. do E.)
Serás é o nome que Ptolomeu dava à China. (N. do E.)
Esse desenho não se conservou, mas deve ser o que foi visto por Alonjo de Hojeda e que acabou
resultando na expedição que ele fez, junto com Américo Vespúcio (cujo relato foi publicado na
coleção L&PM/História), ao golfo de Pária. (N. do E.)
Colombo escreveu da Jamaica, um mês após sua chegada. O relato da Quarta Viagem é conhecido
como Lettera Raríssima. (N. do E.)
Eram quatro navios: a caravela Santa Maria e as naus Santiago, Gallego e Vizcaina. (N. do E.)
Colombo chegou a Santo Domingo em 29 de junho, mas o governador Ovando não o deixou
desembarcar, apesar da tormenta que se aproximava. (N. do E.)
Depois da tempestade de 29 de junho, Colombo se refugiou em Porto Hermoso e chegou à
Jamaica em 16 de julho. (N. do E.)
Na atual Costa do Mosquito, no Panamá. (N. do E.)
Nome que Marco Polo deu à Conchinchina. (N. do E.)
Nome indígena da costa ocidental do atual Panamá. (N. do E.)
Branca, moeda da época, equivalente à quarta parte de um maravedi. (N. do E.)
De juro e herdade por direito de herança, perpetuamente, para que passe de pais a filhos. In
perpetuam. (N. do T.)
Micér, título, honorífico da coroa de Aragão. (N. do T.)



 
 
 
 
Lançamento Arcanjo Micael
Diários da Descoberta da América - Cristóvão Colombo
 
 
 
links abaixo
 
 
digitalização, formatação e revisão - Lucia Garcia
agradecimentos pela doação do ebook para o Memorial do Conhecimento
 
 
 
 
Sinopse:
 
O Relato Fascinante da Descoberta de um Novo Mundo.
 
Cristóvão Colombo  (1451 ? - 1506) foi um dos maiores navegadores da história "todos os mares em que hoje se navegaeu os percorri"escreveu aos reis da Espanha, em 1501. Apaixonado pela idéia de chegar ao Oriente pela rota do Oeste, venceu o desafio das lendas e navegou na direção do poente. Disposto a atingir a qualquer preço o mundo fabuloso descrito por Marco Pólo, até o fim de seus dias Colombo recusou-se a admitir que havia descoberto um novo mundo. Morreu na miséria, desacreditado. Séculos mais tarde, viria a ser consagrado como um dos maiores descobridores da história do planeta. Seu fascinante diário da descoberta da América é um relato poético
 
 
 
Links:
 
megaupload:

http://www.megaupload.com/?d=DD8U6QC0
 
mediafire:
http://www.mediafire.com/download.php?qct40rpk2904te4
 
 
 
 
 
 
PASTAS LANÇAMENTOS  Arcanjo Micael:

 
http://rapidshare.com/users/KPGYUD
http://www.mediafire.com/?q6ebsi7j6b5cv
 
 
Este e-book representa uma contribuição do grupo Arcanjo Micael para aqueles que necessitam de obras digitais como é o caso dos Deficientes Visuais e como forma de acesso e divulgação para todos.
É vedado o uso deste arquivo para auferir direta ou indiretamente, benefícios financeiros.
Lembre-se de valorizar e reconhecer o trabalho do autor, adquirindo suas obras
 
 
 
 
 
 
 
 
inesquecível.
Animacoes GRATUITAS para seu e-mail – do IncrediMail! Clique aqui!
Vida de bombeiro Recipes Informatica Humor Jokes Mensagens Curiosity Saude Video Games Car Blog Animals Diario das Mensagens Eletronica Rei Jesus News Noticias da TV Artesanato Esportes Noticias Atuais Games Pets Career Religion Recreation Business Education Autos Academics Style Television Programming Motosport Humor News The Games Home Downs World News Internet Car Design Entertaimment Celebrities 1001 Games Doctor Pets Net Downs World Enter Jesus Variedade Mensagensr Android Rub Letras Dialogue cosmetics Genexus Car net Só Humor Curiosity Gifs Medical Female American Health Madeira Designer PPS Divertidas Estate Travel Estate Writing Computer Matilde Ocultos Matilde futebolcomnoticias girassol lettheworldturn topdigitalnet Bem amado enjohnny produceideas foodasticos cronicasdoimaginario downloadsdegraca compactandoletras newcuriosidades blogdoarmario arrozinhoii