sexta-feira, 22 de setembro de 2023 By: Fred

{clube-do-e-livro} LANÇAMENTO : CARTA DO DR. INÁCIO AOS ESPÍRITAS - CARLOS BACCELLI - FORMATOS : PDF, EPUB E TXT

Revis�o: Fausto De Vito e Maria de Lourdes S. Moitinho

Capa: Luciana Silveira - Imagem
Tela da Capa: Pit�goras na escola de Atenas

Projeto Gr�fico:


FICHA CATALOGRAFICA
(Preparada na Editora)

Ferreira, In�cio (Espirito)

Cartas do Dr. In�cio aos Esp�ritas / Pelo esp�rito
In�cio Ferreira ; [psicografado por] Carlos A. Baccelli. -
Uberaba, MG : Liv. Esp�rita Edi��es "Pedro e Paulo", 2008.

240p. ; 14x21 cm.

ISBN 978-85-60628-03-2

1. Obras psicografadas. 2. Espiritismo,
I. Baccelli, Carlos A.
II. T�tulo
CDD-133.93
Copyright 2008 by �
LIVRARIA ESP�RITA EDI��ES "PEDRO E PAULO"
Av. Elias Cruvinel, 1200 - Bairro Boa Vista - 38070-100
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E-mail: leepp@terra.com.br
Site: www.leepp@terra.com.br

Os direitos autorais deste livro foram doados �s obras assistenciais
da Livraria Esp�rita Edi��es "Pedro e Paulo", Uberaba-MG.

1�

Edi��o - Do 1� ao 10� milheiro
Janeiro/2008

Impresso no Brasil

Printed in Brazil


LIVRARIA ESP�RITA EDI��ES
"PEDRO E PAULO"

Cartas do Dr. In�cio
aos Espiritas


Carlos A. Baccelli
In�cio Ferreira


Ano de 2008


Por mera conveni�ncia, eu n�o posso
renunciar ao que penso, sem ser hip�crita. Da�

o motivo destas garatujas que, da forma com a
qual s�o aqui apresentadas, talvez venham a
desagradar a muitos. Nunca tive, por�m, a
pretens�o da unanimidade de opini�es em
torno de meu apagado esp�rito. Sou o que sou e
me apresento sem qualquer aparato ou disfarce,
movido pelo �nico prop�sito de ser �til aos que
comigo se identificam. O que posso fazer, se
ainda me encontro distante da aura luminosa
com que os esp�ritas, de maneira geral, se
habituaram a envolver os desencarnados que,
atrav�s deste ou daquele int�rprete encarnado
de seus pensamentos, falam ou escrevem para
o mundo, comprazendo-se, muitos deles, na

condi��o de "Instrutores", que, a bem da
verdade, a maioria n�o �?

At� segunda ordem, estamos numa
Doutrina de livre express�o da id�ia, e o dia em
que me vir cassado deste sagrado direito, que
muito sangue e l�grima custou � Humanidade,
com certeza estar� na hora de, inclusive,
repensar a minha condi��o de esp�rita, esteja no
corpo ou fora dele.

Assim sendo, sem maiores delongas,
antecipo-me, no limiar destas p�ginas, a dizer
que voc�, caro leitor, ir� correr os olhos sobre o
que um homem, que vive agora noutra
Dimens�o, pensa, � luz de seus ainda parcos
conhecimentos, a respeito dos v�rios temas em
que foi sabatinado.

Cordialmente,

IN�CIO FERREIRA

Uberaba -MG, 21 de novembro de 2007.


-Resposta 11
- Depress�o 17
- Saudade de M�e 23
- Oferta de Cozinheira 29
M�dium
e Gato 35
- Estupro e Aborto 41
- Meus Livros 46
- Desobsess�o 52
- Esp�ritas Brig�es 58
Homossexualismo
63
Profissionalismo
Religioso 69
Gravidez
no Mundo Espiritual 75
Solidariedade
de Companheiro 81
Manifesta��es
Ostensivas 87

- Jeito de Ser 93
Campanha
Orquestrada 98
Esquizofrenia
104
9


18 - Porta Estreita

110
19 - A Carta Que N�o Recebi 116
20 - Filho Problema 122
21 - A Gatinha Mimi 128
22 - Nossas Ocupa��es

133
23 - Ligeira Entrevista 138
24 - Missivista Malcriado 143
25 - Espiritismo e Censura 148
26 - Mediunidade e N�s. 153
27 - Infelizmente, Creio!

159
28 - Sess�es Medi�nicas 165
29 - Crian�as �ndigo30 - Prece dos Desesperados 176
31 - Chico e Kardec: Assunto Pol�mico?

182
32 - A Quest�o do Pl�gio Medi�nico 188
33 - Maria Modesto Cravo 194
34 - Espiritismo e Jesus. 199
35 - Meus Livros Medi�nicos 205
36 - Li��o Que Aprendi Com a Vida 210
37 - A Que Ponto Chegamos! 216
38 - Algo Pitoresco39 - Querosene e Luz 228
40 - In�cio Versus Ignacio

233

10

171
222

inha irm�, voc� me escreve perguntando o que,
em minha modesta opini�o, � essencial ao esp�rito no
processo da evolu��o. E argumenta: � "Doutor, a vida na
Terra � dura... A gente faz o que pode, mas, por vezes,
tenho a impress�o de completo fracasso. A minha vida se
divide entre as ocupa��es do lar, com marido, filhos e
netos, al�m do tempo que me sobra para as tarefas, na
condi��o de m�dium. Fico triste, pensando que poderia
fazer muito mais pela nossa Doutrina..."


Em primeiro lugar, quem n�o poderia fazer, pela
Doutrina, mais do que faz - mais e melhor? Todos os que
a conhecemos, seja na Terra ou no Al�m, ficamos a lhe
dever o melhor do nosso esfor�o e boa vontade. N�o

11


podemos, todavia, querida irm�, desconsiderar as nossas
provas particulares.

Eu tamb�m me sentia, quando encarnado - e ainda
me sinto agora-, limitado pelas minhas imperfei��es. Como
voc�, por vezes, me aborre�o ante a minha incapacidade
de mais ampla realiza��o no bem. Quero, mas n�o posso;
anseio, mas n�o consigo... � que ainda n�o estamos,
interiormente, fortes o bastante. Temos caminhado, mas
nos falta maior determina��o para que possamos vencer a
enorme dist�ncia entre o que somos e o que precisamos
ser.

Por outro lado, considere comigo: o que estar�amos
eu, voc� e tantos mais (milhares!) fazendo exatamente agora,
caso n�o fosse o aben�oado conhecimento do Espiritismo,
que j� nos felicita? Com certeza, estar�amos na mesmice
de s�culos e s�culos, sem sequer conseguir cogitar da
necessidade da pr�pria renova��o. J� estamos nos sentindo
de consci�ncia incomodada; �timo! Quantos, infelizmente,
ainda n�o conseguiram chegar at� a�?

Voc� � esposa, m�e e av�. Eu n�o fui nada disso.
Casei-me com quase 70 de idade e, naturalmente, n�o pude
deixar descendentes. N�o experimentei a alegria de ser pai
e av�, naqueles bons tempos em que as crian�as eram
obedientes. Hoje, s�o pequenos pirralhos, colocando pais,
pedagogos e psic�logos em polvorosa. F�cil, por�m,
resolver esta quest�o: ressuscitem a palmat�ria! Menino
algum pode fazer o que lhe d� na telha... Ora, linha dura!
Revejam tudo e, desde o primeiro vagido, imponham-lhe a

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daztas 2o *^z. Ondeio aos �-sp�zitas

necess�ria disciplina. Eu me recordo do que, certa vez,
ouvi Chico Xavier dizer: � "Quando renascer, eu n�o
quero pais que me deixem na moleza... N�o preciso apanhar

o tanto que apanhei, mas algumas palmadas me fariam
bem."
O nosso assunto, contudo, n�o � este. O Chico, ao
que sei, apanhou por muitas encarna��es... Coitado!
Franzino e subnutrido como era, n�o sei como p�de
sobreviver. Hoje, um garoto de 10 anos tem quase a altura
do pai, e as meninas, aos 12, 13 de idade, s�o mo�as lindas,
capazes de fazer sucesso em qualquer passarela.

Ent�o, al�m de tudo - esposa, m�e e av� -, voc� �
m�dium? Acredite, eu n�o fiz a metade do que voc� est�
fazendo. N�o estou querendo convenc�-la de nada, mas �
verdade. Com os livros e artigos que escrevi, confer�ncias
que proferi e com os doidos (desculpe-me a express�o) de
que tratei, centenas e centenas deles, em mais de 5^ anos
de exerc�cio da Medicina, estou convencido de que n�o fiz
a metade da metade do que voc� est� fazendo. Voc� � uma
hero�na! Ag�entar marido, filhos, netos, al�m dos mortos,
e, o que � pior, os esp�ritas... Sinceramente, voc� me
deprime - sinto-me no chinelo! E deixe-me acrescentar: no
chinelo daqueles p�s de andarilho, que ficam meses sem
ver �gua...

A Modesta, a nossa querida Maria Modesto Cravo,
era, como voc�, esposa, m�e, av� e... m�dium. At� hoje,
n�o sei como ela conseguia atender a tudo, a tempo e a
hora. Ela conciliava as atitudes de Marta e Maria, as irm�s


de L�zaro, �s quais Jesus se refere no Evangelho. Lembra-
se? � "Marta! Marta! andas inquieta e te preocupas com
muitas coisas. Entretanto, pouco � necess�rio, ou mesmo
uma s� coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte e esta n�o
lhe ser� tirada."

Olhe que eu vinha queimando as pestanas com estas
palavras do Senhor, tentando descobrir-lhes o significado,
quando diz: � "...pouco � necess�rio, ou mesmo uma s�
coisa..." Voc� imaginou que maravilha?! A gente
preocupado com tanto, e "pouco � necess�rio"?...
Diversificamos tanto, quando uma s� cousa nos � suficiente!

Voltando a Chico Xavier (a gente tenta deix�-lo em
paz, mas n�o h� como!), lembro-me de que, em conversa
r�pida com ele, numa de suas visitas ao Sanat�rio, eu o
questionei em torno da referida passagem evang�lica. �
"Chico - perguntei -, "pouco � necess�rio, ou mesmo uma
s� coisa..." O que pode ser t�o pouco e necess�rio?" Ele,
com a simplicidade que sempre o caracterizou, respondeu
preciso: � "� o Amor !..."

Veja, minha irm�, t�o f�cil! "Ainda quando eu falasse
todas as l�nguas dos homens e a l�ngua dos pr�prios anjos,
se eu n�o tiver amor (caridade), serei como o bronze que
soa e um c�mbalo que retine; ainda quando tivesse o dom
de profecia, que penetrasse todos os mist�rios e tivesse
perfeita ci�ncia de todas as coisas; ainda quando tivesse
toda a f� poss�vel; at� ao ponto de transportar montanhas,
se n�o tiver amor, nada sou." E por a� vai. O segredo � o

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Amor! A uma s� coisa necess�ria, a que Jesus se refere, �

o Amor!
Posso, agora, responder a sua pergunta inicial: "O
que � essencial ao esp�rito, no processo da evolu��o"?
Fazer com amor tudo o que faz, pois, executada com amor,
a tarefa considerada mais insignificante transcende em
valor. O Amor � a �nica coisa capaz de fazer a diferen�a
em tudo quanto fazemos. As portas do Reino dos C�us s�
se descerram �quele que ama!

Permita-me, nesta missiva, citar uma trova de um
amigo, o admir�vel poeta Eur�cledes Formiga:

"Somente o Amor � capaz

De prod�gio singular:

Quanto mais tira de si,

Mais ele tem para dar."

De modo geral, n�o vejo os crist�os da atualidade e
neles eu nos incluo -, os esp�ritas, preocupados em amar
o pr�ximo como a si mesmos! Para que teimamos tapar o
Sol com a peneira, n�o? Sejamos realistas. O Evangelho
ainda � mensagem in�dita para os nossos cora��es.

N�o sei se consegui lhe responder a contento, mas,
pelo menos, tentei. Ser esp�rita com amor - eis o nosso
maior desafio! Conhecer, do ponto de vista filos�fico, a
Doutrina n�o basta. O conhecimento superficial disto ou
daquilo, se nos torna inflamados contendores, n�o nos
renova o esp�rito. E eu, minha irm�, estou com a cabe�a

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cansada de teorias... Troco tudo o que possa saber por um
pouquinho s� da sua capacidade de amar! Ent�o, fazemos
neg�cio? Voc� fica com os meus livros e os meus t�tulos
(menos os meus gatos!) e eu com os seus filhos e netos,
menos com o seu marido!...


ecebi a sua carta, minha filha. Seria
complicado explicar-lhe como, mas ela, junto a outras
correspond�ncias, veio parar sobre a minha mesa. N�o
descreia da possibilidade do interc�mbio medi�nico
tamb�m se fazer em sentido inverso, ou seja, da Terra para


o Mais Al�m! Li, certa vez, em uma das obras de Andr�
Luiz, ao que me parece "Mission�rios da Luz", que "o
interc�mbio do pensamento � movimento livre no Universo.
Desencarnados e encarnados, em todos os setores de
atividade terrestre, vivem na mais ampla permuta de
id�ias". A chamada mediunidade � algo que, felizmente,
n�o est� afeto t�o-somente aos m�diuns que assim s�o
rotulados ou se rotulam; as faculdades ps�quicas extrapolam
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o �mbito da Doutrina e, embora o que voc� me diz em
determinado trecho de sua missiva, o cora��o tamb�m
intermedeia os nossos anseios, e, n�o raro, chega a faz�-lo
com mais propriedade que o c�rebro. Sim, porque alega
ser uma pessoa desprovida de cultura, que n�o teve
oportunidade de bons estudos e que n�o sabe se expressar
direito.
Mas, sem maiores delongas, vamos ao que interessa.
Por quatro vezes, na carta de duas p�ginas, voc� cita a
palavra "depress�o", afirmando-se cansada de tratamento
e rem�dios. Compreendo. Os efeitos colaterais dos
barbit�ricos, em maioria, costumam ser mais nocivos ao
organismo que as suas indica��es terap�uticas. E, depois,
com a experi�ncia de m�dico antigo, digo-lhe: rem�dio
n�o cura a depress�o, em sua causa profunda, a menos que

o problema seja decorrente de aus�ncia de alguma
subst�ncia na qu�mica do c�rebro, o que, convenhamos,
n�o � facilmente detect�vel nos exames laboratoriais �
disposi��o no Sistema de Sa�de de um pa�s de terceiro
mundo.
Eu e esta minha mania de alfinetar... Devo ter sido
alfaiate relapso, em outra encarna��o!

Se voc� me permite, sintetizarei alguns itens
importantes a serem observados, caso voc�, de fato, esteja
almejando se curar do mal que a vem acometendo, "de uns
10 anos para c�", segundo a sua palavra. Falo assim porque
conhe�o muita gente que n�o quer sarar; aprende a

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chantagear com a pr�pria situa��o e... � um caso s�rio. A
doen�a se cronifica e, verdadeiramente, toma as
caracter�sticas de uma auto-obsess�o.

Vamos l�:

- em primeiro lugar, n�o procure culpados para o
estado psicol�gico em que se encontra;
- a quest�o heredit�ria, quando se trata de problemas
de origem ps�quica, n�o determina a prova sem o endosso
c�rmico de quem esteja envolvido;
- a movimenta��o da vontade � fator determinante
em sua recupera��o - se voc� n�o se ajudar, quase nada
poder� ser feito;
- n�o seja rebelde ao tratamento m�dico auxiliar e
muito menos � necessidade de ocupar a sua mente e as
suas m�os - principalmente, minha filha, as suas m�os;
- tanto quanto poss�vel, evite a cama e o sof�;
- n�o tenha excessiva compaix�o de si mesma, em
l�grimas sem motiva��o, a remexer feridas que precisam
cicatrizar - n�o fique rememorando as coisas, como quem
faz quest�o de n�o esquecer a ofensa para justificar-se
perante a consci�ncia;
- n�o deixe de considerar a hip�tese de que os seus
sintomas podem estar sendo agravados por uma influ�ncia
espiritual perniciosa, � qual voc� esteja dando guarida;
- n�o pense que a desencarna��o possa solucionar o
drama existencial em que voc� se v�: quem desencarna
deprimido, chega deprimido a este Outro Lado;
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� a depress�o, n�o raro, � decorrente de nossa postura
ego�stica diante da Vida: imaginamos que a Vida, atrav�s
de algu�m, nos deve algo que nem n�s mesmos sabemos
dizer o que �;
� de todos os pacientes deprimidos que tratei na carne,
nenhum conseguia atinar com a causa de seu abatimento
moral; respondiam-me de modo vago, como se estivessem
a fugir da pr�pria realidade...
Bem, devo ter me esquecido de alguma considera��o
importante, mas, traduzindo, se voc�, repito, de fato quer
voltar a sorrir com espontaneidade poss�vel no orbe de
provas e expia��es em que se encontra encarnada,
freq�ente mais o "consult�rio da caridade" do que o do
psiquiatra ou do analista. Os meus colegas s�o muito �teis,
quando receitam menos e conversam mais; todavia, no
corre-corre da vida de hoje na Terra, com tantas contas
para pagar, raros s�o os profissionais que ir�o atend�-la
por algum conv�nio, sem que a aten��o deles esteja mais
voltada para os ponteiros do rel�gio. Faz-se Medicina de
quantidade, n�o de qualidade. Mas este � um assunto que
n�o nos � pertinente agora.

Antes de terminar, outra considera��o. Voc�
escreveu:

� "Dr. In�cio, ser� que eu sou diferente de todo o
mundo?" N�o - respondo-lhe -, n�o �. Todos, acredite,
t�m os seus momentos, quase cotidianos, de, como se diz
vulgarmente, luz um pouco mais baixa... A depress�o, nas
criaturas humanas, ousaria dizer, difere apenas quanto aos

seus n�veis. Afinal, como est� escrito em "O Evangelho
Segundo o Espiritismo", "demonstrado est�, por experi�ncia
arqui-secular, que s� excepcionalmente este globo
apresenta as condi��es necess�rias � completa felicidade
do indiv�duo.

Em tese geral, pode afirmar-se que a felicidade �
uma utopia a cuja conquista as gera��es se lan�am
sucessivamente, sem jamais lograrem alcan��-la. Se o
homem ajuizado � uma raridade neste mundo, o homem
absolutamente feliz jamais foi encontrado."

Jesus Cristo era um esp�rito feliz? Certamente, sem

o que n�o seria um esp�rito perfeito. N�o obstante, eu e
voc�, isoladamente e juntos, temos sofrido mais do que
ele? � claro que n�o. O estado de felicidade, portanto,
independe do que se sofre, mas de como se sofre, concorda?
H� quem sofra sem realmente nada sofrer, como h� quem
n�o sofre, sofrendo verdadeiramente.
Quando me ponho a pensar em qu�o distante me
encontro dos Paramos Superiores - confesso-lhe - eu fico
momentaneamente aborrecido comigo mesmo,
principalmente quando penso que, um dia, vou ter que
voltar � Terra e ag�entar uma "turminha" da qual j� me
supunha livre... Todavia, o que posso fazer? Para mim, um
dos homens mais s�bios � aquele que aprende a sorrir nas
adversidades. Ningu�m � mais do que � s� porque quer
ser. A vontade � uma alavanca que n�o dispensa o concurso
das m�os. Querer com as palavras nem sempre � querer
com as entranhas do ser!

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Espero que, de alguma maneira, estas palavras
possam auxili�-la. Escrevendo-as a voc�, eu as reafirmo a
mim mesmo, endere�ando-as a punhado de gente que est�
na mesma barca em que ambos estamos.

N�o desanime, na certeza de que, deste Outro Lado,
voc� conta com um aliado e um amigo que n�o a esquecer�
em suas ora��es quanto solicita seja lembrado pelas suas.

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inha filha, a sua carta de m�e me comoveu.
Senti vontade de chorar com voc�, ao l�-la, relatando o
drama da filhinha de 8 anos vitimada pela leucemia, ap�s
uma luta que se arrastou por vinte e quatro meses, inclusive
com um transplante de medula malsucedido.
Voc� me fala de seu anjo de cabelos encaracolados,
ficando o tempo todo resignada, ante os agressivos
tratamentos quimioter�picos que, cada vez mais, a
deixavam abatida e desfigurada.
Em suas palavras, voc� me solicita: � "Dr. In�cio,
encontre-a para mim e cuide dela..." Acredite, o seu pedido
soou como uma ordem ao meu cora��o. J� estou


23


providenciando localiz�-la, para transmitir-lhe as suas
not�cias, todavia n�o pense que, deste Outro Lado, existam
crian�as abandonadas, qual, infelizmente, acontece na
Terra. Neste sentido, os nossos servi�os s�o muito mais
perfeitos que os dos homens encarnados, que, de maneira
geral, na inf�ncia desvalida, relegam o pr�prio futuro ao
descaso.

Se, por exemplo, a sua filhinha desencarnada n�o
estiver sob a tutela de familiares que a precederam na
viagem de volta, estar� aos cuidados de uma fam�lia que,
de imediato, a ter� adotado, protegendo-a, em nome de
Deus, para voc�, at� que, um dia, o reencontro lhes seja
poss�vel.

N�o chore! Obterei as informa��es que voc� deseja
e, mesmo que n�o possa repass�-las em detalhes ao seu
cora��o, devido a dificuldades t�cnicas comuns na tarefa
do chamado interc�mbio medi�nico, voc� n�o ficar� sem o
conforto da f� na imortalidade.

Se tudo desaparecesse no Universo, as m�es e as
crian�as, al�m dos gatos, n�o desapareceriam nunca! O
Amor sobrevive a qualquer tipo de destrui��o. A morte �
uma ilus�o da qual precisamos nos desfazer de uma vez
por todas.

Voc�, ainda, me pergunta o que o seu anjinho ter�
feito para merecer t�o triste prova��o... Reflita: Deus n�o
� injusto! � "A minha filha, Doutor - argumenta -, � uma
flor que sequer chegou a desabrochar, fenecendo na pr�pria
haste..." Em cada exist�ncia, o esp�rito viv�ncia as


experi�ncias de que mais necessita ao seu progresso. N�o
h�, entre uma vida e outra, solu��o de continuidade, como
n�o existem hiatos na Cria��o Divina. Tudo � conseq��ncia
de nossas escolhas. Em vidas pregressas, todos j� nos
equivocamos muito, acumulando amarguras e decep��es.
Os nossos erros, quando extrapolam, se nos fixam no corpo
espiritual e, conseq�entemente, se refletem no corpo de
carne, que, por assim dizer, � a parte mais externa de n�s
mesmos. A doen�a � processo de cura no esp�rito!

Outra coisa: em tudo o que lhe aconteceu, voc� tem
� sua disposi��o excelente material para concluir que, de
fato, a Vida � bem mais do que os homens comumente
imaginam. Que sentido, por exemplo, ela teria para voc� e
a sua filhinha, ante a felicidade que parece reservar a outras
m�es junto aos rebentos amados? De que crit�rios ela se
utilizaria para conceder a uns o que nega a outros?
Estar�amos � merc� do acaso? Todas estas quest�es, no
entanto, esbarram na ordem que impera na Cria��o Divina,
contestando a teoria do caos das teses materialistas. O
Universo � uma Obra de Intelig�ncia e de Amor! Deus a
nada e a ningu�m privilegia. As oportunidades que, em
rela��o aos outros, nos s�o aparentemente negadas s�o
aquelas mesmas que malbaratamos e aquelas de que, sem
d�vida, voltaremos a desfrutar.

Est� escrito em "O Evangelho Segundo o
Espiritismo", no cap�tulo IX, que "a dor � uma b�n��o que
Deus envia a seus eleitos..." Somente pela vis�o esp�rita,

o homem ser� capaz de entender o sofrimento na condi��o
25


de b�n��o. N�o foi por outro motivo que Jesus bem-
aventurou os aflitos! N�o me encontro entre os apologistas
da dor - quando a piorreia generalizada come�ou a me
atormentar muito, fui ao dentista e mandei que todos os
meus dentes fossem extra�dos; coloquei duas "chapas", ou
seja, duas dentaduras, e... pronto. No entanto, devo
reconhecer que quem n�o sofre, ainda que seja um tiquinho
s�, n�o cresce! � neste sentido que a dor � b�n��o e que a
afli��o � boa. A dor retempera o a�o que somos, e o amor
d� os retoques finais � obra-prima!

Espero que voc� esteja me compreendendo. Coloco-
me em seu lugar de m�e e, apenas de admitir um filho meu
desencarnando antes de mim, quase vou � loucura... Se
somente de pensar na hip�tese me transtorno, imagine voc�,
minha irm�, na experi�ncia real da mais do�da de todas as
saudades!

Conhe�o m�es deste Outro Lado que vivem
completamente desassossegadas pelos filhos que deixaram
no mundo. Quando n�o podem, por si mesmas, ir e vir de
iniciativa pr�pria � superf�cie do Orbe, vivem procurando
os nossos servi�os de informa��o^ com o intuito de obterem
not�cias daqueles que parecem ter sido formados de um
peda�o do seu cora��o. As m�es n�o esquecem nunca! Se,
na reencarna��o, n�o houvesse a b�n��o do olvido
tempor�rio, as m�es haveriam de querer ser sempre m�es
dos mesmos filhas... Seria um problem�o para Deus,
concorda?


Mas voltemos ao assunto central desta carta, que
espero possa chegar �s suas m�os. N�o se preocupe, minha
irm�! Farei o que estiver ao meu alcance para encontrar a
sua menina. Ela ser�, com a sua permiss�o e a dos
verdadeiros av�s, � claro, a minha primeira neta adotiva.
Pe�a aos seus pais e aos pais de seu marido para n�o
ficarem com ci�mes. Eu sempre estive dividido entre os
meus pacientes no Sanat�rio e as crian�as no Lar Esp�rita,
que, com um grupo de amigos, fundamos em Uberaba
um Lar que s� acolhia meninas, que eu gostava de ver
sempre bem penteadas e de fitinhas amarradas aos cabelos!
Que festas, meu Deus, elas faziam para mim quando,
escapulindo do Sanat�rio para respirar, eu as visitava,
apertando as bochechas rosadas de uma e de outra!

Portanto, fique tranq�ila e, enquanto espera pelos
Des�gnios Divinos, n�o sossegue a sua capacidade de amar
a outras crian�as, principalmente �quelas que foram

r

enjeitadas pelos seus genitores biol�gicos. � poss�vel que
possa detect�-las no primeiro sem�foro, sujas, desnutridas
e maltrapilhas, estendendo a pequena m�o � indiferen�a
dos que passam, incapazes sequer de levantar o vidro do
carro para uma palavra de carinho... Meu Deus, quanto
carma, coletivamente, a Humanidade est� acumulando para
si mesma!

V�, minha irm�, ainda hoje se poss�vel, a uma creche
ou a um orfanato, em nome de sua filhinha, que tanto amor
continua recebendo de voc�, levar um pouco de amor aos
garotos de futuro incerto... Fa�a pelos filhos sem pais no


mundo o que os pais sem filhos deste Outro Lado haver�o
de fazer pela sua pequena Thais!

Perdoe-me, se n�o pude lhe responder segundo as
suas expectativas. Para falar de igual para igual a uma
m�e sofredora, penso que s� outro cora��o de m�e
sofredora, e eu - pobre de mim! - nem as alegrias da
paternidade pude conhecer.


Minha irm�, a sua solicita��o, feita atrav�s da
carta que me enviou, est� registrada. � "Dr. In�cio - voc�
me escreveu -, reserve a�, no Hospital dos M�diuns, um
lugarzinho para mim: quero trabalhar com o senhor..."

Com o Senhor - ele, sim - um dia, haveremos todos
de trabalhar. Desde muito, estou convencido de que n�o
h� melhor patr�o e mais r�gio sal�rio do que ele nos paga!
Estou me esfor�ando ao m�ximo, "fazendo das tripas
cora��o para continuar merecendo a chance de estagi�rio,
que na Doutrina, ele me tem facultado... Temo, de uma
hora para outra, ser despedido. Se, porventura, tal ocorresse,
a quem eu iria servir? Deus me livre! O trabalho com o
Senhor � �rduo. mas extremamente gratificante.


CARLOS.A.BACCELLI\ IN�CIO FERREIRA

Definitivamente, n�o quero servir a mais ningu�m, sen�o a
ele, o Divino Mestre. J� perdi muito tempo com patr�es
mentirosos e caloteiros, trabalhando em regime de
escravid�o da mente e do cora��o. Nenhum nunca nos
exortou como ele: "Vinde a mim todos v�s que estais aflitos
e sobrecarregados, que eu vos aliviarei. Tomai sobre v�s

o meu jugo e aprendei de mim, que sou brando e humilde
de cora��o... "
Fugindo, no entanto, de tantas divaga��es, devo dizer
que ser� uma alegria t�-la conosco, mais tarde. Tomara
que bem mais tarde, n�o �? A Terra � aben�oada escola
que nos cabe valorizar em cada uma de suas li��es, por
mais amargas. A luta, minha irm�, � a mesma em toda
parte. N�o pense voc� que as coisas sejam mais f�ceis por
aqui; um pouco melhores, talvez, n�o mais do que isto...
Digamos: menos corrup��o, maior igualdade de direitos,

justi�a n�o t�o facilmente suborn�vel, deveres mais
prontamente atendidos... N�o se espante, pois nos
encontramos apenas no "andar de cima", distantes do
"apartamento de cobertura", que, creio, seja sonho de
consumo de quase todo cond�mino, pelo menos de quem
n�o sofre de vertigem das alturas.

Dia chegar�, mesmo na Doutrina Esp�rita, em que
compreenderemos a Vida Al�m da Morte como
desdobramento natural da exist�ncia no corpo f�sico. A
�nica diferen�a, assim mesmo tomando o mundo material
como ponto de refer�ncia, � que tudo nos d� a impress�o
de ser mais eterizado. A desencarna��o, em termos de


qualidade de vida, s� se compara a um salto �quele que,
de algum modo, logrou transcender as pr�prias limita��es
�ntimas; para esmagadora maioria dos que "morrem", � um
simples deslocar da mente, como se parte de nosso c�rebro,
afetada por uma isquemia ou algo parecido, nos provocasse
a ilus�o de caminhar nas nuvens... O Mundo Espiritual,
para decep��o de muita gente, n�o � um mundo m�gico!

Portanto, quando voc� vier, teremos, sim, lugar para
voc� na cozinha... N�o � o que nos pede? � "Quero
trabalhar como cozinheira em seu hospital..." A car�ncia
de trabalhadores por aqui � uma coisa espantosa! E uma
crise mais s�ria do que voc�s enfrentam por a�, nas casas
esp�ritas, com quase ningu�m querendo se responsabilizar
por esta ou aquela tarefa. Al�m da morte, nas imedia��es
da Terra, os volunt�rios tamb�m escasseiam. Raros os
seareiros de boa vontade que se disp�em a servir pela
ventura de ser �til aos semelhantes.

Dias atr�s, conversando com o Odilon Fernandes e
com a Maria Modesta, eu cheguei a lhes propor que
"import�ssemos", urgentemente, da Terra, alguns
companheiros, revogando, assim, as morat�rias com que
foram beneficiados, a t�tulo de qu�, sinceramente, n�o sei,
j� que ultrapassaram a barreira dos j^Lde idade e... n�o
desencarnam!

Odilon, sempre ponderado, argumentou:

� In�cio, a turma l� n�o pode prescindir deles...
� Mas - respondi - est�o caindo pelas tabelas...
Eu, depois dos 80, n�o valia mais nada: dores em tudo
31


quanto eram juntas, cabe�a cansada, indisposi��o at� para
dormir - gripe, bronquite, sinusite, artrite...

�A simples presen�a deles � importante - disse-me

o amigo -, para que a coisa n�o desande de vez!
Entendi o que ele, polidamente, insinuou: � que essa
turminha de meia idade, na Doutrina, ainda n�o se definiu
bem e, quanto aos mais jovens, eu n�o sei, de vez que
parecem estar mais invis�veis nos centros esp�ritas do que
n�s, os desencarnados. N�o se trata de cr�tica, mas de
fraterno alerta aos que se preocupam com o futuro da
Doutrina. A mocidade esp�rita est� precisando de uma
sacudida - ou duas... Falando em mocidade esp�rita, no
centro que voc� freq�enta, em S�o Paulo, ela funciona?
Os dirigentes a apoiam? Ou l� o que se tem � dono de
centro esp�rita e n�o presidente? O Espiritismo prega o
desapego, mas ningu�m quer abrir m�o de seus cargos...
Sei de gente que sai no tapa, quanto se sente amea�ada
por uma lideran�a mais jovem na casa. O m�dium n�o
abre m�o da mediunidade, o orador n�o abre m�o da tribuna,

o presidente n�o abre m�o da presid�ncia... Engra�ado:
ningu�m briga para fazer sopa, costurar para os pobres,
dar banho nos doentes acamados, visitar os internos nos
asilos... N�o � curioso? A turma briga pelo poder e n�o
para poder!
Como j� est� perto de 20 anos que desencarnei, deixe-
me ficar no lugar que me compete. Reconhe�o que, �s
vezes, eu me intrometo demais nos assuntos de voc�s.

32


Estaremos, minha irm�, com as portas abertas para
receb�-la em nossa cozinha... Informei-me e sei que voc�
� das melhores, al�m de ter um grande cora��o. N�o estamos
t�o interessados em seus indiscut�veis dotes culin�rios,
como estamos em sua nobreza de sentimentos. Voc� �
esp�rita da gema! Com o seu curr�culo, quem sou eu para
lhe dizer n�o? Filha, esposa, m�e e av� exemplar, voc� "
n�o sei fazer outra coisa, a n�o ser cozinhar" - � uma das
mensagens mais eloq�entes que a Doutrina possui, sem
que, para divulg�-la, tenha necessidade de abrir a boca. Eu
queria ter, em cada departamento deste nosocomio sob a
nossa responsabilidade, uma pessoa como voc�: o que
equivale dizer: uma costureira, uma enfermeira, uma
auxiliar de servi�os gerais, uma cantineira, uma m�dica,
uma atendente... Nada contra os marmanjos, hem?! Por
antecipa��o, estou escutando a chiadeira: � "O Dr. In�cio
discrimina os homens..." N�o, n�o se trata de discrimina��o,
mas de prefer�ncia. Assumo. Eu sempre fui um sujeito
assumido, se bem que empregar esta palavra hoje � um
perigo!

Voc�, na carta que me remeteu, sequer mencionou
pretens�o salarial. E n�o haveria mesmo necessidade.
Trabalhamos por casa, roupa e comida. Para que mais, n�o
�? O mais que o trabalho no Bem nos proporciona, todo o
dinheiro seria incapaz de pagar. Eu n�o ando com um vint�m
no bolso e nada me falta. Tudo de que preciso, por prod�gios
que n�o sei definir, vem parar nas minhas m�os - n�o sei o
que fazer com tantas b�n��os, que me fazem sentir

33


imensamente devedor da Divina Miseric�rdia. E t�o devedor
me sinto, minha irm�, que, ultimamente, tenho me
desdobrado, trabalhando nos Dois Lados da Vida, a ver se
amortizo o meu d�bito, que, em vez de diminuir, espicha a
cada vez mais!


enho o seu bilhete em m�os: � "Dr. In�cio, eu
quero ser m�dium, mas tenho medo da cr�tica. O que o
senhor me aconselha?"

Meu filho, para ser sincero, eu o aconselho a preparar

o lombo... Todo aquele que trabalha � criticado,
principalmente pelos que t�m tempo de sobra para isto. Se
voc� n�o quer ser incomodado, se acomode. N�o fa�a
absolutamente nada - � o que os esp�ritos obsessores
querem.
Na acep��o da palavra, eu n�o fui m�dium; tinha l�
as minhas intui��es, meus insights, mas n�o passava disto.
Gastava tempo e fosfato para escrever os meus artigos e

35


organizar as minhas brochuras. A minha m�o, ao contr�rio
da m�o do medianeiro, que, c�lere, corre sobre as laudas,
pesava feito chumbo; eu escrevia e reescrevia os meus
textos, cortando aqui, acrescentando ali... Enfim, era uma
luta de esgrima, com v�rias estocadas... O meu cesto de
lixo vivia repleto de bolas de papel, que, n�o raro, serviam
de brincadeira para os meus gatos.

Com toda a minha confessa dificuldade liter�ria, voc�
n�o h� de ver que eu ainda apanhava dos cr�ticos de plant�o!
Batiam-me a valer com varas de marmeleiro, socos e
pontap�s... No sentido figurado, � claro, mas do�a no sentido
real da sova. E olhe que, em bater, os esp�ritas s�o
especialistas: ningu�m bate como eles... N�o digo "n�s",
porque o meu neg�cio era com os padres - o meu e o do
Doca, o amigo Orlando Ferreira, autor de uma obra
confiscada chamada "O P�ntano Sagrado". Isso foi nas
d�cadas de 40 e 50; voc� n�o era nem nascido. Ali�s,
compreenda, eu nunca fui de bater, ainda mais em gente de
saia... Simplesmente me defendia, com a pretens�o de
defender a Doutrina, que a turma do Xandico enxovalhava.
Xandico era o apelido de uma autoridade eclesi�stica em
Uberaba, pecinha fina que comandava os ataques
sistem�ticos contra n�s.

Voltemos, no entanto, ao seu bilhete: � "O pessoal
aqui do centro esp�rita que freq�ento fica me olhando de
banda, e j� os surpreendi cochichando a meu respeito."

Pois �, depoi| dizem que eu sou muito duro com os
esp�ritas... N�o � verdade: com todos, n�o: com alguns,

36


sim. A turma � especializada em bater e cochichar! Temos,
gra�as a Deus, exce��es. Conhe�o esp�ritas que, por n�o
falarem nada de ningu�m, chegam a dar t�dio definitivamente,
n�o abrem a boca. Assim tamb�m n�o d�:
inviabilizam qualquer di�logo...

A seu respeito, enquanto voc� for m�dium, console-
se: cochichar�o a vida inteira. Inventar�o um punhado de
coisas; se voc� n�o se casar, ent�o... Voc� j� publicou
algum livro? Penso que n�o, certo? Quando sair o primeiro,
voc� ser� esfolado em pra�a p�blica... Se n�o desencarnar
com a provid�ncia, quando voc� editar a sua segunda obra,
eles haver�o de empal�-lo! Todo m�dium tem que ter os
sete f�legos de um gato.

Eu tinha um gato rajado. Inacredit�vel! O nome dele,
por causa do p�lo cinza-listrado, era "Rajado". Depois,
passei a cham�-lo de "M�dium". Ele, brigando com os
outros gatos, ca�a do telhado da casa, despencando de uma
altura de 7, 8 metros (eu morava num sobrado); escapou
duas vezes de morrer envenenado (desconfio que foi gente
do Xandico); saiu ileso de sob as rodas de um caminh�o-
leiteiro; teve um tumor em um dos olhos que precisei
lancetar e tacar penicilina por sua goela abaixo; foi arrastado
por uma enxurrada e s� n�o caiu dentro do c�rrego que
transbordava porque a boca do bueiro estava entupida...
Ao que o "M�dium" sobreviveu, eu teria desencarnado
um sem-n�mero de vezes. Ele s� foi derrotado pelo
reumatismo: ficou velho e uma artrite reumat�ide o
consumiu aos poucos... Espero que seja o que venha a

37


suceder com voc�; � o que lhe desejo: desencarnar por
problemas no esqueleto!

Lembrei-me agora de Chico Xavier. Por que ser�,
hem, que ele sempre vem � lembran�a da gente? Aos 80 e
poucos de idade, Chico come�ou a manquitolar e, um dia,
chegou com isto l� no "Grupo Esp�rita da Prece": � "Eu,
que, a vida inteira, cuidei da sa�de do corpo, agora vou ter
que tratar do esqueleto. O m�dico falou que estou com
problema nas articula��es..." E sorria de si mesmo, feito
uma crian�a das mais inocentes.

N�o ligue, n�o, meu filho, para as cr�ticas que, com
certeza, vir�o. Coloque chuma�os de algod�o nos ouvidos

r

e continue trabalhando. E claro, voc� n�o deve fazer por
merec�-las... Enquanto estiver sendo injustamente criticado,
�timo! Melhor que, a seu respeito, falem mentiras que
verdades. Aja de consci�ncia tranq�ila e deixe o cora��o
ferver. Sirva desinteressadamente, conservando a
consci�ncia em paz. Eu vou lhe dizer uma coisa muito
s�ria - como diz um amigo nosso, vou lhe fazer uma
revela��o: os bajuladores do m�dium s�o muito piores!
N�o acredite nos elogios. Se algu�m disser que voc� � um
esp�rito mission�rio, benza-se; se n�o puder tomar um
passe, procure uma benzedeira. Eu tinha uma, chamada D.
Cherubina. Morava, nos arrebaldes da cidade, com seus
dois netinhos, Cosme e Dami�o. Quando a coisa apertava,
eu procurava a minha irm� cachimbenta; sim, porque
benzedeira que se preze precisa fumar cachimbo ou
charuto... Estou at� vendo, sentindo aqui na minha pele, o

38


arrepio dos ortodoxos! N�o lhes devo um centavo e, em
nada, absolutamente nada, os reconhe�o melhores do que
sou.

Outro conselho a voc�, que est� come�ando: nunca
se afaste dos pobres! O dia em que come�ar a pensar que
� o tal, tchau - adeus, mediunidade! Os Esp�ritos Bons,
que s�o bons porque s�o misericordiosos, se afastar�o de
voc�, que preferiu outras companhias. Tanto quanto
poss�vel, fa�a o Bem, envolvendo-se diretamente nas tarefas
consagradas � Caridade. Nada de lidar apenas com os
desencarnados... O s�bio amigo Odilon Fernandes costuma
dizer: � "Mediunidade � compar�vel a uma cascata: cai
na vertical, mas corre na horizontal, fertilizando a terra e
fazendo nascer a semente..." Tem m�dium que s� quer
mediunidade na horizontal, ou seja, na parte mais f�cil ou
supostamente mais f�cil, que � lidar com os esp�ritos.

Deixe-me ainda, antes de encerrar, passar-lhe uma
outra dica: estude sempre, mas n�o somente obras
doutrin�rias. Leia, leia muito, leia bastante, submetendo
as informa��es ao crivo da F� Raciocinada. O Espiritismo
est� em tudo e em toda parte. Com os princ�pios da Doutrina
assimilados, voc� penetrar� na ess�ncia de todas as coisas.
Seja um esp�rita de mente aberta e cora��o escancarado!
Jamais adote posi��es extremistas em suas opini�es.

Era o que, em poucas palavras, eu tinha a lhe dizer.
O resto voc� aprender� com a pr�pria experi�ncia, � custa
dos verg�es que lhe ser�o deixados da cabe�a aos p�s. H�
algo errado com o m�dium que n�o apanhar; o normal �

39


que, pelo menos, ele tome uma sova por dia... As vezes, a
coisa acontece antes do caf� da manh� ou j� bem � noitinha,
quando ele come�a a achar que atravessou ileso aquele
dia.

No mais, seja bem-vindo. � sempre muito bom
receber o refor�o de carne jovem, disposta a dividir com
as nossas costas maceradas as vergastadas implac�veis
dos verdugos.


inha irm�, o assunto � grave e demanda muitas
reflex�es. A senhora explica: � "Doutor, a minha filha, de
16 anos, foi v�tima de estupro e est� gr�vida de um homem
casado. O que devemos fazer? O que diz o Espiritismo em
casos assim? O aborto seria leg�timo?".
Sinceramente, n�o sei por onde come�ar; ou melhor,
sei, mas me encontro impedido de fazer o que o meu
primeiro impulso orienta: prender o safado que fez isto
com a sua filha, aplicando-lhe uma sova por dia nas partes
pudendas! Desculpe-me a indigna��o. Ponho-me no seu
lugar e avalio a sua dor.
Sou contra o aborto indiscriminado. Se existem
m�todos contraceptivos, n�o se justifica tamanha falta de


41


rever�ncia com a vida: que quem queira se relacionar
sexualmente se previna contra a chamada gravidez
inesperada. N�o sejamos hip�critas, exigindo dos outros o
que n�o cumprimos. A Igreja Cat�lica adota tal posi��o
extremista, condenando a p�lula anticoncepcional, o
preservativo e similares, porque os padres n�o engravidam;
se engravidassem, seria indiferente... Deixemos, no entanto,
a Igreja de lado, com o seu ortodoxismo sustent�vel nos
tempos modernos.

O caso de sua menina, no entanto, deve ser analisado
por outro �ngulo. Pe�o n�o se escandalizar com a minha
posi��o. A pergunta foi sua; a resposta � minha.

Imaginemos que um estranho nos invadisse a casa e
quisesse se apossar do que � nosso, sem o nosso
consentimento. � "Doravante - diria ele -, morarei com
voc�s e esta casa tamb�m ser� minha... Daqui ningu�m me
tira. Deitar-me-ei em qualquer cama, assentar-me-ei � mesa
com voc�s; enfim, serei parte integrante da fam�lia e...
pronto". Duvido que a nossa generosidade nos impedisse
de chamar a pol�cia e colocar o intruso para fora; isto, se
n�o deliber�ssemos faz�-lo a muque, agarrando-o pelos
fundilhos e atirando-o no meio da rua... Se tal ocorresse
comigo, eu o faria. Se um parente dentro de casa nos
aporrinhando � dif�cil de tolerar, o que dizer de algu�m que
aparece do nada?

Em "O Livro dos Esp�ritos", escrito 150 anos atr�s,
quando essas coisas de honra de fam�lia eram resolvidas a
bala, os Esp�ritos Superiores, responderam a quest�o 359,

42


formulada por Kardec: � "No caso em que a vida da m�e
estaria em perigo, pelo nascimento da crian�a, h� crime em
sacrificar a crian�a para salvar a m�e?" � "� prefer�vel
sacrificar o ser que n�o existe a sacrificar o que existe".
Neste �nico caso, admitiram eles a possibilidade do aborto.
Oficialmente, pois, eis a posi��o da Doutrina Esp�rita, a
qual eu endosso. Como ficar�amos, no entanto, na gravidez
oriunda de estupro, quando a m�e - e t�o-somente ela! n�o
deseja o filho assim concebido? � uma discuss�o que,
reconhe�o, h� de dar pano para mangas... Porque, em
Espiritismo, n�o podemos adotar posi��es dogm�ticas,
tra�ando para os outros regras comportamentais. O
Espiritismo � a doutrina do livre-arb�trio; em outras
palavras, de conscientiza��o com responsabilidade...

N�o creio que seja justo colocar filhos no mundo e,
depois, releg�-los � tutela do Estado. Antigamente, as m�es
que n�o podiam ou n�o queriam criar os seus rebentos os
abandonavam nos mercados ou � porta dos conventos ou,
desalmadas, os atiravam �s �guas dos rios... De quando
em quando, a imprensa do mundo noticia o fato de uma
crian�a encontrada na lata de lixo, no banheiro de uma
rodovi�ria, num terreno baldio...

Esclare�o, j� que voc� solicita a minha opini�o, que
sou contra a legaliza��o do aborto; todavia, nos casos de
gravidez, repito, oriundos de estupro, a opini�o da futura
m�e deve ser soberana. N�o sejamos moralistas a tal ponto.
Se a mulher aviltada em sua honra e dignidade, v�tima de
viol�ncia sexual, n�o quiser a crian�a, melhor que a gesta��o


n�o chegue a termo do que contarmos em nossa sociedade
mais um membro desajustado, mergulhado em conflitos
psicol�gicos que poder�o martiriz�-lo por toda a vida. Do
ponto de vista espiritual, o estrago ser� menor: o esp�rito
reencarnante, que pode ou n�o ter afinidades com os pais,
principalmente com a m�e, interromper� a viagem, que
muitas vezes for�ou, planejando-a melhor.

� o que sinceramente penso. Permita-me, por�m, ser
um pouco mais claro, assumindo a minha posi��o pessoal,
j� que os esp�ritos que participaram da Codifica��o n�o
foram arg�idos quanto ao tema que lhe motivou a consulta.
Se fosse eu o pai de uma menina estuprada e que, em
decorr�ncia, houvesse ficado gr�vida, como agiria?
Primeiro, digo-lhe, passaria a ouvi-la, procurando n�o tomar
nenhuma decis�o precipitada. Se a minha filha optasse
pela consuma��o da gravidez, dando-me um neto ou uma
neta, eu a apoiaria; no caso inverso, tamb�m. Na condi��o
de esp�rita, se, porventura, ela decidisse pelo aborto,
procuraria, ainda, argumentar discorrendo sobre as b�n��os
da maternidade, que me parece mais sublime quanto mais
dolorosa. Argumentaria, sim, sem muita veem�ncia, mas
argumentaria. Sei de alguns casos de jovens que, vitimadas
assim, est�o hoje felic�ssimas com os seus filhos - atrav�s
do amor que lhes dedicaram, converteram um suposto mal
em bem. O Amor transfigura a treva em luz!

N�o podemos esperar que os Esp�ritos Superiores
explicitem tud o que nos conv�m fazer, relegando a eles
a responsabilidade de nossas decis�es. Se assim fosse,
qual nos seria o m�rito?


Deixei-a ainda mais confusa? Espero que n�o. � que

o assunto � delicado mesmo. Fique sempre do lado de sua
filha e, se poss�vel, de seu neto, deixando que os outros
falem o que quiserem. � simples encontrar solu��o para
os problemas alheios, n�o � verdade?
Quanto ao derradeiro t�pico de sua carta, em que
voc� indaga quanto � natureza do esp�rito reencarnante
numa situa��o adversa como esta, eis o que tenho a
acrescentar: existe, sim, a chamada Lei da Compensa��o!
Pode ser que o esp�rito que assim se lhes encaminha �
fam�lia consangu�nea seja uma afei��o de outras exist�ncias

- um esp�rito que, inclusive, tenha se adiantado � sanha de
um perseguidor invis�vel e, � �ltima hora, tomado o seu
lugar na reencarna��o.
S� me resta desejar a voc� e � sua menina muita
lucidez na hora de tomar a decis�o do problema em pauta,
orando para que, seja ela qual for, n�o venham a se
arrepender, pois, afinal de contas, com apenas 16 de idade,
a sua filha � uma flor que come�a a desabrochar para a
vida, � qual, tenho certeza, n�o faltar�o in�meras
oportunidades de sorrir e de ser plenamente feliz.

Quanto ao infeliz que, voluntariamente, se fez
instrumento de t�o grande afli��o para voc�s, processe-o,
para que, impune, n�o venha a fazer o mesmo com outras
crian�as. Rejeite o seu nome e o seu dinheiro, mas ponha-

o nas grades, que � onde toda fera, que venha da selva para
a cidade, precisa estar.
Com o meu carinho e solidariedade, sou o irm�o e o
amigo sempre ao seu dispor.

45


eu irm�o, voc� me escreve indagando a minha
opini�o sobre os meus livros de natureza medi�nica: �
"Percebo, Dr. In�cio, certa diferen�a de estilo entre eles e
os que escreveu quando estava encarnado. O senhor poderia
me auxiliar em meus estudos?".


Pergunta sincera reclama resposta do mesmo n�vel.

Em primeiro lugar, eu n�o acho absolutamente nada
diferente nas obras medi�nicas que tenho escrito com o
concurso de um companheiro de boa vontade, que, �s vezes,
por minha causa, se v� em constrangedoras situa��es.

Aproximei-me dele, do m�dium, com base em
amizade antiga, que transcende a que t�nhamos quando,


durante anos a fio, fazia o obs�quio de, semanalmente, me
visitar em minha casa para um bom papo.

Desde muito, via nele o essencial: transpar�ncia, o
que, convenhamos, hoje em dia, � virtude dif�cil de ser
encontrada. Certa vez, enquanto convers�vamos em meu
escrit�rio, saboreando um suco de caju, determinada id�ia
passou pela minha cabe�a como um rel�mpago:�"Quando
desencarnar, procurarei este caboclo para escrever alguma
coisa..." Quando avaliei o que pensava, tratei de sacolejar
a cabe�a, pois, afinal, n�o estava em meus planos
desencarnar t�o cedo.

Ent�o, sinceramente, eu n�o acho nada diferente. S�o
obras comuns, simples, escritas sem qualquer pretens�o.
Comparando-as, por exemplo, com obras de outros autores,
estejam mourejando no corpo da carne ou n�o, eu me avexo
por ser incapaz de produzir algo mais substancioso, que
valha a pena ser lido e estudado, provocando toda essa
pol�mica, mormente entre os que n�o se sentem motivados
a tarefas mais produtivas e interessantes para si e para a
Doutrina.

Como tem gente com tempo sobrando no Espiritismo!
Na tal de Internet, ent�o, � calamitoso. A comunica��o
globalizada, em outras palavras, horizontalizada, est�
impedindo a sua verticaliza��o. Para milhares de
aficionados, os chamados internautas, o computador se
transfigurou no altar de suas ora��es, quando, para os
menos espiritualizados, n�o se transforma noutra coisa...
Enfim, viva o progresso!

47


Quanto ao cerne de seu questionamento, a suposta
diferen�a de estilo que detecta, devo dizer que nunca tive
nenhum intencional e, assim, elaborado, como continuo
n�o tendo. Escrevo conforme posso, de acordo com as
circunst�ncias - nas quais incluo o meu estado psicol�gico
no momento -, procurando nitidez com as palavras e n�o
erudi��o ou riqueza de vocabul�rio que n�o possuo. A
rigor, a minha marca registrada � o chiste, as brincadeiras
que fa�o em minha voca��o para o picadeiro. Coisa sem
maldade, acredite.

Acusam-me de ser duro demais com os esp�ritas e
com os m�diuns... N�o � verdade. � zelo de irm�o que
extrapola. Tenho receio de que fa�amos a Doutrina
enveredar por atalhos que a desfigurem. N�o estou me
justificando. N�o sou homem de agir sem pensar, para n�o
me arrepender depois.

Se voc� reparar bem, os livros que escrevi quando
estava por a� s�o uma "colcha de retalhos", repletos de
cita��es, textos transcritos, casos de pacientes meus, sob

o tempero de velada ou expl�cita cr�tica aos materialistas
e aos fan�ticos religiosos. Os tempos eram outros e, em
Uberaba, onde o Bispo, depois Arcebispo, se arvorava na
maior autoridade da cidade, sem que, evidentemente, jamais
tivesse sido, as coisas eram feias. A persegui��o aos
esp�ritas era declarada. Em nossa mem�ria, ainda estava
bem viva a no��o do que, em Sacramento, Eur�pedes
Barsanulfo havia amargado. Se fosse a alguns s�culos atr�s,
n�o duvide: ele teria sido queimado em pra�a p�blica!

Ora, algu�m, inconseq�ente como eu, precisava peitar
aquela turma de batina - algu�m com relativa independ�ncia
econ�mica, que n�o precisasse deles para nada, inclusive
para o p�o de cada dia. Era o meu caso. Nunca fui rico,
mas o meu consult�rio e o Sanat�rio regurgitavam de
clientes, garantindo-me o necess�rio � subsist�ncia, com
uma beirada para ajudar a edi��o de "A Flama Esp�rita",
peri�dico que circulava semanalmente, e custear os livros
que, praticamente, eram distribu�dos de gra�a. Livro esp�rita
d� dinheiro hoje, mas, no meu tempo, era investimento sem
volta. � l�gico que n�o estou me referindo ao capital de
ordem moral, de retorno sempre garantido aos seus
aplicadores.

Esta nossa conversa, no entanto, est� se alongando
em demasia. Outra coisa que voc�, como estudioso, deve
levar em considera��o � a quest�o da "filtragem medi�nica",
um tanto prec�ria em quase todos os sensitivos. Permita-
me transcrever, para sua an�lise, o que Kardec escreveu
no cap�tulo 16, de "O Livro dos M�diuns", quando fala
sobre os medianeiros pneumat�grafos: "Os esp�ritos
insistiram, contra a nossa opini�o, em colocar a escrita
direta entre os fen�menos de ordem f�sica, pela raz�o,
disseram eles, que: "Os efeitos inteligentes s�o aqueles
pelos quais o esp�rito se serve dos materiais cerebrais do
m�dium, o que n�o � o caso da escrita direta; a a��o do
m�dium � aqui inteiramente material, enquanto que no
m�dium escrevente, mesmo completamente mec�nico, o
c�rebro desempenha sempre um papel ativo ". (grifei)

49


N�o � curioso que Kardec e os Esp�ritos divergissem
em certos pontos?

Agora veja: nem mesmo o m�dium considerado
completamente mec�nico � inteiramente passivo! A quest�o
de estilo, pois, passa a ser relativa, voc� n�o acha? No
m�dium e no esp�rito em trabalho conjunto mais duradouro,
os psiquismos acabam por se misturar. � natural. Fen�meno
de empatia, que, em mediunidade, n�o pode ser
desconsiderado. A diferen�a, por exemplo, entre Chico
Xavier e Emmanuel, para mim, era a informalidade de um
e a formalidade de outro. Emmanuel n�o desperdi�ava
palavras; Chico n�o as economizava... Mas a ess�ncia da
li��o, que, na verdade, � o que importa, era sempre a
mesma.

Ent�o, eu vou lhe dizer o seguinte: a minha falta de
estilo com a falta de estilo do m�dium d� na produ��o
medi�nica que come�amos com "Sob as Cinzas do Tempo",
sem data para parar, contrariando as expectativas dos
opositores. Enquanto puder, escreverei, como o fa�o agora,
em aten��o � missiva que voc� me escreveu.

H� outro ponto ainda que quase ningu�m leva em
considera��o, assunto que, se discutido a fundo, daria para
se escrever um livro: o esp�rito, quando deixa a carca�a
que o prende � Terra, muda, �s vezes, t�o radicalmente,
que fica irreconhec�vel para os pr�prios familiares. Com o
passar do tempo - vai para 20 anos que desencarnei! -, o
esp�rito muda quanto mais se veja distanciado do cen�rio
terrestre; alguma coisa que restou de n�s sobrevive no


subconsciente do m�dium: h� mais do antigo In�cio nele,
no medianeiro, do que propriamente em mim! Se eu fosse
eu, eu mesmo hoje, a� � que voc�s n�o me identificariam
de jeito nenhum! Ser� que voc�, meu irm�o, ser� capaz de
compreender isto? Espero que sim, pois, caso contr�rio,
nem quero saber como ficar� a sua cabe�a.

Ah!, em tempo: Entre os meus livros medi�nicos e os
da lavra espiritual de Emmanuel e Andr� Luiz, n�o perca
tempo com os meus. Se lhe sobrar um tempinho, leia-os
por diletantismo, e � s�.

Um abra�o!

51


-, ser� -, ser�
que n�o estou precisando de um trabalho de desobsess�o?
Ando tendo uns pesadelos estranhos; � noite, pressinto
vultos no meu quarto e... O que o senhor, com a sua
experi�ncia, me aconselha? Ser� que estou ficando louco?
Ser� que devo consultar um psiquiatra?".

Meu rapaz, louco voc� n�o est� ficando, n�o, e, por
enquanto, creio que um psiquiatra seja desnecess�rio. Voc�,
conforme o m�dico que consultasse, poderia voltar para
casa com um problema muito maior. Os meus colegas
conscientes sabem do que estou falando e n�o tomar�o as
minhas palavras como cr�tica a eles.


Quanto � sua primeira pergunta, relativa �
necessidade de um trabalho de desobsess�o, a resposta �
afirmativa: sim, voc�, eu e aquele ou aquela que, neste
instante, esteja a ler as linhas que ora lhes escrevo,
necessitamos, em boa terminologia, de nos desobsedar.
Ali�s, aponte-me um s� que, sobre a Terra, n�o pade�a
algum tipo de nociva influencia��o espiritual, por mais
discreta. Se o pr�prio Senhor foi tentado no deserto! E eu
creio na palavra dos Evangelistas, Mateus, Marcos e Lucas,
que, sucintamente, descrevem o pol�mico epis�dio. Seria
muita coisa os tr�s se equivocarem sobre o mesmo assunto,
voc� n�o acha?

� "Devo recorrer - inquiriu-me, ao final de sua carta
-, a um centro esp�rita especializado nas atividades de
desobsess�o, a fim de que os meus poss�veis obsessores
sejam doutrinados?" N�o, n�o � bem assim que a coisa
funciona ou deve funcionar. A rigor, os obsessores s�o t�o
carentes quanto n�s mesmos. N�o devemos, pois, pensar
em expuls�-los, ou provid�ncia semelhante, muito em voga
antigamente, antes do advento das obras medi�nicas de
Chico Xavier que mais bem nos elucidaram sobre a delicada
quest�o. H� d�cadas, certos doutrinadores utilizavam o
expediente de "mandarem" acorrentar os obsessores mais
tenazes que n�o se convenciam pelo simples di�logo que
tinham oportunidade de entabular. Eu n�o sei como (creio
que por ignor�ncia das pr�prias entidades), mas a coisa
costumava funcionar - nem uma forte e decisiva sugest�o
mental sobre o encarnado pode ser descartada.
53


Certa vez, participei de uma reuni�o assim. O esp�rito
obsessor n�o atendia os alvitres do doutrinador, que, a
determinada altura, exasperando-se, disse: � "Evoco,
ent�o, as Mil�cias do Espa�o; voc� ser� amarrado, neste
exato momento, por uma corda de bacalhau constitu�da de
fluidos eterizados e, depois, ser� lan�ado nas profundezas
do abismo!..." � C�us! - exclamei, em sil�ncio -, "uma
corda de bacalhau" e, ainda por cima, "lan�ado nas
profundezas do abismo"?!... Isto � que � doutrina��o. O
resto � fichinha!

Enquanto assim recriminava, escutei o esp�rito sorrir
e responder, para, em seguida, deixar o m�dium,
sacolejando-o: � "Aqui n�o tem pol�cia nenhuma; a pol�cia
aqui sou eu... Sou o Sargento Fulano de Tal (declinou o
nome e a patente) e o safado que estou perseguindo � meu
genro, que anda traindo minha filha com a lavadeira!..."

A gente precisa saber muito bem a quem manda
amarrar, para n�o sair amarrado, n�o �?

A verdadeira desobsess�o, meu filho, � a nossa e n�o
a dos outros, estejam encarnados ou n�o. Muitas vezes, os
esp�ritos que imaginamos nos obsidiarem s�o obsidiados
por n�s, que vivemos a atra�-los atrav�s de invigil�ncia
sistem�tica. A medida que promovermos a nossa ilumina��o
�ntima, tudo, � nossa volta, se iluminar�. N�o lhe parece
coerente?

O homem sempre tende a recorrer � lei do menor
esfor�o. Quer se ver livre dos empecilhos, de prefer�ncia
sem qualquer empenho de sua parte. E um tal de encher os


centros �s sextas-feiras para tomar passes... Nos outros
dias da semana, eles ficam quase vazios, mas, na sexta-
feira, ainda mais se cair no dia 13!...

Desculpe-me as hist�rias que conto. N�o estou
fugindo de responder as suas perguntas; � que uma coisa
vai puxando outra. Era comum l� no Centro Esp�rita
Uberabense algu�m me questionar:�"Doutor, este centro
aqui � fartei". Eu, como perdia o amigo, mas n�o perdia a
resposta, dizia: � Muito! � dos mais fortes que existem
na cidade, na regi�o e, qui��, em todo o Estado. Isto aqui
foi constru�do sobre pedra tapiocanga; as paredes s�o de
um tijolo, assentado em pura massa de cimento... N�o cai
de jeito nenhum!" � claro que, posteriormente, eu
amenizava. Voc�, por favor, n�o me leve t�o a s�rio, como
muitos de muitos cr�ticos que, qual bonecos de ventr�loquos,
s� conseguem sorrir movimentando o maxilar inferior...

Vamos, por�m, voltar ao problema da nossa obsess�o.
Um dia, Chico estava conversando a respeito e, quando
ele falava, fosse qual fosse o assunto, eu ficava de mutuca.

� "Quem se sente obsidiado, molestado por algum esp�rito
obsessor renitente, deve trabalhar at� se exaurir, trabalhar
at� a mais completa exaust�o, pois, quando cair no ch�o
de tanto trabalhar, o esp�rito obsessor h� de deix�-lo..."
Ent�o, tomar passes ajuda? Ajuda! A ora��o ajuda?
Ajuda! A desobsess�o propriamente dita ajuda? Ajuda!
Diante de nossa enorme car�ncia, toda provid�ncia espiritual
ser� sempre bem-vinda. Disto n�o tenhamos qualquer
d�vida. Mas o que nos pode ajudar decisivamente � a

55


nossa mudan�a: de h�bitos, de prop�sitos, de id�ias, de
sentimentos e tudo mais que concorra para a nossa
eleva��o. Ah, mudar de roupa n�o adianta, hem! De
penteado, de marca de perfume...

Fal�vamos, anteriormente, sobre a lei do menor
esfor�o. No Espiritismo, n�o existe lugar para ela! Este �
um dos motivos de ele ainda n�o ter quadruplicado os
seus adeptos. A turma quer o C�u pelo caminho mais f�cil.
Nada de ch�o acidentado, subidas muito �ngremes, pedras
e seixos ao longo da estrada.

Dias atr�s, bisbilhotando um programa de TV,
presenciei v�rias senhoras conversando. Surgiu a pergunta:

� "Como � que cuida de sua muscula��o interior?". Achei
curiosa a quest�o, numa �poca em que s� se fala em malhar
o corpo. Para minha decep��o, por�m, uma delas respondeu:
� "Durmo, ou�o os meus discos...". A outra: � "Escrevo,
vou � praia...". Uma terceira: � "Vou ao shopping adoooooro
ir ao shopping! � a minha terapia!". Das 4 ou
5 que opinaram, n�o ouvi no que listaram, uma vez sequer,
algo que estivesse relacionado � palavra "solidariedade"!
E isto logo ap�s a visita do Papa ao Brasil. Deus meu!
Em resumo: convide o seu obsessor ou obsessores
(n�o sei se � mais de um - pode ser uma legi�o!) para dar
uma chegada com voc� � periferia... �! Saia um pouco do
centro... da cidade. V� visitar uma fam�lia carente, depois
outra e mais outra. No outro dia, se voc� puder, d� um
chego a um hospital, a um lar de idosos - v� conversar um
pouco com eles ou simplesmente ouvi-los. Obsessor que


se preza n�o ag�enta ouvir conversa de gente paciente.
Depois de umas duas horas de conversa com um velhinho
num asilo (detesto esta palavra!), aposto o que voc� quiser:
n�o ficar� um por perto! Considerar�o voc� um caso perdido
e partir�o para outro. Os que ficarem estar�o amolecendo

o cora��o e ser�o pegos na pr�pria armadilha, convertendo-
se de ca�adores em ca�as!

senhora me pergunta, compreensivelmente
preocupada:�"Dr. In�cio, como h� de ser, com os esp�ritas
brigando tanto assim? Aqui, no centro que freq�ento, o
grupo se dividiu em dois... Parece coisa de pol�tica. Uma
ciumeira entre os m�diuns. Muita gente para mandar e
quase ningu�m para servir. Esclare�a-me, por favor".

A �nica claridade que posso fazer ser� se estiver
com uma lanterna nas m�os. Eu mesmo, minha filha, estou
no breu, tateando, para ver se saio dele.

Voc� tem raz�o, � verdade: "muita gente para mandar
e quase ningu�m para servir"! Eu j� mandei muito e... n�o
resultou em nada. Agora o que me interessa � �nica e t�o-
somente servir para alguma coisa.


Certamente, voc� j� efetuou a leitura do livro "Nosso
Lar", n�o? Permita-me recordar um trecho do cap�tulo 8,
"Organiza��o de Servi�os". L�sias, conversando com Andr�
Luiz, assim se refere ao Governador da cidade: "Nos
trabalhos administrativos, utiliza ele a colabora��o de tr�s
mil funcion�rios; entretanto, � ele o trabalhador mais
infatig�vel e mais fiel que todos n�s reunidos (grifei). Os
Ministros costumam excursionar noutras esferas, renovando
energias e valorizando conhecimentos; n�s outros gozamos
entretenimentos habituais, mas o Governador nunca disp�e
de tempo para isso. Faz quest�o que descansemos, obriga-
nos a f�rias peri�dicas, ao passo que ele mesmo quase
nunca repousa, mesmo no que concerne �s horas de sono.
Parece-me que a gl�ria dele � o servi�o perene (tornei a
grifar). Basta lembrar que estou aqui h� quarenta anos e,
com exce��o das assembl�ias referentes �s preces
coletivas, raramente o tenho visto em festividades p�blicas
[que semelhan�a com os homens p�blicos da Terra, n�o
�?] Seu pensamento, por�m, abrange todos os c�rculos de
servi�o, sua assist�ncia carinhosa a tudo e a todos atinge.
[...] N�o faz muito, comemorou-se o 114.� anivers�rio da
sua magn�nima dire��o".

N�o quero cans�-la com cita��es, mas consinta-me
transcrever algo do cap�tulo 32, "Not�cias de Veneranda".
� pertinente aos questionamentos que voc� me endere�a.
Creio que, de maneira geral, os esp�ritas leram e
esqueceram. Desta vez, � Narcisa dialogando com Andr�:

� "Com exce��o do Governador, a Ministra Veneranda
� a �nica entidade, em "Nosso Lar ", que j� viu Jesus nas
59


Esferas Resplandecentes, mas nunca comentou esse fato
de sua vida espiritual e esquiva-se � menor informa��o a
tal respeito (grifei). Al�m disso, h� outra nota interessante,
relativamente a ela. Um dia, h� quatro anos, "Nosso Lar"
amanheceu em festa. As Fraternidades da Luz, que regem
os destinos crist�os da Am�rica, homenagearam Veneranda
conferindo-lhe a medalha do M�rito de Servi�o, a
primeira entidade da col�nia que conseguiu, at� hoje,
semelhante triunfo, apresentando um milh�o de horas de
trabalho �til, sem interromper, sem reclamar e sem
esmorecer", (grifei de novo)

Acho, sinceramente, que voc� deveria sugerir ao
pessoal l� do centro a releitura da obra, n�o? E que eles
amarrem as carapu�as!

O problema dos esp�ritas brig�es � que eles t�m muito
tempo para isso. Se trabalhassem um pouco mais, nem que
fosse pelo desgaste f�sico provocado pelo trabalho,
haveriam de se acalmar. Penso que o seu centro est� repleto
de te�ricos, de gente interessada em saber da natureza do
perisp�rito, essas coisas, n�o �?

Ainda a prop�sito, abusando de sua paci�ncia, deixe-
me recorrer a outra transcri��o. N�o quero que falem que
estou tirando isto da minha cabe�a. No livro "Chico Xavier,
Mediunidade e Luz", de autoria de um amigo meu, no
cap�tulo "Dr. Bezerra e os Esp�ritas", est� anotado: "Ontem,
dia 13 de fevereiro de 1988, fazendo a visita semanal ao
nosso querido Chico Xavier, coment�vamos com ele a
situa��o dif�cil que vivemos presentemente na Doutrina,


quando observamos tantas opini�es contradit�rias e tantos
atritos entre os seus adeptos, notadamente nos que ocupam
algum cargo de responsabilidade dentro dela e, por isso
mesmo, deveriam dar o exemplo.

"O Chico ouviu os nossos argumentos e passou a
contar-nos um di�logo que teve com a inesquec�vel m�dium

D. Yvonne Pereira, de quem foi sempre um grande
admirador.
� "Um dia, encontrando-me com D. Yvonne Pereira
no Rio de Janeiro, perguntei-lhe se estava indo ao Mundo
Espiritual... Ela respondeu-me que, algumas vezes,
conseguia o seu intento ao desdobrar-se do corpo f�sico.
Questionei-a se os esp�ritos, com os quais se
encontrava na oportunidade, tinham alguma opini�o
formada sobre as atitudes pouco fraternas dos esp�ritas.

Ela disse-me que o Dr. Bezerra de Menezes
conversava muito com ela a respeito do assunto e que,
embora demonstrasse preocupa��o, dizia que os esp�ritas
estavam fazendo o que podiam fazer, de vez que a maioria
deles era delinq�ente (grifei), esp�ritos que haviam ca�do
nas vidas anteriores pelos abusos desintelig�ncia ou pelo
abuso de personalismo..."

Fazendo uma pequena pausa, o Chico arremata:

�"� por isso, meu filho, que encontramos nas fileiras
esp�ritas tanta gente que diz ter sido bar�o, pr�ncipe,
marquesa, rainha ou algo semelhante, numa exist�ncia
passada...

Afirma Emmanuel que eles foram mesmo e hoje est�o
por a�, resgatando os seus d�bitos.

61


As lavadeiras, os lavradores, os servi�ais humildes
est�o todos nos Planos Superiores..."

Nos meus tempos do Sanat�rio - bons tempos! -, a
gente colocava os pacientes melhores para trabalharem,
varrerem o p�tio, arrancarem mato do jardim, coisas assim.
A� veio um pessoal, n�o sei de onde, dizendo que os doentes
psiqui�tricos precisavam de lazer. Pressionaram-me at�
que eu concordasse em comprar uma mesa de bilhar, para
que eles se divertissem. Arrancaram-lhes das m�os a
vassoura e lhes deram uma arma: o taco de bilhar! Num
dos primeiros surtos de que um deles foi acometido, rachou
a cabe�a do outro com o taco de bilhar!... Foi uma correria:
ambul�ncia, hospital, pol�cia... Uma comiss�o veio
conversar comigo. Escutei, escutei, acendi um cigarrinho
de palha, alisei uma siamesa que estava em meu colo (uma
gatinha, hem! N�o maliciem!) e disse aos seus integrantes,
pegando as chaves do meu Simca Chambord: � "Passar
muito bem!" E, como diz a meninada de hoje, "fui"!...

Creio, minha irm�, que, finalmente, detectamos o
problema dos confrades l� do centro que voc� freq�enta:
trocaram a vassoura pelo taco de bilhar! Enquanto tal
situa��o perdurar, lamento informar que haver� muita
cabe�a rachada... N�o fique muito perto. Surto de esp�rita
psic�tico � pior do que quebradeira em bar em zona de
meretr�cio. N�o � para rir, n�o - � para chorar.

Em tempo, aos que querem saber: Em meus tempos
de estudante no Rio de Janeiro, eu era ass�duo freq�entador
da zona bo�mia e, portanto, posso falar de c�tedra.


eu jovem, recebi, acompanhada de seu
question�rio, a carta em que voc� me sabatina, explic�ndose:
� "Dr. In�cio, tenho 24 anos de idade e sou
homossexual. Freq�ento um centro esp�rita em que sou
meio discriminado; quase todo o mundo me olha como se
eu fosse uma aberra��o ou coisa assim... Tudo come�ou
quando eu tinha de 11 para 12 de idade, com um primo
meu que, � �poca, tinha 18. Mas, sinceramente, a inclina��o
homossexual j� estava comigo; creio que reencarnei nesta
condi��o... Se poss�vel, gostaria que o senhor me
respondesse algumas perguntas em anexo. Desejo ouvir a
sua opini�o. Tenho lido os seus livros e passei a consider�



63


lo como a um pai espiritual. O seu parecer ser� muito
importante para mim. Trabalho, n�o uso drogas, tenho um
namorado..."

Bem, vamos l�.

� Dr. In�cio (� a sua primeira pergunta), o senhor
acha que o homossexual � obsidiado?
� N�o, essa condi��o n�o pode ser generalizada.
N�o creio que, na maioria dos casos de homossexualismo,
a obsess�o seja a causa determinante.
� Como � que considera o homossexualismo?
� Uma experi�ncia evolutiva que o esp�rito viv�ncia.
N�o se trata de uma aberra��o. Lidei com muitos
homossexuais de car�ter e ainda lido. N�o estranhe, pois
deste Outro Lado, tamb�m os temos.
� A homossexualidade � incompat�vel com o
exerc�cio da mediunidade?
� N�o, absolutamente.
� O senhor acha que um homossexual pode presidir
uma casa esp�rita?
� Por que n�o? A condi��o sexual de qualquer ser
humano n�o � o que deve vir em primeiro lugar. A
sexualidade de todo o mundo nem sempre se define pelos
padr�es convencionais de masculinidade e feminilidade.

�A homossexualidade � uma doen�a? O senhor a
considera assim?

�N�o necessariamente. A pr�tica sexual desvairada
� uma doen�a. Como psiquiatra, tratei, quando encarnado,
de muita gente viciada em sexo, principalmente homens.

�Acha errado eu ter um namorado?

� N�o, desde que seja um s�.
� O que pensa do homossexual que se submete �
cirurgia para mudan�a de sexo?
� Se � uma op��o dele, quem sou eu para contestar?
Ali�s, atrav�s do avan�o da Medicina, as Leis da Vida
est�o concedendo aos homens recursos para que algumas
de suas provas sejam amenizadas. Faz parte do gradativo
processo de transi��o da Terra, de mundo de provas e
expia��es para orbe de regenera��o.
� O senhor � contra o casamento entre
homossexuais?

�N�o, acho at� que deveria ser incentivado. Um de
seus benef�cios mais imediatos seria a diminui��o da AIDS,
voc� concorda?

� E sobre a ado��o de crian�as por um casal
homossexual? � contra ou a favor?
� Sou contra a crian�a �rf� de amor e de carinho.
65


� Tenho o direito de ser o que sou?
� Na minha opini�o, voc� s� n�o tem o direito de
escandalizar ningu�m. Voc� pode ser o que �, sem esperar
que os outros o aplaudam. Como jovens de sua idade
gostam de dizer, "fique na sua".
� O Espiritismo � doutrina meio preconceituosa,
n�o?
� O Espiritismo, n�o; muitos esp�ritas, sim.
� Nas reuni�es medi�nicas de que j� participei, os
esp�ritos homossexuais n�o se comunicaram. A que se deve
o fato?
� Talvez, ao machismo dos m�diuns, n�o �? Voc� j�
imaginou aquele m�dium s�rio de repente fazendo gestos
feminis na sess�o?... � brincadeira. � prov�vel que, no
Mundo Espiritual, os esp�ritos homossexuais estejam numa
situa��o melhor, n�o �? Se n�o se comunicam, algum motivo
h� de existir.
� O que o senhor acha dos ped�filos?
� N�o t�m vergonha na cara! Cadeia com eles! A
pedofilia deveria ser crime inafian��vel.
� Um menino, v�tima de estupro, pode, a partir da�,
se tornar homossexual?
� Aconteceucom voc�.

� O homossexual foi mulher em vidas anteriores?
� Pode ser que sim, pode ser que n�o. Na maioria
das vezes, n�o.
�A homossexualidade, a sua pr�tica, nos degrada
moralmente?

� N�o mais que a propens�o a mentir, a roubar, a
matar. A verdade � que, ao longo da Hist�ria, os
homossexuais s�o mais v�timas que algozes.
�E m duas palavras, que conselho o senhor me daria?

� Dec�ncia e fidelidade.
� O que o senhor diz do homossexual que n�o aceita
a sua homossexualidade?
� De todas as suas perguntas, esta � a mais dif�cil
de responder. Tive um paciente assim. Ele queria que eu o
mandasse fazer o que queria, como se me transferisse a
responsabilidade da decis�o. Mentia para mim e para si
mesmo o tempo todo. Era uma criatura amarga.
� O homossexual, masculino ou feminino, deve se
casar com algu�m do sexo oposto?
� S� se estiver disposto a respeitar tal rela��o.
Apenas para dar uma satisfa��o � sociedade, n�o!
� Qual � a diferen�a entre o santo e o moralista?
� O santo � algu�m que pecou e n�o peca mais; o
moralista nunca pecou, mas tem uma vontade danada!

A� est�o, meu caro rapaz, as suas respostas. Esforcei-

me mais que pude para n�o decepcion�-lo. Continue lutando

pela aquisi��o de bons sentimentos - eis o que interessa.

Quem sabe conduzir o seu cora��o sabe conduzir qualquer

outra parte de seu corpo ou de seu esp�rito.

Consinta-me encerrar com um dos textos que sempre

mais me comovem no Novo Testamento, segundo o

Evangelho de Mateus, cap�tulo _22, vers�culo 3l "Em

verdade, vos digo que publicanos e meretrizes vos

precedem no Reino de Deus".


oc� me escreve, preocupado: � "Dr. In�cio,

gostaria de ouvi-lo sobre a quest�o do profissionalismo
religioso na Doutrina, erva daninha, que, aos poucos, vai
se alastrando colocando em risco a nossa lavoura de luz. �
muita gente boa que me parece estar se deixando envolver...
Opine, francamente, como de h�bito".

Meu amigo, ultimamente s� me tem sobrado abacaxis
para descascar... Este � mais um deles. Assunto delicado
que precisamos comentar sem subterf�gios, sob pena de,
em nos omitindo, sermos coniventes.

Voc� tem raz�o: o profissionalismo religioso, uma
das carantonhas com que o elitismo se apresenta em nosso

69


Movimento, est� mesmo quase se instituindo entre n�s,
por influ�ncia de algumas lideran�as desavisadas. For�a
de express�o, de vez que avisados todos estamos desde
longa data: "Restitu� a sa�de aos doentes, ressuscitai os
mortos, curai os leprosos, expulsai os dem�nios. Dai
gratuitamente o que gratuitamente haveis recebido."

(grifei)

Sou totalmente contra todo e qualquer evento
doutrin�rio pago. Compreendo: hoje em dia, infelizmente,
nada se faz sem dinheiro. N�o sabemos, por�m, lidar com

o precedente. Come�amos a cobrar insignificante taxa, para
cobrir eventuais despesas, com aluguel disto ou daquilo, e
logo estamos faturando alto, alegando que parte do
arrecadado ser� encaminhado a obras de benemer�ncia.
Creio que a atividade doutrin�ria, qualquer que seja,
n�o deve, em termos financeiros, ser utilizada como pretexto
de manuten��o �s tarefas assistenciais. A Mensagem
Esp�rita, em si, � a maior das caridades! Por exemplo, o
livro esp�rita n�o deve ser vendido a pre�o elevado, gerando
divisas que n�o sejam destinadas ao seu pr�prio sustento

- investimento com reedi��o, se for o caso, e patroc�nio da
edi��o de obra in�dita. O livro pelo livro - eis, neste sentido,
o meu lema. � claro que seria justo prever o sal�rio dos
que n�o possuem outra ocupa��o profissional e que
necessitam sobreviver honradamente.
N�o sei. No meu tempo, a gente colocava a m�o no
bolso para a edi��o reduzida de uma obra que, praticamente,
era distribu�da de gra�a, mesmo porque n�o havia muitos


aos quais pud�ssemos vend�-las. N�s nos cotiz�vamos e
arc�vamos com tudo, inclusive comos preju�zos sociais,
oriundos do preconceito, que nos eram advindos. Hoje em
dia, o autor esp�rita, seja m�dium ou n�o, desfruta de
perigoso status...

Sinceramente, meu irm�o, n�o sei o que dizer quando,
num dos par�grafos de sua carta, voc� desabafa: � "Dr.
In�cio, o pessoal n�o est� t�o preocupado em difundir a
Doutrina no Exterior; a preocupa��o maior � a de vender o
livro esp�rita em d�lares e em euros..."

Eu n�o sei o que � euro... Quando ainda andava por
a�, esta moeda n�o existia. Agora, se � assim, embora,
evidentemente, as exce��es, eu s� posso lamentar, pois a
briga pelo mercado, com certeza, est� maior do que penso.
Quando o assunto � dinheiro, o pessoal costuma perder os
bons modos. Recordo-me de antigo companheiro de lide
esp�rita em Uberaba, o m�dium Joaquim Cassiano, ao qual
eu costumava encaminhar uns pacientes. Ele me dizia: �
"O m�dium quando obseda, Doutor, � pior que qualquer
um outro; � muito mais dif�cil de tratar..."

Assim, tenho receio de que estejamos fazendo o
Movimento enveredar por um caminho sem volta. Esta
quest�o de direitos autorais, cedidos ou doados, � mais
palavra no papel do que qualquer outra coisa. Se Jesus
tornasse a vir � Terra e nos adentrasse os templos - os
nossos centros esp�ritas -, sem d�vida, ele teria muito
trabalho com o chicote...

71


Compreenda, meu amigo, que estamos "lavando roupa
suja"; n�o � minha inten��o e tamb�m creio n�o ser a sua
efetuar acusa��es - t�o-somente externamos uma
preocupa��o que � de todo esp�rita sinceramente apreensivo
com o futuro da Doutrina.

Fugindo a toda hipocrisia, de minha parte, digo-lhe o
seguinte: o com�rcio do livro esp�rita se profissionalizou
ou est� em vias de se profissionalizar; h� consider�vel
economia girando em torno dele: pais de fam�lia ganhando

o p�o de cada dia, etc. Esperamos apenas que, de modo
geral, os companheiros sejam comedidos, n�o percam o
idealismo e n�o lancem no mercado livreiro qualquer coisa
como est�o fazendo, colocando o lucro em primeiro lugar.
Fa�am de tudo para que o dinheiro fique em segundo plano,
caso contr�rio...
Falamos um pouco sobre o livro e, em s�ntese, deixei
expresso o que penso. Falemos agora sobre os eventos
doutrin�rios pagos. Neste aspecto, voc� tem raz�o: � "O
pessoal est� enfiando os p�s pelas m�os..." Cobrar por
cursos e palestras?! Deus meu! Essa gente deve se
considerar muito boa, hem?!... Acho, no entanto, que pior
do que quem cobra � quem paga... Eu... pagar para ouvir
um orador esp�rita, nunca! Daqui a pouco v�o estipular
pre�o para sess�o medi�nica - sess�o de cura: tanto; de
psicografia, com cartas do Al�m: inscri��o at� dia tal,
consider�vel desconto; sess�o de pintura medi�nica:
depender� da fama dos artistas desencarnados que
comparecerem...


Sei n�o. Talvez, antes de Jesus dar uma passadinha
pelos centros esp�ritas, em seu retorno � Terra, fosse
interessante que, primeiro, Mois�s viesse dar uma saneada...
A coisa est� prometendo ficar feia.

Outro dia, recebi uma carta semelhante � sua, em
que o missivista argumenta: � "Dr. In�cio, o senhor n�o
acha que o Espiritismo precisa ir �s elites?" N�o, n�o acho

- respondo agora -; acho que deve ser o contr�rio: as
elites � que devem vir ao Espiritismo... Ali�s, eu nunca vi
as chamadas elites sociais sinceramente interessadas pela
Doutrina. E, depois, n�o podemos mostrar aos outros uma
realidade diferente da vivenciada no Movimento. Paulo de
Tarso foi aos gentios, aos pag�os, n�o aos ricos. A sua
decep��o em Atenas foi enorme. Em "Atos dos Ap�stolos",
cap�tulo 17, vers�culo 32, est� escrito: "Quando ouviram
falar de ressurrei��o de mortos, uns escarneceram e outros
disseram: A respeito disso te ouviremos noutra ocasi�o."
As elites sempre ignoraram Jesus, ao ponto de ele
exclamar: "Gra�as te rendo, meu Pai, Senhor do C�u e da
Terra, por haverdes ocultado estas coisas aos doutos e aos
prudentes e por as teres revelado aos simples e pequenos".
O que ir� anunciar o Evangelho �s elites � o Anjo da Dor!

Desculpe-me, meu amigo, se n�o consegui ser
suficientemente claro em quest�o t�o controvertida e t�o
nova para mim. Isso tudo vem nos mostrar quanto ainda
estamos despreparados para sermos mais do que somos...
Voc� j� imaginou se, de repente, ocorresse (como � mesmo,
a palavra?) um boom na Doutrina? N�o ter�amos cabe�a,


n�o ter�amos estrutura. Veja voc� o que acontece em quase
todos os centros esp�ritas grandes, mais bem freq�entados:
os dirigentes parecem deuses que se deixam entronizar e
os m�diuns se pavoneiam, qual modernos or�culos
revivendo os cultos a Apolo, que eles mesmos imaginam
personificar.

Eis o momento do ponto final. Se consegui me segurar
at� aqui, n�o conv�m que, pela minha maior irrever�ncia e
indigna��o, eu coloque tudo a perder.


aro amigo, eis, em s�ntese, o que voc� me diz: �
"Dr. In�cio, aprecio muito as obras que o senhor tem escrito
via medi�nica. Embora n�o a tenha compreendido direito,
acho fant�stica a id�ia, que o senhor coloca em um de seus
livros, sobre gravidez no Mundo Espiritual. Creio ser este


o tema mais pol�mico de suas obras. O senhor teria mais
alguma coisa a dizer a respeito?".
Sim, teria e tenho, caso, em futuro pr�ximo ou remoto,
venha a encontrar receptividade medi�nica para tanto. N�o
pense voc� que me foi f�cil vencer a resist�ncia inicial do
m�dium, neste sentido. Precisei, digamos assim, ganhar
dele um voto de confian�a para o que pretendia expor; o
que s� me foi poss�vel devido � nossa longa amizade e a

75


certeza pessoal de que n�o estava sendo v�tima de
mistifica��o. Hoje, felizmente, sinto-o cada vez mais
convicto quanto, reconhe�o, � controvertida tese que
abordamos.

Na atualidade, com os elementos � minha disposi��o,
n�o sei como poderia explicar isto melhor, de modo que as
d�vidas fossem minimizadas. Penso que, mais tarde,
quando vencerem o receio da cr�tica, outros medianeiros
se mostrar�o dispostos a colaborar no desenvolvimento
do assunto. Por enquanto, muitos deles - acredite, at� por
falta de humildade, posto que n�o foram os primeiros atrav�s
dos quais a quest�o se ventilou - se conservam retra�dos,
observando o que h� de acontecer com o m�dium que teve
a boa vontade de ousar conosco um passo al�m... Se ele
n�o cair em completa excomunh�o, � prov�vel que,
gradativamente, a t�o propalada "concord�ncia universal
do ensino dos Esp�ritos" venha a se confirmar. Tenhamos
um pouco de paci�ncia, e o voto de confian�a que mereci
dele espero merecer de voc�.

A F�sica Qu�ntica a� est�, referindo-se aos Universos
Paralelos, endossando o que os Esp�ritos Superiores
disseram a Kardec, respondendo a pergunta de n�mero 22,
em "O Livro dos Esp�ritos": "...a mat�ria existe em estados
que n�o a conheceis".

Ao universo f�sico dos encarnados sucedem-se
outros, mais eterizados, dos desencarnados, menos
compacto do que aquele que o homem percebe com os
sentidos que lhe s�o conferidos pelos �rg�os materiais.


Temos, assim, m�ltiplos universos: "H� muitas moradas
na casa de meu Pai..."
Sigamos adiante. Ainda em "O Livro dos Esp�ritos",
temos a quest�o 183: "Passando de um mundo para outro,

o esp�rito passa por nova inf�ncia? � A inf�ncia � por
toda parte uma transi��o necess�ria, mas n�o � sempre
t�o est�pida como entre v�s. " (grifei) Estariam os Esp�ritos
admitindo a possibilidade da reencarna��o apenas nos
mundos f�sicos? - eis o cerne da quest�o. Desde a Teoria
da Mec�nica Qu�ntica, de Einstein, a mat�ria propriamente
dita deixou de ter sentido. Recordo-me do maravilhoso
pref�cio que, atrav�s de Chico Xavier, Emmanuel grafou
para a obra de Andr� Luiz "Nos Dom�nios da Mediunidade":
"Qu�micos e f�sicos, ge�metras e matem�ticos, erguidos �
condi��o de investigadores da verdade, s�o hoje, sem o
desejarem, sacerdotes do esp�rito, porque, como
conseq��ncia de seus porfiados estudos, o materialismo e
o ate�smo ser�o compelidos a desaparecer, por falta de
mat�ria, a base que lhes assegurava as especula��es
negativistas".
Para bagun�ar um pouco mais a sua cabe�a - este
n�o � meu prop�sito, mas vamos l�-, convido-o a refletir
comigo sobre a quest�o de n�mero 82, da Obra B�sica: �
"� certo dizer que os esp�ritos s�o imateriais? � Como se
pode definir uma coisa, quando n�o se disp�e de termos
de compara��o e se usa uma linguagem insuficiente? Um
cego de nascen�a pode definir a luz? Imaterial n�o � o
termo apropriado; incorp�reo seria mais exato; pois deves


compreender que, sendo uma cria��o, o esp�rito deve ser
alguma coisa. � uma mat�ria quintessenciada (grifei), mas
para a qual n�o dispondes de analogia, e t�o eterizada que
n�o pode ser percebida pelos vossos sentidos".

Neste exato momento, meu irm�o, h� ao seu lado, a�
"na Terra", uma popula��o invis�vel, como se um mundo
existisse dentro do outro, e, mais, sendo um a continua��o
do outro - mundos que n�o se tocam, mas que, de certa
forma, coexistem. E o mais curioso � que eu sei que,
igualmente neste exato momento, h� ao meu lado, aqui "no
Al�m", uma popula��o mais invis�vel ainda... Temos n�s,
aqui, o nosso Mundo Espiritual! A escada da Perfei��o,
que precisamos subir, � realmente de provocar vertigem a
qualquer...

Pelo rapidamente exposto acima, imagino que voc�
n�o ter� dificuldade em aceitar que a Lei da Reencarna��o
� universal, ou seja, n�o � Lei de Deus apenas para o orbe
terrestre! Reencarna-se em mundos f�sicos e extraf�sicos!...

Quando nos referimos � Reencarna��o, n�o nos
prendemos ao que o termo sugere: carne! N�o nos
apequenemos intelectualmente. Pensemos no fen�meno da
reencarna��o, no que tange a corpo para o esp�rito
reencarnante, em termos de inv�lucro, pois � exatamente
isto o que a vestimenta f�sica representa. Em �ltima an�lise,
"carne" � energia... Voc� n�o come arroz, feij�o, macarr�o
(pelo sobrenome, voc� � descendente de italianos, n�o?):
voc� come... energia! Futuramente, voc� engolir� uma p�lula
e estar� alimentado por uma semana. N�o fique triste: estou


me referindo a uma �poca remota; por enquanto, voc� dar�
muito trabalho aos seus caninos e molares...

Ent�o, o que lhe pe�o apenas � o seguinte: procure
pensar, nada negando a priori, como costumam fazer os
que s� conseguem pensar quando o fazem pela cabe�a dos
outros! Engravide-se comigo e n�o de mim, � claro,
colocando a cachola para funcionar. Escreveu Teilhard de
Chardin que "s� o fant�stico tem alguma probabilidade de
ser real".

Antes de encerrar, incapaz, no momento, de lhe
oferecer outros argumentos - simples material para reflex�o
-, gostaria, se poss�vel, que medit�ssemos juntos sobre a
palavra "gravidez", quando o dicion�rio nos remete a um
de seus significados: "gesta��o", que tamb�m quer dizer,
em sentido figurado, "elabora��o; produ��o"... Talvez o
que lhe tenha causado estranheza e a outros mais, quando
me referi, em "Funda��o Emmanuel", � prenhez no Mundo
Espiritual, � o nosso entendimento limitado para a
concep��o da vida intra-uterina. Querendo ou n�o, al�m
da id�ia pecaminosa do sexo que as religi�es dominantes,
com o seu falso moralismo, nos infundiram, ao longo de
s�culos e s�culos, n�o somos capazes, enquanto na carne,
de conceber a pr�tica sexual, para fins reprodutivos, fora
da maneira convencional. Estamos enganados. Existem,
por exemplo, esp�cies animais que dispensam o coito; a
abelha, que � o cupido do reino vegetal, cuida da poliniza��o
com invej�vel compet�ncia, deixando, na corrida pela vida,
muito espermatoz�ide para tr�s...

79


Espero que, ainda nessa sua encarna��o, meu amigo,
voc� consiga, pelo menos como hip�tese, admitir a tese da
gravidez no Mundo Espiritual, que, sinceramente, por aqui
� um fen�meno corriqueiro. N�o tanto quanto por a�, �
�bvio, onde os esp�ritos desprevenidos s�o praticamente
sugados pelo redemoinho das paix�es incendiadas.


eu amigo, recebi as suas palavras e pude avaliar
a sinceridade do que me diz: � "Dr. In�cio, eu n�o sei o
que acontece comigo, que sou t�o fr�gil... Fa�o, todos os
dias, prop�sito de n�o mais errar, para, quase todos os
dias, cometer os mesmos erros. Sou esp�rita e tenho
vergonha de mim. Como � dif�cil, meu Deus, vivenciar as
li��es do Evangelho! Tenho pensado em me afastar das
tarefas, considerando que o Espiritismo � uma doutrina
pura demais para mim. Por favor, envie-me uma palavra...".


As lutas que voc� enfrenta, no campo da renova��o
�ntima, s�o semelhantes �s nossas, esp�ritos que ainda n�o
logramos superar a pr�pria humanidade, nem al�m da vida

81


no corpo f�sico. N�o se sinta, pois, exclu�do, em situa��o
pior que a dos outros.

Eu tamb�m, meu filho, quando encarnado, resvalava
um sem-n�mero de vezes em minhas pr�prias mazelas. No
entanto, o que podia fazer de inteligente, a n�o ser continuar
lutando para me superar?

Voc� fala em se afastar das atividades doutrin�rias.
N�o fa�a isto - n�o fa�a o jogo daqueles, encarnados e
desencarnados, que torcem pelo seu fracasso. O momento
� de maior perseveran�a ainda. Continue, com a
determina��o poss�vel, no cumprimento do dever e, aos
poucos, voc� vencer�. N�o estamos semeando para colher
de imediato. A rigor, o nosso plantio diz respeito ao
amanh�...

Permita-me transcrever parte de inesquec�vel
prele��o de Chico Xavier que, creio, tem a ver com a
situa��o que me � exposta por voc�. Ele a proferiu em
uma daquelas aben�oadas reuni�es "� sombra do
abacateiro". "[...] Quando - disse na oportunidade -a
Doutrina Esp�rita nos alcan�a, de certo modo, nos sentimos
apreensivos e muito alegres ao mesmo tempo - o que parece
um paradoxo.

"Come�amos a pensar nas nossas inferioridades e
come�amos a exercer um controle muito grande sobre n�s
mesmos.

"A Doutrina Espirita pode ser comparada a uma luz
que nos foi entregue. Imaginemos uma l�mpada acesa...
Sentimos aquela alegria imensa no primeiro momento, uma


felicidade muito grande; descobrimos que a vida continua;
que estamos a caminho da perfei��o... Da� a dois, tr�s
dias, a Luz vai nos iluminando e vamos nos conhecendo
por dentro, � maneira de uma casa abandonada h�
s�culos... Entramos, ent�o, nesse estado de inquieta��o,
de amargura que n�o devemos conservar... Precisamos
manter a alegria de termos recebido aquela luz e devemos
perseverar - ainda mesmo que as imperfei��es se
avolumem dentro de n�s - como quem est� reconstruindo
a si mesmo...

"Muitos recebem a luz e se encolerizam, se
enraivecem, humilhados, porque aquela luz mostrou demais
as qualidades menos felizes de que a pessoa � portadora.
Alguns se entregam � in�rcia, cruzam os bra�os... Outros
se deixam dominar por um esp�rito de tristeza, quando
essa luz nos convida a trabalhar, mas a trabalhar
intensamente por dentro de n�s para que possamos, ao
inv�s de apenas receb�-la, irradi�-la em benef�cio de todos...

"J� ouvimos algu�m dizer que os esp�ritas s�o
companheiros muito tristes, revoltados e que acabam
desertando dos seus deveres... Isso acontece quando n�s
n�o sabemos acariciar essa luz e pedir a Deus for�as
para que essa luz nos penetre e nos renove com a nossa
alegria da primeira hora, para que possamos prosseguir
em frente, trabalhando e servindo sempre com a esperan�a
viva no cora��o... ". (os grifos s�o do original)

As palavras de nosso Chico t�m ou n�o t�m a ver
com o conflito que voc� viv�ncia, ou melhor, que todo


esp�rita sincero viv�ncia, objetivando a pr�pria renova��o?
Qual vulgarmente se diz, ningu�m se transforma a toque
de caixa... N�o fosse o conhecimento que a Doutrina nos
faculta sobre n�s mesmos - conhecimento superficial, �
verdade -, prosseguir�amos ignorando a necessidade de
mudan�a para melhor em nosso mundo interior. O
conhecimento esp�rita � a nossa b�n��o, e o trabalho, a
nossa oportunidade.

O Espiritismo, meu filho, at� onde sei, n�o � uma
doutrina para os anjos, mas, sim, para as criaturas humanas,
que desejam, sinceramente, se empenhar em seu
aperfei�oamento. Assim, ainda que seja um �nico passo
por dia, n�o deixe de caminhar adiante, embora, como nos
solicita o Ap�stolo, "de joelhos desconjuntados"...

Procure n�o cair com tanta freq��ncia. Para tanto,
agarre-se no que voc� puder. Mas, se, porventura, cair, n�o
fique no ch�o se lamentando. Levante-se e retome a
caminhada. Use a cabe�a e responda-me: se voc� retroceder
e se render de todo �s inclina��es infelizes, o que lhe
suceder�? Tudo h� de ficar pior, n�o �? H� esp�rito que se
utiliza desse expediente, a fim de chantagear as Leis da
Vida, na expectativa de que elas o poupem do esfor�o de
ascens�o. Ora, sejamos adultos, eu e voc�. O dinamismo
do Universo n�o se compromete por conta dos que se
recusam a acompanh�-lo! Quem fica para tr�s fica para
tr�s, at� que, compreendendo a inutilidade de sua rebeldia,
tome a decis�o de apressar o passo. As coisas funcionam


exatamente assim. O que podemos fazer para ajudar aquele
que n�o quer ser ajudado?

N�o me interprete mal. Com estas palavras, n�o estou
contemporizando com os seus e os meus erros: estou me
solidarizando com as suas lutas que, em ess�ncia, s�o
igualmente minhas. A diferen�a entre elas est� apenas na
natureza das provas que enfrentamos.

Quanto �s cr�ticas, � maledic�ncia, �s insinua��es,
n�o se importe. A vida se encarregar� de dar ocupa��o aos
desocupados, que vivem com censura nos l�bios. A seu
tempo, haver�o de ser requisitados neste ou naquele campo
de enfrentamento, onde ter�o oportunidade de testemunhar
os valores que exigem dos outros. A�, segundo o ditado,
eles ver�o com quantos paus se faz uma canoa...

Conheci um esp�rita de conduta exemplar, ilibada,
mas que era excessivamente moralista. N�o bebia, n�o
fumava, n�o comia carne e n�o fazia outras coisas mais.
Ele costumava me dizer: � "Dr. In�cio, eu n�o entendo
como um homem como o senhor pode ser t�o agarrado ao
v�cio do cigarro..." O tempo correu. Pai de dois filhos que,
� claro, acabaram crescendo, eis o que, infelizmente,
aconteceu, quando ambos lhe escaparam � tutela: o primeiro,
aos 21 anos, come�ou a beber e a usar maconha - tivemos
que intern�-lo diversas vezes no Sanat�rio; a segunda, uma
jovem linda, ficou gr�vida do namorado que, acobertado
pela fam�lia, fugira, indo morar no Rio de Janeiro... Um
dia, eu me encontrei com ele no Mercado Municipal, com

o netinho de quase 2 anos no colo. Em pouco mais de 3

anos, a vida lhe aplicara uma rasteira fenomenal. Como
ele havia mudado!

Ent�o, meu filho, seja humilde, identifique as suas
mazelas e nelas n�o se compraza. Lute, com todas as for�as,
para adequar-se aos ditames da consci�ncia, mas, por outro
lado, n�o fique se martirizando, como se voc� n�o fosse
digno de ser esp�rita. Se ser esp�rita fosse uma quest�o de
m�rito ou eleva��o espiritual, eu desconfio que sobraria
pouca gente...

8 6


In�cio - voc� me interpela em sua
carta -, por que os esp�ritos n�o mais promovem, como
outrora, manifesta��es medi�nicas ostensivas, com o
prop�sito de convencer os incr�dulos? O cepticismo parece
se alastrar entre as criaturas encarnadas, ante a
impassividade do Mundo Espiritual. O senhor que me
parece, no bom sentido, um esp�rito reacion�rio..."


Meu irm�o, em primeiro lugar, devo dizer a voc� que
n�o existem manifesta��es mais convincentes que as
dirigidas � raz�o, o que o Espiritismo faz, sempre fez e
continua fazendo com grande compet�ncia. Quem n�o se
convence pelo racioc�nio n�o se disp�e a modificar a


pr�pria vida. O fen�meno n�o passa de espet�culo para os
olhos...

Quando encarnado, tive oportunidade de participar
de algumas sess�es de efeitos f�sicos, com a presen�a de
diversos medianeiros de ectoplasmia. Digo-lhe, com toda
a sinceridade, que nenhuma delas me tornou mais crente
do que j� era. Mesmo a produ��o de fen�menos medi�nicos
de ordem f�sica deixam a desejar � mente mais perquiridora.
Dif�cil, por exemplo, m�diuns de evid�ncia inequ�voca
como Peixotinho e Chico Xavier e, dizem, Mirabelli, que,
infelizmente, n�o conheci. Os m�diuns de efeitos f�sicos
mais portentosos com os quais pude privar, � exce��o de
Chico, � claro, eram agentes de fen�menos um tanto
prim�rios: levita��o de pequenos objetos, ru�dos, voz direta
que n�o se sustentava por mais de alguns minutos, luzes
que se acendiam e logo se apagavam, materializa��es
obscuras e incompletas...

Tamb�m n�o tive oportunidade de privar com
Peixotinho, que, segundo Chico Xavier, era, de fato,
extraordin�rio medianeiro na leg�tima produ��o dos
fen�menos que voc� desejaria presenciar, com o intuito de
se fortalecer na f�.

A Doutrina Esp�rita, na revivesc�ncia do Evangelho,
� um apelo � intelig�ncia e ao sentimento e n�o aos sentidos.
Veja voc�, est� escrito no �ltimo vers�culo do Evangelho
de Jo�o: "H�, por�m, ainda muitas outras coisas que Jesus
fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio eu
que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam


escritos". Hoje questiona-se at� a exist�ncia real do Divino
Mestre, que peregrinou entre n�s, produzindo fen�menos
de transcendente beleza e significado. Acaso poder�amos
exigir, para nele crermos, que Jesus continuasse, at� a
consuma��o dos evos, a curar os cegos e os paral�ticos, a
limpar os leprosos e a ressuscitar os mortos? Tudo o que
ele fez aos olhos da gera��o que testemunhou a sua
passagem na Terra n�o impediu que fosse condenado �
morte no madeiro infamante!

Estudemos, por outro lado, a pr�pria origem do
Espiritismo. Somos quase contempor�neos de Allan
Kardec. A Doutrina que professamos, meses atr�s,
completou 150 anos, o que, convenhamos, n�o � muito
mais que o tempo de uma encarna��o... Os Esp�ritos
Superiores comunicavam-se atrav�s das faculdades
median�micas de duas meninas, Julie e Caroline Baudin,
de 12 e 15 anos respectivamente, que apenas tocavam
com as m�os as bordas da cestinha que, ent�o, grafava os
princ�pios b�sicos que foram enfeixados em "O Livro dos
Esp�ritos". O Codificador e os que lhe integravam a equipe
testemunharam o inusitado um sem-n�mero de vezes, gente
de idoneidade moral � toda prova, como o Prof. Rivail,
que n�o iludiria a si mesmo e nem se deixaria iludir por
mentirosas artimanhas.

� poss�vel, meu amigo, que, ao longo das vidas
sucessivas, j� tenhamos tido oportunidade de participar,
como agentes diretos ou indiretos, da produ��o de
fen�menos median�micos que se dirigiam aos olhos, nossos


e dos circunstantes. A fenomenologia medi�nica n�o data
do surgimento do Espiritismo. Desde que o mundo � mundo,

o interc�mbio entre as Duas Esferas � realidade
inquestion�vel; a Religi�o foi o ber�o da Filosofia e da
Ci�ncia, sendo que a Religi�o teve a sua origem no
mediunismo, com as pr�ticas primitivas de contato com o
Invis�vel. A B�blia est� repleta de narrativas de experi�ncias
ditas paranormais, n�o obstante, os que se lhe apegam �
letra prosseguem distorcendo a Verdade. � que,
contrariando toda a l�gica, o homem s� cr� naquilo que
atende aos seus interesses de ordem imediata.
Acredite, hoje n�o seria diferente de ontem... Se,
porventura, em um novo Pentecostes, os Esp�ritos
deliberassem organizar contatos que se generalizassem,
n�o faltaria quem meditasse a teoria do del�rio coletivo,
ou de alucina��o de causa desconhecida, no intuito de
continuar sistematicamente negando o que, caso admitido,
compeliria a Humanidade a rever os valores �ticos em que
se estrutura. Se o Espiritismo triunfasse de um instante
para outro, o que, por exemplo, haveria de ser das religi�es
constitu�das, em sua organiza��o hier�rquica, refeitas de
interesses subalternos? A pr�pria economia mundial
sucumbiria, de vez que toda transi��o, para que aconte�a
com seguran�a, deve se verificar lenta e gradualmente,
com o amadurecimento progressivo dos esp�ritos.

Desculpe-me, se a minha resposta n�o o satisfaz,
contrariando a condi��o de "esp�rito reacion�rio" que voc�
me tributa. Estou convencido de que o Espiritismo h� de


avan�ar homem a homem, ou seja, pensamento a
pensamento, sem que, de outra �maneira, consiga se
generalizar. Todavia, por si s�, a ordem de id�ias que a
Doutrina Esp�rita defende em seus postulados
consubstancia extraordin�rio avan�o espiritual, qual nunca
se verificou em qualquer �poca da hist�ria da Humanidade.

O esp�rita convicto sente-se naturalmente compelido
a empreender mudan�as radicais na exist�ncia, na produ��o
particular de um fen�meno �tico que influenciar� os que
lhe estejam em torno. Essas mudan�as ser�o definitivas, e
n�o transit�rias quanto �s motivadas pelos sentidos, sempre
pass�veis de se equivocarem.

N�o creio, pois, que a Espiritualidade Superior, pelo
menos t�o cedo, volte a se movimentar no campo da
fenomenologia ostensiva, que, ali�s, objetivava concretizar

o que logrou na sistematiza��o da Doutrina. O trabalho
agora � de ordem interna, introspectivo.
Antes de encerrar esta missiva, retomando a sua
defini��o sobre mim - "esp�rito reacion�rio", ainda que,
como faz quest�o de frisar, "no bom sentido" -, fugindo a
toda hipocrisia, devo, sim, concordar com voc�: escrevendo

o que acima escrevi e sabendo o que j� sei, se pudesse, se
contasse com m�diuns que me cedessem ectoplasma em
abund�ncia, eu haveria de afrontar a ordem natural das
coisas e, � luz do dia, tentaria me materializar numa sess�o
esp�rita p�blica das mais concorridas, pondo para correr
ou, quem sabe, at� para desencarnar, os ortodoxos de
coron�rias entupidas, que, de t�o apegados ao corpo, n�o
91


desocupam lugar para as mentes mais livres, fadadas a
trazerem novo surto de progresso para o Espiritismo, dentro
do dinamismo que o caracteriza e deve prosseguir
caracterizando a nossa Doutrina de vanguarda, que os
esp�ritos retr�grados n�o compreendem e n�o conseguem
acompanhar.

92


In�cio, escrevo-lhe para dizer que
aprecio muito o seu jeito de ser, que se parece com o meu.
Eu tamb�m sou assim: falo o que tenho a dizer, sem
rodeios... Os seus livros muito me confortam, a sua
transpar�ncia e a humanidade que, na condi��o de esp�rito,
continua a revelar. Pe�o-lhe n�o se importar com as
cr�ticas..."


Minha irm�, sou muito grato �s suas palavras de
incentivo; sim, porquanto n�s, os desencarnados, igualmente
necessitamos de palavras que nos encorajem a prosseguir...
As vezes, em nossos contatos com voc�s, nos retra�mos poder�amos
dizer muito mais e n�o dizemos, porque
percebemos que a maioria n�o est� preparada para novas

93


informa��es. O m�dium � uma esp�cie de term�metro,
aferindo as rea��es de impacto, ou seja, a receptividade
do que procuramos lhes transmitir. Quando ele se encolhe,
diante dos reveses que experimenta, encolhemos junto e,
ent�o, s� nos resta lamentar os que insistem em continuar
ignorando as realidades de Al�m-T�mulo.

A humanidade que voc� constata em mim, atrav�s de
meus escritos despretensiosos, � o que sou. A
desencarna��o n�o nos promove a anjos - infelizmente! �
claro que eu preferiria ter sa�do do corpo com duas asas
robustas, a me conduzirem para al�m do que sou, sem que,
para tanto, tivesse que prosseguir me esfor�ando como
qualquer mortal. Em a Natureza, de fato, nada d� saltos.
Tudo obedece a determinado esp�rito de seq��ncia, e a
lagarta, antes de transfigurar-se em falena, h� de se arrastar
por muito tempo no solo.

N�o tenho a inten��o de ser deseducado com
ningu�m... Quando menino, a minha m�e soube me educar
pela infal�vel pedagogia do chinelo, que hoje a Psicologia
moderna contesta, afirmando que coisas assim geram
traumas irrevers�veis nas crian�as. Discordo. � um direito
meu, pois n�o? Eu n�o sei se, quando oportunas, umas
boas chineladas nas n�degas ocasionam maiores problemas
que o excesso de liberdade com que os meninos t�m sido
criados. Deixemos, no entanto, este t�pico de lado. Al�m
de n�o ter sido pai, sou um psiquiatra ultrapassado, que
precisa se atualizar.

H� quem me acuse de ser excessivamente rigoroso
com os esp�ritas e, em particular, com os m�diuns.


Sinceramente, esta � a minha maneira de manifestar o
carinho que os irm�os de Ideal me merecem. A semelhan�a
de um pai preocupado com os filhos (ou de uma m�e),
tenho receio de que eles venham a se afastar do bom
caminho; por este motivo, pare�o andar sempre carrancudo
e com o relho nas m�os. Creia, n�o estou procurando me
justificar, pois que, de meus atos, a n�o ser � pr�pria
consci�ncia, n�o devo satisfa��o a ningu�m.

N�s, os esp�ritas, estamos na posse de valioso tesouro,
que � a Doutrina. Precisamos valoriz�-lo, permanecendo
atentos, j� que, ao menor descuido, as nossas imperfei��es
falam mais alto.

Chico contou-nos que, certa vez, em visita ao
cemit�rio, onde tinha o h�bito de ir orar, deparou-se com
um esp�rito sentado sobre o pr�prio t�mulo. Aproximou-
se e come�aram a conversar. Coisas da fabulosa
mediunidade de Chico Xavier -o maior fen�meno
medi�nico de todos os tempos! O esp�rito, que havia
animado o corpo de rico empres�rio uberabense, cometera
suic�dio; arruinado em seus neg�cios, disparara um proj�til
� altura da cabe�a, estourando os miolos... Estava ali, preso
aos seus despojos, por mais de cinco anos. � "Meu irm�o

- disse-lhe o m�dium, com a ternura que lhe era
peculiar -, voc� precisa aceitar e compreender a situa��o
em que se encontra. � momento de seguir... Voc� ser�
convenientemente tratado. Deus � Pai de Infinita
Miseric�rdia!" Identificando a presen�a de Chico, que, �
claro, era mais conhecido entre os mortos que entre os

vivos, o esp�rito respondeu: � "Voc�s, Chico, os esp�ritas,
s�o os verdadeiros milion�rios da Terra! Se eu soubesse o
que voc�s sabem, jamais teria consentido que o desespero
tomasse conta de mim..." E gemeu, com a m�o � cabe�a:

� "Ai, meu Deus, que triste sina a minha!... O que fui
fazer?..."
Naquele instante, por intercess�o das preces de
Chico, Amigos Espirituais conseguiram se aproximar e
conduziram o esp�rito, que se revelava em estado
deplor�vel, � indispens�vel hospitaliza��o. Aquela frase,
por�m, reproduzida pelos l�bios do m�dium, ficou ecoando
em meus ouvidos: � "Voc�s, os esp�ritas, s�o os
verdadeiros milion�rios da Terra!".

Ent�o, minha irm�, eu me preocupo com os
companheiros e n�o me importo que toque a mim a parte
mais espinhosa na tarefa de alert�-los. Sei que muita gente
me considera um mistificador - ora, que esp�rito haveria
de perder tempo em mistificar In�cio Ferreira! O esfor�o
da mistifica��o � para quem valha a pena e n�o para mim,
que nada sou, ao lado deste m�dium, que nada �.
Felizmente, ambos nos identificamos tamb�m neste aspecto:
na nossa total desvalia, que equivale a somar nada com
coisa alguma! Os nossos supostos advers�rios � que nos
supervalorizam e nos deixam constrangidos, induzindo-nos
a redobrada luta para que n�o venhamos a nos convencer
de que possu�mos a import�ncia que nos atribuem. Toda
vez que a borduna canta sobre a nossa cabe�a (e,
ultimamente, tem cantado todo dia), eu digo a ele: � "Isto


� vacina, meu filho, vacina contra o personalismo e a
vaidade... Vamos tom�-la e agradecer aos enfermeiros que,
em nome de Deus, no-la aplicam, embora pudessem
maneirar um pouco no peso da m�o..."

N�o pense voc� que eu n�o gostaria de ser diferente:
verdadeiramente humilde, verdadeiramente fraterno, enfim,
verdadeiramente evangelizado. Gostaria, sim! Agora,
fingimento n�o � comigo. Nunca fui de dar tapinhas nas
costas e, por detr�s... Voc� sabe, n�o �? Prefiro ser assim,
bronco, sendo eu mesmo, a ludibriar as pessoas, afivelando
ao rosto uma m�scara de santo. O que - deixe-me ressalvar

- n�o me aliena da preocupa��o constante de ser melhor a
cada dia, conforme o Espiritismo nos preceitua. Apretexto
de ser aut�ntico, n�o posso me esquecer de ser bom!
Recomenda��es aos seus familiares e aos integrantes
do grupo que voc� freq�enta. � "Sou sua advogada",
voc� me diz no trecho final da carta que me remete. Que
parada dura, defender-me! Coitada! O meu caso � processo
para toda a vida... Todavia, voc� se haver� muito bem, se
conseguir que eu n�o venha a ser condenado sem, pelo
menos, o direito de ser ouvido, j� que os meus mais
ferrenhos acusadores nada sabem de mim, ou melhor, nada
sabiam, at� que, atrav�s deste amigo, tive oportunidade de
dizer em alto e bom som que n�o morri!

Voc� se diz parecida comigo. N�o seja tanto, minha
filha; n�o seja tanto. H� muito tempo atr�s, ouvi o conselho
de um amigo que n�o segui: � "N�o ofere�a as suas carnes
aos c�es..." Ele estava certo. Conv�m poupar-se dos
caninos, porque a turma est� sempre de muito bom apetite.

97


In�cio - desculpe-me perguntar-, o
senhor acha mesmo que h� uma campanha orquestrada
contra a obra medi�nica de Chico Xavier? Li algo a respeito
em um de seus livros e, ao que me parece, noutro da lavra
do mesmo m�dium ("Eu, Esp�rito Comum", de nossa irm�
desencarnada Domingas) e fiquei estarrecido. Ser� cr�vel?
O senhor n�o estar� exagerando?".


Gostaria de acreditar que sim, meu amigo, no entanto
existem evid�ncias que comprovam a nossa preocupa��o
de uma campanha, como voc� diz, orquestrada, por parte
das Trevas, no intuito de que a obra medi�nica de Chico
Xavier, por complemento natural da Codifica��o, caia no
esquecimento. Temos certos dados concretos a respeito.


Segundo nos tem sido poss�vel levantar, em pesquisa
efetuada em n�vel de Brasil, junto aos freq�entadores
regulares das casas esp�ritas, apenas 1/3, se tanto, leu, do
referido medianeiro, a sua obra mais conhecida - "Nosso
Lar", ditada por Andr� Luiz. O livro, publicado pela
Federa��o Esp�rita Brasileira, tem pref�cio datado de 3_de
outubro de 1943, portanto �s v�speras de completar 64
anos!

Do mencionado 1/3 dos leitores, menos da metade
promoveu uma releitura da obra que, a rigor, para ser
assimilada em seu extraordin�rio conte�do, necessita ser
estudada e refletida. Tais n�meros, veja bem, se referem
aos esp�ritas que pertencem � gera��o de Chico Xavier,
tendo sido, no m�nimo, seus contempor�neos, de 50 anos
para c�. Contudo, entre os esp�ritas mais jovens, que se
colocam numa faixa et�ria de 18 a 25 anos, pouqu�ssimos
tiveram acesso ao nosso maior best-seller, excetuando-se,
� claro, os livros que constituem o Pentateuco.

Agora, vem o mais grave: em5, anos da desencarna��o
do m�dium, ocorrida em 30 de junho de 2002, na cidade de
Uberaba, onde residia desde 1959, raros os peri�dicos
esp�ritas que continuam a enfatizar-lhe a tarefa mission�ria,
nos sendo poss�vel verificar at� mesmo cr�ticas, algumas
veladas, outras nem tanto, ao conjunto de sua obra
psicogr�fica. Da tribuna, poucos s�o os oradores que,
deixando de falar de si, na propaganda pessoal, dedicam
minutos de sua fala em coment�rios �quele que foi detentor
do mais leg�timo mandato medi�nico entre os homens.

99


Consideramos, sem nenhuma idolatria, que falar hoje
sobre Chico Xavier significa expor a mensagem doutrin�ria
em seu maior ponto de intera��o com o Evangelho do Cristo

- falar sobre Chico Xavier � falar sobre Espiritismo em
uma linguagem que todo o mundo entende, mormente os
que ainda n�o se lhe fizeram adeptos.
Pois bem. Referimo-nos a "Nosso Lar", que, salvo
engano, � o livro medi�nico mais traduzido no mundo inteiro.
Se avan�armos, por�m, um pouco mais, na famosa s�rie
andreluiziana, formada por 16 volumes, nos depararemos
com "Os Mensageiros", o 2.� que veio a lume, com pref�cio
escrito por Emmanuel, em Pedro Leopoldo, em 26 de

a

fevereiro de 1944. "Os Mensageiros", atualmente na 42.
edi��o, vendem menos de 1/3 que "Nosso Lar". Apenas
para efeito de c�lculo matem�tico, "A��o e Rea��o", cujo

a

pref�cio � de 1.� de janeiro de 1957, em sua 24. edi��o
n�o chegou ao 300.� milheiro!

Dos esp�ritas que adquirem livros (eles n�o s�o tantos
assim), poucos s�o os que efetivamente se entregam � sua
leitura.

N�o estou, na resposta que elaboro �s suas
indaga��es, colocando em pauta, por exemplo, o quase
total desconhecimento de obras da pr�pria Codifica��o,
como "O C�u e o Inferno" e "A G�nese". � raro que
visitemos uma casa esp�rita que tenha estes dois citados
volumes sobre a mesa ou mesmo que os tenha, ainda que
empoeirados, em sua biblioteca ou estante � guisa de tal.


Algu�m j� me perguntou se sou contra os novos
autores, encarnados e desencarnados. N�o, n�o sou.
Entendo que todo livro esp�rita tem o seu p�blico e, por
pior que seja, como disse um amigo, "� melhor que um
copo de cacha�a"... Entendo, todavia, que, do ponto de
vista doutrin�rio, o Espiritismo assenta sobre 3 pilares
fundamentais: Jesus, Kardec e Chico Xavier! N�s outros,
estejamos no corpo ou n�o, somos meros oper�rios da
Obra que se agiganta e, se n�o prescinde de nossa
colabora��o, transcende a nossa capacidade de algo lhe
acrescentar. Pelo menos, no que tange ao meu singelo
esfor�o liter�rio, tenho feito o poss�vel para que ele seja
apenas um canal que remeta o sedento � �gua da fonte, da
qual, igualmente �vido, eu me aproximo com rever�ncia.

Seria interessante, e necess�rio, que os esp�ritas
conscientes, realmente compromissados com a Doutrina,
cerrassem fileiras, intensificando a divulga��o das obras
da aben�oada lavra medi�nica de Chico Xavier; por�m o
que se v�, de uns tempos a esta parte, s�o m�diuns e
escritores difundindo projetos pessoais, seus ou das
entidades que os assistem, objetivando n�o sei bem o qu�.

Pelo sumariamente exposto, tire voc� as suas
conclus�es e assuma a parcela da responsabilidade que
lhe toca; sim, porquanto n�s, os esp�ritas, em geral somos
assim: preparando-nos para uma futura encarna��o de
equilibrista, ficamos em cima do muro... No que depender
de mim, haverei de empurr�-lo, para que, finalmente, voc�

101


me venha fazer companhia e n�o me deixe, sozinho, na al�a
de mira dos franco-atiradores.

Eu j� sei, algu�m h� de argumentar: � "Esse Dr.
In�cio � ladino, esp�rito perigoso, repleto de sofismas...
Fala de Chico para falar de si, fazendo propaganda de seus
livros!" N�o posso impedir que, a meu respeito, pensem
ou digam o que quiserem. Estou habituado, desde muito, a
todo e qualquer tipo de acusa��o. Fazendo coro � palavra
de um amigo, at� hoje s� n�o me acusaram de assassino,
pois, se o fizerem, no m�nimo, estar�o obrigados a apresentar

o cad�ver.
Concluindo, � com imensa alegria que lhe informo o
seguinte: em reuni�o com diversos amigos deste Outro
Lado, da qual participaram os vener�veis Dr. Bezerra de
Menezes e Irm�o Jos�, entre outros, doravante toda obra
de nossa lavra, antes do pref�cio, far� constar, a partir
desta data, 30 de junho de 2007, uma nota preliminar
remetendo o leitor �s obras da lavra do m�dium Francisco

r

C�ndido Xavier! E o m�nimo que, pela Doutrina, nos cabe
fazer, no sentido de que se registre, perante a Espiritualidade
Superior, a nossa despretens�o nos textos que fazemos
publicar.

Voc� me perdoe, se, por falta de espa�o, deixo de me
estender em outras considera��es, que, com certeza,
acabariam por ferir suscetibilidades, visto que as Trevas,
no que voc� definiu t�o bem - "campanha orquestrada"
-, a fim de colimarem o seu intento - colocar em
plano secund�rio o acervo bibliogr�fico de Chico Xavier



contam com o aval, consciente e inconsciente, dos que
militam � frente do Movimento, na condi��o, direta ou
indireta, de formadores de opini�o. Sinceramente, eu n�o
gostaria de lhes ocupar a pele, quando, ao efetuarem a
Grande Viagem, perceberem o crime de lesa-doutrina que
est�o cometendo, instigados por escusos interesses. Para
enxugar tanto pranto de arrependimento, todo len�o haver�
de ser pouco...


In�cio, os m�dicos, diversos
psiquiatras que consultei, na companhia de minha esposa,
diagnosticaram esquizofrenia para o meu caso. A doen�a
se manifestou agora, na idade adulta, mas, desde crian�a,
eu pr�prio estranhava o meu comportamento - id�ias
esquisitas me assaltavam de repente... N�o seria um caso
t�pico de obsess�o? Uma tia minha era assim e, segundo
sei, esteve internada diversas vezes, antes de desencarnar.
O senhor acha que devo continuar com os rem�dios? Por
caridade, preciso de ouvir a sua palavra."

� Caro amigo, em primeiro lugar, gostaria de
parabeniz�-lo pela coragem de enfrentar, �s claras, o seu

poss�vel problema psiqui�trico, que, em ess�ncia, �
espiritual - todo problema comportamental tem a sua g�nese
no esp�rito; o corpo � o ve�culo de suas manifesta��es...
Este � o primeiro passo para que voc�, efetivamente, possa
alcan�ar a cura, sen�o absoluta, pelo menos relativa, na
presente encarna��o.

Quase todos os doentes psiqui�tricos com os quais
lidei, mormente os com diagn�stico de esquizofrenia,
resistiam ao tratamento, opondo-se a medicamentos que,
se, de fato, n�o resolvem, amenizam os sintomas.

Se a Medicina Som�tica, embora os avan�os
extraordin�rios nos �ltimos lustros, engatinha, a Ps�quica
ainda se encontra no ber�o. Neste sentido, carecemos de
estudiosos e pesquisadores despojados inclusive de
preconceitos cient�ficos que, no dizer do Dr. Bezerra de
Menezes, em sua obra pioneira, nos auxiliem a entender "a
loucura sob novo prisma". N�o tenho qualquer d�vida de
que, nos pr�ximos dois, tr�s lustros, o conceito de
esquizofrenia, empregado hoje de maneira um tanto
gen�rica, haver� de ser revisto.

Esquizofr�nico?! Com base na defini��o do
"Aur�lio", quem n�o �?! "Grupo de dist�rbios mentais que,
basicamente, demonstram dissocia��o e discord�ncia das
fun��es ps�quicas, perda da unidade da personalidade,
ruptura de contato com a realidade". Diria, assim, sem
medo de errar, que todos, uns mais, outros menos, nos
enquadramos na descri��o acima. Pelo menos comigo, de

105


seu lado, voc� pode contar, pois que encaixo perfeitamente
na palavra poucas com que rotulam t�o complexo processo.

"Ruptura de contato com a realidade", interna e
externa, acrescento. A bem da verdade, ent�o, quase todos
demandam o Al�m-T�mulo esquizofr�nicos, posto que s�o
raros os que conseguem se situar deste Outro Lado da
Vida, sem crises de identidade ou perda de referencial de
valor.

Sem, contudo, enveredar por este caminho filos�fico,
serei pr�tico. Com base em minha viv�ncia, como m�dico
e paciente, recomendo-lhe o seguinte:

1 - n�o se trate com psiquiatras de orienta��o
reconhecidamente materialista;
2 - n�o acredite em promessa de cura imediata que
algum m�dium, ou esp�rito, lhe fa�a;

3 - aceite, com humildade, o transit�rio diagn�stico
que lhe arranjaram aos dist�rbios, procurando ouvir a
opini�o de outros especialistas na �rea;

4 - n�o seja resistente aos medicamentos que, sem
exagero, lhe sejam prescritos (o paciente, digamos, mais
acentuadamente esquizofr�nico, costuma fugir ao
medicamento, chegando mesmo a dissimular que o toma);

5 - n�o tenha, voc� mesmo, qualquer tipo de
preconceito contra a sua enfermidade psiqui�trica;

6 - cuide-se espiritualmente, por�m sem fanatismo leia
boas obras e reflita sobre elas, ligando-se, com
assiduidade, a esta ou �quela tarefa assistencial -; em n�vel
inconsciente, voc� precisa melhorar a sua auto-estima;


7 - controle a sua agressividade; � atrav�s dela que

os esp�ritos obsessores costumam se insinuar, agravando-

lhe o quadro cl�nico;

8 - toda patologia de ordem emocional � semelhante

a uma ferida, cujo processo de cicatriza��o, na repara��o

dos tecidos lesados, acontece lentamente, de dentro para
fora (grifei);

9 - n�o seja pessimista e nem se coloque
indebitamente no centro das aten��es, como se, de repente,
pessoas e coisas passassem a existir em fun��o de voc�;

10 - alguns casos de esquizofrenia se vinculam �

exacerba��o de sentimentos ego�sticos - combata-os,

sistematicamente...

Sim, voc� se refere a uma tia, j� desencarnada, com
os seus mesmos problemas. A Gen�tica est� no mundo
cumprindo a sua fun��o, n�o apenas na transmiss�o dos
caracteres morfol�gicos heredit�rios; as leis da mat�ria
est�o a servi�o de leis que as transcendem, em obedi�ncia
ao caima de cada um... Eis o salto que a Medicina est�
sendo chamada a dar, para transpor, de uma vez por todas,

o abismo entre a mat�ria e o esp�rito. Porque, no corpo
f�sico, sempre se encontram e sempre se encontrar�o
aparentes causas que correspondem a dist�rbios ps�quicos
os mais variados, ent�o, conclui-se, equivocadamente, pelas
teorias do materialismo. A harmonia ou desarmonia do
quimismo cerebral � pertinente ao teor dos pensamentos.
Quanto ao mais, meu amigo, esforce-se, quanto puder,
para que as pessoas em torno n�o o vejam como um


problema. N�o abdique da possibilidade de ser �til. Se
voc� n�o estiver com cabe�a para, por exemplo, continuar
sendo professor, ag�entando meninos endiabrados em salas
de aula, v� mexer com papelada na secretaria da escola ou
mesmo colaborar com a distribui��o de lanche na cantina.
A ociosidade, acredite, pode ser uma tenta��o de luxo,
mas acaba nos depositando na lata de lixo!

Entre os meus doentes, no Sanat�rio, eu sempre fiz
quest�o de ser um paciente a mais: eles vinham com loucura
para cima de mim, eu partia em cima deles com loucura e
meia... Alegria, meu irm�o, a alegria � um ingrediente muito
importante para as aspira��es do corpo e da alma.

L�, no Sanat�rio, como hoje aqui, no Hospital dos
M�diuns, eu dava muito boas risadas. Voc� n�o h� de ver
que, um dia, a nossa interna mais perturbada me chamou
de louco! O pior � que Manoel Roberto, o Enfermeiro-
Chefe, me encontrou gargalhando sozinho pelos corredores
e, durante v�rios dias, me olhou com aquela vontade com
que os enfermeiros de hospitais psiqui�tricos olham os
pacientes que surtam, quando prestes a coloc�-los em
camisa-de-for�a.

N�o fique triste. � melhor ser esquizofr�nico,
depressivo ou bipolar do que corrupto e malandro, como a
maioria dos nossos... Bem, deixe para l�. A ladroagem �
uma doen�a que se cronificou e ningu�m toma rem�dio nem
para detr�s das grades vai! O que tem de gente insana
passando por normal � brincadeira. Pelo menos, com as

m

nossas vozes e vis�es, eu e voc� temos as m�os limpas. �


claro, n�o estou falando do passado, hem! Porque anjos
tamb�m n�o fomos; se tiv�ssemos sido, n�o estar�amos a�,
�s voltas com a nossa e a loucura dos outros.

Fique tranq�ilo. V� tomando os seus rem�dios e os
seus passes, tanto quanto eu tenho procurado tomar os
meus.

De esquizofr�nico para esquizofr�nico, um abra�o!

109


eu irm�o, voc� me escreve: � "Dr. In�cio,
sou esp�rita h� mais de 30^anos e, no entanto, me sinto
longe da viv�ncia dos postulados da Doutrina. O que posso
fazer, para ser melhor? O Espiritismo � t�o sublime, e eu
t�o imperfeito ainda! Escrevo esperando a sua
compreens�o, de vez (desculpe-me!) que o senhor me parece
t�o humano quanto eu. N�o leve em conta o meu
atrevimento. A porta a que Jesus se referiu � mesmo t�o
estreita assim?"


Estreita, meu amigo?! Estreit�ssima, isto sim, a porta
que necessitamos atravessar! T�o estreita que, digo-lhe,
at� precisamos nos colocar de banda, ou seja, de lado,
para que, finalmente, logremos transp�-la...


De minha parte, ainda n�o consegui - preciso jejuar
um pouco mais, perder "gordura"... Fomos cevados,
regiamente, nos lautos banquetes da ilus�o e, agora, a gente
tenta atravessar e fica travado, feito essas senhoras e esses
senhores, um pouco mais rechonchudos, que se engastalham
numa roleta ou que n�o cabem no elevador. Com o nosso
ego�smo, temos ocupado espa�o demais, porque a outra, a
porta larga, � de f�cil acesso aos que n�o se preocupam
com sua silhueta espiritual.

A t�tulo de ilustra��o, permita-me reproduzir o que
Mateus narra em seu Evangelho, cap�tulo 17, vers�culos
14 a 21: "E, quando chegaram para junto da multid�o,
aproximou-se dele um homem que se ajoelhou e disse:

"Senhor, compadece-Te de meu filho, porque �
lun�tico e sofre muito; pois muitas vezes cai no fogo e
outras muitas na �gua.

"Apresentei-o ateus disc�pulos, mas eles n�o puderam
cur�-lo.

"Jesus exclamou: O gera��o incr�dula e perversa!
At� quando estarei convosco? At� quando vos sofrerei?
Trazei-me aqui o menino.

"E Jesus repreendeu o dem�nio, e este saiu do menino,
e desde aquela hora ficou o menino curado.

"Ent�o os disc�pulos, aproximando-se de Jesus,
perguntaram em particular: Por que motivo n�o pudemos
n�s expuls�-lo? [Os disc�pulos "perguntaram em particular"

o que eles j� sabiam, n�o lhe parece?]
111


"E ele lhes respondeu: Por causa da pequenez da
vossa f�. Pois, em verdade, vos digo que, se tiverdes f�
como um gr�o de mostarda, direis a este monte: Passa
daqui para acol� e ele passar�. Nada vos ser� imposs�vel.

"[Mas esta casta n�o se expele sen�o por meio de
ora��o e jejum.] " (grifei)

Penso que somos como aquela casta de esp�ritos
malignos: n�o nos expeliremos, "sen�o por meio de ora��o
e jejum".

N�o, afaste de sua cabe�a tal pensamento -Vade
retro! Aqui, na travessia da porta, o famoso "jeitinho
brasileiro" est� ultradesmoralizado; era s� o que faltava a
gente tentar corromper o porteiro ou interferir na balan�a,
para entrar com aqueles quilinhos a mais... Desista, pois a
cancela � eletr�nica e incorrupt�vel! O neg�cio � mesmo
emagrecer...

Ent�o, voltando � vaca morta, ou melhor, magra,
precisamos, espiritualmente, nos enquadrar no regime
dessas famosas modelos internacionais, que parece se
contentarem em comer uma ou duas folhas de alface por
dia.

Voc� sabe, em mat�ria de suborno, n�s, os brasileiros,
somos doutores, mas, por enquanto, em contato com
muambeiros paraguaios, com os quais competimos, sem
me reportar a especialistas de outras nacionalidades (bastam
os inimigos que tenho dentro da pr�pria casa!), ainda n�o
descobri, para o Alto, outra via de acesso que n�o fosse a


Crucis! O Divino Senhor � en�rgico e, quando fala, n�o
brinca: "Se algu�m quiser vir nas minhas pegadas, renuncie
a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me..." N�o existe a
menor possibilidade de negocia��o, de encaminhamento
de uma proposta, com pedido de abatimento...

Quanto � minha compreens�o, n�o se preocupe, pode
contar com ela. Sou totalmente solid�rio a voc�. No que
tange, por�m, � sua consci�ncia, nada posso fazer, de vez
que, com a minha, eu ando em papos-de-aranha.

Certa vez, ouvi de Chico Xavier (j� devo ter
mencionado o fato em outras ocasi�es - desculpe-me o
humano esquecimento): � "O Espiritismo � uma doutrina
que n�o nos pede prod�gios de renova��o �ntima, n�o nos
efetuando nenhuma cobran�a de natureza interior, mas...
(� a� que a pancada canta na moleira!)..., justamente porque
a nada nos obrigue, nos sentimos na obriga��o de oferecer
a ele alguma coisa".

N�o � meu intuito, � l�gico, desanimar a quem quer
que seja, mesmo porque n�o adianta: at� as pedras, um
dia, s�o compelidas a sair do lugar! Portador de livre-
arb�trio, voc� poder� cruzar os bra�os por mil anos e, por
outros mil, ensimesmar-se, mas... (olhe esta palavrinha de
novo, que "exprime oposi��o ou restri��o")... h� de
acontecer algo na Cochinchina que ir� incomod�-lo onde
estiver. A�, meu amigo, voc� verificar� que o seu
emburrecimento ou contrariedade s� significou uma coisa:
tempo perdido!


Ouvi de um confrade a conversa que Chico mantinha
com um outro, que o visitava. � "Chico - dizia o
companheiro -, a constru��o da creche est� pronta h� 1_0
anos... Vimos, este tempo todo, protelando a sua
inaugura��o. N�o cont�vamos com suficiente material
humano, para coloc�-la em funcionamento. Pretendo agora
trabalhar dobrado, a fim de recuperar o tempo perdido..."
Ap�s escut�-lo, o m�dium, que n�o costumava mandar
recado, respondeu: � "Voc� quer saber de uma coisa?
Tempo perdido � tempo perdido; n�o se recupera mais...
Voc� fala em trabalhar dobrado? Trabalhasse dobrado desde

o in�cio..."
Ent�o, meu caro, como o povo costuma dizer no
interior, "rapadura � doce, mas n�o � mole"! (Arre, que
palavrinha chata e inconveniente: "mas"!)

Sempre lembrando Chico Xavier, ocorre-me neste
momento o que ele nos contou, a respeito do que um amigo
lhe disse, depois de acompanh�-lo em sua maratona de
trabalho, num final de semana: � "�, seu Chico, a gente,
para ser esp�rita, precisa ter muita sa�de..."

Tratemos, pois, de adquirir sa�de, comendo menos
e... malhando mais. A nossa academia de muscula��o (ouvi
um jovem, dias atr�s: �"Estou definindo os m�sculos...")
� a da caridade, que fica na poeira da periferia, sob Sol
causticante, abdicando da sesta do almo�o... � l�, na
periferia, que deixaremos estirados no ch�o, mortos de
cansa�o, o orgulho, o ego�smo e a vaidade que,

114


milenarmente, nos engordam, como se n�o pass�ssemos
de mam�feros su�deos.

Encerro, pois, meu amigo, esta carta, encorajando-o
a seguir em frente, rumo � porta estreita. E, se lhe serve de
consolo, acrescento: seguirei imediatamente atr�s de voc�,
concedendo-lhe a primazia de estar um passo adiante dos
meus!


n�o me escreveu, meu amigo - n�o teve

coragem bastante para tanto! -, mas o seu pensamento
chegou at� mim e me detive a sond�-lo, sem a pretens�o, �
claro, de ir t�o fundo, com receio mesmo de n�o encontrar

o caminho de volta, em meio � grande escurid�o.
Voc� n�o me engana. Conhe�o-o desde longa data e
sei perfeitamente do que � capaz para tirar proveito pessoal
da situa��o; diga-se de passagem, de qualquer situa��o,
sem medir conseq��ncias imediatas e, muito menos, a longo
prazo. Por conseq��ncias a longo prazo, quero me referir �
verdade com a qual se deparar� a respeito de si mesmo,
ap�s a desencarna��o. Embora, como tantos, viva


apregoando a mensagem da imortalidade, sabemos que
voc� n�o acredita muito nisso, pois, se acreditasse, seria
outra a sua �tica. Fazer o qu�, n�o �? Tive oportunidade de
conhecer muitos m�diuns, excelentes por sinal, que, quando
sa�am do transe, questionavam a autenticidade dos
comunicados que obtinham. Pelo menos, no entanto, esses
tais a que me reporto, n�o ambicionavam a fama e o poder;
eram pobres companheiros de Ideal que lutavam pelo
consumo do p�o da f� de cada dia...

� uma pena! Voc� n�o precisava de manipular tanta
gente quanto manipula, com a finalidade de incensar-se, j�
que, de livre e espont�nea vontade, ningu�m o incensaria.
Se se aceitasse exatamente do tamanho que �, pugnando
pela simplicidade, voc� superaria a sua pr�pria expectativa
de crescimento e, creia, seria seguido por uma legi�o imensa
de admiradores. N�o careceria de t�o grande esfor�o assim,
face � car�ncia de l�dimos pastores � necessidade de nosso
tresmalhado rebanho.

Sei que voc�, em certa �poca, foi duramente
combatido; mas, afinal, quem n�o o � sobre este mundo
que o salmista definiu como "vale de l�grimas"? A
persegui��o por verdadeiro amor a Jesus � uma honra para
qualquer. Conta-nos Lucas, em "Atos dos Ap�stolos", no
cap�tulo 5, vers�culos 40 e 41, que os doutores da lei,
"chamando os ap�stolos, a�oitaram-nos e, ordenando-lhes
que n�o falassem no nome de Jesus, os soltaram. E eles se
retiraram do Sin�drio regozijando-se por terem sido

117


considerados dignos de sofrer afrontas por esse Nome ".

(grifei)

Infelizmente, por�m, voc� saiu pelo lado oposto e,
para se defender, enrijeceu-se... S� Deus sabe os c�lculos
que efetuou, com o aux�lio de invis�veis calculistas,
maquiav�licos, mais somando que diminuindo,
multiplicando que dividindo, para, em ess�ncia, quase n�o
lhe sobrar nada ao fim do tentame em que, aos poucos, se
frustra.

Meu amigo, a Humanidade est� cansada de viver de
estampas... Antigamente, as crian�as (estou falando no meu
tempo e n�o, certamente, no seu), quando se encontravam
com os padres na rua, ganhavam deles medalhinhas e figuras
de santos de presente; lembro-me, inclusive, que cheguei a
ganhar um ter�o de contas coloridas de um sacerdote amigo
de minha m�e. Hoje, por�m, est� tudo mudado, a come�ar
que pouca gente � capaz de reconhecer um padre na rua,
desde que quase todos resolveram abdicar de seus h�bitos,
no vestir-se e no perfilar-se. Entenda l� como voc� puder.
N�o preciso gastar muitas palavras com a sua intelig�ncia
sagaz.

Chico Xavier! Consinta-me transcrever resumido
artigo de um amigo comum, para que, em minha dificuldade
de express�o, mais bem eu me fa�a entendido nas id�ias
que pretendo colocar. "Por vezes - diz o beletrista -, o
pr�prio Chico Xavier se admirava do fen�meno da multid�o
que, invariavelmer�te, o procurava em suas atividades
medi�nicas, fosse em Pedro Leopoldo, fosse em Uberaba.


"�s sextas-feiras e aos s�bados, quando o Grupo
Esp�rita da Prece regurgitava de gente, candidamente ele
se virava para n�s, como se pud�ssemos explicar a causa
de tanta procura, qual se ele nada tivesse a ver com tudo
aquilo - recusava-se a crer que as pessoas ali estivessem
motivadas pela sua bondade!

"Um dia, algu�m arriscou-se a lhe perguntar:

"� Chico, o que voc� mesmo tem a dizer, a respeito
da multid�o de todo fim de semana aqui?...
"Compenetrado, o m�dium respondeu:
"�Ah, � que o povo tem saudade de Jesus!... (grifei)
"Resposta profunda e s�bia de quem, em sua

humildade, sequer admitia que a sua presen�a pudesse
polarizar aten��es, como um dos mais l�dimos
representantes do Cristo sobre a face da Terra.

"De fato, o povo, com saudade de Jesus, ia ameniz�la
junto ao seu cora��o!"

Voc� n�o deve achar, mas � lindo, n�o? Percebeu a
diferen�a? O povo quer Jesus e n�o a estampa dele! A
meninada da era do computador � muito mais exigente.

Por falar em Chico Xavier, ele tem sido uma
"obsess�o" para n�s, n�o �? Sim, para n�s, os m�diuns,
que nos fixamos nele e... Onde ele coloca os p�s, n�s n�o
conseguimos nem colocar as m�os! Se eu estiver errado na
frase, dou liberdade a voc� de me corrigir. Ah, como a
gente gostaria, sim, eu e voc�, de ter pelo menos uma unha
da mediunidade dele!...

119


Por voc� ser uma pessoa de valor, de um potencial
indiscut�vel, eu n�o desejaria que desencarnasse assim,
como, em parte, eu desencarnei. Enquanto � tempo, meu
irm�o, por que n�o tenta um retorno �s origens? N�o sente
saudade daquela �poca?... Se o pr�prio Chico, certa vez,
nos disse em desabafo: � "Eu tenho saudade daquele
Chico Xavier que j� fui!..." Pesado, n�o? A gente tem
vontade de chorar. E, por falar em chorar, voc� chora ainda?
N�o, n�o em p�blico. A s�s, quando se recolhe... Mesmo
assim, com o intuito de auxili�-lo, eu ousaria perguntar
sobre a natureza de suas l�grimas. Engra�ado, quase
ningu�m atenta para a natureza das l�grimas que verte; n�o
obstante, se existem l�grimas-b�lsamo, existem l�grimas-
�cido... H� quem chore de amor; h� quem chore de �dio!...

Venho, pois, apesar dos pesares, hipotecar-lhe a minha
solidariedade; ela n�o vale muita coisa, n�o, mas, em �poca
de escassez, melhor que nada, concorda? Voc� n�o � dos
nossos, mas voc� � nosso!

Ao curioso que, porventura, esteja querendo saber a
quem me refiro nestas linhas, direi que pode ser ele mesmo
ou n�o? Outra vez, Chico Xavier, com a sua sabedoria,
transmitindo li��o de Emmanuel: � "O criminoso �
qualquer um de n�s que foi descoberto".

O personagem desta minha hist�ria de fic��o estar�
encarnado? N�o sei. J� desencarnou ou reencarnar�? E
prov�vel que esteja encarnado, que j� tenha desencarnado
e que ainda v� reencarnar!

120


Bem, na impossibilidade de, como outrora, receb�lo
em minha casa, coloco � sua disposi��o as depend�ncias
do hospital onde presentemente moro, tratando de alguns
pacientes e recebendo tratamento daquele que, um dia, h�
de nos libertar da personalidade falsa que constru�mos, na
m�scara que n�o se nos desagarra do rosto nem a porrete.
Se precisar - note bem, se precisar! -, grite pelo nome, que
tudo farei para n�o decepcion�-lo, reparando poss�veis
preju�zos que, na condi��o de esp�rita desavisado, eu tenha
concorrido para lhe causar, com a minha lisonja e com o
meu aplauso.

121


inha irm�, voc� me escreve, falando de quanto
anda preocupada com o seu filho de 31 anos que, at� hoje,
n�o tomou um rumo na vida: � "Sou m�e solteira, Dr.
In�cio. Criei meu filho sem o pai e tinha que trabalhar fora
para dar conta do recado. Oriente-me. N�o sei o que fa�o.
A culpa ter� sido minha? Ele s� vive em m�s companhias
e at� cigarro de maconha j� encontrei no bolso de uma de
suas cal�as. Dorme at� tarde, n�o se firma em emprego
algum, n�o quis estudar..."

Filha, se voc� tem tido paci�ncia ao longo de todo
este tempo, procure, daqui para a frente, ter paci�ncia em
dobro. Seja como for, embora as suas dificuldades, voc�


tem dado ao seu rapaz os melhores exemplos de dignidade.
Abandonada pelo homem que a engravidou - que deveria
estar na cadeia, pelo duplo crime que cometeu, o de
abandon�-la com o filho que tamb�m pertence a ele -,
voc� nunca descambou para a prostitui��o ou foi relapsa
em suas tarefas de m�e, com deix�-lo crescer ao sabor das
circunst�ncias. Trabalhava, como trabalha, diuturnamente,
para colocar o p�o dentro de casa. N�o perca a esperan�a
de que a boa semente de seus exemplos venha a frutificar.
Por vezes, a terra a que somos chamados a semear n�o �
assim t�o fecunda: falta-lhe um pouco de trator, de arado
que lhe revolva as entranhas...

Em minha lida no Sanat�rio, conheci muitas m�es em
situa��o semelhante � sua. O caso de uma delas me marcou
profundamente. O filho come�ou a beber e virou marginal,
sendo preso diversas vezes. A senhora � qual me refiro
trabalhava a semana inteira, lavando roupas, para, aos
domingos, ir visit�-lo na cadeia, levando-lhe um agrado,
como prova de seu incondicional amor. Conheci o mo�o,
ent�o com quase 40 de idade, cambaleando nas ruas de
Uberaba; ficou internado conosco, mas, quando recebia
alta, voltava a se entregar ao v�cio... Um dia, numa briga
dentro da cela, foi esfaqueado e desencarnou. Atingindo o
�pice, a prova daquela sofrida senhora, com o assassinato
do filho, come�ou a arrefecer.

Um dia, em uma de nossas sess�es medi�nicas, ele
se manifestou atrav�s de nossa irm� Maria Modesto Cravo.
Fui atend�-lo, na condi��o de mero interlocutor. Chorou


muito, desabafou e, depois, come�ou a falar: �- "Dr. In�cio,
leve este recado � minha m�e... Diga-lhe que, finalmente,
ela conseguiu: parei de beber e de roubar! Ela tinha raz�o...
O senhor sabe que a minha m�e nunca me recriminou,
nunca me virou as costas? N�o sei onde ela encontrava
for�as, para n�o desistir de mim! Coitada! Como me
envergonho e me arrependo... Que prova, meu Deus! E ela
s� contava comigo, em sua velhice. Como fui ego�sta! Ah,
como n�s, os filhos, fazemos sofrer as criaturas que, depois
de Deus, s�o as que mais nos amam na vida!..."

No s�bado imediato, procurei D. Sebastiana, numa
tarde chuvosa. Em sua casinha pobre, ela cozinhava feij�o
numa panela de ferro, sobre um fog�o a lenha. Recebeu-
me com alegria e me ofereceu a �nica cadeira que possu�a.
Aos 60, ela aparentava quase 80 de idade, com as rugas
que o cinzel do sofrimento lhe esculpira no rosto.

� Doutor, que surpresa!...
� Vim lhe trazer um recado do esp�rito de seu filho
- expliquei, indo direto ao assunto. � Ele se comunicou
l� no Sanat�rio...
� Como � que ele est�? - indagou-me com aquele
mesmo brilho no olhar. �Ah, que saudades do T�nico!...
�Arrependido, mas pediu-me que dissesse � senhora
que parou de beber e de roubar.

� Gra�as a Deus! - exclamou, juntando as m�os e
caindo de joelhos sobr�o piso de ch�o-batido da cozinha.
� Ent�o, consegui, Doutor?

� Conseguiu, minha filha - respondi, maravilhado
com tamanha f�.
�N�o foi em v�o, n�o foi em v�o - repetia, tr�mula,
como se, ao seu modo, estivesse a orar, agradecida.
Com todo aquele drama, confesso, minha irm�, que
sa� dali profundamente edificado: aquela mulher simples e
sofredora tinha muito mais f� e muito mais amor do que
eu! Nem a morte, que, de fato, n�o existe, a fizera desistir
do filho, um esp�rito dif�cil que renascera por seu interm�dio.

Eu n�o sei se voc� estar� me entendendo.
Determinados n�s c�rmicos n�o se desfazem assim, como
queremos, de imediato; alguns nos requisitam exaustivos
labores, atrav�s das exist�ncias que se sucedem. O
importante � n�o desistir nunca. O amor nos transforma
sem viol�ncia alguma.

Acredite, o meu primeiro impulso, ao ler a sua carta,
seria o de aconselh�-la a deixar esse marmanjo de seu
filho para l�. Eu sei, por�m, que as m�es, a n�o ser que
sejam d�beis, jamais adotam semelhante postura. Conheci
genitoras que chegavam a ser espancadas pelos filhos, av�s
maltratadas pelos netos... Com que facilidade elas tudo
esqueciam e perdoavam! O cora��o das m�es � de diferente
textura do cora��o de todos os mortais!...

Agora, o que seu caso requer � uma orienta��o mais
pr�tica, antes que possa se complicar de vez. Existem duas
atitudes, ou solu��es, � guisa de tratamento, que poder�o
ser propostas a ele. A primeira, sem �nus para a sua
economia escassa e de resultados mais efetivos, � a de


tentar faz�-lo participar de uma atividade esp�rita - no
centro esp�rita-, onde possa receber o benef�cio do passe,
da ora��o em conjunto e, melhorando a auto-estima, sentir-
se �til, integrando-se a esta ou �quela tarefa assistencial
compat�vel com as suas possibilidades. Este trio - passe,
ora��o e trabalho - � uma das mais poderosas terapias
desobsessivas que conhe�o. N�o h� esp�rito obsessor que
ag�ente isto por muito tempo. A segunda provid�ncia, se
ele recusar a primeira, � a de encaminh�-lo a um tratamento
psiqui�trico, com profissional gabaritado, o que, certamente,
ser� dispendioso. O servi�o p�blico de Medicina Psico-
Social, no Brasil, infelizmente, deixa muito a desejar. O
pessoal, malremunerado, vive reclamando, com certa dose
de raz�o, e luta para se harmonizar dentro do quadro de
seus anseios e frustra��es.

No entanto, minha irm�, pela minha experi�ncia, �
prov�vel que o seu rapaz n�o aceite uma coisa nem outra.
Aos 31 de idade, pela vida que segue levando, na melhor
das hip�teses, ele j� viveu metade da exist�ncia na atual
encarna��o. Sendo assim-espero que n�o seja-, somente
lhe restar� aguardar pela interven��o do Alto e preparar-se
para ela, a fim de que voc� mesma n�o venha a aborrecer-
se com Deus. Alguns esp�ritos, por exemplo, acabam, por
m�rito direto ou indireto, merecendo uma doen�a (grifei)
que os resgate da quase completa inutilidade espiritual,
evitando que a patologia ps�quica que adquiriram se lhes
cronifique. � por este motivo que muitos v�o para a cadeira-
de-rodas, para o leito, em que se imobilizam por v�rios


lustros, recebendo no corpo o rem�dio que, na verdade, se
lhes destina ao esp�rito.

Desculpe-me se, nestas palavras em resposta � sua
missiva, existe mais verdade do que consolo. Em um
homem como eu, mesmo quando abre o cora��o, � o c�rebro
que lhe toma a dianteira dos sentimentos.


uerido Dr. In�cio, quero dizer que sou
sua f�... N�o se preocupe, o meu marido n�o tem ci�mes.
Tamb�m pudera, n�o �? Quero dizer que, como o senhor,
adoro gatos: tenho dois lindos angoras, em minha casa. A
hist�ria da Mimi, que o senhor conta em "Funda��o
Emmanuel", � verdadeira? Fiquei comovida... Os animais
sobrevivem e tamb�m procriam, al�m da morte? Eu acho
l�gico e de acordo com a Sabedoria Divina, mas tenho
ouvido tanta coisa! Poderia nos falar algo mais a respeito?"


Cara amiga, de fato, n�o teria cabimento o seu marido
ter ci�mes de mim. Era s� o que me faltava! Agrade�o as
suas palavras t�o gentis e a elevada considera��o em que
tem este seu servidor. Ter meia d�zia de amigos sinceros


� uma riqueza! Estou consciente de que nada fiz e nada
fa�o para merecer tamanha considera��o.

Sim, a hist�ria de Mimi � ver�dica. Por que os animais,
em maioria, seres t�o admir�veis, n�o haveriam de
sobreviver al�m da morte? Em que somos assim t�o
diferentes deles? F�ssemos n�s o Criador, negar-lhes-�amos
direito � imortalidade? A vida de Al�m-T�mulo, sem as
gra�as da Natureza, n�o teria nenhum encanto. Eu n�o
consigo conceber a Cria��o Divina sem flores e p�ssaros,
sem fontes cantantes deslizando por entre vales apraz�veis
e sem a m�sica do vento penteando a cabeleira dos campos,
e, � claro, sem os nossos gatos!

Deste Outro Lado - n�o sei entre as estrelas, em que
tanta gente, ainda encarnada, parece ser mais versada do
que eu -, na dimens�o em que me situo, a vida � quase
c�pia da vida que deixamos a� embaixo... Ali�s, em
linguagem doutrin�ria correta, a exist�ncia f�sica � que copia
a espiritual. A vida n�o vem da Terra para o Al�m, conforme
as religi�es tradicionais ensinavam aos seus adeptos ensinavam
e continuam ensinando, obtusos em seus
conceitos, cada vez mais ultrapassados em confronto com
a Ci�ncia. A vida, de acordo com a moderna concep��o
esp�rita, se projeta do Al�m para a Terra, ou seja, vai do
Espa�o C�smico, onde possui sua g�nese, florescer em
regi�es �ridas e in�spitas!

Tente acompanhar o meu racioc�nio. Digo assim por
defici�ncia minha em expor o que pretendo. Para n�s, os
domiciliados no Plano Espiritual, ele � f�sico, entendeu? O


nosso Plano Espiritual fica um pouco mais acima... E,
conseq�entemente, para os que l� j� se encontram, onde o
esp�rito se despojou da forma humana, transcendendo-a, o
que denominamos Plano Espiritual � inconceb�vel mesmo
para n�s, os desencarnados. A Vida � uma escalada de luz!

No entanto, por aqui e mais abaixo, repito, as
altera��es, no que tange a horizonte e paisagem, valores e
concep��es, h�bitos e cultura, s�o m�nimas, percept�veis
apenas �queles que, mentalmente, se situam noutro patamar
de compreens�o e lucidez. N�o se espante, mas a Terra,
em plena Idade M�dia, ainda existe, nas entranhas do pr�prio
orbe! Em rela��o a voc�s, os encarnados, h� quem, j� tendo
morrido, viva no passado ou no futuro. Por exemplo, as
dimens�es situadas acima da Crosta representam-lhes o
futuro; as chamadas subcrostais, o passado...

Vamos, por�m, ao que interessa, na tentativa de
responder �s suas argui��es. Em nosso habitat espiritual,
nas vizinhan�as da Terra, contamos com esp�cies vegetais
e animais que voc�s desconhecem e que n�s igualmente
desconhec�amos; esp�cies que aqui nascem, crescem,
reproduzem-se e... morrem! Sim, morrem, liberando-se
do envolt�rio de sua manifesta��o. Se voc� me permite,
transcreverei algo do fabuloso livro "Cartas de uma Morta",
de Maria Jo�o de Deus, que o m�dium Chico Xavier
psicografou h� 70_ anos! Veja bem: verdades que se
encontram � disposi��o dos esp�ritas h� sete d�cadas: "�
que a vida n�o palpita, apenas, no mundo distante, onde
abandonastes as vossas derradeiras ilus�es: em toda parte,
ela pulula triunfante e o ve�culo de suas manifesta��es � o


que se diversifica na multiplicidade de seus planos ".
(grifei) Em ess�ncia, morrer � isto: simplesmente trocar
de corpo! A gente vai trocando de corpo, at� perd�-lo por
completo, alcan�ando, ent�o, a condi��o de esp�ritos puros.
Mas, sinceramente, s� de pensar, me d� uma pregui�a
danada... Quanto mais morte, mais vida!

Voc� me questionou sobre a Mimi, por�m,
aproveitando o ensejo, eu quero lhe falar sobre um gato
safado de nome Perneta. Ele aparece no livro "Obsess�o e
Cura". N�o se trata de propaganda, mas, quem sabe, pode
ajudar a desencalh�-lo, n�o �? Futuramente, se o m�dium
n�o desencarnar, est� em meus planos escrever sobre o
que lhe passo em primeira m�o. Com o aux�lio de alguns
amigos meus, os impropriamente chamados de "element�is",
consegui, depois de muita procura, localiz�-lo deste Outro
Lado. Que gato lindo e inteligente! Quando ele me viu,
bem mais domesticado do que sempre pude v�-lo e mais
crescido, aproximou-se, ronronou, esgueirando-se-me por
entre as pernas, e lambeu-me as m�os. Era, se assim posso
me expressar, um Perneta muito mais espiritualizado!
Adotei-o de novo e ele ficou morando comigo por alguns
anos, at� que chegou a sua hora... Acometido por um
problema card�aco, Perneta desencarnou por aqui, para
reaparecer por a�, na condi��o - pasme! - de pequeno
chimpanz�! O seu princ�pio inteligente deu um salto, e que
salto! Fui v�-lo, em esp�rito, na floresta em que vive com
a fam�lia. Fitei-o demoradamente nos olhos e percebi que
ainda eram os olhos de um gato, com a diferen�a de que,

131


agora, as suas pupilas procuravam as minhas, trocando a
perspic�cia por rudimentos de racioc�nio.

Ent�o, minha cara, a coisa est� a� e, digo-lhe, � pegar
ou largar. Quanto ao que voc� afirma estar ouvindo, eu
nada posso fazer. Como diz um amigo, � melhor ouvir
certas coisas do que ser surdo, n�o �?

Eu n�o me preocupo. Se me preocupasse, n�o estaria
aqui, respondendo a sua carta, aparentemente colocando
mais lenha na fogueira, para g�udio dos inquisidores que
se encontram reencarnados na Doutrina, loucos para fazerem
de mim um churrasco.

Discordar por discordar � sempre f�cil; no m�nimo,
os contestadores devem se sentir obrigados a apresentar
uma teoria, digamos, mais consent�nea com os nossos
princ�pios. O pior � que eles n�o sabem dizer nem por que
n�o concordam... Que turminha fraca, meu Deus! A Cria��o
Universal � t�o mais estonteante do que sup�em em seus
racioc�nios t�o t�midos. O Espiritismo est� apenas
come�ando... De fato, o que vem por a�, esta gera��o n�o
tem cabe�a para ag�entar!...

Com os meus respeitos a voc� e ao senhor seu marido,
hasteando a bandeira branca da paz, rogo que o Divino
Mestre continue a lhes aben�oar o lar e a fam�lia,
especialmente os filhos de seus filhos, nos quais, em
verdade, est� encerrada a semente do Amanh�!

Ah, sim! quanto � Mimi, na velocidade com que as
coisas acontecem por a� e muito mais por aqui, devo
informar a voc� que ela j� � trisav�!


In�cio, quando poss�vel, fale-nos
algo sobre as ocupa��es dos esp�ritos. Como voc�s vivem?
O que fazem? Est�o sempre aqui conosco, na Terra? T�m
permiss�o para tanto ou condi��o?"


As suas perguntas, minha irm�, aparentemente
simples, s�o curiosas, e tenho recebido muitas cartas neste
sentido. E cada vez maior o n�mero de pessoas que querem
saber como n�s realmente vivemos. Note que procurei dar
�nfase � palavra realmente.

N�o � t�o simples assim uma resposta satisfat�ria �
sua pergunta. O homem ainda acredita que, do lado de C�,
seja o mundo do sobrenatural ou do imagin�rio delirante.


Neste sentido, repito o que disse alhures, mesmo os
esp�ritas, com a vasta literatura � sua disposi��o no mundo,
sabem pouco; ali�s, n�s pr�prios, os desencarnados,
sabemos pouco, pouqu�ssimo, quanto � vida dos esp�ritos
nas Dimens�es Mais Altas.

Onde presentemente nos situamos, temos uma vida,
intensa e absorvente, a ser vivida, com requisi��es comuns
de trabalho e aprendizado. Temos uma vida social por
aqui, sem tantas futilidades, mas temos. Eu n�o sei por
que vida social tem que ser sin�nimo de vida sem
ocupa��es mais s�rias, que interessam � comunidade. At�
de nossos instantes de lazer procuramos extrair algum
proveito, efetivamente conferindo uma utilidade a tudo.
Lazer, por aqui, n�o se traduz por ociosidade. Conscientes
da import�ncia do tempo, envidamos esfor�os no sentido
de aproveit�-lo ao m�ximo. O esp�rito que desperta para
as suas necessidades de aprimoramento n�o descansa mais.
O Espiritismo faz isto com a gente, n�o? Descruzamos,
delicadamente, os bra�os e se nos descortina a vis�o imensa
do campo de trabalho.

Quando na carne, recostando-me por instantes numa
poltrona, a consci�ncia come�ava a me falar, � semelhan�a
de uma voz que, aos poucos, fosse se alteando at� quase
bradar aos meus ouvidos: � "Vamos, In�cio, levante-se!
Deixe de ser in�til... Com tanto a ser feito e voc� a�? Saia
dessa pachorra, que a nada o levar�. Vamos, ponha a sua
imagina��o para funcionar. N�o d� trela �s ilus�es. Breve,
breve, voc� h� de se arrepender de cada minuto ocioso..."


As vezes, eu n�o tinha outro recurso sen�o me levantar
e pegar um livro para ler, rascunhar algum artigo ou mesmo
voltar ao Sanat�rio, para mais uma vista d'olhos nos
pacientes. De outras, confesso-lhe, mentalmente preparava
uma seringa, a maior que pudesse imaginar, enchia-a de
anest�sico e, mirando bem em suas n�degas - as da
consci�ncia-, injetava at� o �ltimo ml... Ent�o, por fim, eu
podia ficar � toa, � vontade, sem nada e ningu�m para me
incomodar. O problema � que, depois, vinha o remorso...
Quando, entre um ui e um ai (depois de certa idade, s�o
estas as nossas notas musicais!), eu me levantava e olhava

o rel�gio, indo, de imediato, lavar a cara toda amarrotada,
analisando, no espelho, os meus olhos empapu�ados, eu
dizia: � "�, In�cio, voc� n�o tem mesmo vergonha...
Enquanto Chico Xavier dorme apenas 3, 4 horas por noite,
voc� dorme todas as horas da noite e quer dormir algumas
horas do dia! Agora n�o adianta correr: voc� j� perdeu um
temp�o... S� para se livrar dessa ressaca, gastar�, no
m�nimo, mais uma hora..."
Ent�o, minha irm�, essa hist�ria de descanso eterno �
balela! Ningu�m venha para c� pensando em aposentadoria,
coisa e tal. Nas Esferas Inferiores � que se trabalha pouco
- o trabalho por l�, sim, � mais pesado, grosseiro. Todavia,
do n�vel da Crosta para cima, intensifica-se-nos o trabalho
intelectual; o pensamento pouco descansa ou n�o descansa
nada. E pensar e agir, o tempo todo! Se, a� embaixo, a gente
respira pelas narinas, aqui � pelo pensamento... Quem p�ra
de pensar morre!


Estamos, sim, sempre com voc�s, mais ou menos da
mesma maneira como procuram estar conosco. Tente
imaginar uma coisa perto e longe... Um filho seu, por
exemplo, que tenha ido morar no Exterior. Espiritualmente,
para voc�s dois, ele nunca se ausentou de casa, certo?
Quanto mais longa a dist�ncia, mais intenso o sentimento
que os entrela�a. Fisicamente, por�m, a verdade � que ele
est� a milhares de quil�metros, que n�o poder�o ser
transpostos assim.

Vejamos se consegue entender. Para que nos
movimentemos na superf�cie da Crosta, com possibilidade
de maior aproxima��o de voc�s, quase que necessitamos
de nos tangibilizar. A vida nas diferentes dimens�es � assim:
uma quest�o de pouco mais ou pouco menos de mat�ria!

H� um livro da lavra medi�nica de Chico Xavier,
com o sugestivo t�tulo: "Astronautas do Al�m". � mais ou
menos por a�... N�s, os esp�ritos que deliberamos viver
nas proximidades da Crosta, carecemos, figuradamente,
de nos meter numa esp�cie de roupa espacial, para
respirarmos livremente e atuarmos com o desembara�o
poss�vel.

Muitos, quando desencarnam, ainda n�o
completamente libertos dos fluidos mais pesados, logram
permanecer entre voc�s com maior facilidade; � medida,
por�m, que efetivamente se desmaterializam, distanciam-
se.

Vamos a uma outra compara��o: imaginemos uma
escada constitu�da por sete degraus. ..01.� degrau de ferro,


o 2.� de chumbo, o 3.� de madeira, at� chegarmos ao 7.�, de
cristal. Quem se situa, por exemplo, no degrau de madeira,
pode falar a quem se demore no degrau de ferro, mas, sem
se transfigurar, n�o pode descer a ele. � lei do Universo.
Raciocinando por este prisma, voc� j� imaginou quantas
dimens�es o Cristo teve que atravessar para corporificarse
entre n�s? O tamanho da dist�ncia c�smica percorrida
por Ele d�-nos id�ia do tamanho de sua ren�ncia!
� por este motivo, minha irm�, que algu�m, n�o sei
onde nem quando, disse, inspiradamente: "Deus atende a
criatura atrav�s da pr�pria criatura". Na obra da
Codifica��o h� uma coloca��o semelhante. Deu para
entender a car�ncia que temos de m�diuns no mundo? Sem
eles, os sensitivos, ficar�amos isolados. Estou me referindo
� mediunidade com amplitude e n�o convencionalmente.
O m�dium das boas id�ias, por vezes, nos � mais �til do
que aquele que, limitando-se em suas faculdades, se disp�e
apenas a incorporar ou psicografar.

N�o sei se lhe forneci as respostas solicitadas. N�o
se esque�a, todavia, de que n�o estou, nestas linhas, com
a abnega��o de quem, sendo madeira, se disp�e a revestir-
se de ferro, passando do 3.� para o 1.� degrau.

Como um jogador de basquete, nada ex�mio, diga-se
de passagem, arremesso o meu pensamento no espa�o, na
esperan�a de que consiga "encest�-lo" na cabe�a do
m�dium.


eu caro, as perguntas que voc� me enviou
foram tantas, que, a rigor, para respond�-las, eu teria que
escrever um op�sculo, o que, presentemente, se me faz
impratic�vel. Em aten��o, por�m, ao seu interesse de "leitor
ass�duo" de nossas obras de cunho medi�nico, tomei a
liberdade de refundir as quest�es, suprimindo algumas e
acrescentando outras, para unific�-las por assunto, dentro
da praticidade que nos far� ganhar tempo, a mim e a voc�.


Assim, vamos ao nosso r�pido "bate-papo", como
duas pessoas que conversassem num botequim. Fa�o
quest�o de que seja num botequim, j� que foi para l� que
me mandaram com o nosso "Fala, Dr. In�cio!". De minha
parte, bebericando alguma coisa - �gua t�nica ou soda


limonada-, estarei muito bem instalado. Voc� pe�a o que
quiser, que o m�dium pagar� a conta por n�s.

� Dr. In�cio, das obras de sua lavra espiritual, qual
a sua preferida?
�A minha obra preferida ser� aquela que ainda vou
escrever, n�o sei quando.

� Quando conclui um trabalho medi�nico, o senhor
se d� por satisfeito?
�N�o plenamente. Sinto que ainda podemos avan�ar
no que tange � filtragem - muita coisa fica para ser dita ou
� dita pelas metades. Note bem: a defici�ncia de
transmiss�o � minha e do m�dium... N�o crucifiquem o
coitado sozinho! Em termos de comunicado de Al�m-
T�mulo, o desencarnado necessita igualmente se esmerar.

� O senhor apontaria em seus livros uma falha
gritante?
� Doutrinariamente, n�o e desafio quem o fa�a.
Agora, perfeitos eles n�o s�o. Se os reescrevesse, em todos
promoveria algum retoque, procurando aclarar o
pensamento.
� Considera-se um esp�rito revelador, uma esp�cie
de Andr� Luiz?
� Quem me dera! Meu filho, eu sou o engraxate de
Andr� Luiz, e com muita honra.

� O senhor � assim como �, ou faz tipo?
� Nem eu sei. A �nica coisa de que tenho absoluta
certeza � que n�o desejo mal a ningu�m. Se algu�m se
sente magoado ou ofendido com o que escrevo, n�o era a
minha inten��o. No entanto, a suscetibilidade ferida conv�m
ser examinada; pode estar colocando � mostra sentimentos
que gostar�amos de continuar ocultando de n�s mesmos...
� Submete o que escreve � triagem espiritual de
algum mentor?
� O Manoel Roberto costuma ler, a Modesta, o
Odilon... Dos mentores aos quais se refere, eu n�o estou
t�o perto assim. Uma coisa lhe digo: o dia em que me
chegar uma contra-ordem de cima, eu paro!
�A gente percebe que o Dr. Odilon vive tentando
control�-lo...

� No que lhe sou profundamente agradecido. A
metade da metade, que, em seguida, pode ser dividida por
dois, dos esp�ritos que escrevem para a Terra, apresentando-
se na condi��o de mentores, n�o o �, inclusive eu! E da�?
Espiritismo n�o � feito s� de mentor e de m�dium
mission�rio.
� Quando pretende reencarnar?
� Tem gente com pressa de que isto aconte�a, mas
eu vou tranq�iliz�-los: nos pr�ximos 100 anos, pretendo
estar por aqui! E, depois, por melhor a proposta, a vida na
140


Terra n�o est� nada animadora. Na atualidade, isso a� �
nadar contra a correnteza...

� O Hospital dos M�diuns, afinal, � dirigido pelo
senhor ou por Eur�pedes Barsanulfo?
� Por Jesus Cristo!
� Qual � o seu verdadeiro nome?
� Qual � a cor de uma casa, cuja fachada � azul, as
paredes laterais externas s�o verdes, a sala-de-estar � rosa,
os quartos s�o brancos?... Todas as virtudes t�m uma m�e
em comum - a Caridade!
� O senhor j� se sentiu atra�do para escrever por
outros m�diuns?
� Por enquanto, n�o. Mas vou logo avisando: n�o
sou propriedade exclusiva de algu�m, nem tampouco
propriet�rio! Acho que deu para entender, n�o �?
� � In�cio ou Ignacio?
� Eu c� tenho cara de Ignacio?!...
� Na "Escala Esp�rita" ("O Livro dos Esp�ritos",
item 100), onde � que se situa?
�Acho que nem entrei nela, ainda.

� Se fosse um pouco mais s�rio, os seus livros n�o
seriam mais bem aceitos?

� Para fazer sucesso, eu jamais deixaria de ser eu
mesmo. Na minha opini�o, os nossos livros est�o indo
al�m da minha expectativa.
� O senhor considera que esteja "humanizando" o
Mundo Espiritual?
� N�o; no m�ximo, talvez, devolvendo alguns
esp�ritas � lucidez que eles perderam... N�o � o Mundo
Espiritual que precisa se humanizar: � o Movimento
Espirita!... A vaidade, em nosso meio, est� virando uma
praga. Haja inseticidas!
� � contra as Federa��es?...
� N�o; sou contra os cardeais, travestidos de
federados... Todavia, h� muita gente boa sufocada no meio.
�Considera mesmo que o Movimento Esp�rita esteja
elitizado?

� Reencarnarei gritando contra isto... � claro que
est� elitizado! Mas se n�o estivesse, para que nunca viesse
a estar, continuaria gritando. Algu�m tem que fazer o papel
de bobo-da-corte, n�o �? Enfim, como diz um amigo, "tudo
pela s� Doutrina"...
�As suas considera��es finais.

�E u n�o as tenho. Apenas, se me permite, repetirei
velho chav�o: "No fim, d� certo. Se n�o deu certo, � porque
ainda n�o chegou o fim" - o que � extremamente confortador
para ambos os lados.


ecebi, meu caro, o seu xingat�rio. Fiquei
impressionado, confesso, com o seu arsenal de palavras
para ofender. Uma coisa, por�m, devo reconhecer: voc�
escreve bem - pelo menos, o texto � limpo! O mesmo,
infelizmente, n�o posso dizer de sua cabe�a. Admirei as
suas frases curtas, com v�rgulas bem postas. Eu sempre
tive grande dificuldade para virgular; n�o fosse a
prestimosa colabora��o do amigo Prof. Fausto De Vito, os
meus escritos seriam ileg�veis. Para qualquer escritor, um
bom revisor vale o seu peso em ouro.

Desculpe-me decepcion�-lo com esta carta branda.
Voc� me pegou numa boa hora e n�o sinto a m�nima vontade


de "dar a voc� qualquer cartaz". Convido-o a utilizar a sua
habilidade liter�ria, no sentido de produzir algo construtivo.
N�o conhe�o uma �nica obra sua no mercado livreiro.
Ter� escrito alguma monografia, uma apostila que seja,
sobre um tema doutrin�rio edificante? Ou a sua inspira��o
s� funciona quando se trata de denegrir? Militei no
Movimento Esp�rita durante d�cadas e, depois de morto,
continuo militando, mas nunca ouvi falar em voc�. Que
apito voc� sopra na Doutrina? Qual � o seu curr�culo de
tarefeiro?

Dizem que conselho, se fosse bom, seria vendido; no
entanto, mesmo assim, arrisco-me a dar-lhe um, na condi��o
de m�dico: n�o se irrite tanto, n�o! Voc� pode acabar sendo
acometido por um insulto cerebral... Lembre-se: na Lei de
Causa e Efeito, � insulto por insulto. Mantenha a calma.
Se n�o consegue parar de xingar, tome, a cada novo
xingat�rio, um Diazepan ou um Rivotril. Propaganda de
gra�a para os laborat�rios? N�o, eu vou querer a minha
parte; podem encaminhar l� para o Sanat�rio Esp�rita, que
est� precisando de uma caia��o no pr�dio... Auscultando

o pulsar de seu cora��o em suas palavras, fiquei, deveras,
preocupado com a sua press�o arterial, em constante sobe
e desce. N�o quero ser respons�vel por nenhuma morte.
Um cad�ver - eis tudo que me falta, para me complicarem
ainda mais! Prefiro continuar como Odorico Paragua�u, da
famosa novela de Dias Gomes, "O Bem-Amado", que n�o
conseguia defunto para inaugurar o cemit�rio da cidade.

Ap�s o conselho m�dico, vem o doutrin�rio: n�o
teorize tanto! Deste Outro liado, a primeira coisa que
haver�o de lhe perguntar ser�: Quantos calos tem nas m�os?
Vai ser um vexame, voc�, esp�rita h� 30 ou 40 anos, n�o
sei, estender as m�os para exame sem sequer um her�ico
calozinho! Calos na l�ngua, n�o vale - tem que ser nas
m�os!... Voc� os t�m? Se, aos quase 70 ou 80, ainda n�o os
obteve, eu vou lhe dar uma dica: esfregue um peda�o de
tijolo na palma das m�os... Vai doer um pouquinho, mas,
para livr�-lo das trevas, � de gra�a! Esfregue, mas esfregue
com vontade, porque, nas alf�ndegas do Al�m, tem
especialista em identificar falcatruas. Se perguntarem a
voc� onde adquiriu tais calos, n�o vacile: explique que
carregava tachos de sopa fervente no centro, para as
criancinhas... N�o venha com essa hist�ria de escritor,
etc�tera e tal. Dirigente esp�rita, m�dium, orador e escritor
que, desencarnados, chegam da Terra s�o imediatamente
colocados sob observa��o:

Veja que n�o lhe guardo nenhuma m�goa. Ensinando
a voc�, moralista confesso, semelhantes truques de lud�brio,
estou me expondo ainda mais. J� at� posso v�-lo,
desesperado, tirando diversas c�pias desta minha resposta
e remetendo-as aos centros esp�ritas do Brasil ou exibindo-
as pela Internet. N�o tem import�ncia. "O Evangelho
Segundo o Espiritismo", em seu cap�tulo XIII, me conforta:
"Benef�cios pagos com a ingratid�o".

�, meu caro, a coisa n�o � t�o simples assim quanto
parece. Ser esp�rita � mais que uma profiss�o de f� - � dar

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um sentido diferente � pr�pria vida. A luta � mais interna
do que externa. O campo de batalha somos n�s mesmos,
em que o eu verdadeiro peleja contra o ego... Como disse
Jesus, o Reino Divino n�o surgir� com manifesta��es
exteriores. Em minhas palestras (modo de dizer, pois nunca
fui orador), eu costumava comparar a Doutrina a uma m�e
que despia o filho adulto diante do espelho, para que ele
contemplasse a sua pr�pria imagem sem distor��es.
Efetivamente, � o que o Espiritismo faz com a gente: uma
sess�o de strip-tease, sem plat�ia, � �bvio, e sem direito
algum � sensualidade. Acaso, voc� j� se viu, septua ou
octogen�rio, completamente nu no espelho? N�o � uma
coisa horrorosa, tudo em ru�nas? N�o! Pois eu j� me vi.
Trata-se de um excelente exerc�cio de realidade. Observe-
se nas pregas amareladas e desidratadas de sua pele, na
flacidez de seus m�sculos e mamas, nas suas coxas, antes
atrativas para o sexo oposto, agora finas, quase da grossura
das pr�prias canelas, nas suas n�degas doloridas, que
reclamam almofadas sobre as cadeiras, na sua falecida
genit�lia... Voc� est� quase morto e n�o sabe ou n�o quer
saber. Verifique, pois, enquanto � tempo, o que tem na
mala; n�o, n�o me refiro a voc�, "mala sem al�a", como o
povo costuma tro�ar consigo mesmo. Refiro-me �quela,
nunca maior do que o pr�prio cora��o, que, n�o obstante,
� capaz de conter toda a ess�ncia da vida e de sua vida em
particular. Quais s�o os seus sentimentos? As suas mais
rec�nditas inten��es? Se voc� os descobrir -o que �
prov�vel -, lance fora os trapos do orgulho, do ego�smo,


da vaidade... Depressa, livre-se dessa tranqueira toda, que

o comboio j� vem surgindo na curva! Mesmo n�o querendo
embarcar, voc� ser� sugado, abduzido - para me valer de
uma express�o mais moderna.
Sabe, �s vezes, tenho a impress�o de que n�s, seres
humanos, somos um bando de crian�as com estilingues
nas m�os, brincando de Davi contra Golias. S� que, n�o
sendo, como Davi, guiados por Deus na pontaria,
estilingamos pedras para todos os lados.

Recordo que meu pai, homem severo, um dia, porque
eu vivia ca�ando calangos e lagartixas, arrebentou um
estilingue nas minhas pernas. Voc� j� apanhou assim? D�i,
d�i!... Desde ent�o, perdi a voca��o de estilingar, trocando
a funda de Davi pelo escudo do filisteu. � por este motivo
que todo o mundo quer cortar a minha cabe�a e exibi-la
numa estaca - inclusive voc�.

Deixo-lhe, nestas linhas, consignado o meu abra�o,
agradecendo por voc� ter me reduzido, em seu xingat�rio,
�quilo que realmente sou: p�! De quando a quando, � bom
ouvir o que a gente tende a esquecer a seu pr�prio respeito.
E, se n�o for lhe pedir muito, continue. D�i, d�i, mas faz
um bem danado.

Infelizmente, eu sou daqueles que, com um simples
elogio, come�o a rebolar e, vedete desastrada, trope�o nas
pr�prias pernas, emborcando-me ao ch�o, com bolsa e
sapatos vermelhos de verniz e tudo mais que comp�e a
indument�ria de uma vedete que se preza.

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inha irm�, voc� me escreve, dando not�cia de
que, na capital de seu Estado, alguns dirigentes andaram
proibindo a circula��o de obras minhas nos centros
esp�ritas. � "Dr. In�cio, � um absurdo, um verdadeiro
atentado contra a liberdade de pensamento... O que o senhor
tem a dizer? Sofri muito na �poca da ditadura militar, v�rios
amigos meus (sou professora aposentada) simplesmente
desapareceram. N�o � poss�vel que isso esteja
acontecendo, numa Doutrina de vanguarda como a nossa.
Por favor, manifeste-se. Ningu�m fala nada. O senhor n�o
acha que o esp�rita, de maneira geral, � muito passivo,
subserviente?"



J� me haviam dito, sim, que o famigerado AI-5 est�
de volta, fazendo agora os seus estragos nas fileiras
esp�ritas. Ainda bem, minha irm�, que n�o estamos no poder,
pois voc� imaginou se estiv�ssemos? Far�amos muito pior
que a ditadura militar no Brasil, a partir do golpe de 64,
Disto, n�o tenho a menor d�vida. Temos, no Espiritismo,
muito lobo travestido de ovelha.

N�o quero e n�o devo defender as obras de nossa
lavra medi�nica. N�o fica bem ser advogado em causa
pr�pria, voc� n�o acha? A quest�o, por�m, � que a coisa
pode come�ar a se generalizar, passando a se estender a
outros m�diuns e autores.

No epis�dio, a minha rea��o � um tanto contradit�ria.
Veja se voc� me entende. Lamento, mas, por outro lado,
fico feliz. Lamento, porque, em verdade, significa enorme
retrocesso. A nossa Doutrina, sobretudo, pugna pela
liberdade de pensamento e de express�o. Cassar o direito
de um vivo ou de um morto expor as suas id�ias, no Terceiro
Mil�nio da Era Crist�, � algo inconceb�vel. Bem sei que
Voltaire sustentou: "N�o concordo com uma s� palavra do
que dizeis, mas defenderei, at� � morte, vosso direito de
diz�-lo".

Vamos � minha segunda rea��o: a de felicidade. Ora,
desde os tempos de Ad�o e Eva, o homem amou o
proibido... O sentimento de justi�a, inato nas criaturas, se
rebela contra esse estado de coisas, no que se nos quer
impor "goela abaixo". Veja, por exemplo, o epis�dio do
chamado "Auto-de-F� de Barcelona", ocorrido em 9 de

149


outubro de 1861, quando cerca de 300 volumes esp�ritas
foram incinerados em pra�a p�blica, por ordem do Bispo
Antonio Palau y T�rmens, sob medieva justificativa: "A
Igreja Cat�lica � universal, e, sendo esses livros contr�rios
� moral e � f� cat�lica, o Governo n�o pode permitir que
eles pervertam a moral e a religi�o dos outros pa�ses".
Deu no que deu: os livros viraram cinzas e as id�ias que
encerravam, luz mais intensa ainda! O pr�prio Codificador
exultou, escrevendo nas p�ginas da "Revue Spirite": "Se
examinarmos este processo do ponto de vista de suas
conseq��ncias, desde logo vemos que todos s�o un�nimes
em dizer que nada podia ter sido mais �til para o Espiritismo.

A persegui��o foi sempre vantajosa � id�ia que se quis
prescrever (grifei); por esse meio exalta-se a import�ncia
da id�ia, chama-se a aten��o para ela e faz-se que seja
conhecida daqueles que a ignoravam. Gra�as a esse zelo
imprudente, todos na Espanha ouvir�o falar de Espiritismo
e querer�o saber o que ele �, e isto � o que desejamos."

"Podem queimar livros, mas n�o se queimam id�ias;
as chamas das fogueiras as superexcitam, em vez de
extingui-las. Ademais, as id�ias est�o no ar, e n�o h�
Pireneus bastante elevados para det�-las; e, quando �
grande e generosa uma id�ia, encontra milhares de cora��es
dispostos a almej�-la. Fa�am o que quiserem, o Espiritismo
j� possui numerosas e profundas ra�zes na Espanha; as
cinzas dessa fogueira as multiplicar�o. N�o � s� na Espanha,
por�m, que se obter� esse resultado: os efeitos de
repercuss�o do fato o mundo inteiro os sentir�."

150


E, arrematando, proclamou:

"Esp�ritas de todos os pa�ses! N�o olvideis essa data
de 9 de outubro de 1861. Ela ficar� memor�vel nos fastos
do Espiritismo e que seja para v�s um dia de festa, n�o de
luto, porque constitui o penhor do vosso pr�ximo triunfo!"

Antes que de algo me acusem (o pessoal anda de
esp�rito t�o armado, que n�o nos permite nem concluir a
frase), deixem-me admitir a minha condi��o de reles inseto
-n�o estou estabelecendo compara��o nenhuma. A minha
insanidade n�o chega a tanto!

O agravante s�rio, patol�gico, que pressinto no caso,
minha irm�, � que o esp�rita, de perseguido, est� passando
a perseguidor. Trata-se de um processo autof�gico, que,
no m�nimo, requer mais profunda anamnese, para que se
chegue a um diagn�stico. Eu n�o sei se, simplesmente,
podemos apontar como causa a inveja e o ci�me. Para
mim, o dedo escuro das trevas est� presente. Em suas
tenebrosas malhas, In�cio e outros s�o peixes pequenos,
an�nimos alevinos - querem apanhar em suas redes o
excelente pescado do Espiritismo!

Para que voc� veja o tamanho da convic��o de certos
esp�ritas, um jornal ou uma publica��o qualquer, uma
revista, por exemplo, n�o divulga, em suas p�ginas, tal ou
qual obra de sua lavra, que diz contestar, desde que a
editora n�o pague pela sua publicidade. Se pagar pelo
espa�o, eles se vendem e o ideal vai para as cucuias! Quem
� que vai ter a coragem de dizer que estou mentindo?
Infelizmente, quase todo o mundo tem um pre�o. Quando

151


se trata de criticar um "medalh�o", ningu�m tem coragem
de lhe citar o nome, mas, se se trata de um pobre coitado
como este companheiro... Hipocrisia pura! Os vendilh�es
continuam em atividade no templo...

Desculpe-me, minha irm�, a escorregadela. Prometo
a mim mesmo me comportar, mas, na hora H, vai me subindo
um calor - do tipo desses que as mulheres sentem na
menopausa - e, quando percebo, o sangue est� fervendo
nas veias. � muita cara-de-pau dessa gente, voc� n�o acha?
N�o � � toa que Chico, em momentos de desabafo, dizia
que o que estraga o Espiritismo s�o os esp�ritas. � l�gico
que, como eu, ele n�o generalizava - poupava uma meia-
d�zia!

Finalizando, digo-lhe: o dia em que algo for censurado
oficialmente pelo Espiritismo, estarei fora! Vou ser
umbandista, mas vou ser mais aut�ntico. A �nica coisa
que nos merece combate sistem�tico � o Mal, com todas
as suas deriva��es, atrav�s da nossa viv�ncia no Bem.

Voc� se lembra do verso de uma can��o popular:
"...vida de gado, povo marcado, povo feliz..."? Pois �. O
esp�rita precisa largar de pensar com a cabe�a dos outros,
de ser massa de manobra dos que usurpam o poder. N�o
seria o caso de questionarmos: � Que poder?... S� se for

o que emana da coroa do "rei da cocada preta"!...
152


In�cio, sou m�dium, mas sinto reais
dificuldades no que tange � sintonia. Em certos dias, estou
bem; em outros, n�o, com dificuldade para captar o
pensamento dos esp�ritos. O que o senhor tem a me orientar?
As vezes, penso em parar com tudo. Eu n�o fazia id�ia de
que ser m�dium fosse lutar tanto, em duas frentes versas
de combate; sim, porque, al�m de nossas pr�prias
limita��es, temos que nos haver com a cr�tica implac�vel
dos que nos exigem perfei��o..."


Meu amigo, devo dizer a voc� que, na condi��o de
m�dium do Al�m para Terra, uma esp�cie de m�dium �s
avessas, eu me identifiquei muito com a sua carta. As suas


impress�es s�o quase id�nticas �s minhas. O esp�rito
comunicante tamb�m est� sujeito a oscila��es de natureza
emocional e psicol�gica, em contato com os encarnados; a
menos, � claro, que, por obra da evolu��o, j� tenha
transcendido tais sentimentos...

Deste Outro Lado da Vida, n�o pense voc� que
estejamos dispensados de perseverar nas atividades que
nos dizem respeito: temos, cotidianamente, lutas e desafios
a serem superados. � assim com a quase totalidade de n�s
outros, esp�ritos que apenas e t�o-somente, em rela��o a
voc�s, nos adiantamos no tempo.

N�o nos considerem, pois, dotados de poderes
m�gicos ou sobrenaturais. A consci�ncia da pr�pria
desencarna��o dotou-nos, talvez, com um pouco mais de
senso de responsabilidade, o que nos induz a maior
persist�ncia nos encargos que abra�amos. Sabemos que
estacionar hoje significa reiniciar amanh�, de vez que
ningu�m, absolutamente ningu�m, conseguir� se isentar do
esfor�o individual nas sendas do aperfei�oamento.

N�o confira �s opini�es alheias tanta import�ncia.
Raros haver�o de critic�-lo com sinceridade, preocupados
com o seu �xito na tarefa. A maioria critica movida por um
aluvi�o de interesses pessoais, dif�ceis, inclusive, de
enumerar. De minha parte, tenho ficado com uma orienta��o
do vener�vel Irm�o Jos�, em cujas palavras sempre reflito:
"Os bons n�o criticam". De fato, dos verdadeiramente bons
s� nos chegam palavras de incentivo e de encorajamento,
a fim de que, perseverando, possamos, aos poucos, ir nos


corrigindo, sem que nos sintamos arrasados pelo verbo
impiedoso dos in�teis.

O interc�mbio entre as Duas Esferas, mesmo para
esp�ritos e m�diuns treinados, � sempre um desafio. A t�o
propalada sintonia medi�nica n�o se improvisa e, em
ess�ncia, est� sujeita a n fatores de interfer�ncias.
Interessante que, em nossa atual conjuntura evolutiva, quase
tudo parece conspirar contra... O m�dium, quando logra se
nos disponibilizar psiquicamente, vem de uma luta tit�nica
pelo p�o de cada dia, que n�o lhe concede tr�gua. Isto tudo
sem levar em considera��o a sua disposi��o f�sica,
mormente cerebral, sempre afetada por este ou aquele
achaque que lhe altera o bem-estar, de que minimamente
necessitamos para que o contato medi�nico se viabilize.

Permita-me, no entanto, falar um pouco do que
acontece nos bastidores da Vida Espiritual. Imagine-se
atravessando uma selva, com o objetivo de alcan�ar uma
clareira... N�o � f�cil superar a hostilidade da mata, com
os seus perigos naturais. Os esp�ritos que se disp�em a
construtivo interc�mbio com os desencarnados n�o evitam,
no tentame, o pr�prio desgaste, de vez que as coisas deixam
de ser t�o simples quanto parecem. Mediunidade n�o se
restringe a um exerc�cio de arremesso do pensamento.
Voc�s, habitualmente, n�o levam em considera��o as nossas
condi��es, como se o simples fato de nos situarmos noutra
dimens�o nos redimisse da humanidade que ainda nos
caracteriza. Somos homens fora do corpo e n�o seres alados,


dotados de superpoderes como os her�is das hist�rias em
quadrinhos.

N�o estranhe se eu lhe disser que muitos de n�s, que
voc�s, bondosamente, rotulam de Instrutores, n�o passamos
de meros aprendizes - a condi��o de desencarnados, em
rela��o aos que prosseguem mourejando no corpo de carne,
nos confere uma vantagem mnem�nica, quando, deste Outro
Lado, conseguimos acesso �s reminisc�ncias aproveit�veis,
que jazem nos arquivos da subconsciencia. No mais,
estamos sujeitos �s mesmas varia��es de que voc� se
queixa em sua carta.

Espero que voc� entenda que estou falando de mim,
In�cio Ferreira, e n�o de outras entidades espirituais que
se lhes apresentam com uma aura de luminosidade, que
aqui, entre n�s outros, n�o provoca maior clar�o do que
quando se risca um palito de f�sforo! E, com toda a
sinceridade, n�o estou querendo a elas me nivelar, trazendo-
as para mais perto de mim... Os encarnados t�m a mania
de considerar por mentor todo esp�rito que lhes diz ou lhes
escreve meia-d�zia de palavras bonitas!

De modo geral, excetuando-se o caso de Chico
Xavier, que foi, entre os homens, portador de leg�timo
Mandato Medi�nico, eu considero a mediunidade uma
prova - para o m�dium e para os esp�ritos, que por ele se
manifestam. Devemos ter sido, esp�ritos e m�diuns, t�o
materialistas no passado, que, agora, nos cabe trabalhar
pela cren�a na imortalidade, subtraindo o m�ximo de tempo
�s nossas ocupa��es imediatas; vivemos transitando entre


as Duas Dimens�es, sem que a mente se nos aquiete em
nenhuma delas: estando na Terra, aspiramos pelo Mais
Al�m e, estando no Mais Al�m, nos voltamos para a Terra!

Ent�o, meu amigo, voc� continue. Pelo menos - � o
que se deduz de suas palavras -, voc� se encontra um
pouco mais l�cido do que aqueles m�diuns que se julgam
os tais; fazem tanto mist�rio com a pr�pria mediunidade,
que a gente tem a impress�o de que, trajando antigos
costumes sacerdotais, oficiam sobre os montes, com a
multid�o ainda prostrada aos seus p�s - hierofantes, eis o
que s�o, e n�o m�diuns esp�ritas conscientes de suas
mazelas.

Seja sincero e n�o desista! Trope�ando e caindo, para
erguer-se um pouco mais adiante, prossiga fiel a Jesus e a
Kardec, convicto de que o mais � balela.

N�o invente moda - n�o mistifique e n�o se permita
mistificar. Combata, sistematicamente, a menor tend�ncia
� vaidade que identifique em si. N�o h� nada mais rid�culo
do que um m�dium vaidoso! Que figura triste a do m�dium
com cara de pateta!... Agora, se for para fazer da
mediunidade um circo, em vez do picadeiro, � prefer�vel
que voc� seja a lona rota desses circos bem pobres, em
que o palha�o tamb�m exerce as fun��es de trapezista, e
vice-versa.

Tenho aprendido, por aqui, onde as m�scaras n�o se
nos sustentam com facilidade no rosto, que o bom m�dium
� aquele que, al�m de estudar e servir, c�nscio de sua
ignor�ncia e inutilidade, reconhece o seu pr�prio lugar,

157


sem passar pelo vexame de que algu�m venha a convidalo
a desocupar a cadeira em que descansa o traseiro
indebitamente. Portanto, na d�vida, n�o reclame assento
algum para si, ao redor de mesa nenhuma, seja em que
centro for! Trabalhe, simplesmente trabalhe, que a
Miseric�rdia Divina, compadecendo-se de voc� e de mim,
h� de permitir que sejamos de alguma valia para os
totalmente desvalidos.

158


In�cio - voc� me escreve,
perguntando -, o senhor cr� mesmo que, no meio esp�rita,
tenhamos pessoas agindo movidas por interesse de ordem
pessoal? Algu�m que, sob o r�tulo de esp�rita, esteja
trabalhando em causa pr�pria, ambicionando algum tipo
de poder, etc.?".

Infelizmente, creio! Gostaria de estar equivocado,
todavia possuo elementos para saber que n�o estou. Temos,
sim, companheiros que, em verdade, deixam de ser t�o
companheiros, sendo manobrados pelas trevas, que
intentam trazer confus�o ao nosso Movimento. N�o me
refiro aos que se equivocam de boa vontade, mas aos que


chegam a planejar a sua ascens�o pessoal �s custas da
Doutrina.

Durante algum tempo, meu irm�o, eu n�o admitia a
possibilidade de este ou aquele confrade estar utilizando o
seu espa�o no campo doutrin�rio para, por exemplo, impor
pontos de vista pessoais, disputando cargos de lideran�a
para satisfazer sua vaidade e ambi��o de poder. Confesso
que fui ing�nuo em demasia. Eu n�o acreditava muito nessa
hist�ria de agentes das Trevas infiltrados no Movimento,
conforme den�ncia do pr�prio Andr� Luiz, no primeiro
cap�tulo de "Liberta��o": "Mentes cristalizadas na rebeldia
tentam solapar, em v�o, a Sabedoria Eterna, criando quistos
de vida inferior, na organiza��o terrestre, entrincheiradas
nas paix�es escuras que lhes vergastam as consci�ncias.
Conhecem inumer�veis recursos de perturbar e ferir,
obscurecer e aniquilar. Escravizam o servi�o ben�fico da
reencarna��o em grandes setores expiat�rios e disp�em
de agentes da disc�rdia contra todas as manifesta��es
dos sublimes prop�sitos que o Senhor nos tra�ou �s
a��es ". (grifei)

Aos poucos, no entanto, fui aprendendo a melhor
conhecer as pessoas, logrando, ainda que parcialmente,
enxerg�-las em suas inten��es mais rec�nditas. Hoje,
confesso-lhe com certa tristeza que, em nosso meio, h�,
sim, m�diuns e dirigentes com prop�sitos menos elevados
em suas atitudes, valendo-se da suposta palavra de
vener�veis entidades espirituais para se fazerem acatados.

160


Digo-lhe que convivi com m�diuns que n�o eram
propriamente m�diuns: valiam-se mais da mediunidade do
que consentiam que a mediunidade se valesse deles.
Afirmavam ouvir dos esp�ritos o que n�o ouviam, a ver o
que n�o viam e a perceber o que n�o percebiam. Desejam
influenciar pessoas, desfrutando do status que lhes pudesse
advir de suas conscientes mistifica��es.

Certa vez, em Uberaba, apareceu um m�dium (leia-
se obsidiado) que nos enganou por determinado per�odo
de tempo. Falante e inteligente, dizia-se dotado de v�rias
faculdades medi�nicas, inclusive a da materializa��o.
Recordo-me que, instado por amigos, cheguei a participar
de uma sess�o que promoveram com ele, profanando o
recinto do Centro Esp�rita Uberabense, a casa-m�ter do
Espiritismo em Uberaba. Desculpe-me a express�o, mas o
sujeito era uma farsa. Veio de viagem por conta do
Sanat�rio, instalou-se num dos hot�is da cidade, comendo
e dormindo �s expensas de gente de bem. Para encurtar a
conversa, digo-lhe que um de n�s, tendo ido procur�-lo no
hotel, entrou providencialmente no quarto em que se
encontrava acomodado e, como ele havia sa�do para uma
volta, deparou-se com a sua mala repleta de apetrechos
utilizados no dia anterior em seu espet�culo circense: v�rios
metros de fil� (aquele tecido microperfurado, para simular
ectoplasma), frascos de perfume, uma diminuta lanterna
para os "fen�menos" luminosos... N�o h� necessidade de
que eu me detenha no desfecho da hist�ria.


Eu n�o sei. N�o vou dizer que todo o mundo que
apronta na Doutrina reencarna para aprontar. Penso que,
invigilante e sem no��o de tamanho pessoal, muita gente
termina por se desvirtuar ou ser desvirtuada. Modesta me
dizia: � "In�cio, todo m�dium � um ser humano comum,
pass�vel de erros e acertos. N�o se deve incens�-lo, criando
uma expectativa que ele n�o pode alcan�ar. Qualquer
pessoa que participar de nossa conviv�ncia h� de se
decepcionar conosco..."

Ainda bem que, distanciando-me no tempo, voc�s
n�o conviveram comigo, para saberem quanto eu era duro
de aturar. Todos n�s �ramos e somos!

A gente n�o deve estruturar a pr�pria f� na fragilidade
daqueles que, aos nossos olhos, passam a represent�-la. O
risco de decep��o � enorme. Confian�a irrestrita t�o-
somente em Jesus Cristo! As vezes, eu notava quanto Chico
Xavier se aborrecia com os elogios que lhe eram
desfechados... Era como se os que o elogiavam estivessem
lhe negando o direito de ser humano e, conseq�entemente,
de falhar. Qu�o impiedosos somos com os que elegemos
para santos! Com a mesma velocidade com que os
entronizamos, destro�amos-lhes a imagem!... Chico,
coitado, n�o tinha o direito de comer um peda�o de carne,
tomar uma ta�a de vinho do Porto!... N�s, sim, pod�amos,
pois, afinal, n�o �ramos ele e nem quer�amos ser, a menos
que pud�ssemos conciliar a espiritualidade dele com as
mazelas das quais n�o pretend�amos abrir m�o. Para ser
m�dium por n�s e para n�s, Chico pagou um pre�o bem

162


alto! E ai dele, se cometesse o menor deslize dos maiores
que costumamos cometer, sob o benepl�cito uns dos outros.
Sim, porque h� tamb�m corporativismo entre os que se
acobertam em suas m�tuas falhas...

Permita-me, no entanto, outra abordagem sobre o seu
delicado questionamento. O Espiritismo, para os que
desacreditam dos outros e de si (principalmente de si!),
vai se tornando meio de vida. Eu n�o sou contra o trabalho
honesto, na conquista do p�o de cada dia. O problema � a
inconsequ�ncia no profissionalismo religioso que coloca a
Mensagem em plano secund�rio - a Mensagem e o seu
endosso pr�tico na viv�ncia cotidiana, comprometendo o
maior marketing da Doutrina, que, indubitavelmente, � o
do exemplo! Por este motivo e n�o por outro � que estamos
assistindo a essa "briga de foices" portas adentro do
Movimento, com a p�blica exposi��o de nossas chagas
morais.

Voc� j� imaginou, meu irm�o, se n�s, os esp�ritas,
f�ssemos, de um instante para outro, � condu��o de maior
rebanho de fi�is? Deus nos livre e guarde, por um bom
tempo, de sermos maioria em qualquer coisa! Eu conheci
um senhor, creio que ainda esteja encarnado, presidente de
centro, que, na �poca da distribui��o natalina, a pretexto
de estar fazendo muita caridade, sa�a dando socos nas costas
das pessoas, inclusive das senhoras, que n�o se
comportavam na fila que tentasse organizar. Um outro,
para colocar ordem na fila, � porta do grupo que dirigia,


usava um chicote... Por uma cesta b�sica anual, o povo
apanhava calado.

O esp�rita, com raras exce��es, n�o est� preparado
para dirigir nada, nem patinete de crian�a, sem que
provoque um desastre nas propor��es de um trator
desenfreado. Voc� pode at� achar que eu compare�o aqui
nestas linhas com um daqueles meus exageros, mas lan�o-
lhe um desafio: aceite a presid�ncia de um centro esp�rita,
de qualquer um, n�o importando o tamanho ou a sua
freq��ncia; se voc� n�o mudar no prazo de um ano, dou a
m�o � palmat�ria e serei seu cabo eleitoral no pr�ximo
mandato!


In�cio, como eram realizadas as
sess�es medi�nicas que o senhor dirigia no Sanat�rio? Aqui,
no centro que freq�ento, o pessoal anda inovando e est�
uma confus�o danada. O aproveitamento caiu e a coisa
n�o vai bem. Ser� que n�s, os m�diuns antigos, estamos
ultrapassados? E tanta novidade, coisa que a gente n�o v�
em Kardec nem nas obras do Chico. Responda-me, por
favor".

Minha irm�, de fato, toda inova��o, no campo da
mediunidade, � duvidosa. A gente tem que ir devagar e
com prud�ncia. O personalismo se imiscui em tudo o que
o homem faz. Como dizia Chico, a novidade maior, que o
pessoal continua colocando de lado, � o Evangelho!


No Sanat�rio, as coisas eram demasiadamente
simples. Ningu�m inventava absolutamente nada. N�o
havia t�cnica especial de concentra��o para os m�diuns
ou o que o valha. Apenas faz�amos quest�o de disciplina,
responsabilidade e amor � tarefa. Bons tempos aqueles!

A sess�o come�ava, pontualmente, �s 20 horas, mas
30, 20 minutos antes todos est�vamos l�, em clima de
ora��o e conversa edificante. Nada de ficar batendo papo
sobre assuntos n�o pertinentes. O pessoal se
cumprimentava fraternalmente, passava � m�o um livro ou
um exemplar de "A Flama Esp�rita" e ia ler, preparando o
ambiente �ntimo.

Depois, com uma breve leitura de "O Evangelho
Segundo o Espiritismo", faz�amos aprece, n�o muito longa
(tem gente que transforma a ora��o em palestra, n�o �?), e
nos coloc�vamos � disposi��o da Espiritualidade. Logo,
os m�diuns come�avam a incorporar com naturalidade,
evitando-se, quando poss�vel, por contraproducentes, as
comunica��es simult�neas, conforme, ali�s, recomenda
Andr� Luiz, na obra "Desobsess�o". Vale lembrar que os
m�diuns se entregavam ao transe sem nenhuma agita��o,
conscientes de que eles pr�prios deveriam cooperar na
conten��o dos esp�ritos mais exaltados. Odilon Fernandes,
que, quando podia, nos visitava, sempre fazia quest�o de
frisar que o m�dium psicof�nico � o primeiro doutrinador
do esp�rito comunicante - em sua casa mental, o esp�rito
n�o deveria proceder como quisesse, como um v�ndalo
que invadisse uma resid�ncia.


Por Modesta, por exemplo, com rar�ssimas exce��es,
que tive oportunidade de detalhar no livro "Sob as Cinzas
do Tempo", os esp�ritos dialogavam conosco como se
f�ssemos dois encarnados conversando. Cada
comunica��o, em m�dia, se estendia por 15, 20 minutos,
de vez que, diferentemente de alguns companheiros da
atualidade, n�o t�nhamos pressa de que a sess�o terminasse.
Com tranq�ilidade, durante cerca de 1 hora e 40 minutos,
atend�amos 5,6 entidades que, igualmente, se manifestavam
por outros m�diuns. Ao final da sess�o, Modesta concedia
passividade � palavra de um dos nossos Instrutores, que
resumia a sua fala em 5, 10 minutos.

Proferida a prece final, nos confraterniz�vamos na
cozinha do Sanat�rio, tomando um caf� ou um ch�, que, na
maioria das vezes, era a pr�pria Modesta que nos
preparava.

N�o havia, entre os participantes da reuni�o, qualquer
tipo de competi��o ou espa�o para o melindre. N�s nos
comport�vamos com a simplicidade poss�vel e... o trabalho
rendia. E como rendia! Esp�ritos ligados aos pacientes
internados, ap�s convenientemente esclarecidos, deixavam
as suas v�timas que, em poucos dias, se colocavam em
condi��es de receber alta. Tudo em n�vel da palavra
evangelizada; nada de hipnose ou expedientes estranhos e
complicados, como voc� diz em sua carta.

Em suma, minha irm�, era assim a aben�oada rotina
de nossas atividades desobsessivas no Sanat�rio Esp�rita.
Voc� sabe, o que manda � o sentimento, � a inten��o. A


coisa pode ser muito bem organizada, mas, se n�o tiver
cora��o, n�o funciona!

Conv�m ainda lembrar que todos os participantes de
nossa sess�o medi�nica se sentiam comprometidos com
as demais tarefas da casa: integravam os grupos que
transmitiam passes nos doentes, iam costurar l� como
volunt�rios, assistiam as meninas internas no "Lar Esp�rita",
n�o fugiam aos mutir�es de limpeza... Pelo que estou
sabendo, os m�diuns de hoje, quando muito, comparecem
ao centro t�o-somente na hora do interc�mbio com o Mais
Al�m, existindo muitos que chegam com a luz apagada e
se retiram, antes que ela se acenda. Nenhum aperto de
m�o, nenhum abra�o. � aquela pressa de quem n�o tira os
olhos do rel�gio, pensando no compromisso social de
depois da reuni�o: uma festa de anivers�rio, um jantar, um
cap�tulo de novela - isto sem falar nos celulares que
perturbam com suas chamadinhas musicais, esculhambando
com tudo!

Sinceramente, eu n�o sei com que preparo os m�diuns
e os dirigentes desejam inovar e complicar as atividades
medi�nicas consagradas � desobsess�o. N�o est�o dando
conta nem do que � simples!... Desculpem-me, mas quem
sequer sabe preparar como se deve um arroz com feij�o,
se meter a fazer caviar?! Sem, primeiro, dominar o alfabeto,
ningu�m aprende a ler e a escrever. E, em mat�ria de
mediunidade, � onde n�s estamos: no alfabeto!

Por falta de doutrina e objetividade (leia-se: por falta
de Evangelho), tenho visto muitos grupos se dissolverem.


Os esp�ritos mistificadores adoram coisas complexas cabe�a
de dirigente e de m�dium complicados � com eles
mesmos! Batem sobre ela como ex�mios pianistas nas teclas
de um tal instrumento...

Eu me recordo que, certa vez, uma senhora, dirigente
de um centro esp�rita rec�m-fundado, perguntou ao Chico:

� Estamos com um problema no grupo e gostar�amos que
nos orientasse.
�Pois n�o, minha irm�-respondeu, no breve di�logo
entabulado. � Em que posso ser �til?

� � que estamos organizando o grupo medi�nico e
muita gente quer participar. N�o sei que crit�rio de sele��o
adotar para escolh�-los...
� Ah, minha irm�!, se o problema � este, � muito
simples.
?!...

� Voc� fa�a a reuni�o com os m�diuns que
sobrarem!...
Espero que a minha resposta �s suas indaga��es n�o
lhe saiam retr�gradas aos ouvidos. N�o sou contra o
progresso; sou contra o rid�culo, a falta de bom senso...
Inventar em mediunidade � uma temeridade. Vamos,
primeiro, caprichar no �bvio. O resto, minha irm�, � s�
confus�o, com os esp�ritos levianos sorrindo de nossas
trapalhadas.

Grupo medi�nico s�rio que se preza devota-se ao
estudo da Doutrina e � pr�tica da Caridade, com os seus
integrantes conscientes de que os maiores necessitados


s�o eles pr�prios, j� que todo grupo de desobsess�o �
terapia para encarnados e desencarnados.

Deixo-lhe, nestas linhas, consignados o meu afeto e
a minha considera��o, a voc� e a todos os confrades de
sua equipe, na justa expectativa de que n�o fiquem
chateados comigo, que apenas n�o quero v�-los sob o
fasc�nio travestido de id�ias inovadoras e esdr�xulas.



In�cio, o que o senhor diz dessa
hist�ria de "crian�as �ndigo"? H� algo de verdadeiro em
semelhante teoria? Adoro os meus netos, mas, sinceramente,
eles n�o me parecem "azuis": gostam de festas, d�o trabalho
na escola, n�o saem da Internet... O senhor acha que a
Terra come�ar� mesmo a se regenerar a partir de 2057,�
conforme teria previsto Chico Xavier? Um outro m�dium,
numa palestra que ouvi, fixou a data de 2054... Estranho,
n�o?


Estranh�ssimo, minha filha, estranh�ssimo! Voc� tem
toda a raz�o. Eu, se fosse fixar qualquer data para o in�cio
da regenera��o do planeta, ficaria com 2257... Parece-me
um n�mero bem mais simp�tico, voc� n�o acha?

171


N�o creio que Chico tenha feito qualquer previs�o,
com fixa��o de datas para a Humanidade. Em toda a sua
vida, ele nunca o fez! Se se referiu a 2057, em alguma
entrevista, com certeza, estava se referindo aos 200 anos
do Espiritismo, a partir do surgimento de "O Livro dos
Esp�ritos", em 18 de abril de 1857. � realmente de se
esperar que, at� l�, pelo menos o Movimento Esp�rita tenha
criado um pouco mais de ju�zo. Se, com dois s�culos de
Espiritismo, os esp�ritas n�o aprenderem algo... Quanto �
data de 2054, ignoro. Existe muita gente querendo se
aproximar de Chico Xavier, como diz�amos no interior de
Minas Gerais, "na marra"... � impressionante! Tudo o que
se atribui a Chico, at� inverdades, eles querem para si. S�
n�o se esfor�am em copiar-lhe os exemplos; quanto ao
mais... N�o sei como ainda n�o mandaram raspar a cabe�a,
para usarem uma peruca semelhante � que lhe cobria a
calv�cie. O, louco! Alto l�! Assim n�o d�. � muita
ridicularia.

Quanto �s tais "crian�as �ndigo" e "cristal", � uma
piada. Elas n�o existem nem por aqui! Trata-se, por�m, de
uma hist�ria antiga, de nosso tempo, mais do meu que do
seu, � claro. Voc�, com certeza, ouviu falar do movimento
hyppie, aquele do "paz e amor", que acabou por adotar
outra legenda, na d�cada de 60 : "sexo, droga e rock 'n 'roll "?
Pois �, aquela gera��o era de "indigos" - todos usavam
jeans! Quando, sob os efeitos da maconha ou da mescalina,
n�o resolviam se mostrar como vieram ao mundo, ou seja,
com as "coisas" de fora... Um conjunto de rock, uma banda


de meninos "azuis", chegou a se proclamar mais popular
que Jesus Cristo. Voc� se lembra? Depois, foi aquela
trag�dia...

Em tempo: Eu n�o tenho nada contra o �ndigo das
cal�as de brim, que, ali�s, d�o um pouco menos de trabalho
para as m�es que, em casa, tamb�m fazem as vezes de
lavadeiras, j� que muitos jovens estimam us�-las por dois,
tr�s meses, sem lav�-las!

Por enquanto, minha filha, eu vou dizer a voc�:
conhe�o as crian�as subnutridas e aid�ticas da Africa, os
meninos de rua do Brasil, que vivem esmolando nos
sem�foros, as garotas e os garotos explorados por ped�filos
na Am�rica do Norte, e que, no mundo inteiro, integram o
vergonhoso com�rcio de explora��o sexual; conhe�o os
adolescentes favelados utilizados por traficantes, no Rio
de Janeiro e em Bogot�; os que s�o v�timas de viol�ncia
racial em toda a Europa; os que aos 12.13 de idade j� s�o
pais, sem a menor perspectiva de estudo e de trabalho...
N�o, eu nunca vi uma crian�a "azul". Que cor elitista a
que escolheram para representar essa suposta civiliza��o
do Terceiro Mil�nio! Isto me cheira a heran�a do Nazismo,
de Adolf Hitler!... Os nazistas � que sonhavam com a ra�a
ariana dominando o mundo e tentaram, de todas as formas,
fazer com que desaparecesse das veias da Humanidade o
sangue que n�o se lhes identificasse com a gen�tica! O
maior genoc�dio da Hist�ria foi por conta dessa eugenia
que, agora, ressurge com a teoria das "crian�as �ndigo".

Voc� me desculpe, mas, para certas coisas, eu sou
meio b�blico. Os arautos que andam, no pr�prio Movimento

173


Esp�rita, anunciando o advento das "crian�as �ndigo",
afirmam que elas, quando contestadas, reagem de maneira
imprevis�vel e, por vezes, violenta. Pois bem. Aplique-selhes
o que recomenda o livro dos Prov�rbios, cap�tulo 23, �
vers�culos 13 e14, e o seu "azul" facilmente se transformar�
em "lil�s": "N�o retires da crian�a a disciplina, pois se a
fustigares com a vara, n�o morrer�. Tu a fustigar�s com a
vara e livrar�s a sua alma do inferno". Salom�o, o autor
dos Prov�rbios, me parece que tinha uma implic�ncia
particular com as crian�as, posto que, no cap�tulo 29, volta
a recomendar: "A vara e a disciplina d�o sabedoria, mas a
crian�a entregue a si mesma vem a envergonhar a sua m�e.
(...) "Corrige o teu filho, e te dar� descanso, dar� del�cias
� tua alma."

O texto mencionado me faz recordar Chico Xavier,
quando nos disse: � "Apanhei muito, e n�o gostaria, em
uma nova exist�ncia na Terra, de apanhar o tanto que apanhei

- pois eu era verdadeiramente espancado -, mas tamb�m
n�o gostaria de ter uma m�e que me deixasse sem umas
chineladas, quando eu precisasse..."
De forma que, segundo o meu entendimento, na m�ope
vis�o que possuo das coisas, os esp�ritos que efetivamente
construir�o sobre a Terra a t�o propalada Nova Era, ainda
se encontram em gesta��o. Imperceptivelmente, sem fitinha
azul na testa ou nos pulsos, haver�o de reencarnar como
netos de nossos netos, promovendo as mudan�as sociais e
morais, t�o necess�rias, para que a fraternidade impere
entre as criaturas. Eles se revelar�o por suas obras e n�o

174


propriamente por sua "cor", e ser�o negros e brancos,
vermelhos e amarelos, emergindo do seio das mais
diferentes ra�as em salutar miscigena��o.

Por enquanto, repito, a realidade a� est�, com a nova
gera��o acossada por todos os lados: o fanatismo religioso
que os transforma em homens-bomba, as drogas que lhes
comprometem a reencarna��o e, de quebra, o aquecimento
global que, se n�o revertido, lhes deixar� por heran�a um
mundo desolado.

Creio que, em linhas gerais, era o que eu tinha para
lhe dizer. N�o me considere um descrente. Ah, como eu
gostaria de acreditar que a Terraja estivesse infestada de
esp�ritos egressos n�o sei de onde, que, de fato, pudessem
imprimir um novo rumo � civiliza��o! Oremos, no entanto,
para que isto aconte�a, antes que a �ltima �rvore da Floresta
Amaz�nica tombe sob a a��o das ferozes motosserras que
a devastam e o �ltimo ping�im da Ant�rtida venha a morrer
asfixiado nas praias ensolaradas de Copacabana!

Deixo-lhe o meu abra�o de irm�o, fazendo votos para
que os seus netos cres�am, por dentro, t�o depressa e
vigorosos quanto os jovens da atualidade crescem por fora,
dando-nos a impress�o de que vieram de Esparta e n�o de
Atenas, muito lhes faltando caminhar para que cheguem �
um pequeno burgo da Judeia, chamado Bel�m, onde, numa
estrebaria, em meio a animais e pastores, nasceu aquele
Menino que, sem ser "azul", pele tostada sob o Sol
causticante da ingratid�o humana, tingiu de verde - a cor-
s�mbolo da Esperan�a - os nossos cora��es para sempre!

175


//I
r. In�cio, Jesus nos aben�oe! Terminei
de ler o seu livro "Obsess�o e Cura" e fiquei impressionado
com a narrativa. Tenho receio de que comigo aconte�a
algo semelhante � hist�ria do fazendeiro. Sabe, eu sou
meio fraco de cabe�a; os esp�ritos vivem me atemorizando
com a id�ia de que estou com uma doen�a grave - sou
hipocondr�aco e... obsidiado. Pe�o-lhe que interceda em
meu favor. Adorei aquela prece do senhor..."
Meu amigo, todos estamos mais ou menos expostos
� a��o de esp�ritos obsessores, alguns dos quais foram
nossas v�timas. O esquecimento do passado � uma b�n��o,
pois, se a gente se lembrasse de tudo o que fez ainda
ontem,... Sobre a Terra, com meia-d�zia de exce��es,


ningu�m � flor que se cheire! Aprontamos muito e, agora,
nos vemos �s voltas com a insanidade. N�o temos
alternativa, a n�o ser nos agarrar ao trabalho, ocupando,
diuturnamente, a cabe�a e as m�os.

Eu me recordo do caso do fazendeiro - foi terr�vel!
N�o fosse a intercess�o da Miseric�rdia Divina, ele teria
desencarnado. Eu, como m�dico e esp�rita, fui apenas mero
instrumento para auxili�-lo. Funcionou. Os Esp�ritos
Amigos se valeram de n�s, e ele, embora as seq�elas com
que permaneceu, no corpo e na mente, melhorou. No
entanto, lidei com casos em que a vingan�a de obsessores
se consumou, sem que nada pud�ssemos fazer. Em r�pidas
palavras, contarei a voc� um deles.

Apareceu-nos um jovem, de pouco mais de 20 de
idade, com grave tend�ncia para o suic�dio. J� tinha ingerido
querosene, �lcool... A m�e, coitada, vivia temerosa. Gente
pobre, simples, sem maior esclarecimento espiritual. Na
segunda vez que se internou conosco, no Sanat�rio, o
esp�rito se manifestou por Modesta.

� "Ele n�o me escapa! - dizia, colocando
significativa carga de �dio em cada palavra. �N�o adianta
proteg�-lo! Sabem o que ele me fez? Estripou-me,
literalmente. Amarrou-me m�os, p�s e pesco�o e, com uma
faca, abriu o meu abd�men... Eu vi as minhas tripas-
escorregando para fora da barriga! N�o, n�o me venham
com hist�ria de perd�o. Algu�m precisa ser instrumento
da Divina Justi�a, n�o �? Que esse algu�m seja eu, o maior
interessado em que ela se cumpra. A m�e dele foi o piv�
177


de tudo... Tra�a-o comigo e, depois, me denunciou.
Afirmava me amar... Mentirosa! Deve, tamb�m, sofrer as
conseq��ncias da minha desventura. Eu vou mat�-lo... �
apenas quest�o de tempo. Voc�s n�o podem vigi�-lo o
tempo todo - eu posso. Quero v�-lo queimando por dentro...
Ele j� tomou querosene, mas a quantidade n�o foi
suficiente".

Depois de, aproximadamente, dez meses, o rapaz
ingeriu soda c�ustica e desencarnou, expelindo peda�os
de v�sceras pela boca; a m�e perturbou-se e entregou-se
ao alcoolismo...

Nem sempre, meu filho, a doutrina��o consegue �xito.
No Sanat�rio, conhecemos duros reveses. A gente ficava
sempre muito triste, mas o que podia fazer? Quando
decidimos levar o livre-arb�trio �s �ltimas conseq��ncias,
pagamos um pre�o bem alto, e isto, infelizmente, est�
acontecendo todos os dias em nossas vidas. Ningu�m deve
brincar com a leviandade; os esp�ritos nossos advers�rios
permanecem � espreita: quando nos encontram o endere�o...
Tenho um amigo, m�dico psiquiatra, esp�rita convicto e
idealista, que eu sempre interpelava sobre estranha op��o
que fizera de n�o mandar afixar, na porta de seu consult�rio,
uma placa com o seu nome e especialidade. Ele me
respondia: � "Doutor, eu tenho que me esconder... Se os
esp�ritos obsessores me descobrirem, estou perdido. N�o,
eu quero ficar no anonimato...Eu coloco uma placa l�, um
esp�rito inimigo meu consegue l�-la, pronto."


Coisa de gente doida, n�o? Ou de psiquiatra mesmo!
Aos poucos, por�m, fui entendendo que ele n�o estava de
todo destitu�do de raz�o. Qualquer ind�cio que pudermos
evitar de fornecer aos obsessores, a nosso respeito,
facilitando a a��o deles sobre n�s, � medida recomendada
pela prud�ncia. As pessoas, de maneira geral, facilitam
demais, ficam, como se costuma dizer, "dando sopa por
a�"... Depois, se queixam. Exp�em-se aos chantagistas do
Al�m - homens perigosos fora do corpo - e se tornam
ref�ns de delicadas situa��es, que lhes comprometem a
paz e a sa�de.

Vamos agora ao seu caso espec�fico. Conforme disse
anteriormente, procure trabalhar, ocupando a mente e as
m�os. N�o se d�, n�o o luxo, mas o "lixo" do tempo ocioso!
Tenha confian�a em Deus e siga adiante, realizando o melhor
do melhor ao seu alcance. Agindo assim, se voc� vier a
ficar doente, � porque est� dentro de sua programa��o
c�rmica; afinal, ningu�m h� de permanecer para semente,
n�o �?... A chamada morte, em obedi�ncia � sua fun��o
saneadora, se contenta at� com uma casca de banana, em
que, inadvertidamente, algu�m escorrega e... quebra o
pesco�o!

N�o se preocupe, por�m; voc� n�o morrer�... No
m�ximo, voc� h� de chegar por aqui com torcicolo. O mais
grave, que � o enfrentamento da realidade, vem depois,
quando constatar que a desencarna��o n�o logrou
solucionar nenhum dos problemas que voc� vem adiando,
na esperan�a de que, sem a sua participa��o, eles se


equacionem. A morte � deslocamento f�sico e n�o espiritual.
N�o pense diferente ou ir� "dar com os burros n'�gua"!...
Acredite, a fila de nossos credores deste Outro Lado �
maior que a dos desempregados no Brasil, sem exagero.

Quanto � minha prece, que voc� diz ter adorado em
"Obsess�o e Cura", � a Prece dos Desesperados! Eu nunca
gostei de prece com palavras bonitas - n�o me soa aut�ntica!
A gente, quando ora, tem que abrir o cora��o numa bandeja
e mostr�-lo ao Senhor... A minha ora��o � uma conversa
franca e objetiva! Por este motivo, se me permite, encerrarei
esta carta orando por voc� ao meu modo:

� Senhor, ampare este nosso irm�o pregui�oso,
fustigando-o para que, de uma vez por todas, ele possa
tomar jeito... N�o o deixe a choramingar, sempre na
depend�ncia afetiva de algu�m. Se, de fato, ele estiver
com alguma doen�a grave, elimine-o, mas, caso contr�rio,
ressuscite-o para o trabalho e para a vida �til, que, como
L�zaro quase morto, eleja est� fedendo... Que ele n�o
continue, pois, incomodando as narinas alheias, na condi��o
de morto-vivo em que se encontra, preocupando toda a
fam�lia e aborrecendo os amigos. Que coisa chata � ter
algu�m sempre morrendo ao lado da gente e, o que � pior,
amea�ando morrer e... enterrando gente! Ora, Senhor,
liberte-o, dando sossego � turma que vive na expectativa
da heran�a de que n�o pode usufruir, enquanto ele n�o
desocupa... Ah, e preju�zo aos m�dicos, que, com a sua
hipocondria cr�nica, complementam o seu minguado
faturamento! Agora, se for de sua vontade, d� a ele trabalho,
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e coloque os obsessores a trabalharem junto dele. Seria
uma �tima li��o para eles, os obsessores, ca�rem na pr�pria
arapuca! Leve, Senhor, esse nosso irm�o obsidiado para o
centro esp�rita mais pr�ximo e transforme-o em m�dium,
para ele ver o que � bom... Quase todo obsidiado d� um
excelente m�dium de "incorpora��o"! Na esperan�a de
um deferimento favor�vel � peti��o que protocolo nestas
linhas, pe�o-lhe desculpas por estar a importun�-lo com
coisa t�o pequena e t�o banal!...


uerido Dr. In�cio, eu tamb�m sou
partid�ria de que Chico Xavier tenha sido a reencarna��o
de Allan Kardec. Parece-me �bvio. O assunto, no entanto,
� pol�mico, o senhor n�o acha? Talvez tenha mais que tirar
do que acrescentar � Doutrina. O que me tem a dizer? As
opini�es em torno do assunto v�m acirrando os �nimos
entre muitos companheiros... N�o seria melhor deixarmos
as coisas como est�o?"

N�o, n�o creio, minha irm�, que devamos deixar as
coisas como est�o, pois, afinal, estamos numa doutrina
reencarnacionista e, at� prova em contr�rio, n�o nos �
proibido especular seriamente. A menos - eu n�o estou


sabendo! - que alguma "autoridade" esp�rita haja baixado
um decreto proibitivo, com amea�a de excomunh�o ou
coisa que o valha. H� muita gente com o ran�o da Igreja,
infiltrada no Movimento, gente que ainda imagina poder
silenciar as pessoas, como fizeram nos tempos da
Inquisi��o. Eu, por natureza, sou insubordinado-n�o aceito,
veementemente, qualquer tipo de morda�a na minha boca!
Posso silenciar por convic��o, mas jamais, por
conveni�ncia, me calarei.

Respeito, minha irm�, os que, educadamente,
apresentam argumentos contr�rios � tese que defendemos.
Discordar � direito sagrado. Precisamos, no meio esp�rita,
desenvolver a polidez de saber ouvir as pessoas. At� o
momento, contudo - voc� me perdoe -, a argumenta��o
dos que contestam a reencarna��o do Codificador em Chico
Xavier, al�m de agressiva, me parece tendenciosa. Salvo
exce��es, � claro. A maioria, por�m, dos que t�m vindo a
p�blico defender o seu ponto de vista contr�rio ataca Chico
Xavier e a sua obra. Coisas horrorosas t�m sido ditas e
escritas, com o intuito de que o inigual�vel medianeiro
sequer se nivele ao mestre lion�s. Sinceramente, eu n�o
imaginava que Chico pudesse contar com tantos opositores
intramuros! Sem a menor cerim�nia, fizeram-no como que
deitar-se em um div� e puseram-se a dissecar-lhe a
personalidade. Interessante � que os que t�m sido mais
veementes em seus discursos e arrazoados, negando o
mesmo esp�rito nas duas personalidades, n�o conviveram

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com uma e, muito menos, com a outra! Que petul�ncia!
Esse pessoal fala de Kardec como se tivesse privado com
ele e refere-se a Chico como se n�o sa�sse de sua cozinha!...

Voc� n�o acha, por exemplo, que seria razo�vel nos
determos na an�lise da obra de um e de outro? Neste
sentido, o que voc� me diz? H� algo na obra medi�nica de
Chico que contraria o Pentateuco? A bibliografia xavieriana
n�o � o complemento natural da Doutrina, que atualiza, em
face do vertiginoso avan�o da Ci�ncia? No que a vida
apostolar do m�dium de Pedro Leopoldo e Uberaba fica a
dever ao ap�stolo da Terceira Revela��o? Chico, ali�s,
tornou o Brasil mais esp�rita do que Kardec a Fran�a!

N�o se iluda, minha irm�: o que se pretende,
veladamente, � se reduzir a obra que os Esp�ritos escreveram
atrav�s de Chico Xavier a uma obra medi�nica qualquer;
e, mais, fazer com que os seus exemplos de renova��o
�ntima e de viv�ncia evang�lica n�o permane�am, entre
n�s, na pauta do dia... De maneira geral, os esp�ritas n�o
andam querendo nada com o Evangelho! Preferem, por
esporte, a esgrima intelectual, � maratona da caridade, com
aquelas palavras tremendas e desafiadoras soando-lhes
aos ouvidos: "Se algu�m quiser vir nas minhas pegadas,
renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me..."

Fala-se muito, e com justi�a, da genialidade de
Kardec; menciona-se, por�m, muito pouco o seu
desprendimento, a extrema pobreza material em que se
encontrava, quando foi surpreendido pela desencarna��o...


Kardec n�o era t�o-somente um s�bio, e Chico apenas
um m�dium. Em ambos, surpreendemos, entrela�adas, as
virtudes exponenciais de S�crates e de Francisco de Assis!

Como me intriga o fato de, para negarem que Chico
Xavier tenha sido Allan Kardec, procurem de todas as
formas diminu�-lo, para n�o lhe reconhecerem a autoridade
moral que lhes � inc�moda � consci�ncia! Por despeito ou
raiva, n�o sei, de eles pr�prios n�o terem aproveitado a
oportunidade de conviv�ncia mais estreita e ass�dua com

o m�dium, acess�vel a quantos o procuravam nas tr�s
reuni�es p�blicas semanais, em que atendia a multid�o, ou
por ele n�o lhes endossar os desmandos doutrin�rios, s�
n�o t�m se reportado � sua c�ndida figura com maior
descaso porque, efetivamente, ainda n�o ensandeceram de
vez - deixam de ser t�o tolos de se declararem anti-Chico
Xavier, conflitando-se com a opini�o da maioria, esp�rita e
n�o esp�rita, que nutre pelo m�dium mission�rio ineg�vel
admira��o. O povo pressente Kardec em Chico! �, a meu
ver, quanto basta.
Portanto, desculpe-me se, mesmo deste Outro Lado,
n�o consigo calar a minha indigna��o, quando percebo
tantos sofismando, com o intuito de fugirem ao testemunho
da Verdade. Estar bem, eu quero � com a minha consci�ncia,
e n�o com fulano, sicrano, ou beltrano, fazendo o jogo dos
bajuladores, que se corrompem no tr�fico de influ�ncia
das conveni�ncias do poder. Ora, bolas, o poder esp�rita,
se � que existe, precisa apodrecer! Dos bastidores do


Movimento, no Brasil, exala insuport�vel odor. Como
fede!...

N�o lhes pe�o para crerem na minha palavra de
esp�rito... N�o! Talvez, em toda a hist�ria do interc�mbio
dos mortos com os vivos, ningu�m tenha sido t�o
desqualificado quanto eu e o pobre desse companheiro
que conheci menino. De charlat�o a embusteiro, de
mistificador a obsidiado, j� ouvimos quase tudo da latrina
da boca de quem nos xinga; curiosamente, da mesma boca
que, depois, vai pregar o Evangelho no centro esp�rita e
emocionar as plat�ias, falando de amor e caridade... Tudo
em nome de uma suposta pureza doutrin�ria que me faz
arrepiar at� os p�los do sovaco!

Voc�, no entanto, minha irm�, n�o tem nada com isto;
a sua �nica culpa est� sendo a de me dar oportunidade de
dizer algo que trago atravessado na garganta, para que
todos saibam que n�s, os desencarnados, tamb�m
engasgamos com o que os homens continuam querendo
nos empurrar goela abaixo.

Eu at� j� posso ver algu�m com esta minha carta nas
m�os, furioso da tribuna de um centro qualquer, vomitando
improp�rios contra mim. Um simples Gardenal partido ao
meio resolveria o problema de n�s dois...

O Espiritismo, passados 150 anos da inesquec�vel
efem�ride, 18 de abril de 1857, s� � o que � no Brasil e,
conseq�entemente, no mundo, devido ao advento de Chico
Xavier, ou seja, de Kardec outra vez, dando complemento
� tarefa que, no s�culo XIX, ele mal teve tempo de come�ar.


Sem Emmanuel e Andr� Luiz, representando uma pl�iade
de Esp�ritos Superiores, a Doutrina, sob os aspectos
filos�fico e cient�fico, exibiria lacunas comprometedoras.
Com todo o respeito aos ortodoxos, seria uma Doutrina
estanque, que, por sua pr�pria natureza - F� Raciocinada

- n�o se sustentaria. A Terceira Revela��o, por�m, se n�o
parou em Kardec, n�o h� de parar em Chico Xavier! O
Senhor nos prometeu o Consolador para sempre (grifei),
e n�o para estreito per�odo de tempo; e, sem que se atualize,
o Espiritismo bem depressa h� de ficar para tr�s...
Estes, em s�ntese, s�o os meus argumentos. Agora,
minha irm�, com a sua licen�a e a de nossos leitores, eu
vou tomar a metade do meu Gardenal, porque, sinceramente,
ser esp�rita nos dias que correm, sem Gardenal, n�o d�.

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ilha, voc� me escreve: � "Dr. In�cio, o senhor
acredita mesmo nessa quest�o do pl�gio medi�nico? Custa-
me crer que os m�diuns sejam capazes de copiar uns aos
outros, apropriando-se de id�ias que n�o lhes pertencem...
Dizem que Chico Xavier, em carta de 1962, chegou a
denunciar o problema, o que, convenhamos, at� hoje tem
gerado um certo mal-estar no Movimento. Se puder, diga
alguma coisa a respeito".


Assunto desagradabil�ssimo, reconhe�o, dif�cil de ser
abordado sem aborrecimentos. N�o podemos, por�m, diante
dele, simplesmente dar de ombros. O pl�gio medi�nico,
consciente ou inconsciente, � fato - existe sim. E n�o me


venham com essa hist�ria de "concord�ncia universal do
ensino dos Esp�ritos"!

Tenho, ao m�ximo, evitado qualquer refer�ncia de
ordem pessoal neste sentido, mas veja voc�, eu mesmo,
que nada valho e nada sou, sou v�tima de semelhante ato
de desonestidade. � s� fazerem uma compara��o. Por
exemplo, o Hospital dos M�diuns, pelo qual sou um dos
respons�veis, foi inicialmente citado nas obras "Dr.
Odilon", de Paulino Garcia, e "Lindos Casos de Al�m-
T�mulo", de Ramiro Gama. Posteriormente, em trabalhos
de nossa lavra, tivemos oportunidade de uma abordagem
mais ampla e detalhada. Ora, n�o demorou muito para que
algu�m, em livro de sua autoria, promovesse estardalha�os
na imprensa esp�rita, atribuindo a si o que rotulou de
"revela��o aos esp�ritas"... Fiquei, sim, estarrecido. E o
pior � que me colocaram como personagem na obra, sem a
menor consulta pr�via � minha vontade, entendendo at� de
grafarem o meu nome com uma pompa de que, gra�as a
Deus, abdiquei h� muito tempo.

Aqui no interior, minha irm�, os nossos livros s�o de
tiragem reduzida - dif�cil edit�-los e dif�cil coloc�-los no
mercado, o que n�o significa que sejam destitu�dos de
paternidade. Abem dizer, nossas obras, em n�vel nacional,
passam quase despercebidas, o que n�o d� direito a ningu�m
de usurp�-las � clara luz do dia!

Ent�o, como costumam argumentar, tentando me
acalmar, em louvor da uni�o e da paz na Doutrina, eu posso
permanecer calado, fazendo vistas grossas para o que quase


todo o mundo enxerga, mas n�o quer ver, com receio de
assumir responsabilidade e enfrentar o status quo?

N�o, j� disse e repito, n�o tenho o rabo - se voc�
preferir, escrevo "cauda" - preso com ningu�m. N�o tenho
conv�nio com Federa��es, n�o escrevo para agradar, n�o
fa�o pol�tica e, em trocados e mi�dos, n�o estou em leil�o

- com a cabe�a a pr�mio, sim, mas n�o em leil�o! Querem
agir com corre��o, me procurem; caso contr�rio, n�o
contem comigo! Eu n�o sou de ficar em cima do muro...
Reconhe�o que n�o sou dono de id�ia nenhuma! A
originalidade, em termos de obra medi�nica, pertence a
Chico Xavier. N�s outros estamos capengando... Agora,
n�o venham se travestir de mission�rios para cima de mim.
At� para cometer erros, conv�m que sejamos originais!
Tem gente que est� brincando com o Espiritismo e com a
mediunidade! N�o sou eu que estou em discuss�o, mas a
Doutrina. Que bandalheira � essa? Colocam-se acima do
Bem e do Mal e os esp�ritas, feito "vacas de pres�pio",
balan�ando a cabe�a? N�o, eu n�o me calo e, depois de
terem me espancado tanto, n�o me acenem com a bandeira
branca da paz!

Coisa boa � a gente n�o dever nada a ningu�m. Este
orgulho, eu tenho, encho o peito e falo: N�o devo
absolutamente nada a ningu�m! Devo afeto, amor, carinho
e solidariedade aos amigos - coisa que a gente nunca
paga!...

O meu couro � de rinoceronte: podem bater �
vontade... Tem uma turminha jovem a�, que voc�s n�o


conseguir�o deter, pois n�o se trata de gente contaminada.
Essa nova gera��o que, aos poucos, se levanta � a esperan�a
do Espiritismo! Voc�s haver�o de passar... De sua mem�ria,
sabem o que restar�? Poupem-me de lhes dar a resposta.

Falei em contamina��o, cont�gio... Que l�stima!
Conheci gente boa, simples e humilde que voc�s,
gradativamente, foram pervertendo. Hoje, jazem
irreconhec�veis! O esp�rita, quando entra num smoking,
tem que tomar cuidado... Chico Xavier estava coberto de
raz�o, nas broncas que nos dava: � "O Espiritismo n�o
veio para elitizar; a Doutrina � do povo... Est�o inventando
muita coisa... Eu nasci xavante, morro xavante! � curso
disto, curso daquilo, projeto de n�o sei mais o qu�...
Personalismo puro!" Em tempo: as broncas do Chico eram
hom�ricas... O homem ficava "possu�do", e n�o permitia
apartes. Quando se tratava de defender a Doutrina, ele se
transfigurava; mas n�o dessas transfigura��es de araque,
que est�o muito em voga por a�...

Quero, ent�o, minha filha, aproveitando a
oportunidade que a sua carta me concede, enviar o seguinte
recado: Reconhe�o que, na literatura esp�rita, dos
"benfeitores" que os demais m�diuns costumam receber,
eu destoo totalmente - n�o me cobrem a condi��o de
benfeitor, que n�o sou! N�o me venham com essa morda�a
de veludo... Voc�s est�o corrompendo as coisas na
Doutrina! Onde � que j� se viu cobrar palestras a taxas
exorbitantes ou misturar tudo: hol�stica, cristaloterapia,


musicoterapia, fotografia de aura... Deus meu! N�o se
contentam com os livros que vendem?

De mim, pelo menos uma coisa posso falar, do que
Chico falava de si. Certa vez, conversando conosco sobre
as lutas do esp�rito na encarna��o, ele colocou a m�o direita
espalmada � altura da garganta e disse: � "Daqui para
cima, eu estou limpo"! Entendi: o seu esp�rito permanecia
incorrupt�vel! A sua cabe�a continuava pertencendo aos
Bons Esp�ritos!... Poderia, pelos embates da exist�ncia,
estar enlameado at� o pesco�o, mas preservara, inc�lume,
a Mensagem, que flu�a atrav�s de seu pensamento puro...
Grande Chico Xavier, com as suas li��es s�bias e
comovedoras!

Na atualidade, o que mais anda fazendo falta na
Doutrina � sinceridade da parte dos esp�ritas. Vamos coibir
os excessos e, verdadeiramente, nos respeitar. Tem muita
gente a� que j� dobrou o "Cabo da Boa Esperan�a", mas
ainda h� tempo de retroceder... Uma �nica a��o no Bem
pode anular muitas praticadas equivocadamente. A
Doutrina � santa. N�o consintamos que as nossas atitudes
de invigil�ncia nos fragilizem espiritualmente. Tentemos
vivenciar quanto pregamos! Sejamos honestos. Se cada
qual de n�s se puser em seu pr�prio lugar, na mediocridade
que nos caracteriza, n�o cometeremos tantas asneiras.
Vamos "vomitar" o homem velho... Chega! Estamos no
Terceiro Mil�nio da Era Crist�, e os Esp�ritos esperam de
n�s o m�nimo de coer�ncia.


Dizem, minha filha, que quem pergunta quer ouvir,
n�o �? A� est�: ou a coisa muda ou, a passos largos, vamos
caminhar para o abismo, que se nos escancara adiante.

Conclamo a Mocidade Esp�rita a fazer uma revolu��o
no Movimento! A minha expectativa, em rela��o aos mais
idosos, com as exce��es de praxe, confesso, � pequena.
Deposito toda a minha esperan�a no futuro da Doutrina na
Juventude! Que os jovens venham depressa, de todos os
lados, nos salvar, vacinados contra a vaidade e o
personalismo, a mentira e a ilus�o do poder.

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In�cio, tenho grande admira��o por

D. Maria Modesto Cravo. O senhor poderia nos dizer um
pouco mais sobre o trabalho que ela realizou? Ela foi a
fundadora do Sanat�rio, em Uberaba, n�o? Considera que
tenha sido uma m�dium mission�ria?".
Sim, minha irm�, sem nenhum estrelismo, Modesta
cumpriu a miss�o que o Alto lhe confiou. Podemos
consider�-la, sem nenhum favor, entre os pioneiros do
Espiritismo no Brasil.

Portadora de excelentes faculdades de efeitos
intelectuais, n�o somente foi a mentora encarnada da
constru��o do Sanat�rio, como, ela mesma, recebeu
mediunicamente a planta de sua constru��o!


A sua casa, erguida na Rua Bernardo Guimar�es, foi,
por assim dizer, o primeiro centro esp�rita de Uberaba,
denominado Ponto "Dr. Bezerra de Menezes" - "Ponto",
porque passara a ser a refer�ncia dos esp�ritas na cidade,
que l� se agrupavam para estudar e tra�ar planos de trabalho
na Doutrina. Quando, por intercess�o do ap�stolo de
Sacramento, Eur�pedes Barsanulfo, ela se converteu,
descerrou ao Espiritismo as portas de sua alma e de seu
lar, com, evidentemente, a anu�ncia do esposo, Major
Nestor Cravo, que nutria pela esposa um grande respeito e
uma grande admira��o.

Atrav�s das faculdades medi�nicas de Modesta era
assim que a trat�vamos, na intimidade -, os Esp�ritos
coordenaram ou passaram a coordenar as diversas
atividades de expans�o da Doutrina, na cidade e,
conseq�entemente, na regi�o. Do "Ponto", nasceram o
Sanat�rio, o Centro Esp�rita Uberabense, tendo � frente o
inolvid�vel Prof. Jo�o Augusto Chaves, o Lar Esp�rita e
outros grupos que, aos poucos, foram se inspirando no
trabalho de Modesta.

Desnecess�rio dizer das persegui��es sofridas por
ela e pela fam�lia. A �poca, ser declaradamente esp�rita e
m�dium, como era o seu caso, significava um ato de bravura,
que os esp�ritas de hoje desconhecem. Modesta s� n�o
sofreu maiores retalia��es, por conta da prote��o das
divisas do marido, oficial da Pol�cia do Estado de Minas
Gerais. Antes de apedrejarem a casa do Major, os inimigos
da Doutrina pensavam duas vezes... O que j�, por exemplo,


n�o acontecia comigo, que tinha nos fundos do quintal de
casa um estoque de telhas para qualquer eventualidade.

Diversos esp�ritos se expressavam com naturalidade
impressionante, atrav�s da psicofonia de Modesta, a
mediunidade que, a meu ver, nela se sobressa�a, embora
fosse portadora de in�meras outras faculdades: psicografia
(era not�vel receitista), clariaudi�ncia, clarivid�ncia,
desdobramento... E pensar que, praticamente, chegara
amarrada a Sacramento! Eur�pedes, ao avist�-la,
simplesmente mandou que a desamarrassem, transmitiu-
lhe um passe, prescreveu-lhe alguns fitoter�picos, orientou-
a no sentido de que estudasse o Espiritismo e... pronto! De
uma obsidiada, concedeu � Doutrina uma das mais
extraordin�rias medianeiras com quem, na Terra e no Al�m,
j� tive oportunidade de me deparar.

Era comum que, em nossas reuni�es das quartas-
feiras, no Sanat�rio, eu me detivesse, atrav�s dela, em
longos di�logos com o pr�prio Dr. Bezerra, com Eur�pedes
Barsanulfo, Bittencourt Sampaio, Ant�nio de P�dua, Irm�o
Jos�, Gabriel Delanne, Ernesto Bozzano, Am�lia Domingo
Soler, enfim, com importantes vultos do Espiritismo e da
Psiquiatria, como Pierre e Paul Janet e outros.

Modesta, enquanto teve sa�de - desencarnou em 8
de agosto de 1964, ap�s insidiosa enfermidade que,
lentamente, lhe consumiu as for�as - doou-se � Causa
Esp�rita em tempo integral. Preocupava-se com a viv�ncia
do Evangelho, como, por exemplo, a realiza��o do Natal
dos Pobres, iniciada a partir de 1922. Al�m das centenas
de fam�lias assistidas, o grupo, sob a sua orienta��o,


efetuava visitas aos cegos, aos presidi�rios e aos irm�os
internos no Lepros�rio existente na �poca. Em 1940, ela
nos auxiliou na funda��o da Uni�o da Mocidade Esp�rita
de Uberaba, que, durante anos, tivemos a alegria e a honra
de presidir. Imposs�vel, minha irm�, em r�pidas palavras,
sumariar tudo o que Modesta representou para o
Espiritismo, e, evidentemente, continua a representar, ao
lado de tantas outras devotadas seareiras da Terceira
Revela��o, como Zilda Gama, Maria M�ximo, Yvonne do
Amaral Pereira, Corina Novelino, An�lia Franco, Antusa
Ferreira Martins... Anossa lista seria infind�vel!

Vale, ainda, ressaltar que, al�m de suas atividades
medi�nicas intensas, Modesta, m�e de quatro filhos, era
dona-de-casa exemplar; muitas vezes, ao visit�-la, deparava-
me com o seu esfor�o junto ao fog�o a lenha de sua casa,
preparando a comida do esposo, dos filhos e da pequena
fila de pedintes que, todos os dias, se formava defronte �
sua resid�ncia, quando n�o ia encontr�-la rente ao tanque,
lavando esta ou aquela pe�a de roupa.

Ah, os m�diuns de hoje!... Bem, deixemo-los; foi
apenas um pensamento que me ocorreu e, gra�as a Deus,
consegui sopitar...

Aqui, no Mais Al�m, a nossa companheira atua nas
tarefas do "Hospital dos M�diuns", coopera com o nosso
Odilon Fernandes no "Liceu da Mediunidade", desdobra-
se no amparo a diversos grupos medi�nicos na Crosta,
como, atualmente, realiza avan�ados estudos nas Esferas
Superiores, ainda alusivos � Mediunidade, preparando-se
para futura exist�ncia no corpo, que todos, uns mais cedo,

197


outros mais tarde, haveremos de necessariamente
empreender.

N�o posso, � claro, deixar sem registro, em Modesta,
a mediunidade a servi�o da caridade! Praticamente, todos
os dias ela trabalhava na orienta��o espiritual e no
receitu�rio, sendo que muitos, inclusive eu, passaram a
lhe dever a vida. Fumante inveterado, me aparecera uma
mancha no pulm�o esquerdo, com tosse seca e renitente.
Um colega, pneumologista, n�o afastava a possibilidade
de tumor maligno. Submeti-me com ela a prolongado
tratamento de passes, com prescri��es medi�nicas
fitoter�picas; a mancha desapareceu, a tosse se foi e,
infelizmente, continuei fumando. Mais tarde, quando me
apareceu o enfisema, eu j� n�o tinha Modesta...

Durante v�rios lustros, semana ap�s semana, �s
quartas-feiras, ela concedia passividade aos esp�ritos
atormentados, com os quais, eu tinha oportunidade de
dialogar, em intenso e inestim�vel aprendizado para mim,
preparando-me, talvez, por antecipa��o, para a tarefa que
agora busco desempenhar. O que aprendi com Modesta
valeu pela minha encarna��o inteira.

� uma pena que, nos dias que correm, os m�diuns,
homens e mulheres, n�o sejam t�o modestos quanto ela!
Querem ser o que n�o s�o e ficam a dever at� ao que
poderiam ser. Compreendam, n�o se trata de cr�tica - trata-
se de um "afago" de pai, de av� ou de irm�o mais velho,
naturalmente preocupado com os que, de maneira
impercept�vel, v�o se desviando do bom caminho ou sequer
se animando a palmilh�-lo!

198


eu caro, Dr. In�cio, o que o senhor nos
diz sobre a presen�a de Jesus no Espiritismo? Alguns
esp�ritas contestam o aspecto crist�o da Doutrina,
combatendo a sua religiosidade. Alegam que ela �
eminentemente cient�fica, nada tendo a ver com o
Evangelho. O senhor possui uma opini�o formada a
respeito?".

Meu irm�o, se � assim, eu n�o sei ent�o por que
Kardec teria escrito "O Evangelho Segundo o Espiritismo",
uma das obras do Pentateuco, nem tampouco o motivo de,
em "A G�nese", o Codificador, de capa a capa, se referir
com imenso respeito � figura do Mestre Nazareno,


estudando, � luz da F� Raciocinada, em dois longos

cap�tulos, abrangendo quase 70 p�ginas, "Os Milagres do

Evangelho" e as "Predi��es no Evangelho".

Foram os Esp�ritos Superiores que, em resposta �

pergunta 625 de "O Livro dos Esp�ritos", apontaram Jesus

na condi��o do ser mais perfeito que Deus ofereceu ao

homem, para lhe servir de guia e modelo. Inspiradamente,

comentando a mais curta resposta da Obra B�sica, Kardec

escreveu de pr�prio punho: "Jesus � para o homem o tipo

da perfei��o moral a que pode aspirar a Humanidade na

Terra. Deus no-lo oferece como o mais perfeito modelo, e

a doutrina que ele ensinou � a mais pura express�o de sua

lei, porque ele estava animado do esp�rito divino e foi o

ser mais puro que j� apareceu sobre a Terra".

Como aceitar-se o Espiritismo, como sendo o advento

do Consolador da promessa de Jesus, negando-lhe ser a

revivesc�ncia do Cristianismo? "...o Consolador- disse-

nos o Mestre -, que � o Santo Esp�rito, que meu Pai enviar�

em meu nome (grifei), vos ensinar� todas as coisas e vos
far� recordar tudo o que vos tenho dito ".

O Espiritismo sem Jesus n�o tem sentido. Para mim,

o maior m�rito de Kardec n�o foi, propriamente, o de
codificar a Doutrina, coisa que, talvez, um outro homem
de g�nio pudesse fazer; os Esp�ritos, ali�s, tinham lhe dito
que, caso falhasse, seria, de imediato, substitu�do por um
outro... O grande m�rito de Kardec, a meu ver, foi o de
aproximar a Verdade do Amor, ou seja, espiritualizar antigas
verdades, que, desde os tempos dos Vedas, h� mais de

5.000 anos, j� se encontravam no mundo! Ele espiritualizou
a Filosofia e a Ci�ncia, mostrando que a finalidade prec�pua
do Conhecimento � a de tornar o homem melhor.
Chico Xavier, em precioso depoimento, disse-nos:
"Desde muito tempo, noto que a persegui��o de falanges
das sombras da ignor�ncia � um movimento constante e
sistem�tico que eu acredito venha atuando no mundo,
contra a luz que o Cristo veio trazer-nos, a n�s, os habitantes
multimilenares do Planeta. Eles se revezam, atrav�s de
numerosas reencarna��es, como acontece a n�s mesmos,
que nos revezamos, em vidas e vidas, procurando assimilar
os ensinos do Divino Mestre e segui-los, o que certamente
nos custar�, ainda, encarna��es numerosas. Desde muito
tempo, noto que as nossas reuni�es evang�licas para o
interc�mbio espiritual, do ponto de vista global encarnados
e desencarnados - � um combate travado entre
as luzes e as trevas, no qual, por miseric�rdia do Senhor,
somos defendidos e guardados por vigorosas legi�es de
esp�ritos benfeitores que nos sustentam para a extens�o da
Luz e do Bem que o Cristo nos trouxe."

Em outro depoimento, t�o direto quanto o anterior, o
m�dium adverte: "Se tirarmos Jesus do Espiritismo, vira
uma com�dia. Se tirarmos religi�o do Espiritismo, vira um
neg�cio. A Doutrina Esp�rita � Ci�ncia, Filosofia e Religi�o.
Se tirarmos a Religi�o, o que � que fica?"

Sei que � dif�cil a alguns esp�ritas se aceitarem na
condi��o de agentes das Trevas, mas, quando investem

201


contra a presen�a de Jesus no Espiritismo, eles o s�o, e
n�o h� meio termo. Defendem Kardec e, contraditoriamente,
conspiram contra o seu esfor�o de unifica��o da Verdade,
que se encontrava fracionada, em pontos extremos do
Conhecimento. Alguns deles, talvez, assim venham agindo
com receio de que o Espiritismo se transforme em mais
uma religi�o, abdicando da rever�ncia ao Criador conforme
ensinou o Mestre � mulher samaritana - em Esp�rito e
Verdade! Poucos estudiosos atentam que, no po�o de Jac�,
� samaritana a quem solicita �gua, ele igualmente anuncia

o advento do Esp�rito da Verdade!...
Ent�o, minha cara irm�, o Espiritismo, sem a luz do
Cristo, que nos penetra o cora��o e nos renova, n�o tem a
menor raz�o de ser, renteando com um sem-n�mero de
doutrinas esot�ricas, que, at� hoje, n�o lograram operar a
transforma��o da Humanidade.

O Evangelho � o cora��o da Doutrina Esp�rita.

Vejamos: a Reencarna��o, a Lei de Causa e Efeito, a
Comunicabilidade com os esp�ritos, enfim, os princ�pios
sobre os quais o Espiritismo se fundamenta, n�o se
constituem, propriamente, em revela��o alguma: encontr�los-
emos no Hindu�smo, no Mazde�smo, no Budismo,
quanto, inclusive, recuando ainda mais no tempo, nas
manifesta��es de religiosidade do polite�smo humano - a
cren�a na imortalidade e o interc�mbio com os considerados
mortos est�o na g�nese de todas as religi�es, nas mais
diferentes culturas. O que confere significado a toda esta

202


gama de conhecimentos esparsos � o Evangelho, que
instruiu a criatura no sentido de construir o Reino Divino
dentro de si!

As pessoas, mesmo os esp�ritas (� �bvio que n�o
generalizo), t�m medo da proposta renovadora do Cristo,
proposta t�o revolucion�ria, que, intimidando os doutores
da lei, os levou � condena��o sum�ria de Quem lhes
incomodava tanto a consci�ncia! Jesus foi sentenciado ao
madeiro, justamente por ter desmascarado a hipocrisia da
�poca!

O Espiritismo, na atualidade, vem fazendo o mesmo,
desmistificando a Verdade, ou, em outras palavras,
desnudando-nos da pesada roupagem da ilus�o. O pessoal,
mal-acostumado, quer, no entanto, permanecer na esfera
da discuss�o teol�gica, gastando saliva e n�o consumindo
suor; o que, minha irm�, convenhamos, �, de fato, um
exerc�cio que nos imp�e tremendo desgaste. Trocar o p�lpito
pelo confronto direto com os pobres e estropiados, fechando
a B�blia aqui para abri-la l� fora, atrav�s da a��o incessante
na Caridade, � um tormento para os nossos esp�ritos
pregui�osos, milenarmente acostumados a teorizar.

Eis o que penso, e deixe essa turma espernear quanto
quiser. Entre Jesus e Kardec, se tivesse que efetuar
semelhante escolha, eu ficaria tranq�ilamente com Jesus,
principalmente por saber que ele me aceita como sou.

Eu vou arriscar dizer uma coisa a voc�, sem saber se
conseguir� entender: eu n�o ag�ento esp�rita exclusivamente


kardecista!... Se bem que, para mim, ser esp�rita implica,
necessariamente, em ser crist�o. Mas essa turma que enche
a boca para falar de Kardec, deveria encher de Jesus o
cora��o! Concorda ou n�o? Se n�o concordar, lamento
inform�-la que esta � a minha opini�o e vai ficar assim
mesmo.

Voc� j� viu jogador de futebol, quando erra a bola e
acerta o baixo-ventre do advers�rio? Espiritismo sem Jesus,
para mim, � isto!



In�cio, o senhor poderia nos dizer
algo sobre a maneira com que escreve os seus livros
medi�nicos? N�o se trata de mera curiosidade. � que eu
nunca li qualquer informa��o a respeito. N�o fa�o a m�nima
id�ia e creio que muitos tamb�m n�o. Por�m, sinta-se �
vontade. Sei que o senhor � muito ocupado, para ficar
perdendo tempo com estes questionamentos..."


N�o, meu irm�o, � com muita alegria que passo a
responder a sua missiva, ignorando, por�m, se conseguirei
satisfazer o seu leg�timo desejo de aprendizado.

Vamos l�. O processo, � l�gico, varia de escritor
para escritor, junto a este ou �quele medianeiro. Falarei de
como acontece comigo, certo?


Comporto-me como qualquer autor encarnado:
concebo a id�ia, vivencio a experi�ncia e tento transmiti-la
para o papel, dando-lhe a melhor reda��o poss�vel. Clareza
e concis�o - eis o que me preocupa e me norteia. Nada de
palavreado excessivo e dif�cil ou de d�bia interpreta��o.
Escrevo, rascunho, torno a escrever, substituo palavras,
suprimo alguns par�grafos, acrescentando outros... Enfim,
� uma "guerra". Permita-me utilizar o verbo: n�o � f�cil

parir um livro! Em mim, a produ��o de qualquer texto

sempre foi um parto doloroso; n�o raro, a "crian�a" nasce

com o aux�lio de f�rceps... Sofro e gemo!

N�o pense voc� que n�s, os desencarnados,
conhe�amos alguma f�rmula m�gica para a transmiss�o
do pensamento, de uma dimens�o a outra; pois as coisas,
nestes moldes, � mais dif�cil ainda, porque envolve sintonia
e filtragem, sem me referir � disciplina, boa vontade, esmero,
capacidade, etc. A lista de requisitos n�o caberia neste
cap�tulo.

Tanto quanto poss�vel, evito a improvisa��o. An�o
ser quando, na revis�o de uma id�ia, sou acometido por
uma inspira��o - sim, porque, gra�as a Deus, n�s, os autores
desencarnados, tamb�m contamos com ela que, por vezes,
nos favorece.

Normalmente, antes, por exemplo, de procurar o
m�dium para escrever, estou com quase tudo pronto, em
seus pontos essenciais de abordagem. Raramente, fujo do
preestabelecido. Ao que me lembre, aconteceu uma �nica
vez, quando est�vamos em pleno processo de transmiss�o
de "Na Pr�xima Dimens�o", no 1.� semestre de 2002. Chico


Xavier desencarnou e, ent�o, decidi mudar o projeto
original da obra. Foi em 30 de junho de 2002, h� exatamente
5 anos. Fomos todos para l�, conforme, sumariamente, tive
oportunidade de descrever nas p�ginas da referida obra,

que � a minha preferida.

Procuro, ainda, efetuar um trabalho de aproxima��o

do int�rprete medi�nico: visito-o com maior freq��ncia,

penso nele, fa�o com que ele pense em mim (� quase uma

t�cnica obsessiva!), suscito encontros espirituais... Ali�s,

trazer algu�m para c�, em desdobramento natural, �

dific�limo. Quase sempre, a turma vai se deitar de cabe�a

cheia, repleta de preocupa��es rasteiras e, depois que se

horizontaliza, nada de querer se verticalizar. A gente fica

ali, feito bobo, ao lado do corpo que mais parece um

cad�ver, tentando soprar alguma coisa. Se vida de m�dium

n�o � f�cil, vida de esp�rito mensageiro � um horror!

Enganam-se os que imaginam que n�s, os autores

desencarnados, nos senhoreamos das faculdades

intelectivas do m�dium, anulando-o em sua possibilidade

de interfer�ncia. N�o, praticamente em todo comunicado

nosso, o m�dium mete o bedelho... Estamos j� t�o

habituados ao fen�meno, que contamos com a interfer�ncia,

torcendo para que ela nos seja ben�fica - sim, porque, em

raros medianeiros, ela n�o deixa de ser fator coadjuvante

ou, em outras palavras, positiva e at� mesmo desej�vel! O

nosso caro Odilon Fernandes, estudioso do tema, um dos

esp�ritos que conhe�o que mais entendem de mediunidade

(as suas excelentes obras est�o a�, � disposi��o dos leitores

encarnados), costuma definir o processo como parceria.


De fato, m�diuns e esp�ritos trabalham em regime de
leg�tima parceria, e, em s� consci�ncia, ningu�m poder�
negar isto.

N�o pense voc�, meu irm�o, que eu, por exemplo,
teria paci�ncia para me postar ao lado do m�dium e, letra
a letra, palavra a palavra, ditar-lhe um longo texto. Quanto
mais um livro de n�o sei quantas p�ginas! Fosse assim,
mais pr�tico seria continuarmos com o processo arcaico
da tiptologia ou nos valermos da "cesta-pi�o" - pelo menos,
nos dois casos, o m�dium participaria apenas e t�o-somente
com a libera��o de ectoplasma.

Quase sempre, em linhas gerais, na produ��o de meus
livros medi�nicos, acontece assim: com base no que j�
rascunhei e escolhi por assunto priorit�rio que pretendo
dar conhecimento aos irm�os no corpo de carne, lan�o
sobre a mente medi�nica, como algu�m que projeta imagens
num espelho, as id�ias-clich�s... A mente do m�dium, ent�o,
se me transforma como se fossem aquelas antigas chapas
de ebonite (nas quais os discos eram prensados), nas quais
"imprimo" o meu pensamento. Depois, � rezar e torcer
para que a agulha n�o arranhe o longing-play... N�o sei se
voc� est� entendendo. Espero que a minha explica��o n�o
esteja causando nenhum caos em sua cabe�a.

Se voc� me perguntar - com licen�a do m�dium - se
eu me satisfa�o, doutrin�ria e literariamente, com os livros
medi�nicos que escrevo, eu lhe direi: Mais ou menos! O
que � essencial vai; n�o se distorcem, todavia, os
obst�culos, no que tange � emiss�o e recep��o do
pensamento, que se prop�e atravessar a fronteira das

208


dimens�es diferentes, s�o quase inarred�veis. Compreendo,
no entanto, que, em termos de mediunidade, estamos muito
no come�o. Como Odilon nos diz: � "Estamos saindo da
caverna..." Aos poucos, em se tornando mais conscientes
com rela��o ao processo, os m�diuns ir�o se fazendo mais
respons�veis e participativos, deixando de se constituir,
pela d�vida, num dos principais empecilhos � tarefa do
interc�mbio.

Um �ltimo esclarecimento, que, para voc�, refuto
como valioso, em face do questionamento que me dirigiu.
Desde ontem, quando selecionamos a sua missiva para
resposta, tenho procurado envolver o m�dium, procurando
"impregn�-lo" - n�o fluidicamente! - ou, se preferir,
"fecund�-lo", tornando-o "gr�vido" das id�ias centrais da
abordagem que estamos terminando de fazer. Sim, o
processo n�o deixa de se assemelhar a uma fecunda��o: o
esp�rito entra, literalmente, com o pensamento e o m�dium
com a roupagem do vocabul�rio! Da�, meu amigo, a
import�ncia de o m�dium estudar sempre - do m�dium e
do esp�rito tamb�m!

Espero, numa nova oportunidade, conversarmos mais
a respeito. � melhor procurar o ponto-final, antes que o
m�dium, por sua conta e risco, comece a inventar. Sim,
porque, nos m�diuns prolixos, quando o esp�rito p�ra de
pensar, eles continuam... Enfim, � o pre�o que se tem que
pagar, quando se escolhe por tarefa transitar entre os Dois
Planos.

Um grande abra�o!


In�cio, das li��es de sua vasta
experi�ncia de vida, qual o senhor escolheria para nos
transmitir? Imagino que tenha muito para nos ensinar, com
a sua conviv�ncia, por mais de 50 anos, com os doentes no
Sanat�rio e os familiares deles. N�o sei se seria incomod�lo
em demasia pedir que o senhor nos edificasse com a
lembran�a de alguma li��o que o tenha marcado. Ficarei
imensamente grato".

N�o, meu irm�o, voc� n�o me incomoda com a sua
solicita��o. Para mim, � uma alegria poder atend�-lo, por�m
n�o na condi��o de quem algo possa ensinar. Chico nos
dizia que um amigo n�o d� li��o em outro...


O Sanat�rio, de fato, foi a melhor universidade que
cursei, ao longo de minhas m�ltiplas experi�ncias
reencarnat�rias. O contato di�rio com os internos, os nossos
di�logos, os conflitos com os familiares deles, n�o raro,
fatores agravantes da situa��o em que se encontravam...
Isto tudo, � claro, de permeio com as instru��es que os
Esp�ritos Benfeitores nos transmitiam e, por que n�o dizer,

o que aprend�amos tamb�m com os chamados obsessores.
Dramas, provas, sentimento de vingan�a, �dio, lutas afetivas
que, por s�culos, se arrastavam.
Eu costumava dizer que, no Sanat�rio, n�s nunca
t�nhamos dois dias iguais; a mesmice, �s vezes, era
quebrada ao cair da tarde, quase � noitinha, quando
ach�vamos que atravessar�amos aquelas 24 horas
inc�lumes, sem uma novidade qualquer, quase sempre por
teste � nossa compreens�o e paci�ncia.

Consultando agora os alfarr�bios da mem�ria, ante o
seu fraterno questionamento, fica dif�cil selecionar uma,
dentre tantas li��es que receb�amos cotidianamente e que
t�o profundo me calavam. Elas eram o meu travesseiro
nas madrugadas que varava insone, quando me punha a
pensar em quanto, de modo pr�prio, complicamos as coisas.

Deixe-me, no entanto, reproduzir pequeno di�logo
que, em certa ocasi�o, tive oportunidade de travar com um
confrade que nos visitava. Se n�o me equivoco, era
Leopoldo Machado, de passagem por Uberaba.

Depois de percorrer, em minha companhia, os
pavilh�es do Sanat�rio, em r�pida excurs�o pelas nossas


pobres instala��es, ao retomarmos ao meu consult�rio,
enquanto sabore�vamos um cafezinho, o suposto grande
tribuno me perguntou:

�Dr. In�cio, o senhor, igualmente, deve sofrer muito,
n�o �? Vendo e convivendo com tanta gente sofrida, casos
cr�nicos como os que tive oportunidade de observar... As
suas lutas pessoais na sustenta��o da Doutrina, ante o
preconceito e o fanatismo que ainda enfrentamos... Os
artigos e os livros que escreve... Diga-me - arrematou,
sintetizando o senhor n�o se angustia?

At� hoje eu n�o sei de onde me veio aquela resposta
na hora. Certamente, um Amigo Espiritual que passava
por ali me inspirou.

�Meu caro - disse-lhe -, a gente, para sofrer, precisa
ter tempo!

Ele me olhou, surpreso, e come�ou a sorrir, dando-
me inteira raz�o.

Mais tarde, quando ele se despediu e Manoel Roberto
fora lev�-lo � rodovi�ria, onde deveria embarcar, fiquei eu
mesmo a meditar na s�bia resposta que me escapara dos
l�bios.

�Meu Deus! - exclamei -, de onde me veio aquela
"p�rola"...

E repetia a frase, com a finalidade de n�o a esquecer:
"Agente, para sofrer, precisa ter tempo!".

E, gra�as a Deus, meu irm�o, tempo foi uma das
�nicas coisas que, praticamente, nunca tive na vida. Tempo


para mim, para os meus devaneios, enfim, para as minhas
psicoses e obsess�es. N�o sobrava espa�o, por onde a
depress�o pudesse se me insinuar, como, infelizmente,
acontece com muita gente. Nem que eu quisesse fabricar
algum tempo ocioso, eu conseguiria! Como?! Com uma
m�dia de 50, 60 pacientes internos para cuidar, outros tantos
em meu consult�rio, artigos para escrever, palestras a serem
proferidas, os meus gatos, os meus flertes, que, se n�o
eram tantos, eram em n�mero suficiente...

Positivamente, meu amigo, eu mal tinha
disponibilidade para adoecer - raras vezes, eu me recordo
de mim mesmo acamado! Quando, por conta de um resfriado,
um tanto febril bambeava o corpo, o telefone tilintava: era

o Manoel Roberto, me colocando a par de um "problem�o",
requisitando a minha presen�a urgente, no Sanat�rio.
Tenho um amigo, ainda na carne, que costuma dizer,
brincando: � "Estou na fila para adoecer, mas o pessoal
n�o deixa... � a conta de um se levantar, o outro se deita!"
Ele tem raz�o. O esp�rita que realmente se disp�e a trabalhar
n�o tem tempo para adoecer, curtindo cama e essas outras
mordomias todas que, convenhamos, por outro lado, n�o
deixam de fazer bem � gente, n�o �? Principalmente quando
se ama e se deseja um cafun� especial. Eu, que sempre
morei sozinho - s� me casei quase aos 70! -, quando
amea�ava ir para a cama, eram os meus gatos que me
precediam sob os cobertores e as almofadas.

Penso, assim, que qualquer dor se torna muito mais
insuport�vel quando temos tempo para nos dedicar a ela.

213


A ociosidade � a porta preferencial da obsess�o! E n�o s�
da obsess�o, � l�gico: a vida sedent�ria � foco de in�meros
processos enfermi�os - as defesas org�nicas caem, o
emocional destrambelha e os microorganismos patog�nicos
fazem a festa... O curioso � que, de maneira geral, os
doentes, principalmente os psiqui�tricos, rejeitam a terapia
ocupacional. Todos os pacientes dos quais tive
oportunidade de cuidar, centenas e centenas deles, que
aceitavam participar, trabalhando, da pr�pria recupera��o,
obtinham significativas melhoras, por mais grave a eles
fosse o quadro. Dos que cruzavam os bra�os, a doen�a se
apropriava de vez e... haja encarna��o pela frente!

Creio, sinceramente creio, que toda futura revolu��o
em qualquer tratamento m�dico, em toda a abrang�ncia da
Medicina, se constituir� em um medicamento, n�o
necessariamente qu�mico, que induza a pessoa a participar
do pr�prio processo de cura, fora do que a cura real ser�
sempre uma utopia.

Penso que, embora singelamente, pude lhe responder,
n�o?

Por favor, n�o pense voc� e, porventura, quem vier a
ler estas linhas, que eu esteja exagerando. Reconhe�o que
existem casos complexos de sofrimento e os respeito.
Todavia, mesmo nos que renascem em dolorosos quadros
c�rmicos, o sofrer mais ou menos sempre depende do estado
de esp�rito com que nos dispomos a facear a prova.

Espero, pois, e esta � uma das poucas coisas que
integram a minha escassa lista de peti��es ao Criador, que


Ele, por intercess�o de sua Infinita Miseric�rdia, jamais
me conceda tempo para sofrer, com e na inutilidade,
continuando a plenificar os meus dias de trabalho, porque,
em s� consci�ncia, n�o h� quem n�o se disponha a permutar
um milh�o de gotas de suor por uma �nica l�grima!

215


In�cio, sou apreciador de suas obras
e quero parabeniz�-lo pela coragem. O senhor vem
quebrando paradigmas e desmistificando o Movimento,
acabando com a id�ia equivocada de que m�diuns e
esp�ritos comunicantes s�o seres especiais. A sua ousadia
nos tem feito muito bem...".

A que ponto chegamos, meu amigo!

Compreendo as suas palavras de incentivo, mas,
sinceramente, n�o posso aceitar os seus parab�ns - n�o,
pelos motivos que voc� relaciona em sua missiva. Em
outras circunst�ncias, eu os aceitaria, como se, pelo menos,
eu tivesse realizado um dos doze trabalhos de H�rcules,
filho de Zeus e Alemene, ainda que fosse o mais singelo


deles, qual o de limpar as estrebarias de Augias, cujos
est�bulos, que n�o eram limpos havia 30 anos, albergavam

3.000 bois... D� para se imaginar o tamanho da sujeira,
n�o �?
Mas cumprimentar-me pela minha coragem em dizer

o que penso aos esp�ritas, que presumo sejam meus irm�os,
sinceramente...
N�o creio que esteja fazendo qualquer vantagem, ou
estou? De repente, um regime de exce��o se instalou entre
n�s e, desencarnado h� tempos, n�o fiquei sabendo. �
poss�vel, posto que as not�cias que nos chegam da�
costumam ser desalentadoras, mesmo aquelas que,
ultimamente, se vinculam ao nosso Movimento, as quais
os Esp�ritos Superiores definem como "processo libertador
de consci�ncias".

Se voc� estivesse me parabenizando pela vit�ria
contra o v�cio do tabaco, que, por fim, alcancei, depois de
mais de meio s�culo de luta, eu me ufanaria e, deixando a
mod�stia de lado, esperaria, inclusive, pela coroa de louros
sobre a fronte...

Se os seus cumprimentos, meu irm�o, se motivassem,
digamos, por um ato her�ico de minha parte, semelhante
ao do esfor�o an�nimo de tantos confrades que se
desdobram, cotidianamente, longe das p�ginas de nossa
imprensa algo elitista, no cumprimento de suas
consideradas insignificantes tarefas no campo doutrin�rio
e assistencial de nossas lides, eu os aceitaria, ainda que
me soubesse n�o completamente merecedor...

217


Conheci, em Uberaba, uma m�dium chamada Antusa
Ferreira Martins, que era surda-muda, devido �s seq�elas
de meningite na inf�ncia. Desenganada pelos m�dicos, foi
curada pela intercess�o espiritual de Eur�pedes Barsanulfo,

o qual passou a auxiliar na manipula��o dos medicamentos
que, graciosamente, oferecia �s centenas de enfermos que
procuravam por ele, em Sacramento. Antusa, cuja estatura
f�sica n�o excedia 1,50 metro, transformou-se, ent�o, em
extraordin�rio instrumento entre os Dois Planos da Vida,
desenvolvendo-se-lhe as faculdades de vid�ncia,
clariaudi�ncia, desdobramento e, principalmente, a de cura,
que, durante 70 anos, exerceu com a maior discri��o
poss�vel. Reportando-se � sua condi��o de m�dium
passista, Chico dizia: � "Antusa traz o rem�dio nas
m�os!..." Filas imensas, no m�nimo tr�s vezes por semana,
formavam-se pelos corredores estreitos de sua casa, onde,
abnegadamente, atendia a quantos recorriam aos seus
pr�stimos em um pequeno barrac�o, quase da altura dela,
de ch�o-batido por piso e toscos bancos de madeira com
os p�s fincados no ch�o.
Antusa, nos intervalos de suas atividades medi�nicas,
dedicava-se a confeccionar pequenos tapetes de retalhos,
que vendia, transformando-os em leite para as crian�as
pobres de creches e orfanatos.

Quase nonagenaria, como eu, acometida por um
insulto cerebral que a deixara her&ipl�gica e cega, a nossa
hero�na, recolhida ao leito, insistia em continuar erguendo


uma das m�os para aben�oar aos que a visitavam,
lamentando, por antecipa��o, a orfandade espiritual em
que haveriam de se ver com o desenlace da benfeitora
deles, de seus filhos e netos.

Antusa, ao que sei, se mereceu alguma pequena nota
em uma p�gina de jornal, deve ter sido uma �nica vez,
porque, infelizmente, os nossos articulistas, de maneira
geral, vivem mais preocupados em escrever para fazer
tr�fego de influ�ncia com este ou aquele "medalh�o"
enzinabrado da mediunidade ou da tribuna...

Ent�o, meu caro amigo, solicitando que voc� converta
os seus parab�ns em preces em meu favor, a fim de que eu
n�o sucumba � pr�pria fragilidade, dispenso os seus
cumprimentos formais, por absolutamente n�o atinar com
a sua causa. Convenhamos, parabenizar um esp�rita pela
"coragem" de ser ele mesmo, em seu amor pela Causa, �

o fim da picada! Da� para a frente, n�o h� caminhos, s�
abismos... E, se n�o lograrmos controlar os corc�is de nossa
insensatez, em quase incontido galope, � onde todos n�s
iremos parar...
Dentro de minha insanidade e falta de lucidez, sobrou-
me a consci�ncia de que nada tenho feito digno de qualquer
elogio.

Assim como o que, talvez, tenha concorrido para o
�xito espiritual de nossa irm� Antusa, em seu apostolado
medi�nico, foi a sua condi��o de surda-muda, tenho
solicitado de nossos Maiores a b�n��o de, tanto quanto

219


poss�vel, permanecer alheio aos embates em torno
envolvendo o meu nome, para que eu n�o me distraia do
compromisso essencial, que � o de continuar trabalhando,
oferecendo o melhor de mim � Causa que abra�amos. E
isto - acredite - n�o lograrei, como, de resto, ningu�m h�
de lograr, se, voluntariamente, n�o se fizer cego, surdo e
mudo, para o que n�o deve ver, ouvir e falar!

Antes de encerrar, permita-me um coment�rio �
margem, quanto � sua observa��o de m�diuns e esp�ritos
comunicantes serem considerados especiais... Isto � balela!
Tem gente interessada em fomentar tal ilus�o, para tirar
proveito pessoal, ante os que ignoram a realidade das coisas.
Interc�mbio medi�nico � uma "liga��o telef�nica" entre
duas pessoas, atrav�s da qual quem sabe um pouco mais
informa a quem sabe menos... Os que voc�s costumam
rotular de Instrutores, entre n�s, os desencarnados, s�o
companheiros comuns, sujeitos a equ�vocos e enganos;
raros s�o os que, efetivamente, merecem a defer�ncia com
que s�o tratados pelos seus conhecimentos e capacidade
de amar!

Confesso-me envergonhado, pois as suas palavras,
que, repito, compreendi em sua inten��o de me incentivar
no prosseguimento da boa luta, soaram aos meus ouvidos
com indisfar��vel sentido; � como se algu�m deste Outro
Lado, me saudasse em meu regresso do Orbe, ap�s o
desenlace do corpo: � "Pela sua coragem de ser esp�rita,
entre os esp�ritas, meus parab�ns!..."

220


A que ponto chegamos! Os crist�os que, durante
trezentos anos, pereceram nos circos, em espet�culos
sanguinolentos, aos aplausos da multid�o desvairada, n�o
receberam, no limiar da Nova Vida, tantas efusivas
manifesta��es quanto as que, nos dias atuais, um esp�rita
recebe, simplesmente porque se atreve a dizer o que pensa
e teima em continuar sobrevivendo �s tramas urdidas contra
ele!...

221


In�cio, fa�a-nos sorrir, conte-nos algo
pitoresco... O senhor deve ter muitas reminisc�ncias
curiosas, um homem espirituoso como se revela atrav�s
de seus escritos. Deixemos tricas e futricas de lado...
Adoramos o seu estilo descontra�do".


Conforta-me saber, meu irm�o, que n�o sou t�o
ranzinza assim, feito um gato que tinha, do qual, por mais
fizesse, nunca conseguia me aproximar, nem com uma lata
de sardinhas nas m�os... Agora, voc� imagine o
temperamento desse felino! Penso que, em vida pr�xima,
ele h� de reencarnar esp�rita...

Vamos, ao que voc� me solicita; afinal, um dia, posso
vir a ganhar a vida como humorista, n�o �? Quem sabe, um


Chico Anysio, um Costinha, um Z� Trindade ou, com um
pouco mais de talento e oportunidade, um Cantinflas ou
um Jerry Lewis.

Certa vez, caminhando pelas ruas de Uberaba, avistei

o Agenor. Trata-se, � claro, de nome fict�cio. S� n�o mudei
de cal�ada, porque n�o tive jeito. O Agenor era um desses
esp�ritas do contra... Contestava tudo, at� a ora��o do "Pai
Nosso". Eu, cansado, n�o queria top�-lo naquela tarde,
pois, com toda a certeza, haveria de me aporrinhar com
uma de suas provocativas perguntas. Como esp�rita, ele
daria um excelente protestante, mas Deus me livre daquele
homem com a B�blia debaixo do bra�o...
�Dr. In�cio - disse, cumprimentando-me, a me olhar
como presa a ser devorada -, como vai?

� Bem - respondi, monossil�bico, no di�logo que
se desdobrou.
� Que bom encontr�-lo!
� �...
�H� muito tempo eu tenho uma pergunta a lhe fazer,
ou melhor, um esclarecimento a pedir.
E sem sequer perguntar se eu estava com aquilo cheio,
sem perigo de estourar ali, no meio da rua, emendou:

� Eu n�o concordo com uma frase de "O Evangelho
Segundo o Espiritismo"...
� Nem eu - respondi, disposto a concordar com
tudo, para que o assunto morresse por ali.
� Como?! O senhor nem me esperou falar!...

� Pois fale, Agenor. Seja o que for, eu acho que
voc� est� certo...
� � aquela: "A dor � uma b�n��o que Deus envia a
seus eleitos..." N�o concordo! - enfatizou.
�Assino embaixo.

� Onde � que j� se viu?... O Espiritismo, ent�o, �
uma doutrina masoquista?!
�Apoiado!

� O senhor concorda comigo? - indagou, surpreso.
� Concordo. Quem sou eu, Agenor, para n�o
concordar com os seus argumentos?!
� O senhor sabe, eu sou meticuloso...
� Sei!
� Estudo a fundo...
� Eu sou mais raso, mas...
� Quer dizer, ent�o, que o senhor endossa a minha
tese?
� Perfeitamente.
� O pessoal chega sofrendo, o orador toma a palavra,
emposta a voz e come�a a ladainha: "A dor � uma b�n��o
que Deus envia a seus eleitos; n�o vos aflijais, pois, quando
sofrerdes..." Ora, eu iria embora do centro na hora!
� Eu tamb�m!
� Mas o senhor � esp�rita convicto...
� Se voc� quer, sou!
� Um esp�rita convicto n�o pode pensar como o
senhor...
� N�o, n�o pode.
224


� O senhor entende, h� implica��es filos�ficas no
texto que o povo de intelig�ncia mediana n�o assimila.
Acho que Kardec deveria ter suprimido a frase...
�Voc�, realmente, vai fundo, Agenor.

�Eu imaginei que, sendo um dos maiores defensores
da Doutrina por estas bandas, fosse me repreender,
contestar...

�N�o, de jeito nenhum!

� Estou - perdoe-me -, desconhecendo o senhor...
Famoso polemista!
� Polemizo com os padres, Agenor.
� Desejo, no entanto, Doutor, ouvir a sua clara
opini�o. Est� contra ou a favor?
� Do qu�? - perguntei, ensaiando a retirada, com
ele a me cercar na cal�ada.
� Da frase, Doutor!
� Sobre a dor?... Voc� est� certo.
�N�o, n�o estou, n�o! - exclamou contrariado.
� Ent�o, n�o est�, Agenor!
� Doutor, a frase est� certa. A gente � que � rebelde
demais...
� Sim!
� Sem sofrer, a gente n�o melhora...
� De fato!
� O senhor n�o pode concordar com um argumento
desse; trata-se, Doutor, de um sofisma... A sua
responsabilidade � grande.
� Coitado! - exclamei, penalizado.

� De quem? - retrucou, continuando a desafiar a
minha capacidade de atravessar corpos compactos...
� De mim!
� Doutor, o senhor anda bem de sa�de?
� Mais ou menos...
�Acho que menos do que mais...
�Concordo!
� O senhor est� p�lido...
� Estou!
� Infec��o intestinal?
r

� E...
� Diarr�ia?...
� Das brabas e... preciso ir andando, sen�o...
� Doutor, aquela li��o da "Paci�ncia" � linda...
� �...
� Eu tinha outra quest�o sobre perisp�rito, mas o
senhor...
� Estou com c�lica e receio que...
� V� com Deus, Doutor!
� Vou, Agenor, vou com Deus, ao banheiro,
depressa...
Despedimo-nos, e... respirei aliviado. Escapara vivo,
quase ileso, n�o fosse pela c�lica intestinal que ele mesmo
me arranjara.

No outro dia, recebi dois telefonemas de distintos
confrades que me interpelavam: � "Doutor, � verdade
que o senhor aceita, mas com ressalvas, aquela frase: 'A


dor � uma b�n��o que Deus envia a seus eleitos...'? Est�
circulando entre n�s esse boato."

A ambos, respondi:

� O que voc�s acham? Estou numa fase light. O
que voc�s acharem eu acho!
� N�s achamos, Doutor, o que Kardec acha...
� Eu tamb�m: o que Kardec acha e o Agenor, que
n�o sou louco de discordar dos dois!

In�cio - voc� me pergunta em sua
opini�o, qual �, na atualidade, o maior advers�rio dos
esp�ritas? Tenho para mim que seja a vaidade, contra a
qual, muitas vezes, eu mesmo me surpreendo lutando. A
gente n�o percebe que vai se perdendo... Que dica o senhor
nos daria, a fim de que sejamos mais humildes?".


Meu filho, de fato, a vaidade se disfar�a tanto, que
temos dificuldade para identific�-la em n�s mesmos.
Concordo com voc�. A gente sobe em cima de uma folha
de papel e j� se acha o tal... Interessante � que ela, a vaidade,
n�o nos acomete o sentimento: � na esfera intelectual que
se enra�za, nos induzindo a in�meros del�rios.


Deixe-me contar algo a voc�. Certa vez, semelhante
perigo come�ou a me rondar. Somos fr�geis e tolos. O
pessoal, como se costuma dizer, "enchia a minha bola" e
eu, bobo, acreditava. O nome de In�cio Ferreira estava se
projetando e, devido � posi��o que ocupava, os bajuladores
se encarregavam do resto. Comecei a me achar o tal...
M�dico, solteiro e charmoso, metido a literato, diretor de
um hospital, enfim, essas coisas que n�o passam de p�.
Ainda n�o me havia ca�do aos olhos as s�bias palavras
que o ap�stolo Tiago grafou em sua Ep�stola, cap�tulo 4,
vers�culo 14: "V�s n�o sabeis o que suceder� amanh�.
Que � a vossa vida? Sois apenas como neblina que aparece
por instante e logo se dissipa".

Creio, em resumo, que eu estivesse vivenciando uma
daquelas fases em que os Esp�ritos Amigos nos deixam
mais a s�s, a ver como nos arranjamos com as nossas
mazelas e imperfei��es.

Quando, por�m, me sentia quase vencido, ou melhor,
convencido de que o nada que eu era e sou fosse alguma
coisa, a Miseric�rdia Divina me estendeu as m�os e me
subtraiu ao precip�cio que me tragava.

Naquele dia, o autom�vel quebrara na garagem e
tive que me mandar a p� para o Sanat�rio, subindo e
descendo por aquelas ruelas n�o pavimentadas, com o
intuito de cortar caminho. Uberaba, repleta de morros, �
semelhan�a de Roma, fazia jus � antonom�sia "Cidade das
Sete Colinas", com que � conhecida em todo o Estado.


Assim, caminhava, na tarefa imposs�vel de evitar
sujar os sapatos, quando, no percurso, uma mendiga me
solicitou um adjut�rio. Sinceramente, eu nunca a vira por
aquelas bandas... Pano amarrado � cabe�a, negra e obesa,
segurava um menininho pela m�o que, deduzi, deveria ser
seu neto.

� Doutor, uma esmola para esta pobre - rogou com
olhos suplicantes.
Gra�as a Deus, habituado a socorrer a quantos me
recorriam aos pr�stimos, peguei alguns trocados e, at�
ent�o, sem dizer uma palavra, os entreguei � minha
benfeitora.

�Deus lhe pague! - agradeceu com sincera inflex�o
de voz. � H� tr�s dias estamos no escuro, o querosene da
lamparina acabou e...

� Qual � seu nome? - perguntei por perguntar, como
tantos, na maioria das vezes para amenizar o remorso que
sentem.
�Ah! - respondeu, apontando um desbarrancado.

� Eu sou uma velha gorda que mora ali na descida!...
Poucas vezes, palavras, aparentemente t�o
insignificantes, me soaram t�o expressivas aos ouvidos.
Ora, eu havia perguntado pelo nome dela... E certo que
estava mais preocupado em n�o sujar os sapatos, no ch�o
lamacento pela chuva fina que ca�ra de madrugada, mas,
afinal de contas, a pergunta n�o fora aquela.

Enquanto eu tomava f�leg� sobre o tope do morro
que escalara, a pedinte sem nome, puxando o garotinho

230


pela m�o, enveredou por um atalho em meio �s coivaras
que cresciam rente ao brejo e desapareceu.

Conforme lhe disse, aquelas palavras pronunciadas
por ela, tiveram um efeito anti-hipn�tico sobre mim e,
naquele dia, n�o consegui pensar em mais nada. Valeram-
me por uma esp�cie de Bezetacyl nas veias, ou, se preferir,
por um Haldol nas n�degas, devolvendo-me o ch�o aos
pr�prios p�s.

Por coincid�ncia ou n�o, � porta do Sanat�rio, naquela
manh�, aguardava-me um jornalista da Argentina,
interessado em fazer uma mat�ria comigo. Viera
acompanhado de um confrade de Franca, do jornal "A Nova
Era", que, ao me avistar, subindo a escadaria do hospital,
anunciou-me a ele:�"Eis o grande Dr. In�cio Ferreira!..."

N�o vi quando lhes respondi, franzindo o cenho, como
quem desperta de terr�vel pesadelo: � "...Eu sou uma
velha gorda que mora ali na descida!..."

Esperando pela tradu��o do companheiro, o jornalista
argentino sorriu, sem entender patavina.

� Vamos entrar - convidei-os, tirando o mocassim
semi-enlameado e, descal�o, caminhando na dire��o do
tanque, para lav�-lo.
Desnecess�rio esclarecer que aquela foi a entrevista
mais lac�nica de toda a minha vida.

Voc� me pediu uma dica e ela a� est�: a vacina contra
a vaidade � se sentir uma velha gorda que mora ali na
descida!... � claro, se algu�m tiver algum escr�pulo na
esfera sexual, que, felizmente, n�o � o meu caso, um velho
gordo serve...


Analise comigo: aquela filha de Deus, sem nome e
quase sem rosto (o pano alvo enrolado na cabe�a o encobria
todo), morando praticamente num buraco, a mendigar um
pouco de querosene, e eu - que vergonha de mim!, pelo
fato de ser m�dico e esp�rita e mais de ser esp�rita do que
m�dico, metido a n�o sei l� o qu�...

Todos, sem exce��o, n�o passamos de uma velha
gorda que mora ali na descida!... Aquela senhora
reivindicara todos os preconceitos sociais sobre si, e isto
sem fazer maiores alus�es � cor da pele, que, infelizmente,
ainda � um fator discriminat�rio na sociedade em que
vivemos.

Nunca mais, ao me olhar no espelho, eu me deixei de
ver transfigurado... Quando essa hidra de Lerna, que � a
vaidade, voltava a se insinuar, amea�ando colocar a cabe�a
de fora, ironizando a mim mesmo, eu a ironizava: �
Sossega, In�cio, que voc� n�o passa de uma velha gorda,
que mora ali na descida!...

Em troca dos trocados que eu lhe dera para o
querosene, aquela senhora, que passei sistematicamente a
visitar at� a sua desencarna��o, me dera luz ao esp�rito eu
nunca mais deixei que lhe faltasse querosene e ela nunca
mais deixou que me faltasse luz!

Por isto, quando percebo um esp�rita qualquer de
salto alto, por mais esguio e elegante se me apresente �
vis�o, concluo, sem pestanejar: � Est� dentro de um terno,
mas � uma velha gorda que mora ali na descida!...


voc� me escreve, perguntando: � "Dr.

In�cio, afinal, � In�cio ou Ignacio? Estamos confusos.
Esclare�a-nos, por favor. Seja como for, por�m, amamos o
senhor. Beijos!".

Ignacio, minha filha, � s� no papel... Acredite, seria
muita sofistica��o para quem, a bem da verdade, nem In�cio
se sente. Antes, o meu nome era mais comprido: Ign�cio
Ferreira de Oliveira! Foi assim que o meu pai me
registrou. Entrei na justi�a e... cancelei o Oliveira! Nada,
� claro, contra aqueles que, no pr�prio nome, recordam o
mart�rio de Jesus no Horto das Oliveiras, quando o Mestre
vertera l�grimas de sangue... Depois, por iniciativa pessoal,


cortei o g de Ign�cio, e simplifiquei para In�cio. Em meus
livros de literatura infantil, passei a me assinar apenas 1.
Ferreira! Na pr�xima encarna��o, tenciono cortar tamb�m

o Ferreira, reaparecendo no cen�rio terrestre como, de
fato, eu me sinto - apenas um 1!... Ora, se Chico nasceu
Francisco e atravessou a exist�ncia dizendo-se um cisco,
o que sobra para mim!
Conta-se que o nosso Batu�ra, Ant�nio Gon�alves da
Silva, um dos mais l�dimos pioneiros do Espiritismo no
Brasil, fundou um peri�dico, "Verdade e Luz", no qual
assinava artigos e cr�nicas sob o pseud�nimo "Ningu�m ";
somente �s v�speras de sua desencarna��o, come�ou a
assin�-los sob o ep�teto "Algu�m"... Batu�ra levou a
encarna��o inteira para, de "Ningu�m", promover-se a
"Algu�m", e isto com uma invej�vel folha de servi�os em
prol da Doutrina!

Teria gra�a, eu, um Jo�o Ningu�m qualquer, diante
de vultos t�o eminentes, que se destacaram em nossas
lides doutrin�rias, fazer quest�o de assinar o meu nome
com pompa, acrescentando letras, em vez de subtra�-las,
at� zerar-me totalmente?

Essa quest�o de nomes e sobrenomes, convenhamos,
ainda � muita vaidade nossa! J� tive oportunidade de dizer,
em um de meus escritos medi�nicos, que, quanto maior o
nome, maior o carma que a pessoa ostenta.

Seguindo os exemplos dos vultos do Cristianismo
nascente, que, quando se convertiam, mudavam de
identidade, simbolizando a morte do "homem velho" dentro

234


de si, Hippolyte-L�on Denizard Rivail, o Codificador,
sabiamente adotou o pseud�nimo Allan Kardec,
impessoalizando-se diante da Obra que uma pl�iade de
esp�ritos an�nimos lhe colocou nas m�os!

Assim, pois, como Saulo deixou de ser orgulhoso
rabino do Sin�drio para ser simplesmente Paulo, eu venho
tentando, minha filha, deixar de ser Ignacio, para ser somente
In�cio, com o intuito de, um dia, me tornar digno de perfilar
ao lado dos desconhecidos benfeitores da Humanidade,
como, por exemplo, Teresa, de Calcut�, e Irm� Dulce, da
Bahia, das quais duvido de que voc� conhe�a o sobrenome,
ou de Francisco, aquele da cidade de Assis, que conversava
com os p�ssaros e com as flores, e de Gandhi, que,
espontaneamente, denominavam "Mahatma".

Todavia - eu vou me queixar a voc� -, n�o querem
me deixar ser, como devemos, um pouco mais humilde.
Tenho plena convic��o de que lhe dir�o mais ou menos
assim: � "Esse Dr. In�cio, o nome n�o tem nada a ver..."
Se n�o tem nada a ver para eles, para mim tem! Ignacio,
permita-me o desabafo, � a vovozinha deles... Eu, num
esfor�o danado no campo do n�o-ser, e eles querendo que
eu seja! Ora, eu j� fui Ignacio em muitas encarna��es...
Chega! Atualmente, o que eu tenho desferido de sopapos
nesse espectro que teima em me reclamar a posse, n�o �
brincadeira... Quando penso que o levei a definitivo
nocaute, fazendo-o beijar a lona, eles o "ressuscitam" - e

o pior � que invadem a seara alheia!

Ent�o, minha filha, � In�cio mesmo e, caso me tentem
muito, eu vou passar a assinar apenas 1, porque, segundo
os Esp�ritos Superiores nos ensinam, em "O Livro dos
M�diuns", o que importa, na identifica��o de um
comunicado, no que tange � sua proced�ncia aproveit�vel,
� o teor da mensagem - o resto � disputa do personalismo,
principalmente por parte do instrumento medi�nico que
quer se projetar � custa dos mortos.

Voc� acha que eu j� n�o pensei no caso "Humberto
de Campos", que rendeu um processo contra o m�dium
Chico Xavier e a Federa��o Esp�rita Brasileira, em 1944?
Ainda bem que n�o deixei no mundo herdeiros diretos a
me reclamarem algo - penso que n�o; mas, amanh� ou
depois, caso surja algu�m, n�o sendo, � �bvio, o Irm�o X,
serei o Irm�o I !

Hoje em dia, a gente para escrever um simples bilhete
endere�ado � Terra, tem que pensar em tudo... A coisa �
feia, de todas as bandas que se lhe observe!

Agora, antes de encerrar, para dar a voc� mais uma
prova de que sou In�cio, e n�o Ign�cio, permita-me
extravasar, nestas linhas, toda a minha indigna��o. E muita
desfa�atez desse povo que, invadindo a seara alheia -a
seara medi�nica -, mude o nome da gente e, depois, a
gente � que fica com a obriga��o de se justificar. Seria
interessante que eles se colocassem em seu lugar, med�ocre
como � o meu, e o desse companheiro aqui que tem
apanhado feito massa de p�o de queijo... Recebam l� os
seus esp�ritos com Ph, ou Ph.D, com dois erres ou tr�s, se

236


quiserem, e deixem-nos quietos aqui onde nos encontramos,
em Uberaba, no interior de Minas Gerais, em um acanhado
c�modo do Lar Esp�rita "Pedro e Paulo", distante dos palcos
e dos holofotes que, gra�as a Deus, abominamos. Um �nico
holofote sobre mim, de uma l�mpada de 45 watts, ou mais
fraca ainda, me faria trope�ar nas pr�prias pernas, me
arremessando de cara no ch�o!

Quanta vaidade, quanta ambi��o, quanta �nsia pelo
poder, quanta vontade de ser aplaudido! H� pouco, vi falar
uma oradora que chorava numa palestra, sem derramar
uma �nica l�grima! Fiquei sem entender se se tratava de
uma palestra esp�rita ou uma pe�a de teatro. Outro orador,
quando terminou a prele��o, n�o abandonou o p�lpito
enquanto a plat�ia n�o o aplaudiu... Tamb�m fiquei sem
saber se bateram palmas pelo conte�do da palestra ou se
para o mandarem embora.

O que � isto? Qualquer coisa, menos Espiritismo.
Em p�blico, o pessoal chora e fala bem; no entanto, nos
bastidores, meu Deus!...

Voc� me desculpe, minha filha, mas eu sempre parti
do seguinte princ�pio: "Quem pergunta quer saber". E, at�
hoje, ecoam aos meus ouvidos as s�bias palavras de meu
pai:�"In�cio, n�o conv�m mexer com quem est� quieto..."
Algumas vezes, teimei e, com vara curta, cutuquei caixas
de marimbondos... O resultado, voc� � capaz de imaginar
qual foi, n�o �? Al�m de calombos pelo corpo, os verg�es
da cinta de meu pai nas pernas.


Retribuo os seus beijos, elegendo nas suas as
bochechas que desejo beijar neste instante, agradecendo,
comovido, o imenso carinho que o Brasil esp�rita me tem
dedicado - carinho que, sinceramente, n�o mere�o, mas
que me compele a tudo fazer para n�o decepcionar a
confian�a que, em mim, depositam. Neste sentido, o m�nimo
que posso fazer � continuar sendo sincero e fiel � Verdade,
mesmo sabendo quanto isto haver� ainda de me custar, da
parte daqueles cujos interesses contrario e com os quais,
efetivamente, diante de minha consci�ncia esp�rita, n�o
posso concordar.




De: Bons Amigos lançamentos





O Grupo Bons Amigos e o Grupo Só Livros com Sinopses têm o prazer de lançar hoje mais uma obra digital  no formato  pdf, epub e txt  para atender aos deficientes visuais.

Cartas do Dr. Inácio aos Espíritas - Carlos Baccelli/Inácio Ferreira
Livro doado por Bezerra e digitalizado por Fernando Santos
Sinopse:
Neste livro Dr. Inácio responde algumas das missivas que o sensibilizaram no Mais Além

Lançamento    Só Livros com sinopses e Grupo Bons Amigos:

)https://groups.google.com/forum/#!forum/solivroscomsinopses  


Grupo Bons Amigos grupo parceiro

2)https://groups.google.com/forum/#!forum/bons_amigos  


Blog:



Esta livro representa uma contribuição do grupo Bons Amigos  e Só livros com sinopses  para aqueles que necessitam de obras digitais como é o caso dos deficientes visuais 

e como forma de acesso e divulgação para todos. 
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